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Published by robersons900, 2022-03-17 09:47:51

LIVRO DE HISTORIA

LIVRO DE HISTORIA

Página 278

Para refletir

››Fonte 1

Zahar Editora

Fac-símile da capa do livro A Proclamação da República.
O golpe de 1889 – ou a “Proclamação da República”, como passou à história – foi um momento-
chave no surgimento dos militares como protagonistas no cenário político brasileiro. [...] Havia
muitos republicanos civis no final do Império, mas eles estiveram praticamente ausentes da
conspiração. O golpe republicano foi militar, em sua organização e execução. [...]
Todas as fontes disponíveis destacam a liderança que Benjamin Constant [...] exercia sobre a
“mocidade militar” formada na Escola Militar da Praia Vermelha. Ele seria o [...] “líder” [...] ou
“apóstolo” desses militares. [...]
Minha perspectiva, no entanto, focaliza não o “líder” [...] mas seus pretensos “liderados” [...]. Ao
invés de assistirmos a Benjamin Constant catequizando os jovens da Escola Militar,
encontraremos justamente a “mocidade militar” seduzindo-o e convertendo-o para o ideal
republicano. Atribuo à “mocidade militar”, portanto, o papel de protagonista da conspiração
republicana no interior do Exército.

CASTRO, Celso. A proclamação da República. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2000. p. 8-10. (Descobrindo o Brasil).

››Fonte 2

Em 15 de novembro de 1889, a Monarquia era derrubada por um golpe militar e proclamava-
se a República.
O movimento resultou da conjugação de três forças: uma parcela do Exército, fazendeiros do
Oeste Paulista e representantes das classes médias urbanas que, para a obtenção dos seus
desígnios, contaram indiretamente com o desprestígio da Monarquia e o enfraquecimento das
oligarquias tradicionais. [...]
O ano de 1889 não significou uma ruptura do processo histórico brasileiro. As condições de
vida dos trabalhadores rurais continuaram as mesmas; permaneceram o sistema de produção

e o caráter colonial da economia, a dependência em relação aos mercados e capitais
estrangeiros.

COSTA, Emília Viotti da. Da Monarquia à República: momentos decisivos. 8. ed. São Paulo: Fundação Editora Unesp,
2007. p. 491-492.

a) Como Celso Castro vê a proclamação da República?

a) Ele a vê como um golpe organizado e executado por militares.

b) No texto, Celso Castro minimiza o papel de oficiais como o major Benjamin
Constant na proclamação da República. Justifique.

b) Na visão dele, foi a juventude militar que seduziu Benjamin Constant e não o inverso. [Celso Castro reuniu uma enorme
documentação e apresentou a mocidade militar como principal protagonista no golpe que instalou a República no Brasil.]

c) Compare a visão do autor da fonte 1 à da autora da fonte 2 sobre a proclamação
da República.

c) Semelhança: tanto o autor da fonte 1 quanto a autora da fonte 2 veem a proclamação da República como um “golpe” de
Estado. Diferença: para Celso Castro, o golpe republicano de 1889 foi organizado e executado pelos militares; já para Emília
Viotti o golpe republicano resultou da ação de três forças conjugadas: uma parcela do Exército, os fazendeiros do Oeste
Paulista e os representantes das camadas médias.

d) Em dupla. Qual das versões vocês consideram mais convincente? Justifiquem.

d) Resposta pessoal. Professor: a atividade visa familiarizar os alunos com o debate historiográfico em torno da
proclamação da República e estimulá-los a argumentar em defesa de um ponto de vista.

Página 279

O período de 1889-1894 é conhecido como República da Espada pelo fato de o
país ter sido governado por militares; já o período de 1894-1930 é chamado de
República Oligárquica, pois o poder esteve, em grande parte, nas mãos das
famílias poderosas de cada estado, as oligarquias estaduais (o termo “oligarquia”
vem do grego oligarkhía, que significa “governo exercido por um pequeno número
de pessoas ou de famílias”).

O governo de Deodoro da Fonseca

Iniciado em 1889, o governo de Deodoro da Fonseca tomou algumas medidas
importantes:
»» separou a Igreja católica do Estado e criou o registro civil para nascimento,
casamento e óbito;
»» secularizou os cemitérios, que deixaram então de ser controlados pela Igreja e
passaram ao controle das autoridades municipais;
»» criou novos símbolos nacionais; a nova bandeira tinha por lema uma máxima
de inspiração positivista: a Ordem por base e o Progresso por fim.
Deodoro da Fonseca indicou ministros de diferentes tendências republicanas: o
Ministério da Guerra foi entregue ao militar positivista Benjamin Constant; o
Ministério das Relações Exteriores, ao republicano civil Quintino Bocaiuva; o
Ministério da Fazenda, ao intelectual baiano Rui Barbosa.

A reforma e a crise financeira

Durante sua gestão, Rui Barbosa promoveu uma reforma financeira visando,
sobretudo, à industrialização do Brasil. Como a quantidade de moeda em
circulação no país era insuficiente para financiar a arrancada industrial e pagar
salários, Rui Barbosa baixou decretos autorizando quatro bancos a emitir dinheiro
e a conceder empréstimos àqueles que desejassem abrir uma empresa (1890).
Mas, em vez de aquecer a economia, a expansão do crédito propiciou intensa
especulação: foram criadas empresas-fantasmas, que só existiam no papel. As
ações dessas empresas fictícias eram vendidas na Bolsa de Valores. Tempos
depois, quando os acionistas tentavam vender suas ações, percebiam que elas não
tinham nenhum valor. O resultado foi uma crise de graves proporções. Os preços
das ações despencaram, os pequenos investidores perderam seu dinheiro para os
especuladores, e muitas empresas antigas fecharam suas portas.

Especulação: prática que consiste em criar uma procura ou oferta artificial de um bem ou de uma
mercadoria visando obter lucro.

Bolsa de Valores: local em que são negociados determinados papéis de empresas e do governo. Os papéis
do governo são chamados de títulos e os das empresas, de ações.

Nos dois primeiros anos da República, a inflação disparou, saltando de 1,1% para
89,9%, e a moeda brasileira perdeu o valor. A crise resultante da política
industrialista de Rui Barbosa recebeu o apelido de encilhamento. O nome vem do
verbo “encilhar” (colocar arreios ou cilhas no cavalo para prepará-lo para a
corrida). Como o clima de jogatina existente no lugar onde os jóqueis encilhavam
cavalos e onde os jogadores faziam suas apostas era semelhante ao da Bolsa de
Valores, o nome encilhamento estendeu-se à crise.

Inflação: aumento generalizado e contínuo dos preços, resultando na perda do poder aquisitivo da moeda.

Criticado por muitos, sobretudo pelos representantes da cafeicultura paulista, Rui
Barbosa demitiu-se em janeiro de 1891.

Dica! Documentário sobre a vida de Rui Barbosa. [Duração: 30 minutos]. Acesse:
<http://tub.im/rye6ff>.

Página 280

Constituição e cidadania na jovem República

Ansiosos para aumentar seu poder, os políticos paulistas influenciaram a
Assembleia Constituinte, que aprovou a primeira Constituição republicana.
Inspirada no modelo norte-americano, a Constituição de 24 de fevereiro de 1891:
»» adotou o federalismo: as antigas províncias foram transformadas em estados.
E cada um dos então 20 estados da federação passou a ter autonomia para contrair
empréstimos no exterior, ter forças militares próprias (as forças públicas
estaduais), criar e cobrar impostos.
»» estabeleceu três poderes: Executivo: exercido pelo presidente da República e
por um vice-presidente, eleitos por um período de quatro anos. Legislativo:
exercido pelo Congresso Nacional, formado pela Câmara dos Deputados e pelo
Senado. Judiciário: tinha como órgão máximo o Supremo Tribunal Federal.
»» restringiu o direito ao voto: somente os homens maiores de 21 anos,
brasileiros e alfabetizados podiam votar, desde que não fossem soldados ou
membros do clero regular, como monges e frades. As mulheres não tinham direito
ao voto. A jovem República, portanto, excluía a maioria do acesso à cidadania.
Em 1890, Deodoro foi eleito presidente por meio do voto indireto.

Pereira Neto. 1890. Desenho. Coleção particular

A charge mostra os deputados constituintes que elegeram Deodoro da Fonseca (ao centro, à direita)
e Floriano Peixoto (ao centro, à esquerda) para a presidência e a vice-presidência da República,
respectivamente. As figuras femininas representam os estados da República.

Na presidência, enfrentou forte oposição por ter nomeado um monarquista – o
barão de Lucena – para o Ministério da Fazenda e por ter sido responsável pelo
encilhamento. Quando os parlamentares da oposição aprovaram um projeto
limitando seu poder, Deodoro da Fonseca fechou o Congresso.

