época! Viagens que duravam 12 dias passaram a ser feitas em menos de quatro.
Em 1830, era inaugurada a primeira ferrovia, que ligava Liverpool a Manchester.
Dica! Documentário abordando as principais transformações históricas ocorridas no século XVIII.
[Duração: 46 minutos]. Acesse: <http://tub.im/m8kux3>.
Página 128
Séc. XIX. Gravura. National Museum Of Science And Industry, Londres. Foto: De Agostini/Getty Images
Inauguração da ferrovia Canterbury-Whitstable, em maio de 1830, uma das primeiras da Inglaterra.
O trem e a ferrovia inauguravam uma nova era marcada pela velocidade. O
transporte de pessoas e de mercadorias tornou-se mais rápido, mais barato e mais
seguro, o que contribuiu para que, no século XIX, a Inglaterra passasse a abastecer
com seus produtos boa parte do mercado mundial. Ela tornou-se, como se disse
mais tarde, a “oficina do mundo”.
Dica! Vídeo sobre as máquinas que tornaram possível a Revolução Industrial. [Duração: 29
minutos]. Acesse: <http://tub.im/77yjcb>.
A vida dos trabalhadores no interior das fábricas
As primeiras fábricas eram sujas, mal iluminadas e insalubres. O vapor e o calor
das máquinas tornavam o ar quase irrespirável, causando inúmeras doenças
respiratórias. O trabalho fabril era disciplinado, repetitivo e exaustivo: as jornadas
duravam de 14 a 18 horas por dia e o trabalhador parava apenas para fazer as
refeições rapidamente. O sistema de fábricas aumentou assim a sujeição do
trabalho e do trabalhador ao capital e ao capitalista.
Insalubre: que origina doença; prejudicial à saúde.
As primeiras fábricas fizeram uso intenso do trabalho feminino e infantil, pois
mulheres e crianças ganhavam cerca de um terço do que era pago a um homem. Os
industriais justificavam o emprego de crianças (a partir dos 6 anos de idade)
dizendo que sua intenção era livrá-las da fome e da mendicância. Essas crianças,
além das tarefas de rotina, realizavam, por vezes, serviços arriscados, como se
enfiar por entre as máquinas para limpá-las ou transportar pesadas peças.
Escola inglesa. C. 1835. Ilustração. Coleção particular. Foto: The Bridgeman Art Library/Keystone
Fiandeiras trabalhando com máquinas, c. 1835. A máquina podia ser alimentada por roda d’água ou
a vapor. No canto inferior esquerdo, vê-se uma mulher limpando a parte de baixo da máquina,
trabalho arriscado e que era feito, geralmente, por crianças.
Página 129
A vida dos trabalhadores fora das fábricas
Nos primórdios da Revolução Industrial, o contraste entre as moradias dos
operários e a de seus patrões era gritante, a começar pela localização. As
residências dos industriais ficavam no subúrbio, afastadas dos centros fabris; eram
imponentes, ajardinadas, e possuíam várias divisões internas, elementos que
documentam a riqueza de seus donos, os maiores beneficiários da
industrialização/urbanização que vinha se processando.
Os operários moravam próximos das fábricas, no centro, sendo, portanto, as
principais vítimas da poluição do ar. As famílias operárias, geralmente numerosas,
amontoavam-se em cortiços, com um ou dois cômodos, que eram usados para
tudo: dormir, cozinhar, lavar roupas, se alimentar, brincar. As famílias geralmente
dividiam entre si um banheiro e uma única torneira, localizados no corredor que
dava acesso à rua. As ruas dos bairros operários eram de chão batido, sujas e com
esgotos a céu aberto, o que facilitava a ocorrência de epidemias como a cólera, que
fez muitas vítimas na época.
Cólera: doença infecciosa gastrointestinal produzida pelo vibrião colérico, uma bactéria em forma de vírgula.
Dica! Vídeo sobre o combate às doenças da Inglaterra do século XIX. [Duração: 29 minutos].
Acesse: <http://tub.im/uhqwuv>.
Como os aluguéis eram caros, quase não sobravam recursos para a alimentação; a
principal refeição dos operários reduzia-se, na maioria das vezes, a uma torta de
batata. Os bares (pubs) serviam como ponto de encontro para diversões e debates
políticos entre os operários. Lá eles conversavam sobre o seu dia a dia, distraíam-
se com jogos e também discutiam assuntos de interesse coletivo, como, por
exemplo, as condições de trabalho no interior das fábricas.
Os trabalhadores vão à luta
Os trabalhadores reagiram às suas condições de vida e de trabalho de diversas
formas; uma das primeiras reações dos operários ingleses foi sabotar e destruir
máquinas, consideradas responsáveis por tirar deles o emprego. Na Inglaterra,
essa destruição foi atribuída a grupos liderados pelo “general Ludd”
(provavelmente o pseudônimo do operário Ned Ludd), daí o nome de ludismo
dado ao movimento de trabalhadores que quebravam máquinas, quando suas
exigências de melhores salários e condições de trabalho não eram atendidas. Os
luditas agiam, geralmente, à noite e em pequenos grupos: armados de martelos,
machados e lanças, punham abaixo o portão das fábricas e demoliam as máquinas.
Sabotar: a palavra “sabotagem”, derivada do francês sabot (tamanco), está ligada às lutas operárias.
Revoltado, o operário sabotava o trabalho enfiando seu tamanco entre as engrenagens das máquinas e
parando a produção.
O movimento teve início em 1811, na cidade inglesa de Nottingham, e se espalhou
rapidamente pelas regiões vizinhas. A repressão aos luditas foi dura: em 1812, o
Parlamento aprovou a pena de morte para quem destruísse máquinas, e, no ano
seguinte, o governo inglês condenou à forca o também líder George Mellor e mais
de uma dezena de seus companheiros.
Os trabalhadores passaram a reagir por meio de greves e marchas de protesto e a
exigir redução da jornada de trabalho, abolição dos castigos nas fábricas e aumento
de salário. A polícia reprimia as manifestações operárias com violência, prendendo
e executando seus líderes.
DIALOGANDO
Em sua opinião, o que teria levado os luditas a quebrarem máquinas?
Segundo o historiador Eric Hobsbawm, a quebra de máquinas era uma tática dos luditas para conseguir melhores condições
de trabalho e impedir a queda dos salários.
Página 130
O Parlamento, por sua vez, aprovou leis que proibiam a greve, as associações
operárias (trade unions) e as marchas de protesto. Em 1819, na cidade inglesa de
Manchester, uma manifestação de protesto com cerca de 80 mil trabalhadores
terminou em tragédia: 11 deles foram mortos. O episódio ficou conhecido como
Massacre de Peterloo. Pressionado pelo movimento operário, em 1824 o
Parlamento britânico reconheceu as trade unions, organizações de trabalhadores
que promoviam auxílio mútuo entre os seus associados e que, no fim do século XIX,
passaram a atuar como sindicatos (órgãos de defesa da classe trabalhadora).
Nos anos 1830, o operariado continuou promovendo marchas de protesto por
melhores condições de trabalho, mas passou a lutar também por direitos políticos.
Em 1838, os trabalhadores entregaram ao Parlamento a Carta do Povo, um
manifesto com mais de 1 milhão de assinaturas no qual exigiam:
» voto secreto e extensivo a todos os homens;
» abolição do voto censitário para o Parlamento (do qual até então só podiam fazer
parte os ricos);
» pagamento de salários aos deputados para que os trabalhadores também
pudessem se candidatar.
A luta pela aprovação da Carta do Povo deu origem a um movimento popular com
grande força em toda a Inglaterra: o cartismo. As exigências dos cartistas foram
recusadas pelo Parlamento, desencadeando ondas de greves, prisões e mortes de
líderes operários.
Cartismo: os cartistas recolhiam milhares de assinaturas nas oficinas, fábricas e associações operárias e
organizavam numerosas marchas que cortavam as principais cidades do país, entoando canções de protesto.
As petições cartistas foram enviadas ao Parlamento por diversas vezes, mas, apesar de virem acompanhadas
de milhares de assinaturas, eram rejeitadas.
As lutas operárias, no entanto, não foram em vão; eis algumas conquistas, parte
das quais se devem aos cartistas:
» 1833 – limitação do trabalho das crianças entre 10 e 13 anos a 48 horas
semanais; entre 13 e 18 anos, a 69 horas semanais.
» 1842 – proibição do trabalho infantil e feminino nas minas.
» 1846 – supressão dos impostos sobre os cereais importados, como o trigo, que
encareciam o preço do pão.
» 1847 – estabelecimento da jornada de trabalho de 10 horas diárias.
