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pioneiro financiado por capitais ingleses: a construção da Recife and São Francisco
Railway, iniciada em Pernambuco, em 1855. Três anos depois era inaugurada esta
que é a segunda ferrovia brasileira, e que ligava a capital de Pernambuco ao
município do Cabo.
Café e ferrovias
Já no Centro-Sul, quase toda a malha ferroviária foi construída visando ao
escoamento do café. Pensando em agilizar o transporte desse produto, o Barão de
Mauá planejou a construção de uma ferrovia ligando Jundiaí a Santos, passando
pela cidade de São Paulo. O plano de Mauá se concretizou em 1868, com a
inauguração da São Paulo Railway. Os capitais, os técnicos e os materiais usados
na construção dessa importante ferrovia eram, no entanto, predominantemente
ingleses.
São Paulo Railway: ela foi chamada também de Estrada de Ferro Santos-Jundiaí.
A partir de Jundiaí, o avanço dos trilhos foi inteiramente financiado por capitais
brasileiros, principalmente dos cafeicultores do Oeste Paulista, que pensavam
como empresários: compravam terras, importavam máquinas e investiam na
expansão das ferrovias.
Assim, conforme as “ondas verdes de café” avançavam, ia se multiplicando o
número de ferrovias, como a Paulista, a Mogiana, a São Paulo-Rio e a Ituana. Essa
malha ferroviária abriu o interior de São Paulo à cultura do café, diminuiu o custo
do transporte, aumentou os lucros dos cafeicultores e transformou o porto de
Santos em um grande centro de comercialização do produto. Os grandes
fazendeiros deixavam suas fazendas sob a responsabilidade de administradores e
construíam casas nas cidades, onde abriam negócios, estimulando, assim, a
urbanização e a modernização.
Marc Ferrez/Acervo Instituto Moreira Salles
Trecho da São Paulo Railway, no topo da Serra do Mar em uma fotografia de Marc Ferrez, 1895. No
quarto mês de funcionamento, a ferrovia já permitia aos ingleses um lucro de 300%. Com a
construção da Santos-Jundiaí, os ingleses garantiram uma posição estratégica que lhes assegurava o
controle do escoamento de todo o café produzido no interior paulista.
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A Tarifa Alves Branco e a Lei Eusébio de Queirós
O surto de modernização do Império contou também com a Tarifa Alves Branco
(1844) e a Lei Eusébio de Queirós (1850).
Dica! Vídeo didático explicando a Lei Eusébio de Queirós. [Duração: 3 minutos]. Acesse:
<http://tub.im/y7ew3w>.
A Tarifa Alves Branco aumentou os impostos sobre cerca de 3 mil produtos
importados. Esses produtos, que antes pagavam 15%, passaram a pagar de 30% a
60% de imposto nas alfândegas brasileiras. Com isso, aumentaram as rendas do
governo. A Lei Eusébio de Queirós, por sua vez, proibiu a importação de
escravizados, liberando capitais antes usados na sua reposição.
Os capitais oriundos do café e parte do capital gasto anteriormente na compra de
escravizados passaram a ser aplicados no setor industrial, financeiro e de
transportes, dinamizando, com isso, a economia. Foram inauguradas, então,
dezenas de indústrias (de tecidos, chapéus, cervejas), várias companhias de
seguros, navegação a vapor, estradas de ferro, bancos, empresas de mineração, de
transportes urbanos e de gás. O Barão de Mauá, que tinha capital investido em
muitas dessas empresas, projetou-se como o maior empresário do Império.
Uma das principais iniciativas de Mauá foi a compra de uma pequena fundição e
estaleiro com o nome de Ponta da Areia (1846), em Niterói, no Rio de Janeiro. Em
pouco tempo, o estabelecimento já fabricava tubos para encanamentos, navios a
vapor e trilhos de ferro. Outra importante empresa de Mauá foi a Companhia de
Iluminação a Gás da cidade do Rio de Janeiro, que, a partir de 1854, passou a
fornecer luz para as ruas e residências da capital do Império.
Sebastien Auguste Sisson. 1859. Litogravura. Coleção particular
Rpresentação do barão de Mauá, empresário pioneiro em várias áreas de negócio no Brasil
imperial.
Ismar Ingber/Pulsar Imagens
Acima, a casa desse barão em Petrópolis (RJ), que hoje abriga a Secretaria de Educação da cidade,
2012.
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Séc. XIX. Gravura. Coleção particular. Foto: Acervo Iconografia
Tumbeiro (nome dado aos navios negreiros usados no Brasil por causa da alta taxa de mortalidade
dos escravizados transportados) sendo atacado pela marinha inglesa, em uma gravura do século
XIX.
A questão da mão de obra no Império
A Inglaterra acumulou enormes lucros com o comércio de africanos pelo Atlântico
durante os séculos XVII e XVIII, mas no século XIX passou a combater duramente o
tráfico e a escravidão. O que teria levado o governo inglês a essa mudança de
atitude?
Primeiramente, os interesses da Inglaterra – país líder da Revolução Industrial –
em ampliar os mercados consumidores de seus produtos. Com o fim da escravidão,
o dinheiro gasto na compra de escravizados poderia ser utilizado na aquisição de
manufaturados. Além disso, desde a abertura dos portos, a Inglaterra mantinha um
intenso comércio com o Brasil, que se multiplicaria se os trabalhadores brasileiros
passassem a receber salários.
Acompanhe agora o cronograma sobre a questão pelo fim do tráfico de
escravizados e a reação do governo brasileiro diante da pressão inglesa:
»» 1827: A Inglaterra exigiu que o governo de Dom Pedro I extinguisse o tráfico
negreiro no prazo de três anos, como condição para reconhecer a emancipação
política do Brasil.
»» 1831: Uma lei brasileira declara ilegal o comércio de escravizados para o Brasil.
Essa lei, no entanto, permaneceu letra morta, isto é, sem valia.
»» 1845: O Parlamento inglês aprovou a Bill Aberdeen, lei proposta pelo ministro
inglês George Aberdeen que autorizava a Marinha inglesa a prender ou
bombardear os navios negreiros, e a levar os contraventores para serem julgados
na Inglaterra. A Bill Aberdeen foi uma represália à Tarifa Alves Branco, que elevava
as taxas sobre os produtos importados e contrariava, assim, os interesses ingleses.
A tabela abaixo mostra o número de escravizados trazidos para o Brasil entre 1845
e 1850. Note que, ao perceber que o tráfico atlântico se aproximava do fim, os
proprietários passaram a comprar mais africanos para as suas lavouras.
ANO Nº DE ESCRAVIZADOS
1845 19 453
1846 50 325
1847 56 172
1848 60 000
1849 54 000
1850 23 000
Fonte de pesquisa: COSTA, Emília Viotti. Da senzala à colônia. São Paulo: Unesp, 1998.
A Lei Eusébio de Queirós e a Lei de Terras
Externamente, a marinha inglesa reagia afundando navios suspeitos de
contrabandear escravizados. Internamente, o aumento da entrada de africanos no
Brasil atemorizava a elite, e o temor da africanização fazia com que ela acabasse
por preferir o fim do tráfico.
Pressionado interna e externamente, o governo de Dom Pedro II aprovou em 4 de
setembro de 1850 a Lei Eusébio de Queirós, que extinguiu o tráfico
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negreiro para o Brasil. Este passava a ser considerado crime, ato de pirataria, e
como tal seria julgado. A proibição do tráfico, porém, colocava um problema para
os proprietários escravistas: quem iria trabalhar para eles quando a escravidão
fosse extinta? Em um país com muita terra disponível, como fazer para que o
trabalhador não se estabelecesse como posseiro?
Em resposta a esse problema, naquele mesmo ano (setembro de 1850), o governo
imperial aprovou a Lei de Terras, que proibia o acesso à terra por doação ou
ocupação. Só podia ser dono de uma terra quem a comprasse. Com isso, os
imigrantes, os ex-escravizados e os homens livres e pobres ficavam excluídos do
acesso à terra, cujos preços eram elevados demais para eles. A única alternativa,
então, era trabalhar para os grandes proprietários ou comerciantes. E mais: ao
transformar a terra numa mercadoria valiosa, essa lei favoreceu a concentração da
propriedade nas mãos de uma minoria.
