terra. Como terão sido essas lutas em solo americano em séculos
passados?
»»Nesta unidade vamos estudar uma parte importante dessas
histórias.
Página 228
Professor: a ideia é partir da comemoração da Semana Farroupilha para estimular o aluno a conhecer as lutas que os
sulistas travaram contra o Império entre 1835 e 1845 e o contexto em que isso ocorreu. Sugerimos trabalhar também a
memória construída em torno da Farroupilha e, ao mesmo tempo, evidenciar os laços que unem o passado ao presente.
Comentar a presença dos Centros de Tradições Gaúchas (CTGs) em muitos estados brasileiros, chamando a atenção para a
força da cultura tradicional gaúcha no Brasil como um todo. Lembrar que no fechamento da Semana Farroupilha ocorrem
desfiles, a cavalo ou em charretes, que reúnem em todo o Rio Grande do Sul milhares de pessoas trajando as vestimentas
típicas – os homens usam bombachas, botas, lenços e chapéus de aba larga; e as mulheres usam vestidos de prenda, rodados
e coloridos, e flores nos cabelos.
Capítulo 12 Regências: a unidade
ameaçada
Leia com atenção esta notícia.
Desfile Farroupilha comemora os 180 anos da Revolução
Joel Vargas/PMPA
Desfile da Semana Farroupilha em Porto Alegre (RS), 2015.
Milhares de pessoas passaram na manhã deste domingo, 20, pela avenida Edvaldo Pereira
Paiva (Beira-Rio) para prestigiar o tradicional desfile cívico do 20 de Setembro. Neste ano, o
festejo trouxe como tema O Campeirismo e os 180 anos da Revolução Farroupilha. […]
Na abertura do desfile, centenas de lideranças comunitárias [...] entraram na avenida
cultuando as tradições gaúchas e saudando os participantes da cerimônia. […] Fortunati
destacou a importância de cultivar, preservar e fortalecer as tradições gaúchas. “É uma
demonstração do quanto nos orgulhamos de ser gaúchos […] afirmou.
A Fundação Cultural Gaúcha e o Movimento Tradicionalista Gaúcho, responsáveis pela
iniciativa, levaram para a avenida mais de mil voluntários, artistas amadores, [...] que
apresentaram a teatralização do tema desta edição. Os voluntários integram Centros e
Departamentos de Tradição Gaúcha (CTGs e DTGs), além de piquetes e grupos ligados ao
tradicionalismo.
[...] coreógrafos [...] coordenaram o espetáculo de teatro a céu aberto. […] cerca de 800
cavalarias e 55 entidades tradicionalistas participaram do desfile cívico.
[…]
BARROS, Bibiana. Desfile Farroupilha comemora os 180 anos da Revolução. Porto Alegre: Prefeitura de Porto Alegre,
2015. Disponível em: <http://www2.portoalegre.rs.gov.br/acampamentofarroupilha/default.php?p_noticia=
180946&DESFILE+FARROUPILHA+COMEMORA+OS+180+ANOS+DA+REVOLUCAO>. Acesso em: 11 abr. 2016.
Campeiro: relativo ao campo; que vive nos campos gaúchos.
Fortunati: sobrenome do então prefeito de Porto Alegre.
Cavalaria: grupo de pessoas a cavalo.
»» Você sabe por que a data de 20 de setembro é importante para
os rio-grandenses?
»» O que são CTGs? Qual a sua finalidade?
»» Para você, preservar uma tradição é importante? Por quê?
Página 229
Vimos que, ao se ver isolado politicamente e sob forte pressão popular, D. Pedro I
abdicou, em 1831, em favor de seu filho Pedro de Alcântara, que tinha apenas 5
anos de idade.
Arnaud J. Pallière. C. 1830. Têmpera. Museu Imperial de Petrópolis
O menino Pedro de Alcântara em pintura de 1830.
Segundo o historiador José Murilo de Carvalho, a importância da abdicação de D.
Pedro I reside no fato de que, a partir daquela data, o governo do Brasil ficou
totalmente nas mãos dos brasileiros. Ao ser anunciada a abdicação em praça
pública, a multidão lá reunida aclamou de imediato o imperador-criança,
confirmando sua opção por manter a Monarquia, apesar da pressão de grupos
republicanos ali presentes.
O avanço liberal
No dia da abdicação, a Assembleia estava em recesso, por isso os poucos deputados
e senadores que estavam no Rio de Janeiro só puderam escolher regentes
provisórios. Em junho de 1831, a Assembleia elegeu o brigadeiro Francisco de
Lima e Silva, além dos deputados João Bráulio Muniz e José da Costa Carvalho, para
compor a Regência Trina Permanente. O Ministério da Justiça foi entregue ao
padre paulista Diogo Antônio Feijó.
As lutas políticas contra o autoritarismo de Dom Pedro I uniram grupos de
diferentes tendências e interesses e mascararam as divergências entre eles. Depois
da abdicação, no entanto, essas divergências voltaram a aparecer e se formaram
três grupos políticos. Eles disputavam o poder nas ruas, nos jornais e no
Parlamento e tinham interesses, objetivos e líderes próprios. Observe a
composição desses grupos políticos.
»» Restauradores ou caramurus – comerciantes portugueses, altos funcionários
públicos e alguns oficiais do Exército. Defendiam a volta de Dom Pedro I ao poder.
Eram liderados por Vicente Ferreira de Paula.
»» Moderados ou chimangos – proprietários rurais, profissionais liberais, padres
e militares. Defendiam a manutenção da ordem social e dos privilégios das elites
do Nordeste, do Rio de Janeiro, de São Paulo e de Minas Gerais e também a
Monarquia Constitucional. Eram liderados pelo padre Antônio Feijó e por
Bernardo Pereira de Vasconcelos.
»» Exaltados ou farroupilhas – proprietários rurais, profissionais liberais,
militares, funcionários públicos modestos e padres. Defendiam a autonomia para
as províncias, a nacionalização do comércio, e parte deles era favorável à
República. Entre seus líderes estavam Cipriano Barata e Borges da Ferreira.
Enquanto os moderados, como Antônio Feijó, defendiam a Monarquia e as
hierarquias sociais vigentes, ou seja, a ordem estabelecida, os exaltados tinham
propostas que, uma vez vitoriosas, alterariam a ordem vigente.
Estando no poder durante a Regência Trina Permanente, os moderados tiveram de
enfrentar dois graves problemas: a manutenção da ordem pública e as pressões
por maior autonomia das províncias. Para manter a ordem, o governo dos
moderados criou, em agosto de 1831, a Guarda Nacional, que imitava a instituição
francesa de mesmo nome e, assim como esta, era formada por homens que tinham
algo a defender, isto é, os proprietários de terras.
Página 230
Só podiam fazer parte da Guarda Nacional cidadãos proprietários; brasileiros com
idade entre 21 e 60 anos e renda mínima de 200 mil réis nas quatro maiores
cidades e de 100 mil réis no resto do país.
Romulo Fialdini/Tempo Composto
Uniformes da Guarda Nacional, século XIX.
DIALOGANDO...
a) O que se pode dizer sobre o critério de formação da Guarda Nacional?
b) No tempo das Regências, eram comuns o mandonismo local e o uso privado de cargo
público. No Brasil de hoje isso ainda acontece?
Professor:
a) a intenção do governo era armar cidadãos considerados confiáveis (leia-se: dispostos a reprimir as revoltas populares).
b) A intenção é levar os alunos a refletir sobre o presente e a se posicionar, aprendendo a argumentar e a contestar
argumentações.
Aos fazendeiros mais ricos foi concedida a patente de coronel da Guarda Nacional,
a mais alta de todas elas. Cada um deles organizava um destacamento com homens
de sua confiança e com recursos próprios, conseguindo com isso um grande poder
local.
Coronel: nome dado aos ricos fazendeiros que chefiavam a Guarda Nacional e tinham grande poder político
nas suas localidades.
Em novembro de 1832, o governo dos moderados criou também o Código do
Processo Criminal, que instituiu o tribunal do júri e ampliou os poderes dos
juízes de paz. Eles podiam julgar algumas ações: prender criminosos, preparar as
listas de votantes, presidir mesas eleitorais e ajudar a compor a lista dos jurados.
Interessados em ascender socialmente, os juízes de paz geralmente se rendiam aos
poderosos que, com isso, evitavam a condenação de seus capangas e clientes.
Muitos homens livres pobres, em troca de favores, transformavam-se em clientes e
votavam nos candidatos indicados pelos potentados locais.
Juiz de paz: magistrado não remunerado e sem formação profissional específica, eleito localmente em cada
distrito.
Dica! Vídeo didático explicando as regências provisória e permanente. [Duração: 6 minutos.]