Diante disso, a oposição ao seu governo cresceu, e a Marinha ameaçou bombardear
a cidade do Rio de Janeiro, caso ele não renunciasse. Esse episódio ficou conhecido
como Primeira Revolta da Armada (1891).

Isolado politicamente, Deodoro da Fonseca renunciou em favor do seu vice,
Floriano Peixoto, afirmando que o fazia para evitar uma guerra civil.

Dica! Animação sobre o governo de Deodoro da Fonseca. [Duração: 2 minutos]. Acesse:
<http://tub.im/zhjbwm>.

Página 281

O governo de Floriano Peixoto

Floriano Peixoto convidou membros do Partido Republicano Paulista (PRP) para
compor o ministério e, ao mesmo tempo, favoreceu a população mais pobre
reduzindo os aluguéis e tabelando o preço do pão, do feijão, da batata, entre outros.
Apesar disso, durante seu mandato, Floriano Peixoto teve de enfrentar muitos
inimigos: políticos civis organizaram uma campanha antiflorianista, com base no
artigo 42 da Constituição, exigindo novas eleições presidenciais, e oficiais do
Exército assinaram o Manifesto dos Treze Generais, exigindo sua renúncia. Esse
artigo estipulava que, se o cargo da presidência ou vice-presidência estivesse vago
antes de decorridos dois anos do mandato, haveria nova eleição. Como Deodoro
governara menos de nove meses, os antiflorianistas reclamavam nova eleição.
Floriano reuniu forças para enfrentar os civis e aposentou os generais que queriam
depô-lo. 1

1. Dica! Animação sobre o governo de Floriano Peixoto. [Duração: 2 minutos]. Acesse:
<http://tub.im/rbw4f5>.

1910. Arquivo Público Mineiro, Belo Horizonte.

Por suas atitudes decididas à frente do governo da República, Floriano Peixoto ficou conhecido
como Marechal de Ferro.

A Revolução Federalista

Outro desafio enfrentado por Floriano Peixoto foi a Revolução Federalista – uma
guerra civil sangrenta resultante da disputa pelo poder no Rio Grande do Sul
(1893).

De um lado, estavam os seguidores do republicano Júlio de Castilhos (conhecidos
como pica-paus). De outro, os adeptos de Gaspar Silveira Martins (apelidados de
maragatos).

A guerra civil gaúcha esquentou e repercutiu nacionalmente quando os castilhistas
receberam o apoio de Floriano Peixoto e os seus adversários, os gasparistas,
obtiveram o apoio da Marinha.

Enquanto isso, no Rio de Janeiro, iniciou-se a Segunda Revolta da Armada
(1893).

Liderada pelo oficial Custódio José de Melo, a Marinha começou a bombardear a
cidade do Rio de Janeiro, exigindo a renúncia imediata de Floriano Peixoto e a
realização de novas eleições.

Buscando unir forças para derrubar o presidente, os oficiais da Marinha
deslocaram seus navios para o Sul e se juntaram aos federalistas (os maragatos),
que haviam ocupado Desterro, em Santa Catarina. Floriano Peixoto, porém,
conseguiu dinheiro com os cafeicultores paulistas, comprou navios, submeteu a
Marinha e reprimiu também os federalistas gaúchos.

Desterro: depois de retomada pelo governo, a cidade de Desterro passou a se chamar Florianópolis, em
homenagem a Floriano Peixoto.

A guerra civil gaúcha só terminou em 1895, um ano depois do fim do mandato
presidencial. Mas, quando Floriano Peixoto deixou a presidência, a República
estava consolidada. 2

2. Dica! Reportagem sobre a Revolução Federalista. [Duração: 9 minutos]. Acesse:
<http://tub.im/4tp9pv>.

Página 282

ATIVIDADES

ESCREVA NO CADERNO.

I. Retomando

1. (Enem/MEC – 2013)
A escravidão não há de ser suprimida no Brasil por uma guerra servil, muito menos por
insurreições ou atentados locais. Não deve sê-lo, tampouco, por uma guerra civil, como o foi
nos Estados Unidos. Ela poderia desaparecer, talvez, depois de uma revolução, como aconteceu
na França, sendo essa revolução obra exclusiva da população livre. É no Parlamento e não em
fazendas ou quilombos do interior, nem nas ruas e praças das cidades, que se há de ganhar, ou
perder, a causa da liberdade.

NABUCO, Joaquim. O abolicionismo [1883]. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; São Paulo: Publifolha, 2000 (adaptado).

No texto, Joaquim Nabuco defende um projeto político sobre como deveria ocorrer o fim da
escravidão no Brasil, no qual
a) copiava o modelo haitiano de emancipação negra.
b) incentivava a conquista de alforrias por meio de ações judiciais.
c) optava pela via legalista de libertação.
d) priorizava a negociação em torno das indenizações aos senhores.
e) antecipava a libertação paternalista dos cativos.

1. Resposta: c.

2. (Unimontes-MG – 2014)
[...] Mesmo depois de abolida a escravidão // negra é a mão de quem faz a limpeza // lavando a
roupa encardida, esfregando o chão // negra é a mão, é a mão da pureza // negra é a vida
consumida ao pé do fogão // negra é a mão nos preparando a mesa // limpando as manchas
do mundo com água e sabão. [...]

GIL, Gilberto. A mão da limpeza. In: www.gilbertogil.com.br/sec-disco-info. Acesso em: 3 abr. 2014.

As ações desempenhadas pelos negros, nos versos dessa canção, tornaram-se comuns no Brasil,
entre outras coisas, porque
a) as atividades intelectuais, consideradas supérfluas em fins do século XIX, foram relegadas a um
plano secundário pelo Estado e pela sociedade em todos os níveis, limitando, igualmente, a
ascensão de negros, mestiços e brancos.
b) a Lei Áurea previa que, aos alforriados, seria garantido com exclusividade o exercício de
profissões que demandassem habilidade manual, em face do desinteresse dos negros pela ciência.

c) a abolição da escravidão se fez sem uma preocupação política de garantir ao povo negro o acesso
à cidadania plena e sem a garantia de condições para a conquista da igualdade intelectual.
d) estudos antropológicos de grandes universidades demonstraram que a habilidade manual era
inerente ao povo negro, fosse esse de origem africana ou mesmo crioulo e mestiço, nascido no
Brasil.

2. Resposta: c.

3. (UEG-GO – 2016) Observe a charge a seguir.

2016

Disponível em: <http://www.overmundocom.br/uploads/overblogimg/1215630971_ordemeprogresso.jpg>. Acesso
em: 9 out. 2015.

A charge ironiza o dístico “ordem e progresso”, presente na atual Bandeira do Brasil. A sua origem e
significado remetem a um contexto marcado

Página 283

a) pela presença do catolicismo romano nas instituições políticas do Império Brasileiro e o esforço
de preservar a ordem social vigente.
b) pela influência do positivismo francês entre os oficiais militares republicanos e uma postura
ideológica das elites dirigentes em evitar radicalismos políticos.
c) pelo desejo dos oficiais militares republicanos em romper os laços com a sociedade agrária
imperial, inspirando-se no liberalismo norte-americano.
d) pelo esforço das elites agrárias paulista e mineira em manter os seus privilégios sociais e
políticos, mas, ao mesmo tempo, buscando o progresso econômico.

3. Resposta: b.

4. (Enem/MEC – 2015)
Iniciou-se em 1903 a introdução de obras de arte com representações de bandeirantes no
acervo do Museu Paulista, mediante a aquisição de uma tela que homenageava o sertanista que
comandara a destruição do Quilombo de Palmares. Essa aquisição, viabilizada por verba
estadual, foi simultânea à emergência de uma interpretação his- tórica que apontava o
fenômeno do sertanismo paulista como o elo decisivo entre a trajetória territorial do Brasil e
de São Paulo, concepção essa que se consolidaria entre os historiadores ligados ao Instituto
Histórico e Geográfico de São Paulo ao longo das três primeiras décadas do século XX.

MARINS, P. C. G. Nas matas com pose de reis: a representação de bandeirantes e a tradição da retratística monárquica
europeia. Revista do IEB, n. 44, fev. 2007.

A prática governamental descrita no texto, com a escolha dos temas das obras, tinha como
propósito a construção de uma memória que
a) afirmava a centralidade de um estado na política do país.
b) resgatava a importância da resistência escrava na história brasileira.
c) evidenciava a importância da produção artística no contexto regional.
d) valorizava a saga histórica do povo na afirmação de uma memória social.
e) destacava a presença do indígena no desbravamento do território colonial.

4. Resposta: a.

II. Leitura e escrita em História

a. Leitura e escrita de textos

PROFESSOR, VER MANUAL.

VOZES DO PRESENTE

Bestializados ou bilontras?