DIALOGANDO
Atualmente o Brasil continua sendo um país em que a terra se encontra concentrada nas
mãos de poucos?
Sim; segundo dados do Incra, a concentração de terras aumentou no Brasil em anos recentes. Entre 2010 e 2014, as grandes
propriedades privadas passaram de 238 milhões para 244 milhões de hectares. Quase a metade das propriedades rurais está
nas mãos dos grandes fazendeiros.
O tráfico interno e o debate sobre o trabalhador nacional
Com o fim do tráfico atlântico, aumentou a exigência de braços para as lavouras do
Sudeste. Essa região passou então a comprar escravizados do Norte e Nordeste,
onde a oferta de cativos era maior. Além do tráfico interprovincial, utilizou-se
também do tráfico intraprovincial, ou seja, da transferência de cativos das áreas
mais pobres para as mais ricas. Durante a vigência desses tipos de tráfico,
negociaram-se cerca de 400 mil escravizados.
Enquanto isso, no Parlamento, as poucas vozes que defendiam o aproveitamento
do trabalhador nacional, livre ou liberto, eram abafadas pelo coro da maioria dos
políticos do Império em favor da imigração europeia. A elite imperial referia-se aos
africanos e a seus descendentes como indisciplinados, preguiçosos e desleais, e,
portanto, inaptos para o trabalho livre. Diziam que só a imigração branca daria ao
país cidadãos exemplares e, ao imperador, súditos fiéis.
Esse discurso que desqualificava a população afro-brasileira baseava-se em teorias
produzidas na Europa, segundo as quais negros e mestiços eram “raças inferiores”
e a “raça branca” era a única capaz de criar civilização. Essa visão racista da elite
imperial fazia do europeu, especialmente o de pele mais clara e católico, o
trabalhador preferido.
Dica! Animação explicando o tráfico escravista durante os séculos XVII, XVIII e XIX. [Duração: 4
minutos]. Acesse: <http://tub.im/x6n4tk>.
Christiano Jr. Séc. XIX. Coleção particular
Nessa fotografia de Christiano Júnior, vemos um homem escravizado, 1864-1866.
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Para refletir
O quadro a seguir, chamado por alguns de A redenção de Cam e, por outros, de A
marca de Caim, é de autoria de Modesto Brocos y Gomez. A obra é uma pintura a
óleo e data de 1895.
Modesto Brocos y Gomez. 1895. Óleo sobre tela. Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro
a) O que está acontecendo na cena?
a) A avó negra, cuja filha é mestiça, agradece a Deus pelo fato de o seu neto ter nascido branco, isto é, por ter a cor da pele do
pai dele.
b) Qual a mensagem transmitida pelo artista?
b) A intenção do artista neste quadro é mostrar que a criança branca veio redimir a sua família da “marca de Caim”, isto é, da
cor negra. O bebê puxou ao pai: não traz na pele a cor da avó e nem a de sua mãe. Isto explica as mãos erguidas da avó.
c) Esse quadro realiza visualmente a teoria do branqueamento formulada na época
pelo médico brasileiro João Batista de Lacerda. Em que consistia essa teoria?
c) Segundo ele, em 100 anos, a contar de 1910, a população brasileira seria totalmente branca, por meio de intensa
miscigenação; assim, os negros e os mestiços desapareceriam das terras brasileiras.
d) Em dupla. Pesquisem e descubram qual a porcentagem de negros e pardos na
população brasileira segundo o último Censo do IBGE.
d) Segundo a projeção feita pelo IBGE em janeiro de 2016 a população brasileira é de 205.416.315 habitantes, e os negros e
pardos somam 53,6% da população.
e) Em grupo. O Brasil é um país que apresenta uma rica diversidade étnica e
cultural. Reflitam, debatam e proponham medidas educativas que contribuam para
o respeito à diversidade. Postem o trabalho no blog da turma.
e) Resposta pessoal.
Imigrantes no Brasil
A opção pelo imigrante como solução para o problema de mão de obra estimulou a
vinda de milhares de europeus para o Brasil. O que os impulsionou a virem para cá
no tempo do Império foi a busca de trabalho e o desejo de ter uma terra própria.
Eram, em sua maioria, pessoas pobres, que fugiam das guerras e da carência de
terras agricultáveis e vinham para um país jovem, que a propaganda apresentava
como um “paraíso”, com muitas terras e clima saudável.
Antônio Rocco, c. 1910. Óleo sobre tela. Pinacoteca do Estado, São Paulo. Foto: Nelson Toledo
Os imigrantes, tela de Antônio Rocco, c. 1910.
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No Império, os portugueses foram os que entraram em maior número. Depois
deles, vinham os italianos. Na Primeira República essa situação se inverteu.
Observe a tabela.
CINCO MAIORES GRUPOS DE IMIGRANTES EUROPEUS E ASIÁTICOS QUE
ENTRARAM NO BRASIL ENTRE 1819 E 1940
Nacionalidade 1819-1883 Nacionalidade 1884-1940
Portugueses 223 626 Italianos 1 412 263
Italianos 96 018 Portugueses 1 204 394
Alemães 62 327 Espanhóis 581 718
Espanhóis 15 337 Alemães 170 645
Russos 8 835 Japoneses 185 799
ALVIM, Zuleika. Imigrantes: a vida privada dos pobres do campo. In: NOVAIS, Fernando; SEVCENKO, Nicolau. História
da vida privada no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p. 233.
O sistema de parceria idealizado pelo Senador Vergueiro
O cafeicultor e político paulista Nicolau Campos Vergueiro foi um pioneiro na
introdução de mão de obra imigrante no Brasil; em 1847, ele custeou a vinda de 80
famílias de colonos alemães e suíços para sua Fazenda Ibicaba, em Cordeirópolis,
no interior de São Paulo; eles vieram para trabalhar no sistema de parceria; ficou
combinado que os imigrantes cuidariam de certo número de pés de café e de uma
roça onde cultivariam legumes e verduras para a sua subsistência, e o lucro obtido
com a venda do café seria repartido entre os imigrantes e o dono da fazenda.
O sistema de parceria, porém, não deu certo. Os imigrantes já chegavam ao Brasil
devendo ao fazendeiro o custo da passagem, cujo preço era alto. Além disso, o
imigrante comprava fiado aquilo de que necessitava: roupas, remédios e alimentos
que eram vendidos a preços elevados no armazém da fazenda. Soma-se a isso o
fato de que os imigrantes eram frequentemente desrespeitados, uma vez que a
mentalidade dos fazendeiros era escravista.
Os colonos da fazenda de Ibicaba reagiram à exploração e aos maus-tratos
organizando um movimento reivindicatório, em 1857, conhecido como Revolta de
Ibicaba. O líder dessa revolta, o imigrante suíço Thomas Davatz, denunciou com
detalhes, em Memórias de um colono no Brasil, a opressão sofrida por ele e seus
companheiros. A denúncia teve repercussão na Europa, o que causou desgaste na
imagem do sistema de parceria.
Livraria Martins Editora/USP
Fac-símile da capa do livro Memórias de um colono no Brasil, de Thomas Davatz.
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Colonos nas fazendas de café
Em 1871, o governo paulista começou a pagar as passagens dos imigrantes que
vinham trabalhar para os cafeicultores. Estes, por sua vez, adotaram um novo
regime de trabalho: o colonato. Os colonos recebiam um salário anual, podiam
plantar gêneros alimentícios e criar animais para consumo próprio e para venda.
Com isso, a imigração, principalmente a italiana, intensificou-se na província de
São Paulo. Enquanto os italianos dirigiam-se para as fazendas de café, os
portugueses e os espanhóis afluíam para as grandes cidades, como Rio de Janeiro,
São Paulo e Salvador, onde atuavam no pequeno comércio, trabalhavam como
artesãos (carpinteiro, ferreiro, sapateiro, alfaiate) ou ainda como operários.