» 1878 – limitação do trabalho das mulheres a 60 horas semanais.
» 1919 – estabelecimento da jornada de 8 horas diárias.
1842. Gravura. Coleção particular. Foto: HultonArchive/Illustrated London News/Getty Images
Manifestação na porta de uma fábrica em Salford, Inglaterra, em agosto de 1842. Repare que os
policiais se valem de cassetetes para reprimir os operários.
Página 131
ATIVIDADES
ESCREVA NO CADERNO.
I. Retomando
1. (UEL-PR – 2016) Thomas Morus, em sua obra Utopia, criou uma analogia para a sociedade de
sua época. Nessa representação da sociedade, caracterizada pelo caos, ovelhas se alimentavam de
seres humanos, explicitando, dessa forma, um rompimento do equilíbrio social, no século XVIII.
Com base nos conhecimentos sobre as transformações históricas ocorridas nesse período, assinale
a alternativa que apresenta, corretamente, a denominação da fase do sistema produtivo e a nação
correspondente nesse processo.
a) Plantations – Alemanha.
b) Dominium – Itália.
c) Servidão – Portugal.
d) Corveia – França.
e) Cercamentos – Inglaterra.
1. Resposta: e.
2. (UFRGS-RS – 2015) Durante o século XVII, a Inglaterra experimentou um período de profundas
e violentas transformações políticas, desde a eclosão da Guerra Civil Inglesa (1642-1651) até a
Revolução Gloriosa (1688).
Entre as principais consequências desse processo, podem ser enumeradas
a) a transição do absolutismo para uma monarquia constitucional, e a limitação dos poderes
políticos do monarca.
b) a abolição da propriedade privada e a adoção de um sistema de terras comunais em todo o país.
c) a independência das treze colônias inglesas da América do Norte e a abertura dos portos ingleses
aos navios estrangeiros.
d) a derrota militar das forças reformistas e a consolidação do absolutismo monárquico nas mãos
de Oliver Cromwell.
e) a abolição do anglicanismo e a afirmação do calvinismo como religião oficial da Inglaterra.
2. Resposta: a.
3. (UFMG) Durante a Revolução Inglesa, no século XVII, foi formado o Exército de Novo Tipo,
liderado por Oliver Cromwell, de que participavam, além da classe mercantil, da gentry, dos
pequenos proprietários camponeses e de trabalhadores urbanos, segmentos mais radicais, que
defendiam reformas profundas no Estado inglês. É correto afirmar que esses segmentos eram
constituídos:
a) pelos tories, que visavam ao fechamento do Parlamento e à instituição de um governo popular, e
pelos whigs, defensores da abolição da propriedade privada;
b) pelos levellers, que reivindicavam a democratização, a extensão do sufrágio e uma maior
igualdade perante a lei, e pelos diggers, defensores da posse comum das terras;
c) pelos landlords, que buscavam a implantação do sufrágio universal e a extensão do voto às
mulheres, e pelos warlordists, que pregavam a luta armada do povo contra o Parlamento;
d) pelos saint-simonistas, que defendiam o fim do sistema monárquico, e pelos owenistas,
defensores da abolição da Câmara dos Lordes.
3. Resposta: b.
4. (UEL-PR) Um fator que contribuiu decisivamente para o processo de industrialização na
Inglaterra do século XVIII foi
a) a acumulação de capital resultante da exploração colonial praticada pela Inglaterra através do
comércio.
b) a concorrência tecnológica entre ingleses e americanos, que estimulou o desenvolvimento
econômico.
c) a expulsão das tropas napoleônicas do território inglês, que uniu os interesses nacionais em
torno de um esforço de desenvolvimento.
d) o movimento ludista na Inglaterra com a destruição das máquinas consideradas obsoletas, ao
incentivar a invenção de novas máquinas.
4. Resposta: a.
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e) a abertura de mercados na Alemanha e na França para a Inglaterra, por meio de um acordo
comercial conhecido por Pacto de Berlim.
5. (Enem/MEC – 2015)
Dominar a luz implica tanto um avanço tecnológico quanto uma certa liberação dos ritmos
cíclicos da natureza, com a passagem das estações e as alternâncias de dia e noite. Com a
iluminação noturna, a escuridão vai cedendo lugar à claridade, e a percepção temporal começa
a se pautar pela marcação do relógio.
Se a luz invade a noite, perde sentido a separação tradicional entre trabalho e descanso —
todas as partes do dia podem ser aproveitadas produtivamente.
SILVA FILHO, A. L. M. Fortaleza: imagens da cidade. Fortaleza: Museu do Ceará; Secult-CE, 2001 (adaptado).
Em relação ao mundo do trabalho, a transformação apontada no texto teve como consequência a
a) melhoria da qualidade da produção industrial.
b) redução da oferta de emprego nas zonas rurais.
c) permissão ao trabalhador para controlar seus próprios horários.
d) diminuição das exigências de esforço no trabalho com máquinas.
e) ampliação do período disponível para a jornada de trabalho.
5. Resposta: e.
6. (Enem/MEC) A Revolução Industrial ocorrida no final do século XVIII transformou as relações
do homem com o trabalho. As máquinas mudaram as formas de trabalhar, e as fábricas
concentraram-se em regiões próximas às matérias-primas e grandes portos, originando vastas
concentrações humanas. Muitos dos operários vinham da área rural e cumpriam jornadas de
trabalho de 12 a 14 horas, na maioria das vezes em condições adversas. A legislação trabalhista
surgiu muito lentamente ao longo do século XIX e a diminuição da jornada de trabalho para oito
horas diárias concretizou-se no início do século XX.
Pode-se afirmar que as conquistas no início do século XX, decorrentes da legislação trabalhista,
estão relacionadas com
a) a expansão do capitalismo e a consolidação dos regimes monárquicos constitucionais.
b) a expressiva diminuição da oferta de mão de obra, devido à demanda por trabalhadores
especializados.
c) a capacidade de mobilização dos trabalhadores em defesa dos seus interesses.
d) o crescimento do Estado ao mesmo tempo que diminuía a representação operária nos
parlamentos.
e) a vitória dos partidos comunistas nas eleições das principais capitais europeias.
6. Resposta: c.
7. (UECE – 2016) Atente ao seguinte excerto:
De 1815 a 1847, F. Gaillot arrola uma quinzena de casos ocorridos e outros tantos de tentativas
abortadas. O ludismo é mais importante em 1848, quando assume feições particularmente
graves, à imagem da duração da crise e da esperança despertada pela nova República.
PERROT, M. Os excluídos da História. Operários, mulheres, prisioneiros. Trad. Denise Bottmann. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1988. p. 37.
Sobre o ludismo, é correto afirmar que
a) é um ramo da psicologia voltado para casos extremos de crise política.
b) constituiu um partido político na Inglaterra.
c) foi um movimento operário de protesto contra a produção industrial.
d) foi uma manifestação de rebeldes franceses a favor da produção fabril.
7. Resposta: c.
Página 133
II. Leitura e escrita em História
Leitura e escrita de textos
VOZES DO PASSADO
O texto a seguir foi retirado de um site educacional inglês, contendo depoimentos de pessoas que
trabalharam nas fábricas inglesas do século XIX desde a infância. O depoimento a seguir é de John
Birley, nascido em Londres em 1805 e que começou a trabalhar com 6 anos de idade. Leia o que ele
conta.
Matthias Dunn. 1848. Ilustração. Coleção particular. Foto: The Bridgeman Art Library/Keystone
Mulher e menino trabalhando em uma mina de carvão, em desenho inglês de 1848.
Nosso horário normal era das cinco da manhã até as nove ou dez da noite; e aos sábados, até as
onze, e às vezes meia-noite, e então éramos enviados para limpar o maquinário aos domingos.
Não havia tempo para o café da manhã, não podíamos sentar para o jantar e não tinha tempo
para tomar chá.
Nós íamos para a mina às cinco da manhã e trabalhávamos até quase oito ou nove horas,
quando eles traziam nosso café da manhã, que consistia em mingau com bolo de aveia e
cebolas pra temperar.
O jantar consistia em panqueca cortada em 4 pedaços, separadas em duas pilhas. Uma tinha
manteiga e a outra tinha melado. Ao lado das panquecas havia leite. Nós tomávamos o leite e,
com um pedaço de panqueca na mão, voltávamos a trabalhar sem sentar.
Nós então trabalhávamos até nove ou dez da noite, quando a roda d’água parava. Quando nós
parávamos de trabalhar, éramos levados para a casa dos aprendizes, situada a
aproximadamente 300 metros da mina. Era uma casa grande de alvenaria, cercada por um
muro de dois ou três metros de altura, com uma porta que era mantida trancada. Era capaz de
abrigar cerca de cento e cinquenta aprendizes.