O povo assistiu bestializado à proclamação da República, segundo Aristides Lobo; não havia
povo no Brasil, segundo observadores estrangeiros, inclusive os bem informados como Louis
Couty; o povo fluminense não existia, afirmava Raul Pompeia. Visão preconceituosa de
membros da elite [...]? Etnocentria de franceses? [...]

Página 284

Editora Cia. das Letras

Fac-símile da capa de Os Bestializados, de José Murilo de Carvalho.
Havia tribofe na política, na bolsa, no câmbio, na imprensa, no teatro, nos bondes, nos
aluguéis, no amor. Não se obedecia nem à lei dos homens, nem a de Deus. Como diria o próprio
tribofe: “Ah, minha amiga, nesta boa terra os mandamentos da lei de Deus são como as
posturas municipais... Ninguém respeita!” [...]
Havia consciência clara de que o real se escondia sob o formal. [...] Perdia-se o humor apenas
quando o governo buscava impor o formal, quando procurava aplicar a lei literalmente. Nesses
momentos o entendimento [...] era quebrado, o poder violava o pacto, a constituição não
escrita. Então tinha de recorrer à repressão, ao arbítrio, o que gerava a revolta em resposta.
Mas [...] eram momentos de crise, não o cotidiano.
O povo sabia que o formal não era sério. Não havia caminhos de participação, a República não
era para valer. Nessa perspectiva, o bestializado era quem levasse a política a sério, era o que
se prestasse à manipulação. Num sentido [...], a política era tribofe. Quem apenas assistia, como
fazia o povo do Rio por ocasião das grandes transformações realizadas a sua revelia, estava
longe de ser bestializado. Era bilontra.

CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. São Paulo: Companhia das
Letras, 1987. p. 140, 159-160.

Tribofe: gíria da época que significa trapaça, enganação, engodo. Em 1891, Artur Azevedo lançou uma revista
denominada O tribofe, cujo conteúdo continha forte crítica social e por meio do humor ironizava o
comportamento do fluminense.
a) O que Aristides Lobo quis dizer com “o povo assistiu bestializado à proclamação da República”?
b) Na visão do autor, a República incluiu o povo ou o manteve excluído da política? Justifique.
c) Como o autor do texto responde à pergunta contida no título?
d) Você considerou convincente o argumento do autor? Justifique.

b. Cruzando fontes

››Fonte 1

O texto a seguir é da professora da Universidade de São Paulo Emília Viotti da Costa. Leia-o com
atenção.

O rápido crescimento das plantações de café fez do trabalho o problema mais urgente. Como
podiam os fazendeiros satisfazer suas necessidades de trabalho após a interrupção do tráfico
de escravos? [...] Os fazendeiros das áreas em expansão haviam encontrado a resposta na
imigração. [...] Como eles não se organizaram para defender a instituição, a escravidão foi
abolida por um ato do Parlamento sob os aplausos das galerias. Promovida principalmente por
brancos, ou por negros cooptados pela elite branca, a abolição libertou os brancos do fardo

Página 285

da escravidão e abandonou os negros à sua própria sorte.

COSTA, Emília Viotti da. DA MONARQUIA À REPÚBLICA: momentos decisivos. São Paulo: Ed. Unesp. 2007. p. 366.

››Fonte 2

O trecho a seguir é da professora da Universidade Federal Fluminense Hebe Mattos. Leia-o com
atenção.
Festejada por milhares de pessoas, a Abolição foi um acontecimento ímpar. Pela primeira vez
se reconheceu a igualdade civil de todos os brasileiros. Mesmo que não tenha significado sua
imediata efetivação, marca a invenção de uma cidadania brasileira entendida em termos
universais. Porém, até o surgimento dos movimentos negros do século XX, a hierarquização
racial pouco se modificou.

MATTOS, Hebe M. A face negra da Abolição. In: Revista Nossa História, ano 2, n. 19, p. 20 maio 2005.

a) Segundo a autora da fonte 1, qual foi a solução encontrada pelos fazendeiros das áreas onde o
café se expandia?
b) Para a autora da fonte 1, qual foi o significado da Abolição?
c) A autora da fonte 2 concorda com a autora da fonte 1 quanto ao significado da Abolição?
Justifique.
d) Em dupla: debatam, argumentem: qual das duas interpretações da Abolição é mais convincente?
Justifiquem.

III. Você cidadão!

O texto a seguir trata de d. Obá II, filho de um príncipe africano nascido na vila dos Lençóis, no
sertão da Bahia, em 1845. Seu nome de batismo era Cândido da Fonseca Galvão.
Príncipe guerreiro, d. Obá apresentou-se para lutar na Guerra do Paraguai (1864-1870), saindo
oficial (...) do exército, por bravura. Em 1877, fixou residência no Rio de Janeiro, onde passou a
fazer campanha por melhores condições de vida, igualdade racial, abolição da chibata e da
escravatura.
Abolição da chibata: abolição dos castigos físicos ministrados com a chibata (vara usada para surrar
pessoa ou animal).
Com dois metros de altura, voz firme e modos de soberano, sua figura imponente chamava
atenção. Apresentava-se sempre bem vestido, de fraque, cartola, luvas, guarda-chuva, bengala,
pincenê de ouro e suas “finas roupas pretas” [...].
Pincenê: óculos sem haste preso ao nariz por uma mola.
A elite da época, ignorando a história da África e os direitos reais africanos, entendia d. Obá II
como um subproduto da Guerra do Paraguai [...] uma espécie de veterano resmungão, “meio
amalucado”, figura meramente folclórica. Por outro lado, o povo negro reconhecia e se-

Editora Cia. das Letras

Fac-símile da capa do livro Dom Obá II D’África, o Príncipe do Povo, de Eduardo Silva.

Página 286

guia sua liderança como príncipe real. Escravos, negros libertos do cativeiro e homens negros
livres, ou seja, que nunca foram escravos, não só compartilhavam suas ideias como
contribuíam financeiramente para a publicação nos jornais. E depois se reuniam em suas
modestas casas para ler em voz alta e discutir os artigos.
Mas o que interessava tanto aos leitores? D. Obá pensava de um modo bem diverso da elite que
via as raças humanas essencialmente diferentes; para ele, pareciam perfeitamente
semelhantes, e o valor dos homens não estava na cor da pele, mas no mérito, no valor
guerreiro e humano de cada um. Por isso, a defesa da igualdade entre os homens se torna um
dos pontos centrais de sua prática política, e a abolição total da escravatura vira sua bandeira
de luta pública a partir de 1882.
Soldado valoroso, defensor da pátria nos campos da batalha, d. Obá II d’África se sentia com
autoridade moral para criticar abertamente a classe dominante e os escravistas [...]
E quando sentia que o rumo dos acontecimentos necessitava de uma boa ajuda, apelava para
as forças do sincretismo afro-brasileiro: “invoco sempre ao bem estar dos conselheiros
enfermos [...] em todas as minhas preces [...] a santa Bárbara e aos mais santos da África [...]”.

SILVA, Eduardo. O rei dos excluídos. In: Revista Nossa História, ano 2, n. 19, p. 22-24, maio 2005.

Segundo o texto, o modo como a elite da época via d. Obá é muito diferente do modo como o povo
negro o via. Explique:
a) Como a elite da época via d. Obá?
b) Como o povo negro o via?
c) Como o autor do texto explica essa diferença?
d) Por que d. Obá atraía tanto os seus leitores?
e) Em dupla. Debatam, reflitam e opinem sobre a visão de d. Obá segundo a qual o valor dos
homens não estava na cor da pele, mas no mérito, no valor guerreiro e humano de cada um.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Sugestões de leitura complementar

AMADO, Janaína; FIGUEIREDO, Luiz Carlos. A formação do império português: (1415-1580). São Paulo:
Atual, 1999.
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DECCA, Edgar Salvadori de. O nascimento das fábricas. São Paulo: Brasiliense, 1996.
FALCON, Francisco José Calazans. Iluminismo. São Paulo: Ática, 1994.
FAUSTO, Carlos. Os índios antes do Brasil. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.

FERREIRA, Jorge Luiz. Conquista e colonização da América espanhola. São Paulo: Ática, 1996.
FUNARI, Pedro Paulo; GALDINO, Luiz. Os antigos habitantes do Brasil. São Paulo: Editora da
Unesp/Imprensa Oficial, 2001.
FURTADO, Júnia Ferreira. Cultura e sociedade no Brasil colônia. São Paulo: Atual, 2004.
GRESPAN, Jorge Luís da Silva. Revolução Francesa e Iluminismo. São Paulo: Contexto 2003.
IGLESIAS, Francisco. Revolução Industrial. São Paulo: Brasiliense, 1981.
LOPEZ, Luiz Roberto. História da América Latina. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1998.
MATTOS, Regiane Augusto de. História e cultura afro-brasileira. São Paulo: Contexto, 2007.
MAURO, Frédéric. O Brasil no tempo de D. Pedro II: 1831- 1889. São Paulo: Companhia das Letras, 1991.
MELATTI, Julio Cezar. Índios do Brasil. São Paulo: EDUSP, 2007.