Acesse: <http://tub.im/hmta6c>.
O Ato Adicional de 1834
Um dos debates que mais empolgou os parlamentares nos anos iniciais da
Regência foi a necessidade de reforma na Constituição do Império, considerada
tanto pelos moderados quanto pelos exaltados como exageradamente
centralizadora. Depois de intensa discussão entre eles, chegou-se a um consenso
no Parlamento: aprovou-se o Ato Adicional de 1834, o qual:
»» criou as Assembleias Legislativas Provinciais, concedendo, assim, maior
autonomia às províncias;
»» aboliu o Conselho de Estado, órgão bastante impopular que tinha sido criado
por D. Pedro I, mas conservou a vitaliciedade do Senado;
»» cedeu ao presidente da província o direito de nomear e transferir funcionários
públicos;
»» retirou dos regentes o direito de dissolver a Câmara, uma das principais
atribuições do poder Moderador;
Página 231
»» substituiu a Regência Trina por uma Regência Una;
»» transformou o Rio de Janeiro em município neutro, capital do Império.
Com o Ato Adicional de 1834 e a permissão para que as províncias legislassem
sobre gastos e impostos locais, os liberais moderados buscavam diminuir a
oposição ao seu governo. 1
1. Dica! Vídeo didático explicando o que foi e como foi aplicado o Ato Adicional de 1834.
[Duração: 7 minutos.] Acesse: <http://tub.im/7j6z8m>.
Regência Una Feijó
Com a morte de D. Pedro I, em 1834, os restauradores perderam a razão de existir;
parte deles deixou a política; outra parte se uniu aos moderados que, com isso,
fortaleceram-se. Nesse contexto, ocorreram pela primeira vez eleições para chefe
do governo. A eleição levou ao poder o padre Diogo Antônio Feijó, que venceu seu
opositor por uma margem estreita de votos.
Sebastião Sisson. Séc. XIX. Coleção particular
Diogo Antônio Feijó (1784-1843) foi padre, deputado, senador e ministro da Justiça. Foi o primeiro
chefe do poder Executivo brasileiro a ser escolhido em eleição nacional. Era líder da ala
progressista do grupo moderado, favorável à descentralização política (maior autonomia para as
províncias). Outra de suas bandeiras foi a luta contra o celibato clerical.
Durante seu governo, Feijó teve de enfrentar vários desafios, entre os quais a
eclosão de duas das maiores rebeliões regenciais: a Cabanagem, no Norte, e a
Farroupilha, no Sul. Para reprimir essas rebeliões nas províncias, Feijó precisava
de recursos que deveriam ser aprovados pela Câmara dos Deputados, porém a
maioria dessa Câmara movia uma pesada oposição contra ele, que nada podia fazer
pois o Ato Adicional de 1834 não o autorizava a dissolvê-la.
Além de se oporem a Feijó, os deputados da oposição o acusavam de não reprimir
com firmeza as revoltas provinciais e de ser anticelibatário. Em 1837, o deputado
e jornalista Evaristo da Veiga, principal aliado de Feijó, faleceu, aumentando ainda
mais seu isolamento político.
Anticelibatário: contrário a que os padres se mantivessem solteiros. Feijó era de fato favorável ao
casamento dos padres, tema que gerou grande polêmica na época e lhe rendeu vários adversários.
Sem o apoio da maioria da Câmara e de Evaristo da Veiga, e temendo a
desintegração do Império, Feijó renunciou em setembro de 1837. 2
2. Dica! Vídeo sobre o governo do padre Feijó e as forças políticas atuantes no Brasil da época.
[Duração: 9 minutos.] Acesse: <http://tub.im/nendqk>.
Regência Una Araújo Lima
Seu sucessor legal, Pedro de Araújo Lima, era, além de um político experiente e
formado em Coimbra, senhor de engenho em Pernambuco e politicamente
conservador. Ele, que no ano seguinte foi eleito regente com mais de 4 mil votos,
também era radicalmente contrário à descentralização política; por isso deu início
ao Regresso, uma política de fortalecimento do poder central que tinha o apoio de
representantes da cafeicultura e dos grandes comerciantes do Sudeste.
Página 232
Os regressistas queriam fortalecer a autoridade central e garantir a unidade do
Império e a ordem escravista, pondo fim ao que eles chamavam de “anarquia”. O
principal líder dos regressistas, o deputado por Minas Gerais Bernardo Pereira de
Vasconcelos, dizia ser preciso deter o “carro da Revolução” e restabelecer a
integridade do Império por meio da submissão dos grupos rebeldes, pela força ou
por acordos. Para alcançar seu objetivo, adotaram duas ações: de um lado,
promoveram o carisma da Monarquia e, de outro, enviaram forças militares para
conter as rebeliões que ocorriam nas províncias.
Em 1840, os regressistas obtiveram importante vitória ao aprovar a Lei
Interpretativa do Ato Adicional, que:
»» retirava a autonomia das províncias, permitindo a anulação das leis provinciais;
»» aumentava o poder de repressão do governo central.
Por quererem conservar a ordem imperial, os regressistas passaram a ser
chamados de conservadores, dando origem à primeira organização brasileira a que
se pode dar o nome de partido político, o Partido Conservador; seus opositores,
então chamados de progressistas, formaram o Partido Liberal.
Dica! Vídeo sobre o regresso conservador. [Duração: 9 minutos.] Acesse:
<http://tub.im/kpmggq>.
Para saber mais
Na regência de Araújo Lima foi criado o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro
(IHGB), instituição político-cultural criada com o objetivo de produzir uma história
nacional – até então só existia a portuguesa – que desse aos brasileiros um
sentimento de pertencimento colaborando para acelerar o processo de formação
do Estado Nacional. O IHGB deveria ser o guardião da nossa memória e das fontes
para a escrita da história e da geografia nacionais.
Anônimo. 1860. Desenho aquarelado. Coleção particular
Desenho aquarelado, de 1860, que mostra o figurino do uniforme dos membros efetivos do
Instituto Histórico e Geográfico do Brasil. O modelo era o do Instituto Histórico de Paris, que serviu
de inspiração para o brasileiro.
Página 233
As rebeliões nas províncias
Durante as Regências, explodiram nas províncias brasileiras, de norte a sul,
rebeliões de grande impacto na história social do país. Pobres e ricos, peões e
fazendeiros, indígenas, mestiços, negros e brancos chegaram a se unir contra o
governo central, sediado no Rio de Janeiro. Mas seus objetivos não eram os
mesmos: enquanto as elites das províncias exigiam maior autonomia, os indígenas,
mestiços, negros e brancos pobres lutavam por liberdade e uma vida melhor.
As principais rebeliões iniciadas no período regencial foram:
» a Cabanagem (1835-1840);
» a Guerra dos Farrapos (1835-1845);
» a Revolta dos Malês (1835);
» a Sabinada (1837-1838);
» a Balaiada (1838-1841).
A Cabanagem
Insurreição de escravos e rebeliões sociais nas Regências
Allmaps
Fonte: ATLAS histórico IstoÉ: Brasil 500 anos. São Paulo: Editora Três, 1998. p. 57.
A província do Grão-Pará, na época da Cabanagem, abrangia terras dos atuais
estados do Pará, Amapá, Roraima, Rondônia e Amazonas e tinha uma população
estimada em 120 mil habitantes, distribuídos como mostra o gráfico abaixo.
POPULAÇÃO DO GRÃO-PARÁ (1835)
Indígenas 33000
Negros 30000
Mestiços 42000
Brancos 15000
Total 120000
Editoria de arte
Fonte de pesquisa: FAZOLI FILHO, Arnaldo. O período regencial. 2. ed. São Paulo: Ática, 1994. p. 55.
A economia do Grão-Pará baseava-se na exploração das drogas do Sertão
(castanha-do-pará, cacau, baunilha), de madeiras e de ervas medicinais e na pesca.
Os trabalhadores da região eram, em sua maioria, muito pobres, viviam em
cabanas e trabalhavam para os fazendeiros ou para os comerciantes portugueses e
ingleses, que controlavam o comércio na região. Boa parte desses comerciantes
residia em Belém, onde era forte o antilusitanismo e o sentimento de revolta
contra as condições de trabalho e o alto custo de vida.
Os fazendeiros também estavam insatisfeitos por dois motivos: o presidente da
província, nomeado pelo governo central, era quase sempre favorável aos
portugueses e, além disso, não se importava com os problemas da população.
Presidente da província: cargo equivalente hoje ao de governador do estado.