Rosalbino Santoro. 1903. Óleo sobre tela. Coleção particular
Pintura de Rosalbino Santoro intitulada Terreiro de café, 1903. Na tela, o artista recriou o que de
fato acontecia em algumas fazendas: imigrantes dividiam o trabalho com os negros. No canto
superior direito, vemos a casa-grande e o que parece ser uma capela. À esquerda e ao fundo, vemos
as casas dos trabalhadores. Entre os dois trabalhadores à direita, e mais ao fundo, vemos a figura de
um capataz inspecionando o trabalho.
Alemães, italianos e poloneses no Sul
No Sul, desde cedo, o Império escolheu áreas despovoadas para a criação de
colônias, com o objetivo de povoamento, branqueamento da população e
consolidação das fronteiras.
Uma das primeiras foi a colônia alemã de São Leopoldo, criada em 1824, próxima
de Porto Alegre. A colonização alemã também se estendeu a Santa Catarina, onde o
pioneiro Hermann Bruno Otto Blumenau fundou a colônia Blumenau. Ele se
empenhou em trazer da Alemanha pessoas das mais variadas profissões. Os 17
primeiros colonos chegaram a Blumenau em 2 de setembro de 1850, sendo a
maioria deles do meio rural. Dr. Blumenau, como era mais conhecido, tinha uma
única exigência: que todos começassem a vida como pequenos proprietários,
artesãos, pequenos comerciantes ou exercendo uma profissão liberal. Ele não
queria ninguém trabalhando como assalariado para um grande proprietário. Com
isso, Otto Blumenau ajudou a implantar no Brasil um novo tipo de colonização,
baseada na pequena propriedade e na policultura. Introduziu também um novo
tipo de mentalidade, divulgando a ideia de que, por meio do trabalho, era possível
melhorar de vida e conseguir autonomia (no Brasil daquela época, o trabalho era
visto como coisa de escravizado). 1 e 2
1. Dica! Reportagem sobre a imigração alemã em São Leopoldo (RS). [Duração: 6 minutos].
Acesse: <http://tub.im/rf826b>.
2. Dica! Documentário abordando a perseguição sofrida pelos alemães no Brasil durante a
Segunda Guerra Mundial. [Duração: 50 minutos]. Acesse: <http://tub.im/w8s7hw>.
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Zig Koch/Opção Brasil Imagens
Imigrantes alemãs na Colônia Witmarsum, Palmeira (PR), 2013.
Paulo Fridman/Pulsar Imagens
Acima, bonecas Frida em loja do parque Vila Germânica, Blumenau, (SC), 2010.
Já os italianos começaram a chegar ao Sul por volta de 1875. No Rio Grande do Sul
fundaram as colônias de Caxias (hoje Caxias do Sul), Conde D’Eu (atual Garibaldi) e
Dona Isabel (hoje Bento Gonçalves). Em pouco tempo, a colonização italiana
avançou e se espalhou por todo o nordeste gaúcho.
Os poloneses também se fizeram presentes no Sul, sobretudo no Paraná. Entre
1870 e 1920, entraram no Brasil 103 500 poloneses: 43 mil no Paraná, 34 300 no
Rio Grande do Sul, 6 700 em Santa Catarina, e os demais em outros estados.
Um começo difícil
Alemães, italianos ou poloneses, os imigrantes tiveram um começo difícil no Brasil
– lotes reservados a eles ficavam distantes da cidade, as terras nem sempre eram
boas para o cultivo dos produtos agrícolas a que estavam acostumados e o
isolamento dificultava a adaptação e o progresso.
As colônias de imigrantes com base na pequena propriedade e no trabalho familiar
resultaram no povoamento de áreas enormes, situadas entre o interior e o litoral
das províncias sulistas. Quanto à cultura material, os imigrantes do Sul
contribuíram nas técnicas agrícolas, especialmente no uso do arado, da grade e das
carroças de quatro rodas. Dedicaram-se à policultura e à suinocultura, no Rio
Grande do Sul, e à indústria de laticínios e de conservas, em Santa Catarina. O
fabrico de cerveja, vinho, champanhe e conhaque, a cultura do trigo e da erva-mate
e a manufatura de tecidos e malhas também foram disseminados pelos imigrantes.
Dica! Vídeo sobre a imigração e o café no Brasil. [Duração: 3 minutos]. Acesse:
<http://tub.im/3kj56r>.
Guerras entre os sul-americanos
No Segundo Reinado, o Império Brasileiro envolveu-se também em conflitos na
região platina. Cortada por vários rios navegáveis, como o Paraguai, o Paraná e o
Uruguai, a região é rica e estratégica, e foi palco de constantes conflitos entre os
países sul-americanos. Os rios Paraná e Uruguai desembocam no rio da Prata, que
era usado por comerciantes sul-americanos e europeus para fazer as mercado-
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rias chegarem aos portos de Buenos Aires e Montevidéu, que, dali, seguiam para o
interior ou eram vendidas para a Europa.
Os países sul-americanos lutaram entre si pelo controle dos rios, das terras, do
gado e, sobretudo, do poder. O Império Brasileiro, por exemplo, interveio diversas
vezes na região platina. Em 1851, invadiu o Uruguai para derrubar o blanco
Manuel Oribe e colocar no poder o colorado Frutuoso Rivera. No ano seguinte,
invadiu a Argentina para depor o caudilho Juan Manoel Rosas. E, anos depois,
voltou a invadir o Uruguai para depor Atanásio Aguirre, que era aliado do ditador
paraguaio Solano López. O ditador, então, revidou mandando apreender o navio
brasileiro Marquês de Olinda, que seguia com destino ao Mato Grosso e, em 13 de
dezembro de 1864, declarou guerra ao Brasil dando início à Guerra do Paraguai.
1e2
1. Dica! Documentário sobre a Guerra do Paraguai. [Duração: 46 minutos]. Acesse:
<http://tub.im/9fqgtn>.
2. Dica! Vídeo abordando polêmicas sobre a Guerra do Paraguai que até hoje provocam
divergências entre Brasil e Paraguai. {Duração: 14 minutos]. Acesse: <http://tub.im/ci3ec7>.
Em janeiro de 1865, como o governo argentino não permitiu que os paraguaios
atravessassem seu território para atacar o Rio Grande do Sul, López declarou
guerra também à Argentina. Em maio de 1865, o Brasil de Dom Pedro II, a
Argentina de Bartolomeu Mitre e o Uruguai de Venâncio Flores formaram a
Tríplice Aliança para combater o Paraguai.
Para o historiador Ricardo Salles, por exemplo, o Brasil tinha interesse em impedir
a formação de um Estado nacional forte nas terras onde hoje estão Uruguai,
Paraguai e Argentina, assegurar a livre navegação nos rios da bacia platina e
garantir os ganhos territoriais nas áreas de fronteira.
A Argentina queria garantir a unidade do país, ameaçada pelo fato de que suas
províncias de Entre Rios e Corrientes queriam separar-se e formar países
independentes, contando para isso com o apoio do Paraguai.
Para saber mais
Durante muito tempo, predominou nos livros de História a tese de que Solano
López foi uma vítima do imperialismo inglês que, segundo essa versão, seria o
principal responsável pela Guerra do Paraguai. Hoje, já não se aceita mais essa
versão dos fatos. Com base em extensa documentação, o historiador Francisco
Doratioto comprovou que a Guerra do Paraguai foi provocada pelos próprios sul-
americanos, e não por pressão da Inglaterra (ou do imperialismo inglês). Sua tese,
que é hoje a mais aceita pelos historiadores, está contida na obra de sua autoria
intitulada Maldita guerra.
Editora Cia. das Letras
Fac-símile da capa do livro Maldita guerra, de Francisco Doratioto.
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Guerra do Paraguai (1864-1870)
Allmaps
Fontes: CAMPOS, Flávio de; DOLHNIKOFF, Miriam. Atlas: História do Brasil. São Paulo: Scipione, 1994; ATLAS
histórico escolar. Rio de Janeiro: MEC, 1960; CALDINI, Vera; ÍSOLA, Leda. Atlas geográfico Saraiva. São Paulo: Saraiva,
2009.
A Guerra do Paraguai definiu o mapa do Cone Sul, na América Latina.