SIMKIN, John. John Birley. Spartacus Educational, set. 1997. Tradução do autor. Disponível em: <http://spartacus-
educational.com/IRbirley.htm>. Acesso em: 26 fev. 2016.
a) Qual o assunto principal do texto?
b) O que se pode concluir sobre o trabalho infantil nas fábricas inglesas do início do século XIX e
está explícito no texto?
c) Por que os empregadores preferiam crianças e mulheres no trabalho fabril?
d) Por que, na Inglaterra do século XIX, os empregadores podiam exigir dos aprendizes longas
jornadas de trabalho?
e) Elabore uma pesquisa sobre o trabalho infantil no Brasil de hoje.
PROFESSOR, VER MANUAL.
Sugestões de sites para trabalhar o assunto:
1. <http://www.brasil.gov.br/cidadania-e-justica/2015/06/brasil-e-o-pais-que-mais-reduziu-o-
trabalho-infantil>
2. <http://www.unicef.org/brazil/pt/media_25610.htm>
Página 134
III. Integrando com Biologia
››Fonte 1
A primeira vacina
A primeira vacina foi descoberta pelo médico inglês Edward Jenner, em 1796. Era uma vacina
contra varíola (doença que provoca erupções na pele e deixa cicatrizes). Jenner observou que
as pessoas infectadas com a varíola bovina (cowpox) não contraíam a varíola comum
(smallpox) e estudou o assunto por vários anos. Em 1796, inoculou com varíola bovina um
menino saudável de 8 anos. Algum tempo depois, Jenner expôs o garoto ao contágio com
varíola comum e ele não contraiu a doença: seu organismo havia desenvolvido defesas contra a
varíola. Estava descoberta a primeira vacina. A reação inicial da comunidade médica foi de
indiferença. Dois anos depois, contudo, Jenner divulgou os resultados de sua pesquisa em um
livro e conseguiu reconhecimento no meio científico. A vacina criada por Jenner difundiu-se
rapidamente na Europa e depois no resto do mundo.
››Fonte 2
Médicos alertam para a vacinação de adolescentes
A Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim) lançou ontem um alerta sobre a importância da
vacinação de adolescentes [...].
Entre as preocupações está a hepatite B, transmissível por beijos, relações sexuais e sangue,
que pode se tornar crônica, levando a complicações como a cirrose. A vacina contra a hepatite
B é a primeira a ser dada ao bebê, mas só entrou no Programa Nacional de Imunização a partir
de 1998. Quem tem mais de 15 anos pode não ter recebido as doses necessárias. “[...]. É preciso
se certificar de que o adolescente tomou as três doses, que garantem a imunidade”, disse o
médico Renato Kfouri, presidente nacional da Sbim.
Kfouri lembra que “[...] é difícil levar o adolescente à sala de vacina. Ele não se sente vulnerável
às doenças.” [...] “A preocupação com o adolescente é que ele enfrenta riscos, não só pela idade,
mas pelo comportamento. Ele se expõe mais socialmente, beija mais, tem uma atitude social
que aumenta o contato com várias pessoas diferentes e fica mais suscetível”, afirmou Isabella
Ballalai, presidente da regional Rio da Sbim. [...]
THOMÉ, Clarissa. Médicos alertam para a vacinação de adolescentes. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 27 jun. 2012.
Disponível em: <http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,medicos-alertam-para-a-vacinacao-de-
adolescentes-,892039,0.htm>. Acesso em: 8 mar. 2016.
a) Pesquise e apresente uma definição de varíola.
b) Responda com base na fonte 2: o que explica a preocupação dos médicos com a incidência da
hepatite B entre os adolescentes?
c) Em grupo. Segundo Isabella Ballalai, o adolescente “se expõe mais socialmente, beija mais [...] e
fica mais suscetível”. Vocês concordam com ela?
d) Em grupo. Apresentem sugestões para estimular os adolescentes a se vacinarem.
Página 135
IV. Você cidadão!
O texto a seguir aborda um assunto importante para todos nós. Leia-o com atenção.
Um seminário realizado em Foz do Iguaçu (PR), nesta semana, reuniu autoridades e
especialistas da América Latina para discutir, entre outras questões, como evitar [...] mortes
consideradas crime contra a humanidade.
[...] O crime é justamente esse: o glotocídio. A cada quinze dias morre o último falante de uma
das 6 700 línguas faladas atualmente em 193 países. Com ele desaparece para sempre mais
uma língua.
Com o objetivo de criar estratégias para fortalecer as línguas ameaçadas na América Latina, o
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e o Ministério da Cultura
organizaram [...] um encontro [...] no Seminário Ibero-americano da Diversidade Linguística,
que reuniu mais de 400 pessoas comprometidas com a luta pelos direitos linguísticos das
minorias. [...]
Das línguas indígenas apenas 11 têm acima de cinco mil falantes, o que significa que a maioria
corre sério risco de extinção. [...]
No seminário foi lembrado o drama recente de dois índios. Um deles – Tikuein – único falante
da língua Xetá, vivia na aldeia São Jerônimo, norte do Paraná, com índios Kaingang e Guarani.
Como estratégia para manter a língua viva, ele falava com o espelho e algumas vezes,
caminhando pela aldeia, com um interlocutor fictício [...].
O outro caso foi registrado em 1978 por Zelito Viana no filme Terra de Índio. Ele gravou dona
Maria Rosa, que vivia no Posto Indígena Icatu (SP) e era ali a única falante da língua Ofaié
Xavante. Quando a fez escutar o que ela mesma havia dito, dona Maria Rosa estabeleceu um
diálogo com o gravador, a quem perguntou por seu pai, por sua mãe e no final se despediu do
aparelho dizendo: “Até logo, agora não falo mais porque estou rouca, viu?”.
A extinção é um risco permanente para as línguas minoritárias, principalmente as indígenas,
devido ao reduzido número de falantes e ao uso social restrito. Não existe literatura escrita
nessas línguas, nem espaço na mídia. Em cinco séculos, nessas condições, mais de 1 100
línguas indígenas desapareceram do mapa do Brasil e outras tantas do continente americano,
levando com elas conhecimentos, cantos, rezas, narrativas, poesia, mitos, afetos.
BRASIL perdeu mais de 1100 línguas indígenas em 500 anos. Circuito Mato Grosso. Disponível em:
<http://circuitomt.com.br/editorias/brasil/53754-brasil-perdeu-mais-de-1-100-linguas-indigenas-em-500-
anos.html>. Acesso em: 25 abr. 2016.
Acervo Memorial da América Latina. Foto: Renato Soares/Pulsar Imagens
Arte plumária Karajá, São Paulo (SP), 2008.
a) Em que consiste o glotocídio e como ele é definido no texto?
b) O texto informa que, das línguas indígenas faladas no Brasil, apenas 11 têm acima de 5 mil
falantes; o que isso significa?
c) Quais foram as estratégias usadas por Tikuein e Maria Rosa para manterem suas línguas vivas?
Que avaliação você faz dessas estratégias?
d) E você, considera importante manter vivas as línguas indígenas do Brasil? Por quê?
e) Em dupla. Façam uma pesquisa e tentem descobrir de que forma a tecnologia auxilia na
sobrevivência das línguas indígenas. Postem o resultado da pesquisa no blog da turma.
Página 136
3UNIDADE Cidadania: passado
e presente
››Fonte 1
Professor: para o autor da fonte 1 a cidadania envolve direitos civis, políticos e sociais. A intenção nesta abertura de
unidade é estimular o debate sobre cidadania a fim de preparar o alunado para exercê-la e, ao mesmo tempo, perceber a
historicidade desse conceito. Esse debate inicial pode, por exemplo, ajudar os estudantes a compreenderem o processo que
conduziu a passagem do súdito a cidadão durante a Revolução Francesa, tema vertebral dessa unidade.
O texto a seguir foi escrito pelo historiador José Murilo de Carvalho; leia-o com
atenção.
Direitos garantidos pela lei hoje
Tornou-se costume desdobrar a cidadania em direitos civis, políticos e sociais. O cidadão pleno
seria aquele que fosse titular dos três direitos. Cidadãos incompletos seriam os que
possuíssem apenas alguns dos direitos. Os que não se beneficiassem de nenhum dos direitos
seriam não cidadãos. Esclareço os conceitos. Direitos civis são os direitos fundamentais à vida,
à liberdade, à propriedade, à igualdade perante a lei. Eles se desdobram na garantia de ir e vir,
de escolher o trabalho, de manifestar o pensamento, de organizar-se, [...] de não ser preso a
não ser pela autoridade competente e de acordo com as leis, de não ser condenado sem
processo legal regular. [...] Sua pedra de toque é a liberdade individual.