Página 234
Ricardo Oliveira/Tyba
Dos tempos da Cabanagem para cá, a área correspondente ao Grão-Pará mudou muito, como se
pode ver na fotografia acima, que capta uma vista noturna do bairro Nossa Senhora das Graças, em
Manaus (AM), em junho de 2015.
Lula Sampaio/Opção Brasil Imagens
Mas ao longo do rio Negro continuam existindo palafitas (veja imagem acima, em uma fotografia
também atual), construções semelhantes àquelas em que os cabanos viviam.
Reagindo a essa situação, em 1835, homens ricos e influentes, aliados aos cabanos,
invadiram o Palácio do Governo, em Belém, e entregaram a chefia do primeiro
governo cabano ao fazendeiro Félix Melcher. Iniciava-se assim a Cabanagem.
Melcher, porém, traiu o movimento e prometeu fidelidade ao futuro imperador.
Diante disso, outro líder da revolta, Francisco Vinagre, venceu Melcher pelas armas
e assumiu o segundo governo cabano.
Dica! Vídeo sobre a Cabanagem. [Duração: 9 minutos.] Acesse: <http://tub.im/yxr5ij>.
Vinagre, no entanto, acabou fazendo o mesmo que Melcher e entregou o governo
da província à autoridade enviada pelo governo regencial sediado no Rio de
Janeiro. Mas os cabanos continuaram resistindo no interior. Sob a liderança de
Eduardo Angelim, penetraram a região pelos rios, aliciaram ribeirinhos e,
fortalecidos, retomaram Belém.
O governo do padre Feijó, por sua vez, enviou ao Grão-Pará, em 1836, uma
esquadra comandada pelo brigadeiro Soares d’Andrea, que retomou a cidade de
Belém. A repressão à Cabanagem foi brutal. Soares d’Andrea mandou prender e
fuzilar cabanos sem julgamento prévio.
DIALOGANDO
O que você pensa sobre condenação sem julgamento prévio?
Resposta pessoal. Professor: a questão visa estimular a reflexão sobre a noção de justiça.
Cerca de 30 mil pessoas (40% da população da província) foram mortas. Os
últimos grupos se renderam somente em 1840. Os cabanos chegaram ao poder,
mas não conseguiram conservá-lo: as divergências entre seus líderes, a falta de um
programa de governo, a inferioridade bélica e uma epidemia de varíola que se
alastrou por Belém naquela época contribuíram para o fim da rebelião.
A Guerra dos Farrapos
O mais duradouro movimento rebelde do Império foi a Guerra dos Farrapos,
ocorrida no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina entre 1835 e 1845.
Página 235
Pedro Weingärtner. Séc XIX. Óleo sobre tela. Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro
Chegou tarde, do artista porto-alegrense de origem alemã Pedro Weingärtner. A obra mostra o
interior de uma casa do Rio Grande do Sul, no século XIX. Repare nas roupas dos personagens.
A população da província de São Pedro do Rio Grande era de cerca de 150 mil
pessoas, das quais somente 10% viviam em Porto Alegre, sua capital.
No interior, a base da economia era a criação de gado e a produção de charque
(carne salgada). Estancieiros e charqueadores lideravam aquela sociedade
militarizada que se formou durante os constantes conflitos com os castelhanos nas
terras ou nas fronteiras do Rio Grande do Sul. O charque, o gado, bem como outros
produtos gaúchos, como couro, sebo e graxa, eram vendidos a outras províncias
brasileiras do Centro-Sul e do Nordeste. Ou seja, a produção gaúcha destinava-se
sobretudo ao mercado interno.
Ocorre que o governo brasileiro cobrava altas taxas do charque rio-grandense e
baixas taxas do charque platino importado. Além disso, sobretaxava o sal que os
rio-grandenses importavam para fazer seu charque, levando-os a se sentirem
duplamente prejudicados. Os rio-grandenses reclamavam também que os
presidentes de província nomeados pelo governo eram quase sempre alheios aos
seus interesses e que o Rio Grande do Sul servia apenas como fornecedor de
cavalos e homens às tropas do governo nos constantes conflitos por terra e gado
na região platina.
Em 20 de setembro de 1835, os farroupilhas, liderados pelo estancieiro Bento
Gonçalves, romperam com o presidente da província e invadiram Porto Alegre,
dando início à Guerra dos Farrapos. 1 e 2
1. Dica! Vídeo sobre a Guerra dos Farrapos com contribuição de vários historiadores. [Duração:
25 minutos.] Acesse: <http://tub.im/okw3wf>.
2. Dica! Cenas de minissérie que tem como pano de fundo a Guerra dos Farrapos. [Duração: 4
minutos.] Acesse: <http://tub.im/oxfwoz>.
Em 1836, após importantes vitórias sobre as tropas legalistas, os farroupilhas
proclamaram a República Rio-Grandense.
Em outubro daquele ano, no entanto, vários chefes farroupilhas foram presos,
entre eles Bento Gonçalves, que foi levado para a Bahia. Mesmo preso, ele foi eleito
presidente dessa República, cuja capital era a cidade de Piratini. No ano seguinte,
com o auxílio da maçonaria, Bento Gonçalves fugiu da cadeia e reassumiu o
comando das forças farroupilhas, que, à época, já contavam com o apoio do
revolucionário italiano Giuseppe Garibaldi. Os farroupilhas invadiram, então, Santa
Catarina, e, em 24 de julho de 1839, em Laguna, Garibaldi e Davi Canabarro
fundaram a República Juliana. Pesquisas recentes indicam que a população de
Laguna, em Santa Catarina, colaborou com os rebeldes fornecendo-lhes suporte e
participando efetivamente da luta. 3
3. Dica! Reportagem abordando a participação dos estrangeiros na Guerra do Farrapos.
[Duração: 13 minutos.] Acesse: <http://tub.im/3xphs5>.
Página 236
G. Evangelista/Opção Brasil Imagens
Painel Epopeia Rio-Grandense, Missioneira e Farroupilha, em Porto Alegre (RS), 2012. Esta obra de
Danúbio Gonçalves é uma homenagem à cavalaria e ao líder farroupilha Bento Gonçalves, figuras
decisivas do movimento que agitou o sul do Brasil no século XIX. A cavalaria foi a principal arma
dessa luta prolongada.
Em 1842, o Império enviou ao Sul milhares de soldados sob o comando de Luís
Alves de Lima e Silva, o Barão de Caxias, para pressionar os chefes daquele
movimento que reunia, sob uma mesma bandeira, desde fazendeiros até peões e
ex-escravizados. Os farroupilhas não se renderam.
Então, para pôr fim à guerra, Caxias, que representava o braço armado do Império,
propôs a chamada “paz honrosa”. Por meio deste acordo de paz assinado em 1845:
»» os rio-grandenses ganharam o direito de escolher seus presidentes de
província;
»» os comandantes farroupilhas poderiam passar ao Exército brasileiro com os
mesmos postos que ocupavam nas tropas rebeldes;
»» o charque platino pagaria 25% a mais de impostos para entrar no mercado
brasileiro;
»» o governo imperial reconheceria a liberdade dos escravos que lutaram nas
forças farroupilhas como soldados. 1 e 2
1. Dica! Vídeo pedagógico em que uma avó ensina a sua neta sobre a Guerra dos Farrapos.
[Duração: 11 minutos.] Acesse: <http://tub.im/i3fnxz>.
2. Dica! Reportagem sobre o Museu de Piratini (RS) apresentando importantes fontes escritas e
materiais para o estudo da Guerra dos Farrapos [Duração: 9 minutos.] Acesse:
<http://tub.im/cv2dpk>.
DIALOGANDO
A “paz honrosa” pode ser considerada uma vitória farroupilha? Justifique.
Resposta pessoal. Professor: lembrar que o governo imperial atendeu a várias exigências dos farroupilhas.
Para refletir
A participação negra na Guerra dos Farrapos
[...]
Para arregimentar soldados, os farroupilhas incorporaram escravos às suas fileiras,
prometendo em troca a liberdade após o fim do conflito. De olho na alforria, alguns negros
fugiram das propriedades onde eram mantidos escravos para aderir à luta. Outros foram
cedidos por senhores de terra que apoiavam a revolução. [...]
Página 237
Estima-se que em alguns momentos os lanceiros negros, como ficaram conhecidos estes
soldados, tenham representado metade do exército rio-grandense. O africano José, de nação
angola, foi um desses homens que sonharam em conquistar a liberdade pegando em armas. [...]
[...]
Somente nos últimos anos a importância e a dimensão da participação negra neste conflito têm
recebido maior atenção. Hoje é possível afirmar com segurança que negros, índios e mestiços
desempenharam papel fundamental na Guerra dos Farrapos não somente como soldados, mas
também trabalhando em diversos outros setores importantes da economia de guerra, como
nas estâncias de gado, na fabricação de pólvora e nas plantações de fumo e erva-mate
cultivadas pelos rebeldes.