O Paraguai de Solano López desejava fortalecer-se a ponto de garantir que não
seria anexado pelos seus vizinhos (Argentina e Brasil) e buscava uma saída para o
mar. Por isso, López aliou-se ao Uruguai e aos rebeldes argentinos com o objetivo
de formar um novo país, cujo porto marítimo seria Montevidéu. O presidente do
novo país seria, é claro, ele próprio.
Numa primeira fase, por meio de manobras rápidas, o Paraguai obteve vitórias por
terra. Mas, nos rios, a Marinha de Guerra brasileira mostrou-se superior, vencendo
os paraguaios em junho de 1865, na batalha naval do Riachuelo, travada no rio
Paraná. Em setembro do mesmo ano, outra vitória aliada, desta vez por terra, em
Uruguaiana, no Rio Grande do Sul.
No decorrer da guerra, o número de soldados da Tríplice Aliança foi crescendo. As
forças brasileiras eram compostas pelo Exército, pela Guarda Nacional e pelos
Voluntários da Pátria (recrutados à força e, por isso, chamados ironicamente de
“voluntários a pau e corda”). Estima-se que os efetivos brasileiros podem ter
chegado a 200 mil homens. A superioridade populacional e econômica das forças
aliadas também foi decisiva nos rumos da guerra.
A segunda fase da guerra foi marcada por importantes vitórias dos aliados, apesar
da tenaz resistência paraguaia. Em 1868, sob o comando do Duque de Caxias, as
forças aliadas conquistaram a fortaleza de Humaitá e venceram importantes
batalhas, como as de Itororó, Avaí, Lomas Valentinas e Angostura, chamadas de
dezembradas por terem ocorrido no mês de dezembro. Essas vitórias facilitaram
o caminho para Assunção, capital do Paraguai, conquistada em janeiro de 1869.
A última fase da guerra, em que se deu a perseguição de Solano López em território
paraguaio, é conhecida como Campanha da Cordilheira e foi comandada pelo
Conde D’Eu, autor de muitas atrocidades cometidas contra civis paraguaios. O
presidente paraguaio foi morto por soldados brasileiros em Cerro Corá, em 1o de
maio de 1870.
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Cabichuí. 1868. Coleção particular
Nesta gravura de 1868, publicada em um jornal paraguaio, o ditador Solano López é mostrado a
cavalo afugentando, com sua espada, o imperador Pedro II, que é mostrado no chão e de joelhos
dobrados. Ao contrário do que mostra a imagem, em 1868, o Paraguai estava perdendo a guerra e
Solano López vinha sendo obrigado a recuar.
Um balanço da guerra
Para o Paraguai, a guerra foi um desastre. Segundo o historiador Ricardo Salles, a
guerra vitimou 95% da população masculina do país. Além das mortes em
combate, muitos civis e militares morriam por causa de epidemias, como o cólera,
das más condições de higiene e de habitação, e da fome. O Paraguai perdeu 140 mil
quilômetros quadrados de seu território, parte para o Brasil e parte para a
Argentina. Economicamente, saiu fragilizado, o que teve implicações que se
estendem até os dias atuais.
O Brasil incorporou territórios, garantiu a ligação fluvial com o sul do Mato Grosso
e conservou a hegemonia na região, mas tudo isso a um custo muito alto. Os dados
oficiais falam em 23 917 mortos em combate; mas há estudos que estimam em 100
mil, entre civis e militares.
Os gastos com a guerra foram de 614 mil contos de réis, 11 vezes o orçamento do
governo brasileiro em 1864. O déficit gerado pela guerra atravessou décadas e
ocorreu um aceleramento da dívida externa brasileira, por causa dos empréstimos
contraídos com os banqueiros ingleses.
A Argentina, que possuía na época 1,5 milhão de habitantes, perdeu 18 mil
soldados. Já o Uruguai foi o país que menos teve perdas.
Durante a Guerra do Paraguai ocorreram a institucionalização e o fortalecimento
do Exército brasileiro.
Muitos militares brancos, que haviam lutado ao lado com soldados negros,
voltaram da guerra questionando a escravidão e a monarquia que lhe dava
suporte.
Além disso, a vitória na guerra elevou a autoimagem dos militares brasileiros e os
aproximou das ideias e do movimento em favor da República.
Juan Manuel Blanes. 1880. Óleo sobre tela. Coleção particular. Foto: The Bridgeman Art Library/Keystone
La Paraguaya, 1880. Repare como o pintor Juan Manuel Blanes recriou o ambiente de desolação e
perdas resultantes da guerra em solo paraguaio. Note também a ausência de homens com vida na
pintura, o que sugere um fato realmente acontecido: o elevado número de baixas registradas na
população masculina paraguaia.
Página 264
ATIVIDADES
ESCREVA NO CADERNO.
I. Retomando
1. (Unesp-SP – 2012) A maioridade do príncipe D. Pedro foi antecipada, em 1840, para que ele
pudesse assumir o trono brasileiro. Entre os objetivos do chamado Golpe da Maioridade, podemos
citar o esforço de:
a) obter o apoio das oligarquias regionais, insatisfeitas com a centralização política ocorrida
durante o Período Regencial.
b) ampliar a autonomia das províncias e reduzir a interferência do poder central nas unidades
administrativas.
c) abolir o Ato Adicional de 1834 e aumentar os efeitos federalistas da Lei Interpretativa do Ato,
editada seis anos depois.
d) promover ampla reforma constitucional de caráter liberal e democrático no país, reagindo ao
centralismo da Constituição de 1824.
e) restabelecer a estabilidade política, comprometida durante o Período Regencial, e conter
revoltas de caráter regionalista.
1. Resposta: e.
2. (UFPE) O ano de 1848 assistiu a várias revoluções na Europa como, por exemplo, na França e na
Itália. O espírito “quarenta e oito”, como se chamou este período, também atingiu o Brasil e,
particularmente, Pernambuco. Esta questão diz respeito à Revolução Praieira. ( ) A concentração da
propriedade fundiária e o monopólio do comércio a retalho pelos portugueses foram fatores que
provocaram a Revolução Praieira.
( ) O Partido da Praia, integrado por liberais pernambucanos, tinha no jornal o DIÁRIO NOVO um
instrumento de veiculação de suas ideias políticas.
( ) Joaquim Nabuco, líder abolicionista, logo se tornou um correligionário do jornalista praieiro
Borges da Fonseca.
( ) Os revolucionários praieiros pretendiam que o Governo interviesse nos fenômenos de produção,
distribuição e comércio.
( ) Os revolucionários de Pernambuco lançaram um “Manifesto ao Mundo” esclarecendo suas
posições no que diz respeito ao voto universal do povo brasileiro, ao trabalho como garantia de
vida para o cidadão brasileiro, ao comércio de retalhos, à reforma do poder judicial dentre outras.
2. Resposta: V , V , F, V, V.
3. (UERN – 2013)
O Brasil possui atualmente uma economia forte e sólida. O país é um grande produtor e
exportador de mercadorias de diversos tipos, principalmente commodities minerais, agrícolas
e manufaturados. As áreas de agricultura, indústria e serviços são bem desenvolvidas e
encontram-se, atualmente, em bom momento de expansão. Considerado um país emergente, o
Brasil ocupa o 7º lugar no ranking das maiores economias do mundo (dados de 2011). O Brasil
possui uma economia aberta e inserida no processo de globalização.
Disponível em: www.suapesquisa.com.
O Segundo Reinado é a fase da História do Brasil correspondente ao governo de D. Pedro II, que
teve início em 1840, com a mudança na constituição que declarou a maior idade de Pedro de
Alcântara, com 14 anos, tornando-o apto para assumir o governo. A administração de D. Pedro II,
que durante 49 anos esteve à frente do estado brasileiro, foi marcada por muitas mudanças sociais,
políticas e econômicas no Brasil. Quanto à economia do império nesse período,
a) destaca-se o grande e definitivo crescimento da atividade industrial.
b) observa-se o Brasil em destaque na área da mineração de ouro e prata.
c) destaca-se a produção do açúcar, aproveitando os canaviais do Nordeste.
d) nota-se que o café tomou posição de liderança nas exportações, possibilitando acúmulo de
capital.