É possível haver direitos civis sem direitos políticos. Estes se referem à participação do
cidadão no governo da sociedade. Seu exercício é limitado a parcela da população e con-siste
na capacidade de fazer demonstrações políticas, de organizar partidos, de votar, de ser votado.
Em geral, quando se fala de direitos políticos, é do direito do voto que se está falando. [...] Sem
os direitos civis, sobretudo a liberdade de opinião e organização, os direitos políticos,
sobretudo o voto, podem existir formalmente mas ficam esvaziados de conteúdo e servem
antes para justificar governos do que para representar cidadãos. [...]
Finalmente, há os direitos sociais. [...]. Eles incluem o direito à educação, ao trabalho, ao salário
justo, à saúde, à aposentadoria. [...] Os direitos sociais permitem às sociedades politicamente
organizadas reduzir os excessos de desigualdade produzidos pelo capitalismo e garantir um
mínimo de bem-estar para todos. A ideia central em que se baseiam é a da justiça social.
CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. p. 9-10.
Tasso Marcelo/AE
José Murilo de Carvalho é professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, membro da
Academia Brasileira de Ciências e da Academia Brasileira de Letras. Fotografia de 2012.
Página 137
››Fonte 2
João Prudente/Pulsar Imagens
Fonte 2: pessoa com deficiência visual caminhando sobre piso tátil. O piso tátil é diferenciado por
cor e textura e tem a função de orientar pessoas com deficiência visual ou com baixa visão.
Fotografia de 2015.
››Fonte 3
Adilson B. Liporage/Opção Brasil Imagens
Fonte 3: balanço para pessoas com deficiência física, em Petrópolis (RJ), 2015.
››Fonte 4
Martin Benrnetti/AFP Photo/Image Forum
Fonte 4: manifestação de professores em frente ao Palácio Presidencial La Moneda. Santiago, Chile,
2014.
»» Como o autor da fonte 1 define cidadania?
»» A fonte 2 registra o respeito ao direito de acessibilidade. A
fonte 3 documenta o respeito a um direito contido no Estatuto da
Criança e do Adolescente : o direito de brincar, praticar esporte,
divertir-se. A manifestante da fonte 4 está lutando por um direito
social, o direito à educação.
»» Você já viu um cidadão sendo desrespeitado?
»» Alguém já desrespeitou um direito seu?
»» Você já desrespeitou o direito de outra pessoa (xingando
alguém porque torce pelo time adversário, por exemplo)?
Página 138
Capítulo 7 O Iluminismo e a formação
dos Estados Unidos
Professor: a ideia aqui é estimular o aluno a comparar a Wikipédia, uma invenção recente, com a enciclopédia inventada
pelos franceses no século XVIII, acentuando as diferenças entre uma e outra. Consideramos importante destacar que a
Encyclopédie, modelo para quase todas as enciclopédias posteriores, foi feita por especialistas franceses de diferentes áreas,
buscava organizar e sistematizar conhecimento e, além disso, rendeu um lucro fabuloso aos seus produtores. Já a Wikipédia
é um empreendimento sem fins lucrativos, tem sido escrita a muitas mãos e vem sendo permanentemente atualizada. Esse
paralelo pode alavancar uma aula dialogada sobre o Iluminismo.
Leia o texto a seguir com atenção.
Jonny White/Alamy/Latinstock
Robert Schlesinger/dpa/Corbis/Latinstock
Wikipédia
A Wikipédia é uma enciclopédia multilíngue, on-line, livre, colaborativa, ou seja, escrita
internacionalmente por várias pessoas comuns de diversas regiões do mundo, todas elas
voluntárias.
[...] Este é o fator que distingue a Wikipédia de todas as outras enciclopédias: qualquer pessoa
com acesso à internet pode modificar qualquer artigo, e cada leitor é potencial colaborador do
projeto. A enciclopédia, sem fins lucrativos, é gerida e operada pela Wikimedia Foundation. Ela
está disponível em 272 idiomas [...].
[...] Desde seu início, a Wikipédia tem aumentado sua popularidade e seu sucesso tem feito
surgir outros projetos irmãos. [...]
WIKIPÉDIA. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Wikip%C3%A9dia>. Acesso em: 22 fev. 2016.
Dica! Vídeo sobre a criação da Wikipédia. [Duração: 7 minutos]. Acesse: <http://tub.im/w6uzb6>.
»» Você já consultou a Wikipédia?
»» Acha interessante que cada leitor seja um colaborador em
potencial?
»» O que você pensa de a Wikipédia não ter fins lucrativos?
»» Reparou que ela é uma enciclopédia com características
singulares?
»» Sabia que o primeiro modelo de enciclopédia (a Encyclopédie)
foi criado pelos franceses do século XVIII?
»» Sabia que as ideias contidas na Encyclopédie inspiraram lutas
pela independência na América?
»» Que diferenças há entre a enciclopédia criada pelos franceses e
a Wikipédia?
Página 139
A Ilustração
O Iluminismo ou Ilustração (palavra mais apropriada segundo os especialistas)
foi um movimento de ideias desenvolvidas nos séculos XVII e XVIII, na Europa
Ocidental, sendo a França o seu principal centro de produção e divulgação.
A principal característica do Iluminismo era a crença na razão humana e no seu
potencial. Para os iluministas, os homens só podiam alcançar o esclarecimento e a
luz por meio da razão, que deveria ser aplicada a todas as atividades humanas,
destruindo a ignorância, combatendo os preconceitos e o fanatismo religioso.
Como disse um historiador:
Princípio de toda verdade, autônoma por definição, a razão iluminista se opõe a tudo que [...]
se oculta sob as denominações vagas de “autoridade”, “tradição” e “revelação”.
FALCON, Francisco José Calazans. Iluminismo. 4. ed. São Paulo: Ática, 1994. p. 36. (Princípios).
Chassoneris. 1793. Coleção particular
Para os iluministas, a gestão da sociedade também deveria ser submetida ao império da razão. Note
que nesse baralho comemorativo da Revolução Francesa, em vez do rei de paus, vemos a figura do
filósofo Rousseau, opositor convicto da monarquia absolutista que ajudou a derrubar.
Progresso, otimismo e ciência
Os iluministas acreditavam que pela razão a humanidade chegaria ao
conhecimento que, por sua vez, levaria inevitavelmente ao progresso. Essa crença
no progresso constante da humanidade é uma ideia -chave do Iluminismo: com o
tempo, a ignorância, o obscurantismo e a superstição – frutos da irracionalidade –
iriam ceder lugar ao esclarecimento, às luzes. Para os iluministas, o triunfo da
humanidade era uma certeza, daí o otimismo que caracteriza o movimento.
Leia as palavras de um historiador sobre o conceito de Iluminismo.
O conceito remonta ao próprio século XVIII, quando uma série de expressões relacionadas à
ideia de luz – em oposição às trevas da ignorância e da intolerância – entrou em circulação. [...]
Em 1784, [...], I. Kant (1724-1804) respondeu à indagação de um periódico berlinense sobre o
significado do termo [...]“ilustração”. Esta consistiria num processo de esclarecimento,
representado pela “saída do homem de sua menoridade”, graças ao uso de seu próprio
entendimento. Em sintonia com a crença otimista da época, Kant entendia, assim, as Luzes
como um movimento da humanidade em direção a um futuro melhor que buscava uma
liberdade de pensamento que viabilizasse, pelo “uso público da razão”, o aprimoramento dos
negócios públicos, até então conduzidos no círculo fechado das Cortes.
NEVES, Guilherme Pereira. Iluminismo. In: VAINFAS, Ronaldo (Org.). Dicionário do Brasil Colonial. Rio de Janeiro:
Objetiva, 2000. p. 296.
Escola alemã. Séc. XIX. Óleo sobre tela. Coleção particular. Foto: The Bridgeman Art Library/Keystone
Retrato de Immanuel Kant (1724-1804).
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Os iluministas acreditavam também que o mundo era regido por leis naturais.
Conhecer essas leis era sinal de progresso; daí o ardor com que se dedicaram à
ciência, o que resultou em importantes descobertas científicas como as realizadas à
época por Lavoisier. Por fim, é importante lembrar que o Iluminismo foi também
uma reação ao Antigo Regime: monarquias absolutistas em que o rei, a nobreza e
o clero acumulavam poder e privilégio. Os iluministas opunham-se ao
absolutismo, aos privilégios da nobreza e do clero, à intolerância religiosa e à falta
de liberdade de expressão.