Página 287

MICELI, Paulo. As revoluções burguesas. São Paulo: Atual, 2005.

MOTA, Carlos Guilherme. Revolução Francesa. São Paulo: Ática, 2004.

PINSKY, Jaime. A escravidão no Brasil. São Paulo: Contexto, 2000.

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REMOND, René. História dos Estados Unidos. São Paulo: Martins Fontes, 1989.

SOUZA, Iara Lis. A Independência do Brasil. Rio de Janeiro: Zahar, 2009.

SPOSITO, Fernanda. Nem cidadãos, nem brasileiros: indígenas na formação do Estado nacional brasileiro
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Bibliografia

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ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986.

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Página 289

MATERIAIS DE APOIO AO PROFESSOR

Página 290

Em nossos dias, já ninguém duvida de que a história do mundo deve ser
reescrita de tempos em tempos. Esta necessidade não decorre, contudo, da
descoberta de numerosos fatos até então desconhecidos, mas do nascimento de
opiniões novas, do fato de que o companheiro do tempo que corre para a foz
chega a pontos de vista de onde pode deitar um olhar novo sobre o passado...

GOETHE. Geschichte der Farbenlehre. In: SCHAFF, Adam. História e verdade. São Paulo: Martins Fontes, 1991. p. 267.

Página 291

SUMÁRIO

1. METODOLOGIA DA HISTÓRIA 292
1.1. Visão de área 292
1.2. Correntes historiográficas 293
1.3. Pressupostos teóricos 295
1.4. Objetivos para o ensino de História 296
1.5. Conceitos-chave da área de História 297

2. METODOLOGIA DE ENSINO-APRENDIZAGEM 299
2.1. O conhecimento histórico escolar 300
2.2. A nova concepção de documento. 300
2.3. O trabalho com imagens 302
2.4. Um novo paradigma 311
2.5. O Pisa e a competência leitora 314
2.6. Uma contribuição à adoção de uma perspectiva interdisciplinar 318

3. CIDADANIA, ETNIA E GÊNERO 322
3.1. A temática afro 323
3.2. A temática indígena 328
3.3. A temática de gênero 332

4. AS SEÇÕES DA OBRA 336
4.1. Páginas de abertura das unidades 336
4.2. Página de abertura de capítulo 336
4.3. Corpo do capítulo 336
4.4. Seções internas 336
4.5. Atividades 337

5. PLANEJAMENTO, TEXTOS E ATIVIDADES COMPLEMENTARES 339

Unidade I | Nós e os outros: a questão do etnocentrismo 339

Planejamento 339
Textos complementares 341
Atividades complementares 343

Unidade II | Diversidade e pluralismo cultural 348

Planejamento 348
Textos complementares 350
Atividades complementares 353

Unidade III | Cidadania: passado e presente 357

Planejamento 357
Textos complementares 359
Atividades complementares 362

Unidade IV | Terra e liberdade 366

Planejamento 366
Textos complementares 368
Atividades complementares 370

6. SUGESTÕES DE RESPOSTAS E COMENTÁRIOS DAS ATIVIDADES PROPOSTAS
NO LIVRO DO ALUNO 374
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 383

Página 292

1. Metodologia da História

1.1. Visão de área

Vivemos hoje imersos em um presente contínuo (presenteísmo), que tende a tornar
invisíveis as relações entre a nossa experiência presente e o passado público. Vivemos
também em um universo mediado por imagens, no qual uma avalanche de paisagens,
fatos e processos chegam até nós por meio das representações que deles são
produzidas. Por isso, e cada vez mais, “substituímos nossas experiências pelas
representações dessas experiências” (SALIBA, Elias Thomé. As imagens canônicas e o
ensino de História. Curitiba: UFPR, 1998. p. 117).

Vivendo imersos nesse mundo virtual e apreendendo o que “aconteceu” por meio dos
telejornais com frases sintéticas e imagens fragmentadas, os jovens são levados a
identificar aquilo que estão vendo com a “verdade” e a explicar o presente com base
nele próprio. Ocorre que o complemento desse presenteísmo avassalador é a
destruição do passado, o que pode afetar muito, e negativamente, as novas gerações.
Veja o que diz sobre o assunto o historiador britânico Eric Hobsbawm:

A destruição do passado – ou melhor, dos mecanismos sociais que vinculam nossa experiência pessoal à
das gerações passadas – é um dos fenômenos mais característicos e lúgubres do final do século XX. Quase
todos os jovens de hoje crescem numa espécie de presente contínuo, sem qualquer relação orgânica com
o passado público da época em que vivem. Por isso os historiadores, cujo ofício é lembrar o que outros
esquecem, tornam-se mais importantes que nunca no fim do segundo milênio. Por esse mesmo motivo,
porém, eles têm de ser mais que simples cronistas, memorialistas e compiladores.

HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos: o breve século XX (1914-1991). São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 13.

Se a destruição do passado pode resultar em uma tragédia para as novas gerações, a
alienação dela decorrente pode facilitar a emergência e a imposição de ditaduras
brutais, como as que vitoriaram nas décadas de 1930 e 1940 em países da Europa
Ocidental e Oriental. Ademais, a consciência de que o passado se perpetua no presente
é fundamental para o nosso sentido de identidade. Saber o que fomos ajuda-nos a
compreender o que somos; o diálogo com outros tempos aumenta a nossa
compreensão do tempo presente. Como observou um estudioso:

O passado nos cerca e nos preenche; cada cenário, cada declaração, cada ação conserva um conteúdo
residual de tempos pretéritos. Toda consciência atual se funda em percepções e atitudes do passado;
reconhecemos uma pessoa, uma árvore, um café da manhã, uma tarefa, porque já os vimos ou já os
experimentamos.

LOWENTHAL, David, 1998 apud OLIVEIRA, Margarida Maria Dias de (Coord.). História: ensino fundamental. Brasília,
DF: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2010. p. 160. v. 21. (Explorando o ensino).

Quanto ao modo de abordar o passado, consideramos importante evitar o
anacronismo1 e, seguindo a recomendação de Georges Duby, lembrar que, para

1 1 Anacronismo: consiste em atribuir aos agentes históricos do passado razões ou sentimentos gerados no presente,
interpretando-se, assim, a história em função de critérios inadequados, como se os atuais fossem válidos para todas
as épocas. BRASIL. Edital de convocação para o processo de inscrição e avaliação de obras didáticas para o Plano

conhecer uma determinada sociedade do passado, é importante colocarmo-nos na
pele das pessoas que viveram naqueles tempos. Essa postura, sugerida por ele na
abordagem do medievo ocidental, é, a nosso ver, útil no trabalho com qualquer
sociedade humana, independentemente de tempo ou lugar.
Como lembra Marc Bloch no seu clássico Apologia da história ou o ofício do
historiador: além de prejudicar o conhecimento do presente, a ignorância do passado
compromete também a nossa ação no presente. Assim sendo, não é demais lembrar
que a História tem um duplo compromisso: com o passado e com o presente, bem

Nacional do Livro Didático. PNLD 2018. Brasília, DF: Ministério da Educação, Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação, Secretaria de Educação Básica, 2015. p. 47.

Página 293

como com as relações entre um e outro. Dissertando sobre esse duplo compromisso da
História, Jaime Pinsky observou:

Compromisso com o presente não significa, contudo, presenteísmo vulgar, ou seja, tentar encontrar no
passado justificativas para atitudes, valores e ideologias praticados no presente (Hitler queria provar
pelo passado a existência de uma pretensa raça ariana superior às demais). Significa tomar como
referência questões sociais e culturais, assim como problemáticas humanas que fazem parte de nossa
vida, temas como desigualdades sociais, raciais, sexuais, diferenças culturais, problemas materiais e
inquietações relacionadas a como interpretar o mundo, lidar com a morte, organizar a sociedade,
estabelecer limites sociais, mudar esses limites, contestar a ordem, consolidar instituições, preservar
tradições, realizar rupturas...

Compromisso com o passado não significa estudar o passado pelo passado, apaixonar-se pelo objeto de
pesquisa por ser a nossa pesquisa, sem pensar no que a humanidade pode ser beneficiada com isso.
Compromisso com o passado é pesquisar com seriedade, basear-se nos fatos históricos, não distorcer o
acontecido, como se esse fosse uma massa amorfa à disposição da fantasia de seu manipulador. Sem o
respeito ao acontecido a História vira ficção. Interpretar não pode ser confundido com inventar. E isso
vale tanto para fatos como para processos.