Apesar das promessas, em nenhum momento a República Rio-Grandense libertou seus
escravos. A questão da abolição era controversa entre seus líderes. Ao mesmo tempo em que o
governo rebelde prometia liberdade aos escravos engajados e condenava a continuidade do
tráfico de escravos, seu jornal oficial, O Povo, estampava anúncios de fugas de cativos. Houve
uma tentativa de abolição por meio de projeto apresentado na Assembleia Constituinte de
1842 por José Mariano de Mattos (1801-1866), que foi recusado. Anos após o fim do conflito,
vários líderes farroupilhas ainda tinham escravos, como Bento Gonçalves (1788-1847), que
morreu deixando 53 cativos para seus herdeiros.
[...]
OLIVEIRA, Vinicius Pereira de; SALAINI, Cristian Jobi. Escravos farrapos. Revista de História, Rio de Janeiro, 19 nov.
2010. Disponível em: <http://www.revistadehistoria.com.br/secao/artigos-revista/escravos-farrapos>. Acesso em:
7 maio 2016.
Juan Manuel Blanes. Séc. XIX. Óleo sobre tela. Coleção particular
Retrato de um Lanceiro Negro, de Juan Manuel Blanes (1830-1901). Pesquisas recentes apontam
para uma intensa participação de negros na Guerra dos Farrapos.
a) O engajamento dos escravizados nas fileiras farroupilhas pode ser considerado
uma forma de resistência negra na história do Brasil?
a) Sim, pois os escravizados aderiram à causa farroupilha mediante a promessa de que, ao final do conflito, eles obteriam a
liberdade.
b) Transcreva o trecho do texto em que fica evidente a divergência entre os líderes
farroupilhas no tocante à questão da abolição.
b) “A questão da abolição era controversa entre seus líderes. Ao mesmo tempo em que o governo rebelde prometia
liberdade aos escravos engajados e condenava a continuidadedo tráfico de escravos, seu jornal oficial, O Povo, estampava
anúncios de fugas de cativos.”
c) Debata, reflita e responda: o que explica o “silêncio demorado” em torno da
participação dos negros na Guerra dos Farrapos?
c) Esse silêncio demorado no tocante à participação dos negros pode ser associado ao predomínio de uma história
eurocêntrica de viés positivista, seja nos estudos acadêmicos, seja nos livros escolares brasileiros. A invisibilidade dos
negros e a recusa em vê-los como sujeitos históricos são desdobramentos do predomínio dessa abordagem na história
escrita e ensinada no Brasil.
d) Façam uma pesquisa sobre a participação de negros, indígenas e mestiços na
Guerra dos Farrapos e produzam um texto histórico ilustrado sobre o assunto.
d) Resposta pessoal.
Página 238
Frederic Forbes, Dahoney e Dahomans. S/d. Aquarela. Coleção particular
Aquarela representando Gezo, personagem que havia sido rei do Daomé (atual Benin, na África).
Entre os africanos escravizados trazidos para o Brasil havia líderes religiosos, políticos e militares,
e até mesmo reis, a exemplo deste representado na imagem.
João José Reis
Acima, vista interna de uma loja, década de 1990, isto é, porão de um sobrado. Em uma dessas lojas,
no centro de Salvador, viviam os africanos libertos Manuel Calafate e Aprígio, ambos de origem
iorubá e líderes da Revolta Escrava de 1835. Fotografia de João José Reis.
A Revolta dos Malês
Salvador, em 1835, possuía cerca de 65 mil habitantes. Essas pessoas tinham entre
si diferenças profundas na maneira de trabalhar, tirar folga e orar. A origem, a
condição social e a cor da pele eram outras diferenças importantes para
compreendermos por que, na Bahia do século XIX, uma maioria de negros e
mestiços era oprimida por uma minoria de brancos.
Dica! Vídeo sobre a matriz afro na formação da cidade de Salvador. [Duração: 23 minutos].
Acesse: <http://tub.im/85h5uo>.
Escravizados ou libertos, os africanos eram as maiores vítimas dessa opressão.
Muitos resistiam a isso organizando comunidades de terreiros para cultuar os
orixás, os voduns ou os espíritos ancestrais. Outros aderiram ao catolicismo e o
praticavam à sua maneira. Outros ainda optaram pelo chamado culto malê, que
vinha se tornando popular na capital baiana.
Orixá: nome dado às divindades do panteão iorubá ou nagô.
Vodum: nome dado às divindades nos cultos jejes; equivalente a inquice, na cultura angola, e orixá, no Ketu.
O culto malê era uma combinação de elementos das religiões africanas e dos
princípios muçulmanos contidos no Corão (o livro sagrado dos muçulmanos). Os
malês não comiam carne de porco, jejuavam às sextas-feiras e, uma vez por ano,
faziam uma dieta especial à base de inhame, língua de vaca, arroz, leite e mel. O
tempo de duração desse sacrifício é conhecido como Ramadã (mês do jejum
muçulmano).
Os negros, escravizados ou livres, eram explorados no trabalho, desprezados por
sua cor e perseguidos por causa de suas religiões. Todos entraram no Brasil como
cativos e tinham motivos de sobra para deixar de lado diferenças de origem e
religião e lutar contra seus opressores.
A data escolhida foi 25 de janeiro de 1835, um domingo, dia de homenagem a
Nossa Senhora da Guia. A luta pela Bahia durou a noite inteira. Agitando espadas,
facas e lanças, os negros enfrentaram soldados armados com garruchas, que
fugiam do corpo a corpo, atirando neles de dentro do quartel.
Página 239
Cerca de 50 africanos morreram durante os combates e muitos outros ficaram
feridos, vindo a falecer posteriormente. O tribunal que julgou os rebeldes procurou
provar a superioridade dos brancos sobre os negros, dos homens de posses sobre
os escravos, da religião católica sobre as outras. Qualquer objeto da África
encontrado pela polícia baiana era considerado criminoso. Além dos abadás,
rosários e escritos religiosos dos malês, as autoridades apreenderam atabaques,
colares de búzios, panos da costa, entre outros.
Abadá: espécie de túnica usada pelos negros.
Sufocada a rebelião, os vencedores se lançaram à vingança. Em março de 1835,
centenas de africanos libertos foram mandados de volta para a África. A maioria
voltou para os lugares de onde veio: Lagos, Nigéria e Daomé. Essas pessoas tinham
trabalhado muitos anos para conseguir comprar a carta de alforria. Agora, mesmo
os considerados inocentes, eram ilegalmente expulsos da Bahia. O objetivo das
autoridades, segundo o historiador João José Reis, era o branqueamento da
sociedade livre baiana.
Dica! Vídeo produzido pelo Centro de Memória da Bahia sobre a Revolta dos Malês. [Duração: 9
minutos]. Acesse: <http://tub.im/hk7oy3>.
Ricardo Teles/Pulsar Imagens
Acima, Festa do Nosso Senhor do Bonfim, no Benin, África, 2011. Essa festa organizada por
descendentes de brasileiros, os agudás, foi levada para a África por negros que haviam sido
escravizados no Brasil
Max Haack/Prefeitura de Salvador
Aspecto da Festa do Senhor do Bonfim, na Bahia, 2015. O ritual, que se repete todos os anos desde
1754, reúne milhares de pessoas e acontece sempre na segunda quinta-feira posterior ao Dia de
Reis, no mês de janeiro.
A Sabinada
Na Bahia, era grande a insatisfação com a política centralizadora do governo
instalado no Rio de Janeiro. Os principais motivos dessa insatisfação eram: o envio
obrigatório de rendas para o Rio de Janeiro; a necessidade de fornecer soldados
para lutar no Sul; e a prolongada crise de abastecimento que provocava carestia e
fome.
Em Salvador, o jornal Novo Diário da Bahia, do médico e jornalista republicano
Francisco Sabino Vieira, o dr. Sabino, intelectual e conhecedor das ideias
iluministas, era o principal porta-voz da oposição ao governo. Em 7 de novembro
de 1837, reagindo à notícia de que os baianos seriam convocados para lutar contra
os farroupilhas, militares rebeldes tomaram o Forte de São Pedro, em Salvador,
obrigando o presidente da província a fugir da cidade. Tinha início a Sabinada,
revolta cujo nome se deve ao seu principal líder, Francisco Sabino.
Página 240
Os sabinos proclamaram a independência, mas logo declararam que ela duraria
somente até a maioridade de Dom Pedro II. A reação partiu do Recôncavo, onde os
proprietários locais organizaram um governo paralelo na cidade de Cachoeira. A
Bahia passou, então, a ter dois governos: um na cidade de Cachoeira, controlado
pelas forças legalistas, e outro em Salvador, comandado pelos sabinos.