Lavoisier: Antoine Laurent Lavoisier (1743-1794), cientista francês, personagem mais importante no
desenvolvimento da química enquanto ciência e autor do livro Elementos de química, publicado em 1789.
Privilégio: no Antigo Regime, a palavra privilégio não possuía o sentido que tem hoje, de vantagem
conseguida sem esforço ou ilegalmente. No Antigo Regime, privilégio era o direito legítimo – concedido ou
comprado – de usufruir de um território, um cargo público ou uma pensão, que conferia ao seu possuidor
poder, prestígio e riqueza.
Pensadores iluministas
Os iluministas ocuparam-se de várias áreas do conhecimento: ciência, técnica,
filosofia, literatura, entre outras.
Voltaire e a liberdade de pensamento
Um representante de peso da primeira geração iluminista foi o francês François
Marie Arouet, mais conhecido como Voltaire (1694-1778), e considerado por
muitos como o maior propagandista do novo ideário. Esse filósofo engajou-se nos
debates políticos do seu tempo, esgrimindo contra a Igreja Católica e o Antigo
Regime. Conhecido por seu anticlericalismo, Voltaire condenava por meio de
sátiras, anedotas e ensaios o fanatismo, o preconceito religioso e a infalibilidade do
papa. Ele encerrava seus ataques à Igreja com a frase: “Esmagai a infame”. Mas,
apesar de tecer duras críticas a essa instituição, ele, assim como a maioria dos
iluministas, acreditava na existência de Deus, visto como Ser Supremo, arquiteto
ou relojoeiro do Universo.
Por seus escritos, Voltaire chegou a ser preso duas vezes. Para evitar uma nova
prisão, refugiou-se na Inglaterra. Durante seu exílio escreveu a obra Cartas
inglesas, na qual fazia apologia da monarquia constitucional inglesa e do
liberalismo político defendido por John Locke. Voltaire também foi um defensor
incansável da liberdade de pensamento e de expressão. É atribuída a ele a frase:
“Posso não concordar com nenhuma palavra que você disse, mas defenderei até a
morte o seu direito de dizê-las”.
Dica! Vídeo com crítica de Voltaire ao fanatismo religioso. [Duração: 3 minutos]. Acesse:
<http://tub.im/vvkm4x>.
François Bouchot. Séc. XIX. Gravura colorida. Coleção particular. Foto: The Bridgeman Art Library/Keystone
Gravura de François Bouchot (1800-1842) representando Voltaire preso na Bastilha (prisão usada
pelos monarcas absolutistas franceses para castigar quem, de alguma forma, opunha-se ao Antigo
Regime).
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Montesquieu e a teoria dos três poderes
Outro importante pensador do século XVIII foi o jurista Charles Louis de Secondat,
Barão de Montesquieu (1689-1755), autor de O espírito das leis, obra monumental
composta de muitos livros e publicada pela primeira vez em 1748.
Escola inglesa. Séc. XIX. Gravura. Coleção particular
Perfil de Montesquieu em gravura do século XIX.
Uma ideia importante dessa obra é a de que as leis mantêm estreitas relações com
a história e a realidade do povo submetido a elas. Assim, para Montesquieu, não há
leis justas ou injustas, mas leis adequadas ou não a um determinado povo, tempo e
lugar.
Montesquieu dizia que todo indivíduo que detém o poder tende a abusar dele;
portanto, tudo estaria perdido se o mesmo indivíduo exercesse o poder de fazer
leis, executar e julgar. Por isso, eram necessárias a separação e a distinção dos
poderes. Leia o que o próprio Montesquieu diz sobre o assunto.
A liberdade política [...] é esta tranquilidade de espiŕ ito que provém da opinião que cada um
tem sobre a sua segurança; e para que se tenha esta liberdade é preciso que o governo seja tal
que um cidadão não possa temer outro cidadão.
Quando, na mesma pessoa ou no mesmo corpo de magistratura, o poder legislativo está
reunido ao poder executivo, nã o existe liberdade; porque se pode temer que o mesmo monarca
ou o mesmo senado crie leis tirânicas para executá-las tiranicamente. Tampouco existe
liberdade se o poder de julgar não for separado do poder legislativo e do executivo. Se
estivesse unido ao poder legislativo, o poder sobre a vida e a liberdade dos cidadãos seria
arbitrário, pois o juiz seria legislador. Se estivesse unido ao poder executivo, o juiz poderia ter
a força de um opressor.
Tudo estaria perdido se o mesmo homem, ou o mesmo corpo dos principais, ou dos nobres, ou
do povo exercesse os três poderes [...].
MONTESQUIEU. O espírito das leis. São Paulo: Martins Fontes, 1996. p. 168.
Inspirados em suas ideias, os estadunidenses Alexander Hamilton (1755-1804) e
James Madison (1751-1836) formularam a teoria da divisão dos poderes em três:
Executivo (para administrar o país e executar as leis), Legislativo (para elaborar
e aprovar as leis) e Judiciário (para fiscalizar o cumprimento das leis e julgar os
conflitos).
Segundo essa teoria, os três poderes só funcionariam adequadamente se fossem
autônomos (não interferissem na esfera um do outro) e harmônicos (agissem em
comum acordo). Só mediante esse compromisso de respeito mútuo se alcançaria o
ideal da moderação.
Rousseau e a vontade geral
Por sua originalidade e atualidade, o pensamento do suíço Jean-Jacques Rousseau
(1712-1778), filósofo, escritor e compositor musical, continua a ser muito
estudado e a despertar debates acalorados em todo o mundo. Em sua obra Emílio
ou Da Educação, ele reflete sobre diversos temas a partir da educação de um garoto
por seu tutor.
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Nessa obra, Rousseau inova ao ver a criança como um ser singular e não como um
adulto em miniatura, como até então ela era vista. Sua premissa filosófica é a de
que o homem nasce bom e a sociedade o corrompe. Essa ideia está resumida em
uma frase do personagem Emílio: “Tudo é certo em saindo das mãos do Autor das
coisas, tudo degenera nas mãos do homem”. Com base nessa premissa Rousseau se
coloca contra as rotinas tradicionais destinadas as crianças de sua época, e em prol
da felicidade e das necessidades delas. Emílio é uma obra ao mesmo tempo
filosófica e pedagógica que, ao ser lida ao longo do tempo, influenciou fortemente
práticas e reflexões no campo da pedagogia.
Escola francesa. Séc. XVIII. Ilustração. Bibliotheque Nationale, Paris. Foto: The Bridgeman Art Library/Keystone
Ilustrações da obra Emílio, uma novela pedagógica de Jean-Jacques Rousseau.
Em seu livro Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os
homens, Rousseau afirma que a infelicidade humana tem sua origem na
propriedade privada, que teria arrancado o indivíduo de sua condição natural (a
vida em harmonia com a natureza) e destruído a igualdade entre os homens.
Em seu clássico O contrato social, Rousseau diz que, ao se verem ameaçados, os
homens concordaram em se organizar politicamente, estabelecendo um contrato
social entre eles, que uniu cada um aos demais. Por esse contrato, ficava
estabelecido que a vontade geral é soberana, ou seja, só o povo é soberano; o
governo é apenas delegado, comissário do povo. Sendo o único detentor da
soberania, o povo pode estabelecer e destituir o governo quando julgar necessário;
pode limitar, modificar ou retomar o poder quando lhe aprouver.
Vontade geral: para Rousseau, a vontade geral era a integração, e não a simples soma das vontades
individuais.
As ideias de Rousseau influenciaram movimentos revolucionários, tanto na Europa
como em outros continentes. No continente americano, seu pensamento insuflou,
entre outros, o movimento de independência das Treze Colônias, na América do
Norte, e a Conjuração Baiana, no Brasil. 1 e 2
1. Dica! Vídeo sobre a vida e a obra de Rousseau. [Duração: 9 minutos]. Acesse:
<http://tub.im/6be2hu>.
2. Dica! Vídeo sobre as ideias de Rousseau e sua influência na história do Brasil. [Duração: 11
minutos]. Acesse: <http://tub.im/3bg6go>.
A Enciclopédia
Quando se fala em Iluminismo, nos vem à cabeça imediatamente a Enciclopédia,
obra composta de 35 volumes e 2 885 ilustrações, organizada pelo filósofo Denis
Diderot (1713-1784) e pelo matemático Jean D’Alembert (1717-1783).
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Em 1751, quando essa obra começou a ser publicada na França, foi considerada
perigosa e chegou a ser proibida e retirada de circulação.