PINSKY, Jaime. In: KARNAL, Leandro (Org.). História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas. São Paulo:
Contexto, 2003. p. 23-24.

Vale dizer, ainda, que o historiador se volta para o passado a partir de questões
colocadas pelo presente. Depois de estabelecer um determinado recorte, ele
transforma o tema em problema. A partir daí, trata-o com base em instrumentos e
métodos próprios da História. Por isso se diz que toda narrativa histórica está
relacionada a seu tempo e também é objeto da História.

1.2. Correntes historiográficas

Se, por um lado, “toda história é filha do seu tempo”, por outro é preciso lembrar que
ela é fruto de várias tradições de pensamento que se materializam em diferentes
correntes historiográficas. No texto a seguir, a professora Sandra Regina Ferreira de
Oliveira apresenta, em linhas gerais, e de modo resumido, os pressupostos de três
importantes escolas historiográficas, que podem ser úteis à nossa reflexão e docência.
A familiaridade com essas correntes pode, por exemplo, ajudar a reconhecer a opção
teórica do autor do material didático que estamos analisando e o lugar de onde ele
fala.

[...] São três as correntes mais discutidas: Positivismo, Materialismo Histórico e Nova História.

Positivismo é o nome de uma corrente filosófica originada no século XVIII, no contexto do processo de
industrialização da sociedade europeia. Para os pensadores positivistas cabe à história fazer um
levantamento descritivo dos fatos. “A história por eles escrita é uma sucessão de acontecimentos
isolados retratando, sobretudo, os feitos políticos de grandes heróis, os problemas dinásticos, as
batalhas, os tratados diplomáticos etc.” (BORGES, 1987, p. 32-33). Neste sentido, os documentos oficiais
são as principais fontes de investigação assim como as ações do Estado são as eleitas para constituírem a
narrativa histórica. A concepção de tempo nesta forma de abordagem histórica é caracterizada pela
linearidade (sucessão) dos fatos porque são os fatos o objeto de estudo da história.

Com a efetivação do capitalismo na sociedade europeia do século XIX, proliferam-se as críticas à

sociedade burguesa e outra teoria explicativa para a realidade foi elaborada buscando a superação da
mesma – o materialismo dialético. Karl Marx e Friedrich Engels podem ser destacados como os
principais pensadores desta corrente filosófica para a qual a necessidade de sobrevivência do homem
impele-o a transformar a natureza e, ao transformar a natureza, transforma a si mesmo, numa relação
dialética. Essa ação humana não se dá de forma isolada, mas em conjunto. Portanto, o “ponto de partida
do conhecimento da realidade são as relações que os homens mantêm com a natureza e os outros

Página 294

homens” (BORGES, 1987, p. 35), analisadas a partir das condições materiais de existência.

A investigação histórica realizada a partir dos pressupostos do materialismo dialético considera que a
realidade é dinâmica, dialética e repleta de contradições, gerada pela luta entre as diferentes classes
sociais. Portanto, a concepção de tempo que podemos identificar nesta corrente de pensamento busca
explicar o passado, não somente a partir do tempo do acontecimento, mas da contradição que pode ser
encontrada em todo fato e, para compreender a contradição, faz necessário deslocar-se temporalmente,
intentando como determinados fatos se constituíram historicamente e por que se apresentam de tal
forma ao homem no presente.

Ainda que com o materialismo histórico tenha se constituído uma forma diferente de investigação sobre
o passado e, consequentemente, provocado mudanças na narrativa histórica, foi com a Nova História,
mais precisamente com a Escola dos Annales, em 1929, que a concepção de tempo na historiografia sofre
significativas alterações.

A alteração na concepção de tempo deve ser compreendida a partir da concepção de História, ou melhor,
de como se constrói a narrativa histórica para os pensadores da Nova História. Para estes, todos os
acontecimentos humanos poderiam ser entendidos como temáticas para a construção da História e não
somente a narrativa dos feitos de alguns homens relacionados à história política de seus países. Da
mesma forma, toda produção humana seria passível de ser entendida enquanto fonte para a pesquisa do
historiador, e não somente os documentos oficiais.

Esta forma de se entender a História rompeu com a ideia do tempo do acontecimento, com a concepção
de que a humanidade caminha de forma irreversível para algum ponto preestabelecido e também com a
noção de um progresso linear e contínuo. O papel do historiador, nesta perspectiva, é considerar o tempo
da duração nas análises dos acontecimentos. Para alcançar tal intento, não basta estudar os fatos a partir
de sua organização cronológica, mas considerar também os movimentos de continuidade e mudança.

Fernand Braudel é quem anuncia a importância de considerarmos as diferentes temporalidades na
investigação histórica. Para ele, há o tempo do acontecimento (breve duração), da conjuntura (média
duração) e da estrutura (longa duração). Bittencourt (2008, p. 206), explicando essas diferentes
concepções, afirma que:

[...] o acontecimento (fato de breve duração) corresponde a um momento preciso: um nascimento, uma
morte, a assinatura de um acordo, uma greve, etc.; a estrutura (fato de longa duração), cujos marcos
cronológicos escapam à percepção dos contemporâneos: a escravidão antiga ou moderna, o cristianismo
ocidental, a proibição do incesto, etc.; a conjuntura (fato de duração média) que resulta de flutuações
mais ou menos regulares no interior de uma estrutura: a Revolução Industrial inglesa, a ditadura militar
brasileira, a guerra fria etc.

A concepção de tempo apresentada pelos historiadores da Escola dos Annales nos indica que devem ser
considerados, na construção da História, a simultaneidade das durações assim como os movimentos de
permanências e mudanças que ocorrem em uma sociedade ao longo de um determinado período. Para
realizar esta abordagem não é possível considerar somente a cronologia como ponto de partida para a
compreensão do tempo histórico.

Os conteúdos e as metodologias apresentados nos livros didáticos relacionam-se diretamente com estas
concepções historiográficas abordadas aqui de forma sucinta. Nos manuais destinados aos professores,
os autores explicitam suas opções teóricas, o que merece ser destacado e contribui na melhoria da
qualidade das obras, visto que é ponto pacífico entre os historiadores que todos os sujeitos falam de
determinados lugares sociais e que são influenciados pelas características destes lugares. Estas
informações são valorizadas nas resenhas que compõem o Guia do PNLD porque é importante que o
professor identifique de que “lugar” o autor fala.

OLIVEIRA, Sandra Regina F. de. Os tempos que a História tem... In: OLIVEIRA, Margarida Maria Dias de (Coord.).
História: ensino fundamental. Brasília, DF: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2010. p. 42-45. v.
21. (Explorando o ensino).

Página 295

Neste livro, pautamo-nos por alguns referenciais teóricos da Nova História, daí
entendermos a História como um conhecimento em permanente construção; por isso
tomamos o documento como ponto de partida e não de chegada na construção do
conhecimento e, além disso, incorporamos a ação e a fala das mulheres, dos negros,
dos indígenas, dos operários e de outros sujeitos históricos antes relegados ao
esquecimento.

Ao longo da obra, utilizamos também a história social inglesa, recorrendo mais de uma
vez aos trabalhos de Christopher Hill, E. P. Thompson e Hobsbawm para compreender
episódios decisivos na formação do mundo atual, como a Revolução Inglesa, a
Revolução Industrial, a Revolução Francesa, o imperialismo, o movimento operário,
entre outros. Entendemos que as pesquisas desenvolvidas pelos neomarxistas ingleses
nem sempre se opõem às realizadas pelos integrantes dos Annales e seus
continuadores da Nova História. Por vezes, elas se fundem e/ou se complementam.

Por fim, é preciso dizer que demos maior ênfase ao conhecimento da história política e
do passado público por considerarmos que neste nível de ensino isso é decisivo para o
aluno desenvolver uma consciência crítica. Com essa consciência, ele pode orientar
sua prática como cidadão e participar de projetos de mudança social e cultural. Em um
artigo importante sobre o assunto, a historiadora Maria de Lourdes Mônaco Jannoti
chama atenção para o perigo de se valorizar o privado em detrimento do público:

A História não é terreno do “interessante” e do mundo privado enquanto tal. Este cresce em relação
direta à redução das atividades da vida pública e à consciência da cidadania, como tão bem explicou
Hannah Arendt, podendo levar, como o fez nos anos 20 e 30, à privatização do próprio Estado pelas
ditaduras nazifascistas. Tal experiência deu-se no Brasil num passado muito próximo, durante a ditadura
getulista e a ditadura militar, por mais de quarenta e cinco anos, neste século.

Mesmo considerando [...] fundamentais os estudos sobre a vida privada no passado e no presente [...] é
fundamental rever determinada prática da investigação e do ensino da História que, inspirada em uma
estreita leitura da Nova História com seus novos objetos e abordagens, acabam por não estabelecer
nenhuma “relação orgânica com o passado público da época em que vivemos”, segundo Hobsbawm.