Rugendas. Séc. XIX. Gravura. Coleção particular
Praça da Piedade, tendo ao fundo o Convento de Nossa Senhora da Piedade, em Salvador. Produzida
por J. M. Rugendas, a imagem mostra vários grupos da sociedade baiana da época da Sabinada.
Romulo Fialdini/ Tempo Composto
Em detalhe, acima, cadeirinha de arruar, usada para o transporte de pessoas. Em estilo rococó, com
assento de madeira, cabeceira de couro, almofada, essa cadeira encontra-se no Museu Paulista da
Universidade de São Paulo.
O governo central então decidiu agir: enviou forças que se juntaram às do
Recôncavo e cercaram Salvador por terra, enquanto a Marinha Imperial bloqueava
a cidade por mar. Diante do cerco a Salvador e da falta de alimentos, os rebeldes
convocaram os escravizados para lutar ao lado deles. Muitos, porém, não
atenderam a esse apelo, pois não viam a Sabinada como uma luta deles. De sua
parte, muitos proprietários, assustados com a possibilidade de perder seus
escravos, passaram a defender o governo central.
Com cerca de 4 mil homens, as forças legalistas invadiram a capital baiana e
promoveram um verdadeiro massacre. O tribunal que julgou os sabinos ficou
conhecido como “júri de sangue”, pois os condenou em massa. Francisco Sabino
Vieira foi expulso da Bahia com os outros líderes que sobreviveram ao massacre.
Dica! Comentário do escritor e jornalista Eduardo Bueno a respeito da Sabinada. [Duração: 2
minutos.] Acesse: <http://tub.im/t7sp9i>.
A Balaiada
Ocorrida nas terras do atual Maranhão e do Piauí, entre 1838 e 1841, a Balaiada
teve suas raízes na luta da população pobre contra a opressão, na luta dos políticos
provinciais por autonomia em relação ao Império, nos conflitos por hegemonia na
respectiva província e também nas dificuldades econômicas enfrentadas pelo
Nordeste no período regencial.
As principais dificuldades eram:
» o algodão, principal produto maranhense de exportação, vinha perdendo
mercado para o algodão do sul dos Estados Unidos. Na década de 1820, o algodão
maranhense representava 20,6% do total das exportações brasileiras; no decênio
seguinte, caiu para 10,8% desse total;
Página 241
»» o controle do comércio local pelos portugueses e do comércio exterior pelos
ingleses. Esse controle limitava a concorrência, mantinha os preços dos alimentos
elevados e prejudicava as manufaturas locais;
»» a sobrecarga dos escravizados. Cerca de metade da população era de
escravos, que tinham de fazer o serviço de muitas pessoas, pois a crise atingia o
bolso dos seus senhores e sobrava menos dinheiro para a reposição de mão de
obra. Com isso, multiplicavam-se as fugas, e os quilombos cresciam.
Quando o regente Araújo Lima foi eleito, os conservadores assumiram os
principais postos no Maranhão, inclusive o de presidente da província, passando a
usar o recrutamento forçado para enfraquecer os liberais, apelidados na região de
bem-te-vis.
Nesse contexto, um grupo armado chefiado pelo vaqueiro Raimundo Gomes
assaltou a cadeia da Vila do Manga e libertou vários companheiros que estavam
presos. A seguir, o grupo lançou um manifesto em que se declarava inimigo dos
portugueses e exigia a demissão do presidente da província.
Enquanto o grupo de Raimundo Gomes percorria o interior apoderando-se de
várias localidades, o movimento ganhava novos líderes, a exemplo do artesão
mestiço Manuel Francisco dos Anjos Ferreira, o Balaio, e o negro Cosme Bento das
Chagas, que liderava 3 mil quilombolas fugidos das fazendas maranhenses.
Fortalecidos, em meados de 1839, os balaios conquistaram Caxias, a segunda
maior cidade do Maranhão, e avançaram em direção ao Piauí, onde, com a ajuda da
população local, venceram tropas oficiais enviadas para combatê-los.
Balaio: cesto de palha ou de outro material.
Inicialmente, os políticos liberais incentivaram os balaios, ao mesmo tempo que
culpavam os conservadores pela “desordem”; esperavam, com isso, desalojá-los do
poder nas próximas eleições. Mas, quando viram que a capital maranhense seria
invadida pelos balaios, os liberais se juntaram aos conservadores para pedir
reforços ao governo central.
Este enviou para o Maranhão cerca de 8 mil homens sob o comando de Luís Alves
de Lima e Silva. A repressão ao movimento efetuou torturas, prisões e milhares de
execuções sem direito à defesa. Calcula-se que cerca de 11 mil balaios tenham
morrido em combate com as tropas imperiais. Quanto aos líderes, Manuel
Francisco dos Anjos morreu lutando, Raimundo Gomes foi expulso do Maranhão e
Cosme Bento das Chagas acabou preso e enforcado em praça pública para servir de
exemplo aos que ousassem desafiar as elites imperiais.
Dica! Reportagem sobre a importância histórica da Balaiada nos dias atuais. [Duração: 4
minutos.] Acesse: <http://tub.im/ygusg7>.
Cesar Diniz/Pulsar Imagens
Acima, no jardim do Memorial, vê-se a estátua do vaqueiro Raimundo Gomes. Repare que a obra
está protegida por uma cerca, provavelmente porque depredações de monumentos têm sido
comuns em todo o Brasil. Fotografia de 2014.
Moisés Saba/Fotoarena
Fachada do Memorial da Balaiada, em Caxias, no Maranhão.
Página 242
ATIVIDADES
ESCREVA NO CADERNO.
I. Retomando
1. (UFMG – 2013) Leia o trecho:
O sete de abril de 1831, mais do que o sete de setembro de 1822, representou a verdadeira
independência nacional, o início do governo do país por si mesmo, a Coroa agora representada
apenas pela figura quase simbólica de uma criança de cinco anos. O governo do país por si
mesmo [...] revelou-se difícil e conturbado. Rebeliões e revoltas pipocaram por todo o país,
algumas lideradas por grupos de elite, outras pela população tanto urbana como rural, outras
ainda por escravos.
CARVALHO, J. Murilo et al. Documentação política, 1808-1840. Brasiliana da Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro:
Fundação Biblioteca Nacional/Nova Fronteira, 2011. s/p.
a) Explique o sentido da frase considerando o seu contexto histórico: “a Coroa agora representada
apenas pela figura quase simbólica de uma criança de cinco anos”.
1. a) Em 1831, D. Pedro I abdicou do trono em favor de seu filho Pedro de Alcântara, que tinha apenas 5 anos de idade. Esse
momento representou a consolidação de um processo de rompimento com a Coroa portuguesa, uma vez que o Brasil passou
a ser governado por brasileiros.
b) Apresente dois fatores que contribuíram para as conturbações políticas e sociais que levaram às
rebeliões e às revoltas do período.
1. b) Entre os fatores que contribuíram para as conturbações políticas e sociais do período podemos citar a luta de indígenas,
mestiços, negros e brancos pobres por liberdade e melhores condições de vida e o desejo de as elites das províncias terem
maior autonomia diante do poder imperial.
2. (UFV-MG) Observe a imagem abaixo:
Brito e Braga. Séc. XIX. Coleção particular
Brito e Braga, Batalhão de Fuzileiros da Guarda Nacional (1840-1845).Disponível em:
http://www.multirio.rj.gov.br/historia. Acesso em: 30 jul. 2009.
Com relação à Guarda Nacional, criada durante o Império, é CORRETO afirmar que:
a) funcionava como única força armada que podia defender os interesses dos escravistas e coibir a
fuga dos escravos.
b) objetivava o controle da Corte e da burocracia imperial, alvos frequentes de manifestações
populares de descontentamento.
c) tinha por finalidade a garantia da segurança e da ordem, defendendo a Constituição, a obediência
às leis e a integridade do Império.
d) atuava na defesa das fronteiras externas brasileiras, impedindo a expansão dos países platinos
em direção ao território brasileiro.
2. Resposta: c.
3. (UFRGS-RS – 2014) Durante a regência de Araújo Lima (1837-1840), foram criadas algumas
instituições político-culturais, com o objetivo de produzir uma história da nação, que conferisse aos
brasileiros um sentimento de pertencimento e de nacionalidade, e assim de auxiliar na
centralização e fortalecimento do Estado.
Uma dessas instituições foi
a) a Guarda Nacional.
b) o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.
c) a Academia Imperial de Belas Artes.
d) a Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional.
e) a Academia Brasileira de Letras.