3. Resposta: d.
Página 265
4. (UFRGS-RS – 2012) A Lei nº 581 do Império do Brasil, também denominada de Eusébio de
Queiróz, foi promulgada em 4 de setembro de 1850. Essa lei
a) provocou o confisco dos escravizados ilegais, reprimindo e condenando duramente os senhores
de escravizados.
b) determinou que os traficantes fossem submetidos à jurisdição de um tribunal especial.
c) suspendeu por alguns anos o tráfico transatlântico de escravizados, que foi retomado nas
décadas seguintes.
d) obrigou os donos de escravizados a indenizarem os africanos que ingressaram no Brasil a partir
de 1808.
e) regulamentou o tráfico de escravizados, permitindo que apenas africanos do sul do continente
pudessem ser trazidos da África.
4. Resposta: b.
5. (UERJ – 2015)
A Guerra do Paraguai (1864-1870) foi o conflito externo de maior repercussão para os países
envolvidos − Paraguai, Brasil, Argentina e Uruguai −, quer quanto à mobilização e perda de
homens, quer quanto aos aspectos políticos e financeiros. Essa guerra foi, na verdade,
resultado do processo de construção dos Estados nacionais no rio da Prata e, ao mesmo tempo,
marco nas suas consolidações.
Adaptado de DORATIOTO, F. F. M. Maldita guerra: nova história da Guerra do Paraguai. São Paulo: Companhia das
Letras, 2002.
Os motivos que justificaram a Guerra do Paraguai, ou Guerra da Tríplice Aliança, continuam
gerando controvérsias cento e cinquenta anos depois.
Apresente dois motivos que expliquem essa guerra, tendo em vista as disputas na região do rio da
Prata durante a segunda metade do século XIX.
5. Entre os motivos da Guerra pode-se citar: disputa pela liderança regional entre o Brasil e a Argentina; controle da
navegação pelos rios Paraguai, Paraná e Uruguai; o desejo do Paraguai de conseguir uma saída para o mar.
6. (Enem/MEC – 2014) De volta do Paraguai
Cheio de glória, coberto de louros, depois de ter derramado seu sangue em defesa da pátria e
libertado um povo da escravidão, o voluntário volta ao seu país natal para ver sua mãe
amarrada a um tronco horrível de realidade!...
Angelo Agostini. Séc. XIX. Coleção particular
AGOSTINI. A vida fluminense, ano 3, n. 128, 11 jun. 1870. In: LEMOS, R. (Org.). Uma história do Brasil através da
caricatura (1840-2001). Rio de Janeiro: Letras & Expressões, 2001 (adaptado).
Na charge, identifica-se uma contradição no retorno de parte dos “Voluntários da Pátria” que
lutaram na Guerra do Paraguai (1864-1870), evidenciada na
a) negação da cidadania aos familiares dos cativos.
b) concessão de alforrias aos militares escravizados.
c) perseguição dos escravistas aos soldados negros.
d) punição dos feitores aos recrutados compulsoriamente.
e) suspensão das indenizações aos proprietários prejudicados.
6. Resposta: a.
Página 266
II. Leitura e escrita em História
Leitura e escrita de textos
PROFESSOR, VER MANUAL.
VOZES DO PRESENTE
O trecho a seguir é uma entrevista concedida pelo professor Francisco Doratioto à Revista de
História da Biblioteca Nacional. Leia-o com atenção.
Lula Marques/Folhapress
Francisco Doratioto, 2012.
RH – O que o Paraguai queria nessa guerra?
FD – Fala-se Paraguai por uma questão didática, mas a decisão foi de Solano López. Tratava-se
de uma ditadura, mas não na forma contemporânea que conhecemos. Não havia meios de
comunicação ou inserção internacional, como hoje. Uma ditadura hoje, por mais ferrenha que
seja, tem que reagir ao contexto internacional e há algum processo decisório, mas na de Solano
López tudo se concentrava nele. No Paraguai não existia jornal, além de um diário oficial, e
nem oposição. A oposição estava em cemitérios ou no exílio na Argentina. A população era
pequena, o país era fechado ao exterior e ela não tinha acesso a outras informações, que não as
oficiais. [...]
RH – Qual foi o plano?
FD – Começar uma guerra contra o Brasil, em um ataque surpresa a Mato Grosso, para garantir
a retaguarda paraguaia, o que ocorreu em dezembro de 1864 e, ao ter negada permissão de
Mitre para passar com as tropas por território argentino para invadir o Rio Grande do Sul,
Solano López invadiu a província de Corrientes em abril de 1865 e o Rio Grande do Sul em
junho. Ao que tudo indica, o plano era vencer Mitre e impor uma derrota militar ao Império no
Uruguai. Esse plano era exequível, tanto que os paraguaios chegaram até Uruguaiana e
ocuparam Corrientes com facilidade. Só não foram além porque, no Rio Grande do Sul, o
coronel Estigarribia desobedeceu a ordem de não entrar nas cidades para não perder tempo na
marcha. Mas como Uruguaiana era um centro comercial, os paraguaios nela entraram para
saqueá-la, dando tempo aos aliados de se organizarem, sitiarem a cidade e, após combate,
obterem a rendição de Estigarribia.
GARCIA, Bruno. Entrevista com Francisco Doratioto. Revista de História da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, ano 9,
n. 97, p. 40-41, out. 2013.
a) De que forma o autor caracteriza Solano López e que paralelo ele estabelece entre o governante
paraguaio e alguns governantes atuais?
b) Que elementos o autor cita para comprovar sua visão a respeito de López? Justifique.
c) Durante muito tempo Solano López foi visto pela historiografia como vítima do imperialismo
inglês e não como um dos causadores da guerra. Qual a posição do autor do texto a respeito disto?
Explique.
d) Em dupla. O autor do texto destaca a ambição do coronel Estigarribia que, contrariando a ordem
de seus superiores, entrou em Uruguaiana para saqueá-la, dando tempo de os aliados se
organizarem e contra-atacarem. Debatam e escrevam uma reflexão pessoal com o título “Ambição e
guerra”.
Página 267
Capítulo 14 Abolição e República
Observe a cena com atenção.
Professor: a ideia aqui foi estimular o aluno a ler e interpretar imagens com base em uma charge criada por Angelo Agostini.
Um indígena, simbolizando a Nação (apoiado por negros rebelados), rompe correntes e chuta a carruagem do Império,
lançando ao chão o imperador (com sua coroa, seu livro e sua luneta) e seus seguidores (membros da elite imperial
identificados por seus fraques, botas e cartolas). Enfim, a Nação rompe os grilhões e se liberta da monarquia. Dois animais
conduzem a carruagem: um cavalo identificado como Dissidência Liberal e um touro denominado Partido Conservador. Não
por acaso o título da charge é “A grande degringolada”.
Angelo Agostini. Séc. XIX. Desenho. Coleção particular
»» Quem está atacando a carruagem?
»» Quem é o personagem à esquerda desenhado próximo a um
livro, uma luneta e uma coroa?
»» Quem são os personagens de botas e cartolas que estão sendo
arremessados ao chão?
»» O que o autor da charge quis criticar?
Página 268
O processo de abolição
O processo que conduziu à extinção legal da escravidão no Brasil foi longo e contou
com ampla participação popular, incluindo-se aí a ação dos próprios escravizados,
além de ativistas e intelectuais negros e brancos, chamados, na época, de
abolicionistas.
A resistência negra
Um exemplo expressivo da resistência à escravidão no século XIX foi o ciclo de
revoltas lideradas por africanos ou crioulos na Bahia, entre 1807 e 1835. Segundo
o historiador João José Reis, naqueles anos, a Bahia foi palco de mais de 20 revoltas
e conspirações promovidas pelos africanos e seus descendentes; etnias envolvidas
nessas revoltas foram: haussá em 1887; nagô, haussá e jeje em 1809; haussá de
novo, em 1814; etnias diversas em 1816 e, sobretudo, nagô em 1826, 1830 e 1835.
Christiano Jr. Séc. XIX. Coleção particular
Acima, menino aprendendo a jogar capoeira. A capoeira, que é dança e luta ao mesmo tempo, pode
ser considerada também uma forma de resistência negra no campo da cultura.