JANNOTI, Maria de Lourdes Mônaco. In: BITTENCOURT, Circe (Org.). O saber histórico na sala de aula. 2. ed. São
Paulo: Contexto, 1998. p. 43-44. (Repensando o ensino).

1.3. Pressupostos teóricos

A seguir vamos expor de modo simplificado os pressupostos teóricos que pautaram a
nossa escrita e que, até certo ponto, se tornaram consenso entre os historiadores
atuais.

1. É impossível resgatar episódios do passado tal qual ocorreram. O passado está
morto e não se pode “desenterrá-lo”; só se pode conhecê-lo por meio de vestígios
deixados pelos seres humanos na sua passagem pela Terra.

Sobre esse pressuposto afirmou a historiadora Margarida Maria Dias de Oliveira:

A história escrita é um recorte desse passado, não por incompetência dos profissionais de História, mas
porque este é o objeto da produção do conhecimento histórico: problematizar o passado. Não se estuda
História para contar tudo o que aconteceu, mas para construir uma problemática sobre o passado e
sobre um tema em perspectiva histórica. [...]

OLIVEIRA, Margarida Maria Dias de (Coord.). História: ensino fundamental. Brasília, DF: Ministério da Educação,
Secretaria de Educação Básica, 2010. p. 10. v. 21. (Explorando o ensino).

2. Só se pode investigar o passado por meio de questões colocadas pelo presente.
De tempos em tempos formulam-se novas questões sobre o passado que conduzem a
novas pesquisas, das quais resultam novas reescritas da História.

Página 296

Ou seja, cada época coloca novos problemas, e é a partir deles que nos debruçamos
sobre o passado para investigar, crivar as fontes, comparar, analisar e construir uma
versão dos fatos. Buscando romper com uma visão passadista da História, entendemos
que o presente também é suscetível de conhecimento histórico, desde que o
ancoremos na própria História.

3. Todo conceito possui uma história. A cidadania na cidade de Atenas durante a
Antiguidade, por exemplo, era muito diferente da cidadania no Brasil de hoje. A
consciência disso é fundamental na educação histórica, seja para a construção do
conceito de cidadania, seja para a sua contextualização espaço-temporal. Facilitar isso
ao aluno ajuda-nos a evitar a formulação de juízos anacrônicos, consubstanciados no
senso comum, tais como “o tempo passa e nada muda”, “os políticos são todos iguais” e
outras frases do gênero.

4. O conhecimento histórico é algo construído com base em um procedimento
metodológico; a História é, ela própria, uma construção. Durante muito tempo se
acreditou que os historiadores chegavam a verdades definitivas. Hoje se sabe que a
História produz verdades parciais. Depois da coleta, seleção e crítica dos vestígios,
seguem-se a análise destes e a produção de uma versão possível sobre o fato ou
processo em questão. As conclusões a que chegam os historiadores devem, por isso
mesmo, ser relativizadas.

5. O conhecimento histórico é limitado. Atualmente é consenso entre os
historiadores que a História não é um saber acabado. O conhecimento histórico é algo
construído com base em um método e em um conjunto de procedimentos pertinentes
ao ofício do historiador. Enfim, atualmente, historiadores com diferentes perspectivas
admitem que a História é uma construção e que o conhecimento histórico é parcial e
incompleto, daí a necessidade de a História ser reescrita constantemente à luz de
novas pesquisas que vão sendo feitas.

Contribuindo com esse debate, o historiador Holien Gonçalves Bezerra afirmou:

Ciente de que o conhecimento é provisório, o aluno terá condições de exercitar nos procedimentos
próprios da História: problematização das questões propostas, delimitação do objeto, exame do estado
da questão, busca de informações, levantamento e tratamento adequado das fontes, percepção dos
sujeitos históricos envolvidos (indivíduos, grupos sociais), estratégias de verificação e comprovação de
hipóteses, organização dos dados coletados, refinamento dos conceitos (historicidade), proposta de
explicação para os fenômenos estudados, elaboração da exposição, redação de textos.

BEZERRA, Holien Gonçalves. In: KARNAL, Leandro (Org.). História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas.
São Paulo: Contexto, 2005. p. 42.

1.4. Objetivos para o ensino de História

Nesta obra didática, levamos em conta a perspectiva do Sistema Nacional de Avaliação
da Educação Básica (Saeb) no tocante aos objetivos para o ensino de História, seja
para nortear a nossa compreensão da História, seja para balizar a nossa prática

docente. Segundo as matrizes curriculares de referência para o Saeb, os objetivos do
ensino da História são:

»» Facilitar a construção, por parte do educando, da capacidade de pensar historicamente, sendo que

esta operação engloba uma percepção crítica e transformadora sobre os eventos e estudos históricos.

»» Favorecer a aquisição de conhecimentos sobre diferentes momentos históricos, a fim de desenvolver

a habilidade de coordenação do tempo histórico.

»» Contribuir para a compreensão dos processos da História, através da análise comparada das

semelhanças e diferenças entre momentos históricos, de forma a perceber a dinâmica de mudanças e
permanências.

»» Propiciar o desenvolvimento do senso crítico do educando, no sentido de que este seja capaz de

formar uma opinião possível sobre os eventos históricos estudados.

Página 297

»» Possibilitar a integração dos conteúdos cognitivos com os aspectos afetivos e psicomotores do

educando, valorizando as características relacionais nas atividades de ensino-aprendizagem.

PESTANA, Maria Inês Gomes de Sá et al. Matrizes curriculares de referência para o Saeb. 2. ed. rev. ampl. Brasília, DF:
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, 1999. p. 63.

Atingir esses objetivos, ainda que parcialmente, pode ajudar o aluno a interpretar
situações concretas da vida social, posicionar-se criticamente diante da realidade
vivida e construir novos conhecimentos.

1.5. Conceitos-chave da área de História

A História para o Ensino Médio, segundo os PCN, não pretende fazer do aluno um
historiador. Seu compromisso maior é com o aprofundamento dos conceitos
trabalhados nos anos anteriores e a facilitação ao aluno do acesso à construção do
conhecimento histórico (por meio do uso e do cruzamento de fontes variadas e de
diferentes tipos).

Nesta obra, retomamos alguns conceitos – como o de História, o de fontes históricas,
cultura, tempo – com o objetivo de consolidação ou aprofundamento e trabalhamos
outros conceitos-chave na nossa disciplina – como o de processo histórico, identidade,
memória, patrimônio cultural, representação e cidadania.

A seguir, apresentamos uma espécie de glossário com os conceitos-chave em História,
que pode ser útil ao trabalho do professor na preparação de sua aula.

História. Marc Bloch define a História como o estudo das sociedades humanas no
tempo. Para ele:

O historiador nunca sai do tempo [...], ele considera ora as grandes ondas de fenômenos aparentados que
atravessam, longitudinalmente, a duração, ora o momento humano em que essas correntes se apertam
no nó poderoso das consciências.

BLOCH, Marc L. B. Apologia da História ou o ofício do historiador. Rio de Janeiro: Zahar, 2001. p. 135.

Seguindo a trilha aberta por Bloch, o historiador Holien Bezerra afirma que a História
busca desvendar “as relações que se estabelecem entre os grupos humanos em
diferentes tempos e espaços”. Outra definição de História:

[...] A história é a arte de aprender que o que é nem sempre foi, que o que não existe pôde alguma vez
existir; que o novo não o é forçosamente e que, ao contrário, o que consideramos por vezes eterno é
muito recente. Esta noção permite situarmo-nos no tempo, relativizar o acontecimento, descobrir as
linhas de continuidade e identificar as rupturas.

OLIVEIRA, Margarida Maria Dias de (Coord.). História: ensino fundamental. Brasília, DF: Ministério da Educação,
Secretaria de Educação Básica, 2010. p. 18. v. 21. (Explorando o ensino).

Há autores atuais, como Hayden White, que entendem a História como um gênero da
literatura e querem reduzi-la à ficção. Nós discordamos dessa visão e lembramos que a

História, ao contrário da literatura, tem compromisso com a evidência, e,
parafraseando Marc Bloch, diferentemente do literato, o historiador só pode afirmar
aquilo que tem condições de provar.

Processo histórico. Segundo os PCN, processo histórico é um:

[...] processo de mudança direcional, no qual os sujeitos históricos, em meio à indeterminação das
relações sociais, constroem os caminhos possíveis, inscrevendo nas diferentes dimensões temporais
(conjunturas e estruturas) os acontecimentos que repercutem de modo variado nos diferentes espaços
de ação (privado ou público, local, regional ou mundial) e que contêm diversos elementos (políticos,
econômicos, sociais, culturais) [...]

PCN + ENSINO MÉDIO: orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Ciências
Humanas e suas Tecnologias. Brasília, DF: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2002. p. 77-78.