A Enciclopédia – cujos verbetes foram escritos por filósofos (como Voltaire e
Rousseau), cientistas, artistas, médicos, teólogos e, também, por técnicos – foi
concebida e elaborada para ser uma síntese do saber acumulado e, ao mesmo
tempo, um poderoso instrumento de sua divulgação. Embora na época o número
de leitores fosse proporcionalmente muito menor do que o de hoje, a obra foi um
sucesso de vendas. Conforme pesquisa de um historiador atual:
[...] os editores conseguiram uma fortuna. Com um investimento inicial de 70 mil libras, o lucro
pode ter chegado a 2,5 milhões de libras.
DARNTON, Robert. O Iluminismo como negócio: história da publicação da “Enciclopédia”, 1775-1800. Trad. Laura
Teixeira e Márcia Lucia Machado. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. p. 25.
Dica! Animação sobre o século das luzes na Europa dos séculos XVIII e XIX. [Duração: 25
minutos]. Acesse: <http://tub.im/dgkhcz>.
Escola inglesa. Séc. XVIII. Desenho. Cabinet Des Arts Graphiques, Paris. Foto: The Bridgeman Art Library/Keystone
Desenho do século XVIII representando o interior do Café Procope em Paris, ponto de encontro de
intelectuais e artistas. As ideias iluministas foram divulgadas também entre os populares, nas ruas,
nas praças e nos cafés, e não apenas nos salões dos nobres ou nas residências de burgueses
enriquecidos.
Iluminismo e economia
A revolução intelectual iluminista não se restringiu a criticar o absolutismo
monárquico: atacou também sua política econômica, o mercantilismo. Seus
ataques se voltaram, sobretudo, para a principal característica do mercantilismo: a
intervenção do Estado na economia.
Os primeiros a criticarem o mercantilismo foram os fisiocratas franceses. A palavra
“fisiocracia” – de origem grega, composta de duas outras: physis (natureza) e
kratos (riqueza/poder) – pode ser traduzida por “poder da natureza”. Para os
fisiocratas, a única fonte de toda riqueza era a terra e a agricultura era a principal
atividade econômica. Já a manufatura e o comércio não faziam mais que
transformar e trocar as riquezas oriundas da terra; eram, portanto, atividades
secundárias.
O principal representante da fisiocracia, o economista François Quesnay (1694-
1774), compara o organismo econômico ao corpo humano, afirmando que ambos
são regidos por leis naturais e que a agricultura é o coração da economia. Para esse
autor, a lei mais importante do organismo econômico é a “lei da oferta e da
procura”: quando a oferta é maior que a procura, o preço tende a baixar; quando
ocorre o oposto, tende a subir. Assim, para ele, se o Estado interviesse na
economia, estaria contrariando as “leis naturais”. Para Quesnay, o Estado deveria
restringir-se a incentivar o progresso e eliminar as regulamentações
mercantilistas.
Os fisiocratas criaram uma frase que resume seu pensamento: “laissez-faire,
laissez-passer, le monde va de lui-même” (deixai fazer, deixai passar, que o mundo
caminha por si mesmo).
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Adam Smith e o liberalismo econômico
Os fundamentos do liberalismo na economia foram lançados pelo escocês Adam
Smith (1723-1790), considerado por muitos como o fundador da ciência
econômica.
Em sua obra A riqueza das nações (1776), A. Smith fez uma descoberta científica,
uma espécie de ovo de Colombo, qual seja, a de que somente o trabalho cria
riqueza (e não o comércio, como acreditavam erroneamente os mercantilistas; ou a
agricultura, como pensavam os fisiocratas).
Para Smith, o valor do trabalho seria determinado pela lei da oferta e da procura.
Essa e outras leis do mercado garantiriam a evolução “natural” e saudável da
economia, ou seja, a “mão invisível” do mercado conduziria ao progresso
econômico sem que fosse necessária a “mão pesada” do Estado. Adam Smith
opunha-se, portanto, à intervenção do Estado e de grupos monopolistas na
economia e defendia a livre concorrência e o livre-comércio entre as nações. Se
todas as nações comerciassem entre si, dizia ele, todas elas sairiam lucrando, pois
cada uma produziria somente aquilo que conseguisse fazer melhor. As nações com
perfil mais agrícola se dedicariam à agricultura, e as mais industrializadas se
especializariam na indústria.
A não intervenção do Estado e a livre concorrência entre indivíduos, empresas e
nações constituem os dois postulados básicos do liberalismo econômico. Seus
principais defensores – além do próprio Adam Smith – foram Thomas Robert
Malthus (1766-1834), David Ricardo (1772-1823) e Stuart Mill (1806-1873),
representantes da chamada escola clássica da economia. 1 e 2
1. Dica! Vídeo sobre a vida e a obra de Adam Smith. [Duração: 6 minutos]. Acesse:
<http://tub.im/2h6gzy>.
2. Dica! Vídeo sobre o liberalismo de Adam Smith e o socialismo de Karl Marx. [Duração: 20
minutos]. Acesse: <http://tub.im/7fufsq>.
Escola inglesa. Séc. XVIII. Gravura. Coleção particular. Foto: The Bridgeman Art Library/Keystone
Gravura de Adam Smith no livro Os maiores benfeitores da humanidade, de Samuel Adams Drake,
século XIX.
O despotismo esclarecido
As ideias iluministas foram aplicadas por alguns monarcas absolutistas como
estratégia de governo. Esses monarcas “esclarecidos” pretendiam
modernizar/reformar e enriquecer seus domínios e ampliar seu poder, prestígio e
fama. O tipo de governo adotado por eles foi chamado pelos historiadores do
século XIX de despotismo esclarecido. Em todos os lugares da Europa onde a
experiência foi bem sucedida, isso foi possível porque tais reformas não puseram
em risco a sobrevivência do Antigo Regime. É de se notar que, na Europa, só não
houve despotismo esclarecido na Inglaterra e na França. Na Inglaterra, porque lá já
não existia o absolutismo; e, na França, porque se as reformas tivessem sido
efetivadas, elas teriam correspondido, pela situação do país, a uma revolução, a
uma superação do Antigo Regime.
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Frederico II, da Prússia (1712-1786), foi o déspota esclarecido de maior prestígio
na época. Conhecido como Frederico, o Grande, ele era chamado de rei-filósofo,
pois deixou escritos filosóficos respeitados pelos intelectuais de seu tempo, a
exemplo de Voltaire e outros. Além disso, Frederico II aboliu as torturas aplicadas
aos presos em seu país, criou escolas de ensino fundamental, incentivou as letras,
as artes e as ciências, empreendeu a modernização de várias regiões da Prússia e
dirigiu pessoalmente a reforma de Berlim, capital do país na época.
C. Roechling. 1731. Ilustração. Foto: ullstein bild via Getty Images
A imagem de 1731 representa o Rei Frederico II da Prússia inspecionando, com seu secretário, os
domínios reais, no interior da Prússia.
José II, da Áustria (1741-1790), sensível às ideias iluministas, adotou a tolerância
religiosa e implementou reformas visando à modernização de seu país. As
reformas empreendidas por ele mantiveram intocados, no entanto, o militarismo e
a servidão.
Catarina II, da Rússia (1729-1796), leitora voraz dos enciclopedistas, também
atuou como agente modernizador de seu país: mandou construir escolas, fundou
hospitais, dirigiu a reforma da capital (São Petersburgo) e combateu a corrupção
nos meios civis e religiosos. Além disso, incentivou a construção de um gigantesco
parque industrial metalúrgico que beneficiava ferro e cobre, extraídos das minas
situadas nos montes Urais.
Marquês de Pombal (1699-1782), ministro do rei Dom José I (1714-1777), foi o
representante do despotismo esclarecido em Portugal. Valendo-se de seu enorme
poder, decretou a emancipação dos indígenas na América portuguesa; em Portugal,
decretou a abolição da escravidão africana e a fundação da Imprensa Régia.
Alegando razões de Estado, o marquês ordenou a expulsão dos jesuítas de Portugal
e de suas colônias, em 1759, e confiscou seu vasto patrimônio. Com a expulsão dos
jesuítas, a frágil organização do ensino no Império Português ficou seriamente
prejudicada, e, nos 11 anos seguintes, a educação ressentiu-se da falta de recursos
e de profissionais especializados.
Diante disso, em 1770, Pombal propôs um novo estatuto para a Universidade de
Coimbra. Afinado com as ideias iluministas, promoveu a valorização das ciências
naturais, a adoção do método experimental no curso de medicina e a criação das
faculdades de filosofia e matemática. O governo pombalino abriu também 837
vagas para o cargo de mestre-régio em Portugal e seus domínios, cabendo ao Brasil
apenas 44 delas. Esses professores eram pagos pelo Estado com os recursos
oriundos de um novo imposto criado especialmente para este fim: o subsídio
literário.