Editora Cia. das Letras
Fac-símile da capa do livro de João José Reis que trata da rebelião escrava de 1835 em Salvador, a
maior ocorrida em uma cidade brasileira.
Outro exemplo de resistência negra no Brasil monárquico foi o levante liderado
por Manuel Congo, em 1838, na região de Paty do Alferes, Vassouras, que é hoje
um município do estado do Rio de Janeiro. Os rebeldes foram perseguidos nas
matas da região e recapturados. Justino Benguela, Antônio Magro, Pedro Dias,
Belarmino Congo, Miguel Crioulo, Canuto Moçambique e Afonso Angola foram
julgados com base no artigo 60 do Código Criminal e condenados a 650 açoites, 50
por dia; Manuel Congo, o líder da insurreição, recebeu a pena máxima e, em 1839,
foi enforcado.
Além do mais, com o tráfico interprovincial, milhares de escravizados do Norte e
Nordeste foram separados de suas famílias para servir no Centro-Sul, onde tinham
de trabalhar sob novas regras e por mais horas, de modo a atender à crescente
demanda gerada pela expansão da cafeicultura. Diante disso, a resistência se
tornou mais ativa: aumentaram as fugas, cresceram os esforços dos escravizados
para a compra de sua alforria, multiplicaram-se as ações abertas por eles na Justiça
visando provar seu direito à liberdade.
Dica! Entrevista com o historiador João José Reis sobre a escravidão no Brasil. [Duração: 11
minutos]. Acesse: <http://tub.im/cmktfm>.
Página 269
O abolicionismo
Outra força importante no processo que levou à extinção legal da escravidão foi o
abolicionismo, movimento social liderado por pessoas de diferentes etnias e
condições sociais e que se estendeu por quase todo o século XIX.
Os abolicionistas divulgavam suas ideias por meio de jornais, grupos e associações
e promoviam passeatas, comícios e outras manifestações públicas pelo fim da
escravidão.
Entre os abolicionistas havia profissionais liberais, como o engenheiro baiano
André Rebouças; intelectuais, como o pernambucano Joaquim Nabuco; e membros
das classes populares, como Luiz Gama.
Dica! Vídeo sobre a vida de Luiz Gama. [Duração: 12 minutos]. Acesse: <http://tub.im/k552er>.
James Lafayette. 1902. Coleção particular
Nascido em Pernambuco em 1849, Joaquim Nabuco era filho de José Tomás Nabuco de Araújo, um
destacado senador do Império.
Rodolfo Bernardelli. Séc. XIX. Óleo sobre tela. Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro
Nascido em 1830, na Bahia, Luiz Gama era filho da negra nagô Luiza Mahin e de um comerciante de
origem portuguesa.
Externamente, a escravidão começou a ser vista como “vergonha da humanidade”
na segunda metade do século XVIII; essa condenação da instituição escravista por
filósofos, como Diderot, e economistas, como Adam Smith, penetrou fortemente no
Brasil somente na segunda metade do século XIX, quando as ideias e práticas
liberais já tinham larga aceitação no país. Ao mesmo tempo, o fim da escravidão
nos Estados Unidos, em 1865, acentuou o isolamento político do Brasil e deu mais
um argumento para os abolicionistas brasileiros. Some-se a isso, ainda, o fato de
vários governos estrangeiros pedirem, por meio de seus diplomatas, que D. Pedro
II acabasse com a escravidão no Brasil.
Internamente, com o fim da Guerra do Paraguai, em 1870, a campanha
abolicionista se popularizou e conquistou adeptos inclusive entre os oficiais do
Exército, que passaram a ver com grande simpatia os negros que lutaram ao lado
deles nos campos de batalha. Além disso, aumentavam as fugas de escravizados
para os arredores de cidades que, por serem mais populosas, como Salvador, Rio
de Janeiro e São Paulo, favoreciam o anonimato.
Apesar das pressões externas e internas, o governo de D. Pedro II e a elite imperial
defendiam a abolição lenta e gradual. E, com esse objetivo, aprovaram as
chamadas leis abolicionistas.
Página 270
São elas:
»» Lei do ventre livre – Lei nº 2.040, de 28 de setembro de 1871: [...]
Art. 1º Os filhos de mulher escrava que nascerem no Império desde a data desta lei serão
considerados de condição livre.
§ 1º Os ditos filhos menores ficarão em poder e sob a autoridade dos senhores de suas mães,
os quais terão a obrigação de criá-los e tratá-los até a idade de 8 anos completos. Chegando o
filho da escrava a esta idade, o senhor da mãe terá opção, ou de receber do Estado a
indenização de 600 mil-réis, ou de utilizar-se dos serviços do menor até a idade de 21 anos
completos.[...]
BRASIL. Lei n. 2.040, de 28 de setembro de 1871. Câmara dos deputados. Disponível em:
<http://www.camara.gov.br/internet/infdoc/conteudo/colecoes/legislacaolegimpcd-06/leis1871/pdf17.pdf#
page=6>. Acesso em: 18 mar. 2013.
Henrique Klumb. c.1860. Biblioteca Nacional
Terraço do Passeio Público, Rio de Janeiro, c. 1860.
Foram poucos os beneficiados pela Lei do Ventre Livre. Muitos proprietários
preferiam continuar se utilizando do trabalho das crianças a receber o dinheiro
para libertá-las.
Dica! Reportagem sobre as leis abolicionistas. [Duração: 4 minutos]. Acesse:
<http://tub.im/qvac9x>.
DIALOGANDO O que se pode concluir a partir desta tabela?
VOTAÇÃO DA LEI DO VENTRE LIVRE NA CÂMARA DOS DEPUTADOS
Localização Votos a favor Votos contra
Províncias do Norte/Nordeste 39 6
Províncias do Centro-Sul 12 30
Fonte de pesquisa: LINHARES, Maria Yedda. História geral do Brasil. 9. ed. Rio de Janeiro: Campus, 1990. p. 271.
Pode-se concluir que a maioria dos deputados do Norte/Nordeste (onde o trabalho escravizado na época tinha menos
importância) votou a favor da lei, enquanto os das províncias do Centro-Sul (como Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo)
onde a cafeicultura estava em expansão colocaram-se, em sua maioria, contra ela.
Página 271
Na década de 1880, a luta pela abolição ganhou corpo. Em 1883, foi fundada a
Confederação Abolicionista, que assumiu a proposta de André Rebouças de
abolição sem indenização e de doação de terras para os ex-escravizados.
Pernambuco viu surgir o Clube do Cupim, associação emancipatória que
alforriava e defendia os escravizados contrariando interesses centenários dos
poderosos da província. Em São Paulo, o advogado Antônio Bento fundou uma
organização secreta chamada Caifazes, também promovia e apoiava a fuga de
escravizados. Essa organização protegeu os milhares de escravizados que fugiram
das fazendas paulistas em direção aos morros da cidade paulista de Santos, onde
formaram o Quilombo do Jabaquara. Esse quilombo, surgido nos últimos anos do
período imperial, chegou a reunir cerca de 10 mil quilombolas, entre homens,
mulheres e crianças, e era liderado pelo crioulo sergipano Quintino de Lacerda. A
população livre local escondia os fugitivos e facilitava a chegada deles ao alto dos
morros.
Editora Cia. das Letras
Hisako Tanaka/Getty Images
O historiador Eduardo Silva trabalha com a ideia de “quilombo abolicionista”, um modelo específico
de resistência à escravidão. Seus membros organizavam-se próximo aos grandes centros e seus
líderes mantinham relações estreitas com figuras centrais do movimento abolicionista como André
Rebouças e Rui Barbosa. Entre os exemplos de quilombos abolicionistas estão o Quilombo do
Jabaquara, na cidade paulista de Santos, e o Quilombo do Leblon, no Rio de Janeiro. Na sua obra As
camélias do Leblon, Eduardo Silva parte da camélia, flor que simbolizava a luta pela abolição, para
evidenciar as relações estreitas entre a campanha abolicionista e o aumento das fugas. As camélias,
conhecidas na época como “flores da liberdade”, eram cultivadas, colhidas e distribuídas no
Quilombo do Leblon, onde hoje está o bairro do Leblon. À esquerda, fac-símile da capa de As
camélias do Leblon.