3. Resposta: b.
4. (UFC-CE) O período regencial brasileiro (1831- 1840) foi marcado por rebeliões e revoltas, em
várias províncias, que expressavam as diferentes lutas políticas e sociais. Em relação à composição
dos grupos que participaram da Cabanagem (1835-1840), assinale a alternativa correta.
a) As elites agrárias atuaram no movimento, defendendo uma partilha de terras que incluísse os
camponeses.
b) Os grupos letrados envolvidos no conflito lutavam em favor da construção de um império único,
envolvendo Brasil e Portugal.
Página 243
c) Os estrangeiros foram os condutores desses movimentos e expressavam o desagravo em relação
ao poder comercial controlado pelos holandeses.
d) Os militares revoltosos lutaram contra as elites, pois eram a favor da abolição da escravatura.
e) Os elementos oriundos das camadas mais pobres tiveram papel de destaque na liderança do
movimento.
4. Resposta: e.
5. (Unesp-SP) A Revolução Farroupilha foi um dos movimentos armados contrários ao poder
central no Período Regencial brasileiro (1831-1840). O movimento dos Farrapos teve algumas
particularidades, quando comparado aos demais.
Em nome do povo do Rio Grande, depus o governador Braga e entreguei o governo ao seu
substituto legal Marciano Ribeiro. E em nome do Rio Grande do Sul eu lhe digo que nesta
província extrema [...] não toleramos imposições humilhantes, nem insultos de qualquer
espécie. [...] O Rio Grande é a sentinela do Brasil, que olha vigilante para o Rio da Prata. Merece,
pois, maior consideração e respeito. Não pode e nem deve ser oprimido pelo despotismo.
Exigimos que o governo imperial nos dê um governador de nossa confiança, que olhe pelos
nossos interesses, pelo nosso progresso, pela nossa dignidade, ou nos separaremos do centro e
com a espada na mão saberemos morrer com honra, ou viver com liberdade.
Bento Gonçalves [carta ao Regente Feijó, setembro de 1835] apud Sandra Jatahy Pesavento. A Revolução Farroupilha,
1986.
Entre os motivos da Revolução Farroupilha, podemos citar:
a) o desejo rio-grandense de maior autonomia política e econômica da província frente ao poder
imperial, sediado no Rio de Janeiro.
b) a incorporação, ao território brasileiro, da Província Cisplatina, que passou a concorrer com os
gaúchos pelo controle do mercado interno do charque.
c) a dificuldade de controle e vigilância da fronteira sul do império, que representava constante
ameaça de invasão espanhola e platina.
d) a proteção do charque rio-grandense pela Corte, evitando a concorrência do charque estrangeiro
e garantindo os baixos preços dos produtos locais.
e) a destruição das lavouras gaúchas pelas guerras de independência na região do Prata e a
decorrente redução da produção agrícola no Sul do Brasil.
5. Resposta: a.
6. A historiadora Claudete Dias Soares escreveu um importante livro demonstrando a participação
do Piauí na Balaiada. Os versos a seguir foram retirados desse livro. O que esses versos sugerem?
O balaio entrou!
O balaio entrou!
Cadê o branco?
Não há mais branco!
Não há mais branco!
SOARES, Claudete Maria Miranda Dias. Balaios e bem-te-vis: a guerrilha sertaneja. Teresina: Instituto Dom Barreto,
2002. p. 117.
6. Os versos sugerem que a luta dos balaios se voltou também contra o escravismo e o racismo presentes na sociedade
maranhense daquela época. [Como observou uma historiadora: “Em seu momento de maior radicalização, os balaios vão
priorizar a reivindicação de direitos iguais para o ‘povo de cor’ (tanto ‘cabras’ quanto ‘caboclos’) [...]” (MATTOS, Hebe Maria.
Escravidão e cidadania no Brasil monárquico. p. 28).]
II. Integrando com Língua Portuguesa
O Romantismo é um estilo de arte que fez sua estreia no Brasil em 1836 com a obra Suspiros
poéticos e saudades, do carioca Gonçalves de Magalhães. Na época, o Brasil vivia sob a regência do
padre Feijó; e no campo da cultura buscava afirmar sua independência. Veja o que se diz sobre o
início do Romantismo no Brasil:
Página 244
No Brasil, o início do Romantismo caracteriza-se principalmente pelo tom ufanista em relação
à nação brasileira, venerada em sua natureza exuberante e representada por heróis e heroínas
indígenas. Em verso e prosa, louvaram-se as façanhas de índios idealizados pelos escritores,
que foram tratados na literatura como protagonistas dos primeiros momentos de nossa
história.
Esse viés [...] caracterizou os poemas da primeira fase do Romantismo e se manifestou também
em inúmeros romances indianistas publicados ao longo do século XIX. Assim, a literatura
romântica ajudou a determinar e difundir os símbolos representativos da jovem nação
brasileira, que recentemente havia conseguido sua liberdade política da metrópole
portuguesa, em 1822.
TORRALVO, Izeti Fragata; MINCHILLO, Carlos Cortez. Linguagem em movimento. São Paulo: FTD, 2010. p. 32.
Indianismo: no Romantismo brasileiro, a valorização do índio como um elemento diferenciador da
identidade nacional.
A “Canção do exílio”, do poeta maranhense Gonçalves Dias, tornou-se símbolo da nacionalidade.
Leia-a com atenção.
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá.
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar – sozinho, à noite –
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu’inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
DIAS, Gonçalves. Poesia completa e prosa escolhida. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1959. p. 103.
a) Qual o tema da “Canção do exílio”?
PROFESSOR, VER MANUAL.
b) Trechos da “Canção do exílio” foram incorporados ao Hino Nacional. Você saberia dizer quais?
c) Segundo o texto citado, “o início do Romantismo caracteriza-se principalmente pelo tom
ufanista”.
c1) Procure no dicionário o significado do substantivo ufanismo e transcreva-o no seu
caderno.
c2) Encontre um ou mais exemplos desse sentimento na “Canção do exílio”.
d) Em dupla: A “Canção do exílio”, de Gonçalves Dias, é o poema romântico mais citado e
parodiado (reescrito com intenção satírica) da literatura brasileira. Pesquisem e transcrevam um
exemplo dessa afirmação.
Página 245
Capítulo 13 Modernização, mão de
obra e guerra no Segundo
Reinado
Cesar Diniz/Pulsar Imagens
Vista externa da casa-grande da Fazenda Boa Vista, 2011. Na fotografia é possível observar seus
vários cômodos.
Cesar Diniz/Pulsar Imagens
Vista do interior da casa-grande da Fazenda Boa Vista, em Bananal, cidade do Vale do Paraíba
paulista, 2011.
Professor: essa e outras centenas de fazendas do Vale do Paraíba são documentos materiais do enorme poder que os
cafeicultores da região tiveram nos tempos do Império. Em geral, o capital empregado na construção ou reconstrução dessas
casas era originário da venda de café para o exterior, café este produzido e transportado por africanos escravizados trazidos
aos milhares pelo tráfico atlântico. Sugerimos comentar que a Fazenda Boa Vista é um importante ponto turístico do Vale do
Paraíba na atualidade.
A Fazenda Boa Vista está localizada em Bananal, cidade do Vale do Paraíba
paulista, e é hoje um hotel que recebe pessoas de várias partes do Brasil e do
mundo. Por volta de 1840, quando D. Pedro II começou a reinar, o café era a
principal riqueza dessas terras.
»» O que as imagens deste monumento do Brasil-Império
mostram e o que escondem?
»» Com que recursos esta fazenda foi construída ou reconstruída?
»» Quem trabalhava nas terras dessa fazenda por volta de 1840?
Página 246
Félix Émile Taunay. 1838. Óleo sobre tela. Museu Imperial
Imagem de Dom Pedro com 12 anos de idade; repare que, antes mesmo de assumir o trono, ele é
mostrado como comandante em chefe das Forças Armadas. Dois anos depois, com 15 anos
incompletos, ele assumiu o poder.
O golpe da maioridade
Interessados em derrubar os conservadores e manter privilégios ameaçados por
rebeliões, como a Balaiada e a Farroupilha, os liberais passaram a divulgar que só
um imperador poderia “salvar a nação” da desordem. Como Pedro de Alcântara
contava com apenas 14 anos, eles lançaram uma campanha em jornais e revistas
em prol da antecipação da maioridade, que logo ganhou o apoio de boa parte da
população.
Em pouco tempo, as manobras dos liberais e a força da propaganda surtiram
efeito.
Em 23 de julho de 1840, a Assembleia votou a maioridade de Dom Pedro de
Alcântara e o aclamou imperador do Brasil. Com o Golpe da Maioridade e a
ascensão dos liberais ao poder, iniciava-se o reinado de Dom Pedro II, que se
estendeu por quase meio século (1840-1889).