Dica! Documentário português sobre a vida do Marquês de Pombal. [Duração: 59 minutos].
Acesse: <http://tub.im/3j2794>.
A obra modernizadora de Marquês de Pombal imprimiu novos rumos à cultura no
Império Português, mas manteve praticamente intocados a política tributária e os
privilégios vigentes em Portugal sob o Antigo Regime.
Os ideais iluministas foram aplicados efetivamente, pela primeira vez, nas Treze
Colônias da América do Norte.
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As relações entre a Inglaterra e as Treze
Colônias da América do Norte
Como vimos anteriormente, desde o início da colonização, os habitantes das Treze
Colônias da América do Norte desenvolveram sentimentos de autonomia em
relação à metrópole e hábitos de autogoverno. A Inglaterra, por sua vez, adotou
durante muito tempo a política de negligência salutar, isto é, de não interferência
nos assuntos internos das Treze Colônias. A partir da segunda metade do século
XVIII, no entanto, o governo inglês mudou sua política colonial, passando a oprimir
suas colônias. Entre os fatores que contribuíram para essa mudança de atitude,
cabe destacar:
» a concorrência que os produtos norte-americanos faziam aos ingleses no
mercado externo;
» as guerras em que a Inglaterra se envolveu. Uma delas foi a Guerra Franco-
Índia, iniciada em 1754, quando os colonos norte-americanos invadiram as terras
indígenas situadas além dos Montes Apalaches provocando a reação dos franceses
que lá viviam e dos indígenas aliados a eles. Outra foi a Guerra dos Sete Anos
(1756-1763), a mais importante do século XVIII, um conflito armado entre a
França e a Inglaterra e seus respectivos aliados na Europa e na América. A
Inglaterra venceu essas duas guerras travadas na Europa e na América, mas saiu
delas abalada financeiramente. A França, por sua vez, foi derrotada e teve de
entregar para a Inglaterra uma parte de suas possessões no Canadá, nas Antilhas e
na Índia. Observe o mapa a seguir.
A América do Norte após a Guerra dos Sete Anos (século XVIII)
Allmaps
Fonte: VIDAL-NAQUET, Pierre; BERTIN, Jacques. Atlas histórico. Lisboa: Círculo do Livro, 1990. p. 208.
Na Guerra Franco-Índia e na Guerra dos Sete Anos, os habitantes das Treze Colônias ganharam
experiência na formação de unidades militares e no combate armado, elementos importantes nas
lutas travadas contra a metrópole inglesa.
Para recuperar-se das enormes despesas com as guerras em que havia se
envolvido, a Inglaterra baixou uma série de novas leis desfavoráveis aos colonos:
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»» Lei do Açúcar (1764) – Elevava os impostos sobre o açúcar e derivados da
cana, artigos de luxo, vinho e café importados pelos colonos; além disso,
estabelecia que os colonos só poderiam comprar o melaço das Antilhas inglesas e
não de quem tivesse o preço mais atraente. Os colonos protestaram, mas não
foram ouvidos.
»» Lei do Selo (1765) – Determinava que todos os contratos, jornais, cartas e
documentos públicos deviam receber um selo real; o dinheiro arrecadado com a
venda dos selos destinava-se à Coroa inglesa. Os colonos reagiram a essa lei
invadindo agências postais, queimando selos e boicotando produtos ingleses.
Inspirados nas ideias iluministas, iniciaram um movimento com o lema “No
taxation without representation” (Sem representação não pode haver tributação).
Os colonos negavam-se a pagar os impostos votados por um Parlamento (no caso,
o britânico) no qual não tinham representantes. A Inglaterra recuou, mas no ano
seguinte aumentou os impostos sobre o vidro, o papel, os corantes e o chá que os
colonos importavam.
»» Lei do Chá (1773) – O governo inglês adotou outra medida mercantilista:
concedeu à Companhia das Índias Orientais o monopólio da venda do chá para as
Treze Colônias. A reação foi imediata: 150 colonos disfarçados de indíos invadiram
três navios ingleses no porto de Boston e atiraram o chá ao mar. Esse episódio
importante no processo de lutas pela independência ficou conhecido como Festa
do Chá em Boston (Boston Tea Party). Os colonos justificaram sua ação dizendo
que os impostos sobre o chá e o monopólio violavam o direito que tinham de
serem taxados apenas por representantes eleitos por eles.
Currier e Ives. C. 1846. Ilustração. Yale University Art Gallery. Foto: The Bridgeman Art Library/Keystone
A Festa do Chá em Boston, de N. Currier e J. M. Ives, 1846. Essa é uma das versões da ilustração
produzida na epóca por Sarony and Major. O porto de Boston estava situado em Massachusetts e
era o mais movimentado das Treze Colônias.
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» Leis Intoleráveis (1774) – O governo inglês respondeu com várias leis que os
norte-americanos chamaram de “intoleráveis”. Uma delas interditava o porto de
Boston até que fosse pago o prejuízo causado pelo derramamento do chá; outra
determinava a ocupação de Massachusetts pelo exército inglês e restringia o
direito de reunião; outra, ainda, determinava que todo ato de rebeldia contra a
Inglaterra seria julgado por tribunais ingleses.
Revoltados contra a política fiscal inglesa, alguns colonos lançaram bolas de neve
contra um quartel inglês. Assustados, os soldados reagiram matando quatro
manifestantes. Esse episódio, conhecido como Massacre de Boston, foi
amplamente utilizado pela propaganda a favor da independência. 1
1. Dica! Vídeo sobre o processo de independência das Treze Colônias. [Duração: 43 minutos].
Acesse: <http://tub.im/g4qr6a>.
O movimento de independência
Litogravura. Escola inglesa. Séc. XVIII. Coleção particular. The Bridgeman Art Library/Keystone
Observando a imagem, percebe-se que a coroa, símbolo da monarquia, está no chão. E se nota
também que o pé esquerdo de Paine está prestes a pisá-la, numa clara afronta à monarquia inglesa
que, à época, oprimia as Treze Colônias.
As “leis intoleráveis” estimularam nos colonos um forte sentimento antimetrópole.
Foram criadas várias sociedades secretas, com destaque para a “Filhos da
Liberdade”, que uniu os colonos em torno da ideia de independência. Intelectuais e
ativistas, adeptos das ideias liberais e iluministas, como Thomas Jefferson, Samuel
Adams e Benjamin Franklin, assumiram a liderança do movimento.
Nesse contexto, os colonos organizaram o Primeiro Congresso Continental da
Filadélfia (1774). Repre sentantes de quase todas as colônias (exceto a da
Geórgia) elaboraram uma petição dirigida ao rei protestando contra as medidas
adotadas pela Inglaterra nas Treze Colônias. Naquele momento ainda não havia
consenso quanto à separação. A resposta da Inglaterra foi ordenar a destruição de
um depósito de armas dos colonos. Os colonos reagiram à metrópole e teve início,
assim, a Batalha de Lexington e a de Concord (1775), as primeiras da guerra pela
independência. Nesse clima de hostilidades crescentes, representantes de todas as
colônias se reuniram no Segundo Congresso Continental da Filadélfia (1775 a
1781).
No meio-tempo um folheto denominado Senso comum, de autoria de Thomas
Paine, espalhou-se rapidamente pelas Treze Colônias e foi um poderoso
instrumento de propaganda da ideia de independência. 2 e 3
2. Dica! Vídeo em espanhol sobre a Declaração de Independência. [Duração: 4 minutos]. Acesse:
<http://tub.im/fbvv6w>.
3. Dica! Documentário sobre a revolução americana e suas influências. [Duração: 46 minutos].
Acesse: <http://tub.im/ydd8a6>.
Página 149
Para refletir
O trecho a seguir foi retirado do panfleto de Paine. Curiosamente ele era inglês de
nascimento; e, apesar de ter chegado aos Estados Unidos somente aos 37 anos de
idade, resumiu com muita propriedade o sentimento de revolta crescente dos
colonos norte-americanos contra a Inglaterra. Com 50 páginas de texto, seu
panfleto chegou às livrarias em 10 de janeiro de 1776 e logo fez um enorme
sucesso. Leia o trecho a seguir com atenção.
A Inglaterra é, apesar de tudo, a pátria-mãe, dizem alguns. Sendo assim, mais vergonhosa
resulta sua conduta, porque nem sequer os animais devoram suas crias nem fazem os
selvagens guerra a suas famílias; de modo que esse fato volta-se ainda mais para a condenação
da Inglaterra.
[...]