Ajudado pela resistência escrava, o abolicionismo se espalhou rapidamente pelo
país, provocando reações nas províncias. No Ceará o jangadeiro Francisco José do
Nascimento, o “Dragão do Mar”, se negou a transportar escravizados para o
Sudeste, acelerando a abolição na sua província. Em 1884, o Ceará e o Amazonas
anteciparam-se ao governo imperial e extinguiram a escravidão; o mesmo fizeram
algumas cidades do Rio Grande do Sul.
Angelo Agostini. Séc. XIX. Desenho. Coleção particular
Jangadeiro Francisco José do Nascimento na visão do chargista Angelo Agostini. Note que o
chargista, que também era abolicionista, procurou homenagear o jangadeiro em sua obra.
Página 272
O governo de Dom Pedro II reagiu à onda abolicionista promulgando uma nova lei.
»» Lei dos Sexagenários, de 28 de setembro de 1885: declarava livres os
escravizados com mais de 60 anos, mas exigia que eles continuassem trabalhando
gratuitamente por mais três anos a título de indenização. Além disso, estipulava
uma multa de 500 a 1 000 réis para os que protegessem ou acolhessem
escravizados fugidos.
Fontana. c. 1910. Coleção particular
Senhoras vendendo frutas e legumes nas ruas, em Rio Grande (RS), c. 1910. As duas senhoras vistas
ao centro aparentam ter por volta de 60 anos na data em que a fotografia foi publicada. Se tivessem
essa idade no ano em que a lei foi publicada teriam de trabalhar mais três anos para conseguir a
alforria. A Lei dos Sexagenários livrava os proprietários da obrigação de fornecer comida e moradia
para os poucos escravizados que conseguiam chegar aos 60 anos de idade.
Ao contrário do que desejavam seus promotores, a Lei dos Sexagenários provocou
a radicalização da luta contra a escravidão: os escravizados começaram a fugir em
massa das propriedades de seus donos. Maquinistas colaboravam com as fugas
retardando a marcha do trem para que os escravizados pudessem saltar e,
escondidos entre as sacas de café, chegassem à cidade. Gráficos negavam-se a
imprimir textos defendendo a escravidão. Os militares lançaram um manifesto, em
1887, afirmando que não mais fariam o papel de capitão do mato, isto é, não
perseguiriam mais os fugitivos.
Sob forte pressão popular, o governo imperial, exercido na época pela princesa
Isabel, assinou a Lei Áurea, que declarava extinta a escravidão no Brasil, sem
direito de indenização aos senhores e sem nenhuma reparação aos escravizados,
que, segundo uma estimativa realizada um ano antes, somavam 723419 pessoas,
pouco menos de 5% da população brasileira.
Politicamente a Lei Áurea contribuiu para o desgaste da monarquia: muitos
fazendeiros escravistas, inconformados de não terem sido indenizados, aderiram à
República. Por isso, foram chamados na época de republicanos de última hora.
Dica! Animação sobre a escravidão e o processo de abolição. [Duração: 20 minutos]. Acesse:
<http://tub.im/ah3xf5>.
Página 273
A vida dos recém-libertos
Nas áreas rurais, parte dos libertos permaneceu nas fazendas e negociou com seus
antigos donos salários, parcerias e/ou o direito de ter a própria roça. Outra parte
se mudou para as cidades em busca de moradia e emprego. Em cidades como São
Paulo, porém, os empregos estáveis foram ocupados, sobretudo, por imigrantes
europeus, preferidos pelos empresários da época, cuja visão de mundo era
fortemente marcada pelo escravismo. Nesse contexto era, muitas vezes, a mulher
negra que garantia a sobrevivência da família cozinhando, lavando e passando para
particulares.
As escassas oportunidades abertas aos recém-libertos geraram uma desigualdade
social muito grande que, com o racismo à brasileira, tornaram a vida dos
afrodescendentes mais difícil. Apesar de tantos obstáculos, os libertos amenizavam
a luta diária pela sobrevivência organizando-se em grupos de lazer, clubes
esportivos e centros religiosos.
Racismo à brasileira: racismo disfarçado, implícito, silencioso, não declarado.
Para cantar, dançar, festejar ou simplesmente conversar sobre coisas em comum,
muitos negros do Rio de Janeiro passaram a se encontrar na Praça Onze, na casa da
Tia Ciata, uma baiana que vendia quitutes e roupas típicas. Segundo os
historiadores da música, foi lá que nasceu o samba. Entre os mais importantes
sambistas da época estão nomes como Donga (autor daquele que é considerado o
primeiro samba a ser gravado no Brasil, Pelo telefone), Heitor dos Prazeres,
Pixinguinha e João da Baiana.
Para saber mais
João da Baiana
Carioca filho de migrantes baianos, João Machado Guedes fez parte do que o compositor
Martinho da Vila chamou de “santíssima trindade da música brasileira”: João da Baiana,
Pixinguinha e Donga.
Filho de Tia Perciliana, uma das famosas baianas da Cidade Nova, onde foi criado, João
notabilizou-se por popularizar o pandeiro no samba e por ser exímio ritmista no prato-e-faca,
herança de sua formação na tradição baiana.
João foi um personagem da cidade do Rio de Janeiro. Funcionário da Estrada de Ferro, recusou
o convite dos parceiros Pixinguinha e Donga para realizar a primeira turnê internacional de
um grupo popular no Brasil – os renomados Oito Batutas. Preferiu a estabilidade do emprego,
mas manteve intensa atividade musical.
[...]
Zahar Editora
Fac-símile da capa do livro Almanaque do samba. A pintura que se vê é do compositor, músico e
artista plástico Heitor dos Prazeres.
Página 274
Como o samba ainda estava procurando seu espaço na sociedade, era muito comum os músicos
serem presos pelo simples fato de portarem um instrumento. Certa noite, João da Baiana foi
convidado para ir a uma festa no palácio do senador Pinheiro Machado, um dos mandachuvas
da política na época. Acabou não comparecendo por ter sido preso pela polícia na Festa da
Penha. Acusação: levava um pandeiro a tiracolo. Dias depois, o todo-poderoso senador quis
saber por que João não aparecera em sua festa. Sabendo da história, Pinheiro Machado
mandou fazer um pandeiro na loja Cavaquinho de Ouro, do seu Oscar, com a dedicatória “A
minha admiração, João da Baiana – senador Pinheiro Machado”. Coincidência ou não, o fato é
que João nunca mais foi importunado.
DINIZ, André. Almanaque do samba: a história do samba, o que ouvir, o que ler, onde curtir. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Ed., 2008. p. 30-31.
O processo que conduziu à República
Os processos que conduziram o Brasil à abolição e à República foram simultâneos
e fortaleceram-se mutuamente.
O republicanismo
Ideias republicanas estavam presentes entre os brasileiros há tempos. No século
XVIII, inspiraram movimentos contra o domínio português, como a Conjuração
Mineira e a Conjuração Baiana, e, no século seguinte, rebeliões do período
regencial, como a Balaiada e a Farroupilha.
Mas a Monarquia conseguiu reprimir esses dois últimos movimentos em virtude,
principalmente, da receita obtida com as exportações de café. No Segundo Reinado,
os dois partidos existentes, o Liberal e o Conservador, controlavam o poder
enquanto a imensa maioria da população continuava excluída do direito à
cidadania.
Visando ampliar seu poder político, um grupo de cafeicultores e profissionais
liberais (advogados, médicos, professores, engenheiros, jornalistas) lançou no Rio
de Janeiro em dezembro de 1870 o Manifesto Republicano. O documento
defendia a República e o federalismo e estimulou o surgimento de jornais e
partidos republicanos. Em 1873, nascia em Itu, no interior de São Paulo, o Partido
Republicano Paulista (PRP). Dos 133 fundadores do PRP, 78 eram grandes
cafeicultores do Oeste Paulista.
Federalismo: autonomia para as províncias fazerem suas leis, elegerem seus representantes e
administrarem suas rendas.