Dica! Documentário sobre a vida de D. Pedro II. [Duração: 30 minutos]. Acesse:
<http://tub.im/64rtcj>.
Eleições: violência e fraude
No poder, os liberais praticaram todo tipo de fraude para garantir a vitória nas
eleições para a Câmara dos Deputados: pagaram valentões para surrar eleitores,
roubaram urnas e qualificaram crianças, escravizados e defuntos como eleitores.
Com isso, venceram as eleições que, por incluírem a violência, ficaram conhecidas
como eleições do cacete.
Derrotados, os conservadores pressionaram o imperador para que anulasse as
eleições. Ele o fez e, a seguir, inaugurou o rodízio entre os partidos, nomeando, em
1841, um novo ministério de perfil conservador que deu continuidade à
centralização política, aumentando a força do Estado sobre aJustiça e a polícia nas
províncias.
Justiça: pela Reforma do Código do Processo Criminal, aprovada em 3 de dezembro de 1841, o ministro da
Justiça – como representante do imperador – passava a ser responsável pela nomeação dos chefes de polícia,
dos comandantes da Guarda Nacional e de quase todos os magistrados.
DIALOGANDO
Observe a charge de Angelo Agostini.
Angelo Agostini. Séc. XIX. Coleção particular
a) Quem seriam os “cascudos” mostrados na charge?
a) Os cascudos eram os membros do Partido Conservador.
b) O que a charge ironiza?
b) A charge ironiza o uso da violência nas disputas entre liberais e conservadores. Professor: comentar que a violência e a
fraude foram usadas tanto pelos liberais quanto pelos conservadores.
Página 247
As revoltas liberais de 1842
Alijados do poder, os liberais pegaram em armas nas chamadas Revoltas Liberais
de 1842. Em São Paulo, foram liderados por Feijó; em Minas, por Teófilo Otoni; e,
no Vale do Paraíba fluminense, por Joaquim José de Souza Breves, cafeicultor e
proprietário de 30 fazendas e 6 mil escravizados. Sem conseguir ampliar suas
bases de apoio, a revolta foi derrotada pelas forças legalistas, comandadas por
Duque de Caxias. Seus principais líderes foram deportados para Portugal. Dois
anos depois, no entanto, decretou-se a anistia geral.
Dica! Reportagem sobre o município de Silveiras (SP), palco de algumas revoltas liberais de 1842.
[Duração: 2 minutos]. Acesse: <http://tub.im/xq3xmr>.
A Rebelião Praieira
Em Pernambuco, durante boa parte da história do Império, o poder esteve nas
mãos das famílias tradicionais. Duas dessas famílias, os Rego-Barros e os
Cavalcanti, unidas por laços de parentesco, governaram a província de 1837 a
1844. Durante esse período, usaram o poder público em favor de seus interesses,
além de colocar seus familiares nos principais cargos públicos, gerando assim
grande descontentamento popular.
Cavalcanti: eram donos de um terço dos engenhos pernambucanos. Havia pessoas dessa família tanto no
Partido Liberal quanto no Conservador que, em Pernambuco, tinha seus membros apelidados de gabiru (rato
grande).
Outro fator de insatisfação entre os pernambucanos era o controle que os
portugueses exerciam sobre o comércio varejista: em 1844, das 77 casas
comerciais, apenas 23 eram de brasileiros. Além disso, os comerciantes
portugueses empregavam quase sempre os seus patrícios, o que também era causa
de muitos ressentimentos.
Com a disposição de arrebatar o poder das mãos das famílias tradicionais, um
grupo de liberais formou um novo partido político, o Partido da Praia, assim
chamado porque a sede de seu principal jornal, o Diário Novo, ficava na Rua da
Francisco Henrique Carls. 1873. Gravura. Coleção particular
Esta gravura do século XIX é um indício de que a sociedade pernambucana dos tempos da
Revolução Praieira era altamente hierarquizada. Ao centro, vemos escravizados trabalhando
descalços. Na calçada da esquerda, um bacharel com fraque e cartola; na da direita, um homem, que
parece ser um fazendeiro, conversando com uma senhora da elite.
Página 248
Praia, no Recife. Outros impressos, como o jornal O Repúblico, de Antônio Borges
da Fonseca, e a revista O Progresso, de Antônio Pedro de Figueiredo, também
clamavam por mudanças sociais.
Em 1845, ao ser nomeado presidente da província, o liberal Antônio Chichorro da
Gama substituiu 600 autoridades locais, ofereceu cargos aos praieiros e ampliou as
bases de seu poder. Anos depois, os conservadores ascenderam ao poder e
partiram para o revide.
Em 1848, quando 40 proprietários rurais, ligados aos praieiros, foram demitidos e
recusaram-se a entregar os cargos na polícia e as armas, teve início a Revolução
Praieira. O motivo imediato da Praieira, portanto, foi a disputa de cargos públicos
na província de Pernambuco: a luta pelo poder local. A luta começou em Olinda e
se estendeu à Paraíba, reunindo trabalhadores temporários, pequenos lavradores,
rendeiros e desempregados sob o comando dos senhores de engenho.
A Praieira foi influenciada também pela Revolução de fevereiro de 1848, na França,
onde vicejavam ideias liberais e socialistas. Algumas dessas ideias estão presentes
no Manifesto ao Mundo, de 1º de janeiro de 1849, redigido pelo jornalista Borges
da Fonseca durante a luta. No manifesto ele expôs as exigências mais radicais feitas
durante a revolta:
»» o voto livre e universal do povo brasileiro;
»» a plena liberdade de comunicar os pensamentos por meio da imprensa;
»» o trabalho como garantia de vida para o cidadão brasileiro;
»» o comércio a retalho só para cidadãos brasileiros;
»» a inteira e efetiva independência dos poderes constituídos;
»» a extinção do Poder Moderador.
No campo militar, os praieiros comandados pelo capitão Pedro Ivo, por Felix de
Brito Melo ou pelo crioulo Elias, líderes populares da revolta, conseguiram
algumas vitórias. Ao tentarem conquistar Recife, no entanto, foram derrotados
pelas tropas imperiais. Os principais líderes foram condenados à prisão perpétua,
mas acabaram anistiados em 1852. Com a Praieira encerrou-se, por assim dizer, o
ciclo de revoltas ocorridas no Império entre 1831 e 1850, e teve início um período
marcado por progresso econômico e certa estabilidade política.
O poder do monarca no Império Brasileiro
A constituição do Império, outorgada em 1824, possibilitava ao imperador a
concentração de uma enorme soma de poder em suas mãos. O imperador podia
dissolver a Câmara e convocar eleições para renová-la; nomear presidentes de
província; convocar as Forças Armadas; aprovar ou vetar as decisões da Câmara e
do Senado, e perdoar sentenças dadas pelo poder Judiciário.
Era o imperador também quem indicava o presidente do Conselho de Ministros.
Este, por sua vez, escolhia o ministério (ou gabinete) e o apresentava à Câmara
dos Deputados. Se o ministério fosse aprovado pela Câmara, passava a exercer o
Poder Executivo. Se fosse reprovado, a decisão caberia a Dom Pedro II, que,
geralmente, dissolvia a Câmara e marcava novas eleições, conseguindo, assim,
impor sua vontade. Por isso, o historiador José Murilo de Carvalho caracterizou a
política imperial como um teatro de sombras. Tanto os políticos quanto as
instituições estavam submetidos ao imperador.
Presidente do Conselho de Ministros: cargo equivalente ao de primeiro-ministro que foi criado por D.
Pedro II em 1847.
Dica! Documentário sobre D. Pedro II. [Duração: 30 minutos]. Acesse: <http://tub.im/89nojh>.
Página 249
Angelo Agostini. 1886. Desenho. Coleção particular
Imagem de Dom Pedro II distribuindo favores a políticos: prática habitual no Império brasileiro.
Os partidos do Império: diferenças e semelhanças
Os dois grandes partidos do reinado de Dom Pedro II – o Liberal e o Conservador –
representavam as elites do Império e tinham, entre si, muitos pontos em comum, a
saber: o interesse na manutenção da ordem, do escravismo, da unidade territorial
e das autoridades constituídas. Tanto uns quanto outros tinham interesse na
estabilidade do regime, que mantinha seus privilégios e excluía a maioria da vida
política nacional. Isso ajuda a explicar por que o político pernambucano Holanda
Cavalcanti afirmou: “Nada tão parecido com um saquarema quanto um luzia no
poder”. Era comum também os políticos mudarem de um partido para outro.