A Europa está separada em muitos reinos para que possa viver muito tempo em paz, e onde
quer que estoure uma guerra entre a Inglaterra e qualquer potência estrangeira, o comércio da
colônia sofre ruínas, por causa de sua conexão com a Grã-Bretanha... Tudo o que é justo ou
razoável advoga em favor da separação. O sangue dos que caíram e a voz chorosa da natureza
exclamam: Já é hora de separar-nos! Inclusive a distância que o Todo-Poderoso colocou entre a
Inglaterra e as colônias constitui uma prova firme e natural de que a autoridade daquela sobre
estas nunca entrou nos desígnios do Céu...
PAINE, Thomas. In: KARNAL, Leandro. História dos Estados Unidos: das origens ao século XXI. São Paulo: Contexto,
1999. p. 85.
a) Como Paine descreve a Inglaterra em seu texto?
a) Diz que apesar de ser a pátria-mãe adota uma conduta vergonhosa com relação a seus filhos.
b) Interprete. A quem Thomas Paine está se referindo quando diz “Nem fazem os
selvagens, guerra a suas famílias”?
b) Ele se refere aos povos indígenas da América do Norte. Professor: comentar que o uso do termo selvagens desvela a
visão que os europeus daquela época tinham dos ameríndios.
c) Que argumentos Thomas Paine utiliza em defesa da separação entre as Treze
Colônias e a Inglaterra?
c) Argumento 1: o fato de que qualquer guerra em que a Inglaterra se envolvesse prejudicava as Treze Colônias. Argumento
2: a distância geográfica que o Todo-Poderoso colocou entre a Inglaterra e as Treze Colônias. [Note que o panfleto de
Thomas Paine mistura elementos de racionalismo iluminista com argumentos de viés religioso.]
d) Reflitam e opinem: qual foi o peso do argumento religioso no sucesso do
panfleto de Paine? Justifique.
d) O argumento religioso foi decisivo para o sucesso do panfleto, pois os habitantes das Treze Colônias eram em sua maioria
puritanos e tinham grande apego à Bíblia e à ideia de que todo cristão deve obediência aos “desígnios do céu”; à vontade do
Senhor.
O Segundo Congresso acabou optando pela separação. O comando das tropas foi
entregue a George Washington, um rico fazendeiro do Sul. Uma comissão redigiu
a Declaração de Independência, publicada em 4 de julho de 1776; seu principal
autor foi Thomas Jefferson. O texto da Declaração defendia a resistência à tirania,
o direito à vida, à liberdade e à busca da felicidade.
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A tradição política estadunidense elegeu alguns homens como “pais da pátria”, fundadores da
Nação, os grandes responsáveis pelo que os Estados Unidos são hoje. Eles foram representados das
mais diversas formas em estátuas, pinturas, ilustrações, gibis, e figuram, inclusive, nas notas de
dólar, a exemplo das que trazem a imagem de Thomas Jefferson, à esquerda, e de Benjamin
Franklin, à direita.
A guerra pela independência
Legalmente, a independência estava proclamada, mas, para conquistá-la, os
“patriotas” tiveram de travar uma guerra difícil (1775-1781) contra os “casacas
vermelhas” – como eram chamados os soldados ingleses.
A vitória dos colonos na Batalha de Saratoga (1777) atraiu o apoio da França e da
Espanha, rivais da Inglaterra, que passaram a auxiliá-los com dinheiro, soldados e
navios. Animados pela ajuda externa, os colonos redobraram os esforços e
venceram a Batalha de Yorktown (1781), decisiva para o desfecho da guerra.
Em 1783, pelo Tratado de Paris (ou de Versalhes), a Inglaterra reconheceu a
independência das Treze Colônias, a primeira ocorrida no continente americano.
Nascia assim um novo país: os Estados Unidos da América.
Dica! Documentário sobre os principais eventos e personagens das guerras da independência
norte-americana. [Duração: 25 minutos]. Acesse: <http://tub.im/z858q6>.
Os primeiros anos dos Estados Unidos
Os primeiros tempos dos Estados Unidos foram difíceis. Os constituintes
encontravam-se divididos: alguns, como Thomas Jefferson, defendiam maior
autonomia para os estados; outros, como George Washington, eram favoráveis a
um governo central forte.
A Constituição – em vigor até hoje – foi concluída em 1787 e declarou o país uma
República presidencialista e federalista. O federalismo é um conceito-chave dessa
Constituição: cada estado passou a ter autonomia para criar leis próprias,
organizar forças militares e até mesmo pedir empréstimos no exterior. Ao governo
federal, cabia a responsabilidade pela política externa, pela defesa e pelo comércio
exterior.
Seguindo o modelo proposto por Alexander Hamilton e James Madison, os
estadunidenses adotaram a divisão dos poderes em Executivo, Legislativo e
Judiciário, que deveriam ser autônomos e harmônicos. Madison e Hamilton
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pensavam a divisão entre os três poderes tendo por base uma sociedade
constituída por cidadãos juridicamente iguais.
»» Poder Executivo – exercido pelo presidente da República, eleito
indiretamente; os eleitores de cada estado escolhem seus delegados, que, por sua
vez, elegem o presidente da República.
»» Poder Legislativo – exercido pelo Congresso, composto da Câmara dos
Representantes e do Senado. Para que os atos do Legislativo se transformem em
lei, é necessária a assinatura do presidente, que possui poder de veto. Este, por sua
vez, precisa da aprovação do Congresso para o direcionamento da verba federal e
também para a nomeação de altos funcionários, como secretários de Estado e
embaixadores.
»» Poder Judiciário – no âmbito federal é exercido pela Suprema Corte,
encarregada de garantir o cumprimento das leis.
Com o apoio da maioria dos estados, George Washington foi eleito presidente, o
primeiro dos Estados Unidos da América.
DIALOGANDO
Observe a imagem com atenção:
Howard Chandler. Poster. Coleção particular. Foto: wim Ink 2, LLC/Corbis/Latinstock
Cartaz de 1926 alusivo à independência das Treze Colônias da América do Norte.
a) Quem ou o quê essa mulher representa?
a) Essa mulher representa a constituição dos Estados Unidos.
b) O personagem sentado e com a pena na mão é o principal autor da constituição dos Estados
Unidos. Quem é ele?
b) Ele é Thomas Jefferson.
c) O que está escrito na fita que envolve a figura feminina?
c) “Nós, o povo”.
d) Logo no início da Constituição estadunidense lê-se: “Nós, o povo dos Estados Unidos”. A palavra
“povo” refere-se a todos os estadunidenses daquela época?
d) Não; na prática, a expressão “Nós, o povo dos Estados Unidos...” refere-se apenas aos homens adultos e brancos, que
possuíssem certa renda (da terra ou de investimentos). A maioria do povo teria de lutar muito tempo ainda para conquistar
a cidadania plena.
Repercussões da independência
A independência estadunidense abalou o prestígio do rei na Inglaterra e provou
ser possível fazer valer a soberania popular. Provou também ser possível romper o
elo entre governantes e governados quando os primeiros não garantissem aos
segundos seus direitos fundamentais. Para as colônias da América espanhola e
portuguesa, os Estados Unidos serviriam de inspiração e exemplo de sucesso de
luta pela independência. Essa conquista também repercutiu na França
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absolutista. Os soldados franceses que haviam lutado na América contra a opressão
monárquica voltaram para seu país com ideias republicanas de liberdade e
ajudaram a fazer a Revolução Francesa.
No entanto, a independência, seguida da Constituição, não permitiu o acesso à
cidadania a todos os estadunidenses.
Inicialmente, o grupo efetivamente beneficiado com a cidadania foi aquele que
possuía certa renda (da terra ou de investimentos) e que dirigiu o movimento pela
independência. Esse grupo, conhecido como wasp (abreviatura de branco, anglo-
saxão, protestante) era constituído de fazendeiros e comerciantes e passou a ter o
controle político do país.
Para os povos indígenas, a independência traria prejuízos, pois suas terras,
localizadas em sua maior parte a oeste do Mississípi, passaram a ser atacadas pelos
proprietários de terra e comerciantes de peles de origem europeia. Os afro-
americanos escravizados continuaram na mesma situação: a escravidão persistiria
ainda por quase 90 anos. As mulheres, por sua vez, permaneceram excluídas do
direito ao voto, só conquistado em 1920, após intensas lutas do movimento
feminista.
É importante considerar o caráter revolucionário da expressão “todos os homens
foram criados iguais”, pois foi a defesa desse princípio que moveu os movimentos
pela conquista da cidadania que ocorreram em solo estadunidense daí em diante.
The Bridgeman Art Library/Keystone