Entre os republicanos percebia-se a existência de três grupos principais. Um deles,
liderado por Silva Jardim e Lopes Trovão, abolicionistas convictos, defendia que se
chegasse à República por meio de um movimento popular. Outro grupo, liderado
por Quintino Bocaiuva, era chamado de evolucionista, pois propunha a transição
gradual e pacífica para a República. Um terceiro grupo, que se formou nos meios
militares em torno do major Benjamin Constant, combatia a monarquia em nome
do progresso e defendia um governo forte.
Além do abolicionismo e do republicanismo, duas outras questões abalaram o
Império, contribuindo para o seu fim: a Questão Religiosa e a Questão Militar.
Página 275
A Questão Religiosa
A união entre o Estado e a Igreja era regulada pela Constituição de 1824, que
concedia ao imperador o padroado, isto é, o direito de nomear religiosos para os
principais cargos eclesiásticos (por exemplo, o de bispo), e o beneplácito, o direito
de aprovar ou não as bulas papais, que só seriam cumpridas em território
nacional mediante o placet (permissão) do imperador.
Bula papal: carta expedida pelo papa contendo orientações aos católicos.
Em 1864, uma bula do papa Pio IX, a Syllabus, condenou veementemente a
maçonaria e afirmou a total incompatibilidade entre ser católico e maçom, ao
mesmo tempo. O fato contrariou D. Pedro II, pois o Império, desde sua fundação,
mantinha relações estreitas com a maçonaria. Com o objetivo de cumprir à risca a
decisão do papa, o bispo de Olinda, Dom Vital Maria, e o do Pará, Dom Antônio
Macedo Costa, exigiam que as irmandades religiosas expulsassem os maçons de
seus quadros. Além disso, D. Vital chegou a afirmar que o imperador era súdito do
papa e, como tal, não deveria ter direito ao beneplácito.
Maçonaria: instituição de perfil religioso, político e filantrópico que reúne membros voluntários de diversas
crenças e religiões. A princípio, só era acessível ao sexo masculino.
Fazendo valer o direito que a constituição do Império lhe concedia, D. Pedro II
negou seu beneplácito à bula papal e, além disso, em 1874 processou os bispos,
que foram condenados, então, a quatro anos de prisão com trabalhos forçados.
Um ano depois, em 1875, o papa e o imperador chegaram a um acordo. O
imperador perdoou os bispos (eles já haviam cumprido um ano de prisão), e o
papa suspendeu as punições dadas às irmandades de Olinda e do Pará. No entanto,
a prisão dos bispos abalou a imagem do imperador, e a propaganda republicana
tirou proveito dessa situação. Nos seus comícios, os republicanos passaram a
acusar o imperador de interferir em assuntos da Igreja e na vida religiosa dos
brasileiros.
A Questão Militar
O poder de Dom Pedro II também foi abalado pela Questão Militar, nome dado a
uma série de conflitos entre o exército e o Império, durante a década de 1880. Na
época, os militares eram proibidos de se manifestar pela imprensa. O tenente-
coronel Sena Madureira e o coronel Cunha Matos contrariaram essa proibição e
foram punidos pelo governo imperial.
Angelo Agostini. Séc. XIX. Desenho. Coleção particular
Charge de Angelo Agostini ironizando a recusa de Deodoro da Fonseca em punir oficiais do exército
que faziam declarações por meio da imprensa.
Página 276
Diante disso, Sena Madureira escreveu em um jornal republicano rio-grandense
contra a proibição de os militares se manifestarem pela imprensa. O ministro da
Guerra, que era um civil, exigiu que o general Deodoro da Fonseca, presidente da
província do Rio Grande do Sul, punisse Sena Madureira. Deodoro recusou-se a
fazê-lo e acabou demitido da presidência da província; Deodoro e Sena Madureira
seguiram, então, para o Rio de Janeiro, onde foram recebidos festivamente pelo
major Benjamin Constant, líder da mocidade militar e divulgador do positivismo
nos quartéis. 1 e 2
Mocidade militar: jovens militares de menos de 30 anos que possuíam educação superior e valorizavam o
estudo das ciências exatas.
1. Dica! Documentário abordando o declínio do Império e a proclamação da república. [Duração:
35 minutos]. Acesse: <http://tub.im/cmccv4>.
2. Dica! Vídeo com falas do historiador Boris Fausto sobre a abolição e as razões que teriam
levado à República. [Duração: 7 minutos]. Acesse: <http://tub.im/58four>.
Para saber mais
Décio Vilares. s.d. Instituto Benjamin Constant, Rio de Janeiro
O major Benjamin Constant (1833-1891) era fluminense. Foi professor de matemática na Escola
Militar e o principal divulgador do positivismo entre a mocidade militar.
O positivismo
O positivismo é um conjunto de ideias sistematizado pelo francês Auguste Comte
(1798-1857). Leia o que um historiador escreveu sobre o assunto.
O positivismo [...] tem como pressupostos básicos uma crença inabalável na ciência e no
primado da razão. A história seria regida por leis imutáveis, científicas ou positivas, [...] sendo
que a lei fundamental seria a evolução. A trajetória [...] da humanidade estaria sujeita, para o
positivismo, à lei dos três estados: teológico, metafísico e positivo. No primeiro, predominavam
as crenças no sobrenatural; no segundo, o pensamento metafísico; no terceiro, o pensamento
científico. A República seria o regime ideal para a transição em busca da fase final, pois
ajudaria a superar a fase metafísica, típica das monarquias hereditárias. [...] Apesar das
diferenças entre os positivistas, havia assuntos em que todos concordavam, dentre eles, a
abolição da escravidão e o republicanismo. [...]
VAINFAS, Ronaldo (Org.). Dicionário do Brasil Imperial (1822-1889). Rio de Janeiro: Objetiva, 2002. p. 586-587.
Página 277
No Brasil, os positivistas defendiam:
»» a implantação de uma ditadura republicana;
»» a ideia de que o progresso depende da ordem; daí o lema positivista inscrito na
bandeira brasileira: “Ordem e Progresso”;
»» a crença de que somente os militares poderiam salvar o país das mãos
corruptas dos civis. 1
1. Dica! Documentário abordando o exílio de D. Pedro II e sua morte. [Duração: 34 minutos].
Acesse: <http://tub.im/uno27n>.
A proclamação da República
No dia 9 de novembro de 1889, em clima de forte comoção, Benjamin Constant
comandou uma reunião no Clube Militar para discutir a situação do país e pediu
plenos poderes para mudar a situação dos militares. A mocidade militar respondeu
com uma chuva de aplausos.
Pouco a pouco, a “solução militar” para se chegar à República também foi
ganhando a simpatia dos republicanos civis. A ligação política entre eles e os
militares consolidou-se em 11 de novembro de 1889. Naquele dia, o marechal
Deodoro da Fonseca recebeu em sua casa o major Benjamin Constant e o líder do
Partido Republicano Paulista (PRP), Quintino Bocaiuva. Nesse encontro decidiram
pela derrubada da monarquia.
Em 14 de novembro, boatos de que Deodoro da Fonseca e Benjamin Constant
seriam presos precipitaram os acontecimentos. Na manhã de 15 de novembro de
1889, Deodoro da Fonseca liderou um golpe de Estado contra a monarquia, e a
tropa comemorou o início da República no Brasil.
No entanto, para a população pobre das cidades e do campo, a República recém-
proclamada não trouxe nenhuma esperança de uma vida melhor. 2 e 3
2. Dica! Encenação humorística sobre a proclamação da República. [Duração: 12 minutos].
Acesse: <http://tub.im/5j9bv8>.
3. Dica! Teleaula sobre o fim do Império e o início da República no Brasil. [Duração total: 12
minutos]. Dividido em duas partes. Para a primeira parte, acesse: <http://tub.im/jmc9ui>.
Pedro Bruno. 1919. Óleo sobre tela. Museu da República, Rio de Janeiro
A pátria, de Pedro Bruno, 1919. Note que a bandeira republicana, elemento central do quadro, é
mostrada como objeto de amor e devoção: ela é abraçada, ela protege, ela abriga seus filhos.
Auguste Comte, o idealizador do positivismo, acreditava que só a ordem poderia conduzir ao
progresso.