Saquarema: apelido dado aos conservadores, em função do município fluminense de Saquarema, no qual os
líderes do partido tinham terras e escravizados.
Luzia: apelido dado aos liberais por ter sido Santa Luzia (MG) o lugar em que eles sofreram sua maior
derrota, em 1842.
Havia também algumas diferenças entre eles: os liberais eram favoráveis à
descentralização e à maior autonomia das províncias. Já os conservadores
defendiam a centralização política como condição para impor a ordem. No entanto,
as semelhanças entre eles eram maiores que as diferenças. Prova disso é que,
durante o Segundo Reinado, liberais e conservadores chegaram a governar juntos,
compondo um mesmo ministério: o Ministério de Conciliação (1853-1857). Esse
jogo de alternâncias e alianças contribuiu para a estabilidade e a longevidade do
Império.
Economia do Segundo Reinado
A partir de 1834 – quando superou o açúcar como principal produto de exportação
brasileiro –, o café uniu o centro político ao centro econômico, contribuindo, assim,
para a consolidação do Estado imperial.
O café assume a liderança
Introduzido no Brasil via Belém, no Pará, por volta de 1727, o cafeeiro nos
primeiros tempos era considerado planta de quintal e servia apenas ao consumo
doméstico. No final do século XVIII, os cafezais ocuparam as encostas próximas ao
Rio de Janeiro e, em seguida, avançaram pelas terras do Vale do Paraíba
fluminense e paulista, o berço da cafeicultura comercial brasileira.
Dica! Documentário sobre os imigrantes nas plantações de café no norte do Paraná. [Duração
total: 19 minutos]. Dividido em duas partes. Para a primeira parte, acesse:
<http://tub.im/wb6ipr>.
Página 250
Na década de 1820, o café tornou-se o terceiro produto da pauta das exportações
brasileiras (18,4%), só perdendo para o açúcar (30,1%) e para o algodão (20,6%).
Na década de 1830, passou a ser o principal produto brasileiro de exportação
(43%) e, na segunda metade do século XIX, chegou a responder por mais de 60%
das exportações brasileiras.
Thomas Crane. 1882. Desenho. Coleção particular. Foto: Culture Club/Getty Images
Desenho de 1882 mostrando uma família inglesa, em férias, tomando café ao ar livre em um parque
de Paris, na França; note que o garçom serve a família que, pelos trajes, parece ser rica.
A expansão da cafeicultura no Vale do Paraíba pode ser explicada pelos seguintes
fatores:
»» abundância de terra e mão de obra escravizada: a terra foi concedida por D.
João VI aos cafeicultores em forma de sesmarias e o trabalho cabia aos milhares de
africanos escravizados trazidos pelo tráfico atlântico;
»» mercado externo em expansão: o hábito de beber café tornou-se moda na
Europa e nos Estados Unidos, o que gerou um aumento da demanda internacional
do produto;
»» o cafeeiro podia durar 30 anos ou mais, enquanto a cana tinha de ser
replantada a cada três anos;
»» o café se deteriorava menos do que a cana durante o transporte.
Da década de 1830 até a de 1880, o café produzido no Vale do Paraíba fluminense e
paulista tornou-se a principal riqueza do Império. Daí a expressão muito usada na
época: “O Brasil é o Vale”. Enriquecidos, os cafeicultores do Vale, conhecidos como
“barões do café”, foram a principal base de sustentação política do Império. Nas
fazendas, a mão de obra predominante foi a de africanos escravizados e seus
descendentes. Observe a imagem:
Marc Ferrez /Coleção Gilberto Ferrez /Acervo Instituto Moreira Salles
A imagem, de cerca de 1885, mostra escravizados com peneiras e outros instrumentos de trabalho
saindo para a colheita de café em fazenda do Vale do Paraíba.
Página 251
O Vale do Paraíba foi próspero enquanto produziu café. Em pouco tempo, o
desmatamento e a erosão (desgaste da terra pela ação da água das chuvas e outros
agentes) foram esgotando o solo. Nessa região, os arbustos de café eram plantados
em terrenos altos e muito inclinados. Sem a proteção das árvores na época das
chuvas, a enxurrada acabava arrastando a camada fértil do solo. Conforme o solo ia
se esgotando, os cafezais seguiam em busca de terras férteis. Partiam, deixando
para trás “cidades mortas”, como escreveu Monteiro Lobato.
Aos poucos, os cafezais foram deixando o Vale do Paraíba e ocupando o Oeste
Paulista, onde o café encontrou a “terra roxa”, solo fértil e ideal para o seu
crescimento. Em 1870, a cidade de Campinas, em São Paulo, já produzia mais café
do que a cidade de Vassouras, líder do Vale do Paraíba, e pelo porto da cidade de
Santos, também em São Paulo, já se exportava mais café do que pelo porto do Rio
de Janeiro. Em alguns anos, as ondas verdes de café já cobriam o trecho que vai de
Campinas a Ribeirão Preto. 1 e 2
1. Dica! Documentário abordando a importância do café na história de São Paulo. [Duração: 28
minutos]. Acesse: <http://tub.im/3ti5jy>.
2. Dica! Documentário que aborda o impacto da produção do café na São Paulo do século XIX.
[Duração: 27 minutos]. Acesse: <http://tub.im/kqfwuc>.
A expansão cafeeira (séculos XIX e XX)
Allmaps
Fonte: RODRIGUES, João Antonio. Atlas para Estudos Sociais. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1977. p. 26.
Acompanhe a expansão das fazendas de café durante os séculos XIX e XX. Em 1819, o Nordeste
concentrava 51,2% da população escravizada do país; em 1870, a maioria dos escravizados (quase
60%) trabalhava no Sudeste.
Página 252
Outros importantes produtos brasileiros de exportação no século XIX, além do café,
foram o açúcar, o algodão, couros, peles e a borracha.
Açúcar, algodão e borracha
O açúcar ocupou o segundo lugar na pauta das exportações brasileiras durante
boa parte do século XIX (entre 1861-1870 ele foi ultrapassado pelo algodão). Na
época, o açúcar brasileiro passou a sofrer a concorrência do açúcar extraído da
beterraba, produzido na Europa, e também do açúcar de cana, fabricado nas ilhas
do Caribe, especialmente em Cuba.
Desde os tempos coloniais, o algodão era cultivado sobretudo no Maranhão, em
Pernambuco, em Alagoas e na Paraíba. No século XIX, a guerra civil estadunidense
(1861-1865) desorganizou a produção algodoeira do sul dos Estados Unidos e
possibilitou uma rápida ascensão do algodão brasileiro que, então, passou ao
segundo lugar nas exportações brasileiras.
Produzida na Amazônia e vendida para o exterior, a borracha servia,
principalmente, de matéria-prima na fabricação de pneus para a nascente indústria
automobilística. Como se pode observar na tabela a seguir, o boom da borracha
começou na penúltima década do século XIX.
Dica! Reportagem sobre o apogeu e a queda da produção de borracha na Amazônia. [Duração: 21
minutos]. Acesse: <http://tub.im/o3sgid>.
PRINCIPAIS PRODUTOS DE EXPORTAÇÕES (1820-1890) (PORCENTAGEM SOBRE O
VALOR DA EXPORTAÇÃO)
Produtos 1821/30 1831/40 1841/50 1851/60 1861/70 1871/80 1881/90
Café 18,4 43,8 41,4 48,8 45,5 56,6 61,5
Açúcar 30,1 24,0 26,7 21,2 12,3 11,8 9,9
Cacau 0,5 0,6 1,0 1,0 0,9 1,2 1,6
Fumo 2,5 1,9 1,8 2,6 3,0 3,4 2,7
Algodão 20,6 10,8 7,5 6,2 18,3 9,5 4,2
Borracha 0,1 0,3 0,4 2,3 3,1 5,5 8,0
Couros e 13,6 7,9 8,5 7,2 6,0 5,6 3,2
peles
Total 85,8 89,3 87,3 89,3 89,1 93,6 91,1
Fonte de pesquisa: FAUSTO, Boris. História do Brasil. 6. ed. São Paulo: Edusp, 1998. p. 191.
Modernização no Império
Um dos fatores de modernização do Império na segunda metade do século XIX foi a
construção de uma malha ferroviária que agilizou o transporte de mercadorias
brasileiras até os portos do litoral. Com apenas 14 km de extensão, a primeira
ferrovia foi uma iniciativa do empresário brasileiro Irineu Evangelista de Souza, o
Barão de Mauá, em 1854, e ligava a baía de Guanabara à Serra de Petrópolis, no Rio
de Janeiro. No Nordeste, a necessidade de escoamento da produção agrícola,
sobretudo a de açúcar, estimulou um empreendimento