Página 298

Tempo. É uma construção humana, e o tempo histórico, uma construção cultural dos
povos em diferentes tempos e espaços. As principais dimensões do tempo são:
duração, sucessão e simultaneidade. Isso pode ser trabalhado em aula apresentando-
se as diferentes maneiras de vivenciar e apreender o tempo e de registrar a duração, a
sucessão e a simultaneidade dos eventos – tais conteúdos tornam-se, portanto, objeto
de estudos históricos. O tempo que interessa ao historiador é o tempo histórico, o
tempo das transformações e das permanências. O tempo histórico não obedece a um
ritmo preciso e idêntico como o do relógio e/ou dos calendários. Por isso o historiador
considera diferentes temporalidades/durações: a longa, a média e a curta duração.

Cronologia. Sistema de marcação e datação baseado em regras estabelecidas pela
ciência astronômica, que tenta organizar os acontecimentos em uma sequência regular
e contínua.

Cultura. Segundo os PCN:

[...] cultura [é] um conjunto de crenças, conhecimentos, valores, costumes, regulamentos, habilidades,
capacidades e hábitos construídos pelos seres humanos em determinadas sociedades, em diferentes
épocas e espaços.

PCN + ENSINO MÉDIO: orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Ciências
Humanas e suas Tecnologias. Brasília, DF: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2002. p. 71-72.

Sobre esse conceito, o professor Holien Gonçalves Bezerra afirma:

[...] Cultura não é apenas o conjunto de manifestações artísticas. Envolve as formas de organização do
trabalho, da casa, da família, do cotidiano das pessoas, dos ritos, das religiões, das festas etc. Assim, o
estudo das identidades sociais, no âmbito das representações culturais, adquire significado e
importância para a caracterização de grupos sociais e de povos.

BEZERRA, Holien Gonçalves. In: KARNAL, Leandro (Org.). História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas.
São Paulo: Contexto, 2005. p. 46.

Patrimônio cultural. Segundo uma estudiosa:

Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial [...] nos quais se
incluem: I – as formas de expressão; II – os modos de criar, fazer e viver; III – as criações científicas,
artísticas e tecnológicas; IV – as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às
manifestações artístico-culturais; V – os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico,
artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.

BITTENCOURT, Circe. O saber histórico na sala de aula. 2. ed. São Paulo: Contexto, 1998. p. 134. (Repensando o
ensino).

Identidade. Pode ser definida como a construção do “eu” e do “outro” e a construção
do eu e do “nós” que tem lugar nos diferentes contextos da vida humana e nos
diferentes espaços de convívio social. Essa construção baseia-se no reconhecimento de
semelhanças/diferenças e de mudanças/ permanências. Sobre o assunto, disse uma
ensaísta:

Um dos objetivos centrais do ensino de História, na atualidade, relaciona-se à sua contribuição na
constituição de identidades. A identidade nacional, nessa perspectiva, é uma das identidades a ser
constituídas pela História escolar, mas, por outro lado, enfrenta ainda o desafio de ser entendida em suas
relações com o local e o mundial.

A constituição de identidades associa-se à formação da cidadania, problema essencial na atualidade, ao
se levar em conta as finalidades educacionais mais amplas e o papel da escola em particular.

BITTENCOURT, Circe. Ensino de História: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2004. p. 121. (Docência em
formação).

A construção de identidades está relacionada também à memória.

Página 299

Memória. Segundo Pedro Paulo Funari:

A memória [...] é uma recriação constante no presente do passado enquanto representação, enquanto
imagem impressa na mente.

FUNARI, Pedro Paulo. Antiguidade clássica: a história e a cultura a partir dos documentos. 2. ed. Campinas: Unicamp,
2003. p. 16.

A memória pode ser definida também como o modo como os seres humanos se
lembram ou se esquecem do passado; já a História pode ser vista como a crítica da
memória. Em sociedades complexas, como esta em que vivemos, a memória coletiva
dá origem a lugares de memória, como museus, bibliotecas, espaços culturais, galerias,
arquivos ou uma “grande” história, a história da nação. A memória nos remete à
questão do tempo.

Representação. Modo como os grupos ou os indivíduos veem a si mesmos e são vistos
pelos outros. Ou seja, além de estudar os grupos sociais no tempo, compreender o
modo como eles se representam e como são representados também é objeto da
História. Aqui estamos nos referindo à representação social. Para o teórico Roger
Chartier, as representações são partilhadas socialmente, comandam atos e são
constitutivas da realidade. Esse estudioso refere-se a práticas de representação. Assim,
o conceito de representação reporta-se às diferenças/divergências e às contradições
no processo de construção das identidades sociais.

Política. O termo política teve sua origem na Grécia antiga e foi sendo ressignificado
ao longo do tempo. Ele está estreitamente relacionado à ideia de poder. Segundo
Nicolau Maquiavel (1469-1527), o fundador da política como ciência, a política é a arte
de conquistar, manter e exercer o poder. Já para Michel Foucault (1926-1984), o poder
não se concentra somente no Estado, mas está distribuído por todo o corpo social.
Seguindo essa trilha, dois estudiosos observaram que:

Há relação de poder entre pais e filhos, alunos e professores, governantes e governados, dirigentes de
partido e seus filiados, patrões e empregados, líderes de associações sindicais e seus membros, e assim
por diante. A verdade é que tais relações são, no mais das vezes, sutis, móveis, dispersas e de difícil
caracterização.

SILVA, Kalina Vanderlei; SILVA, Maciel Henrique. Dicionário de conceitos históricos. São Paulo: Contexto, 2005. p.
335.

Cidadania. O conceito de cidadania – chave na nossa proposta de ensino de História –
tem como base as reflexões do historiador Jaime Pinsky:

Ser cidadão é ter direito à vida, à liberdade, à propriedade, à igualdade perante a lei: é, em resumo, ter
direitos civis. É também participar no destino da sociedade, votar, ser votado, ter direitos políticos. Os
direitos civis e políticos não asseguram a democracia sem os direitos sociais, aqueles que garantem a
participação do indivíduo na riqueza coletiva: o direito à educação, ao trabalho, ao salário justo, à saúde,
a uma velhice tranquila. Exercer a cidadania plena é ter direitos civis, políticos e sociais.

PINSKY, Jaime; PINSKY, Carla Bassanezi (Org.). História da cidadania. São Paulo: Contexto, 2003. p. 9.

A compreensão da cidadania em uma perspectiva histórica de lutas, confrontos e
negociações, e constituída por intermédio de conquistas sociais de direitos, pode
servir como referência para a organização dos conteúdos da disciplina histórica. Vale
lembrar ainda que os conceitos possuem uma história, e que esta variou no tempo e no
espaço. Cientes disso nos esforçamos para evitar visões anacrônicas, a-históricas ou
carregadas de subjetividade.

2. Metodologia de ensino-aprendizagem

O trabalho com História em sala de aula é uma construção coletiva e se faz a partir do
saber aceito como legítimo pela comunidade de historiadores. Antes de tudo, porém, é
preciso considerar que esse saber acadêmico não deve ser confundido com o
conhecimento histórico escolar, embora lhe sirva de suporte.

Página 300

2.1. O conhecimento histórico escolar

Para Circe Bittencourt, o conhecimento histórico escolar:

[...] não pode ser entendido como mera e simples transposição de um conhecimento maior, proveniente
da ciência de referência e que é vulgarizado e simplificado pelo ensino. [...] “Nenhuma disciplina escolar é
uma simples filha da ‘ciência-mãe’”, adverte-nos Henri Moniot, e a história escolar não é apenas uma
transposição da história acadêmica mas constitui-se por intermédio de um processo no qual interferem o
saber erudito, os valores contemporâneos, as práticas e os problemas sociais.

BITTENCOURT, Circe. O saber histórico na sala de aula. São Paulo: Contexto, 1998. p. 25. (Repensando o ensino).

Para a construção do conhecimento em sala de aula, a historiadora Margarida Maria
Dias de Oliveira propõe que sejam dados os seguintes passos:

1. elege-se uma problemática (tema, período histórico);

2. tem-se o tempo como categoria principal (como o assunto em estudo foi enfrentado por outras

sociedades);

3. dialoga-se com o tempo por meio das fontes (utiliza-se o livro didático, mapas, imagens, músicas [...]);

4. utilizam-se instrumentos teóricos e metodológicos (conceitos, formas de proceder);

5. constrói-se uma narrativa/interpretação/análise (pede-se um texto, um debate, uma peça teatral,

uma redação, uma prova).

OLIVEIRA, Margarida Maria Dias de (Coord.). História: ensino fundamental. Brasília, DF: Ministério da Educação,
Secretaria de Educação Básica, 2010. v. 21, p. 11. (Explorando o ensino).

Em outras palavras, seleciona-se o tema e transforma-o em problema por meio de um
conjunto de questões. Estuda-se, então, o passado para entrar em contato com as
experiências dos seres humanos de outros tempos no enfrentamento desse problema
e analisa-se o presente levando em consideração esse conhecimento do passado. Esse
caminho sugerido pela historiadora citada foi o que nos esforçamos por realizar nesta
obra.

2.2. A nova concepção de documento

Na visão positivista da História, o documento era visto, sobretudo, como prova do real.
Aplicada ao livro escolar, essa forma de ver o documento assumia um caráter
teleológico – o documento cumpria uma função bem específica: ressaltar, exemplificar,
e, sobretudo, dar credibilidade à argumentação desenvolvida pelo autor. Na sala de
aula isso se reproduzia: o documento servia para exemplificar, destacar e,
principalmente, confirmar a fala do professor durante a exposição.

Com a Escola dos Annales, fundada pelos historiadores franceses Lucien Fèbvre e Marc
Bloch, adveio uma nova concepção de documento que nasceu da certeza de que o
passado não pode ser recuperado tal como aconteceu e que a sua investigação só pode
ser feita a partir de problemas colocados pelo presente. Essa nova corrente
historiográfica, que se formou a partir da crítica ao positivismo, propôs um número
tão grande e significativo de inovações que o historiador Peter Burke referiu-se a essa
corrente como “a Revolução Francesa da historiografia”.
Contrapondo-se à escola positivista, tributária do pensamento do filósofo alemão
Leopold von Ranke, que via o documento como prova do real e capaz de falar por si
mesmo, a Escola dos Annales propunha uma ampliação e um novo tratamento a ser
dado ao documento. Eis o que diz Jacques Le Goff, um dos teóricos da Nova História:

A História Nova ampliou o campo do documento histórico; ela substituiu a história de Langlois e
Seignobos2, fundada essencialmente nos textos, no documento escrito, por uma história baseada

2 2 Nomes dos historiadores franceses por meio dos quais a história metódica, mais conhecida como positivista,
chegou ao seu auge na segunda metade do século XIX.

Página 301

numa multiplicidade de documentos figurados, produtos de escavações arqueológicas, documentos
orais etc.

Uma estatística, uma curva de preços, uma fotografia, um filme, ou para um passado mais distante,
um pólen fóssil, uma ferramenta, um ex-voto são, para a História Nova, documentos de primeira ordem
[...].

LE GOFF, Jacques. In: MARTINS, Ronaldo Marcos. Cuidado de si e educação matemática: perspectivas, reflexões e
práticas de atores sociais (1925-1945). Rio Claro: Unesp, 2007. p. 23. (Tese de doutorado).

Mas, se por um lado é consensual entre os historiadores que estamos vivendo uma
“revolução documental”, por outro a reflexão sobre o uso de documentos em sala de
aula merece, a nosso ver, uma maior atenção. Com base nas reflexões daqueles que
pensaram sobre o assunto e na nossa experiência docente, recomendamos que, ao
trabalhar com documentos na sala de aula, o professor procure:

a) evitar ver o documento como “prova do real”, procurando situá-lo como ponto de
partida para se construírem aproximações em torno do episódio focalizado;

b) ultrapassar a descrição pura e simples do documento e apresentá-lo aos alunos
como matéria-prima de que se servem os historiadores na sua incessante pesquisa;

c) considerar que um documento não fala por si mesmo. É necessário levantar
questões sobre ele e a partir dele. Um documento sobre o qual não se sabe por quem,
para que e quando foi escrito é como uma fotografia sem crédito ou legenda: não tem
serventia para o historiador;

d) levar em conta que todo documento é um objeto material e, ao mesmo tempo,
portador de um conteúdo;

e) considerar que não há conhecimento neutro: um documento tem sempre um ou
mais autores e ele(s) tem(têm) uma posição que é necessário que se saiba identificar.
Visto por esse ângulo, o trabalho com documentos tem pelo menos três utilidades:

»» facilita ao professor o desempenho de seu papel de mediador. A sala de aula deixa

de ser o espaço onde se ouvem apenas as vozes do professor e a do autor do livro
didático (tido muitas vezes como narrador onisciente, que tudo sabe e tudo vê) para
ser o lugar onde ecoam múltiplas vozes, incluindo-se aí as vozes de pessoas que
presenciaram os fatos focalizados;

»» possibilita ao aluno desenvolver um olhar crítico e aperfeiçoar-se como leitor e

produtor de textos históricos;

»» diminui a distância entre o conhecimento acadêmico e o saber escolar, uma vez que

os alunos são convidados a se iniciarem na crítica e contextualização dos documentos,
procedimento importante para a educação histórica.

2.2.1. Orientações para a pesquisa na internet

Se a utilidade da internet é consenso entre os educadores, os procedimentos para seu
uso têm sido alvo de acalorados debates.

Uma das questões que mais têm preocupado os educadores é que, se, por um lado, a
internet facilita o acesso a um amplo leque de textos e imagens, por outro, pode criar o
hábito de buscar o “trabalho pronto”, usando o famoso copiar/colar/imprimir, ou seja,
encerrando a pesquisa naquele que deveria ser o seu primeiro passo. No que tange ao
nosso campo de atuação, e considerando que a internet tem sido uma ferramenta
muito utilizada no processo de ensino-aprendizagem, sugerimos alguns
procedimentos que podem nos ajudar a pensar sobre o seu uso na educação histórica:

a) Definir previamente os objetivos da pesquisa e solicitar que o aluno, enquanto
estiver pesquisando, não desvie a atenção da proposta inicial entrando em redes
sociais, em salas de bate-papo, locais para ouvir música ou jogar.

b) Encorajar a problematização dos materiais encontrados na internet. Depois de
localizar os sites ou vídeos que tratam de um mesmo assunto ou tema, estimular o
aluno a questionar as fontes em que esses materiais se apoiam; identificar as
ausências de informações significativas sobre o assunto; confirmar a veracidade

Página 302

das informações veiculadas; e, por fim, estimular o posicionamento crítico diante das
informações e análises ali disponíveis.

c) Sugerir ao aluno que relacione os sites ou vídeos encontrados a outros materiais
sugeridos em aula. Isso facilita a percepção de que um tema histórico pode ser mais
bem compreendido se recorrermos a diferentes fontes e à crítica destas.

d) Alertar o aluno para o fato de que nem tudo o que está na internet é verdade e que
as homepages são muitas vezes pouco consistentes. Por isso, a indicação do tema deve
vir acompanhada de perguntas que incentivem o aluno a investigar.

e) Incentivar o aluno a trocar informações com colegas de outras escolas do Brasil
e/ou de outros países via internet. Por meio dela, o aluno pode também entrar em
contato com autores, órgãos governamentais, instituições, sites de professores, enfim,
trocar informações significativas, textuais e visuais.

f) Utilizar diferentes sites de busca.

Com esses cuidados, a pesquisa na internet pode ajudar os educandos a
desenvolverem competências e habilidades que lhes permitem apreender as várias
durações temporais nas quais os diferentes atores sociais desenvolveram ou
desenvolvem suas ações, condição básica para que sejam identificadas
semelhanças/diferenças, mudanças/permanências e dominação/resistência existentes
no processo histórico.

2.3. O trabalho com imagens

Até o final dos anos 1960, as imagens dos livros didáticos eram pequenas e em preto e
branco. De lá para cá foram ganhando cores e ocupando um espaço cada vez maior na
obra didática e, hoje, parecem concorrer, cada vez mais, com o espaço ocupado pelo
texto. Esse fato não passou despercebido pelo professor que, reconhecendo o
potencial pedagógico das imagens, passou a utilizá-las com mais frequência na sala de
aula.

2.3.1. Trabalho com imagens fixas

Ao se decidir pelo uso de imagens fixas na sala de aula, o professor deve levar em
conta que essa prática pedagógica requer vários cuidados, alguns dos quais listaremos
a seguir.

• A imagem é polissêmica

Misto de arte e ciência, técnica e cultura, a imagem é polissêmica. Até um simples
retrato admite várias interpretações. Exemplo disso é ver um álbum de fotografias em
família: uma foto que desperta alegria ou satisfação nos avós pode ser causa de
inibição ou vergonha para os netos.

Outro exemplo: Mona Lisa, certamente o quadro mais conhecido do mundo, pode ser
tomado como exemplo dessa característica da imagem. Já se afirmou que, se
estivermos melancólicos, temos tendência a ver, no sorriso enigmático da personagem
retratada, melancolia; se estivermos alegres, ela nos parecerá contente. Ou seja, ela
expressa os nossos sentimentos no momento em que a vemos.

Leonardo da Vinci. c. 1503-1505. Painel a óleo. Museu do Louvre, Paris

Mona Lisa, c. 1503-1505.


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