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Published by sara.acasio, 2017-09-11 12:09:44

O Tutor

O Tutor

Não era por onde ela e Ramiel tinham saído do banho turco ontem à
noite.
—Obrigado. Sim, eu gostaria de tomar um banho, mas me aconselharam que
não me banhe sozinha. Pode por favor, enviar Lucy para que me acompanhe?
—O que lhe espera é um banho inglês, senhora Petre. Não necessita de Lucy.
Eu fui designado para assisti-la.

Elizabeth ficou rígida, enquanto lutava contra uma onda de calor.
—Asseguro-lhe que estou acostumada a me banhar só. Por isso não
precisa me ajudar.
—São as instruções do Ibn.

Abriu os olhos com incredulidade. Não era possível. Aferrou a colcha
mais forte sobre seus seios.
— Para observar como me banho?
—Ele me disse que devo cuidá-la. – Ele repetiu sem emoção.
—Você está tentando me intimidar. - Decidiu Elizabeth, com sagacidade. -
Não me quer nesta casa.

Os olhos negros de Muhamed brilharam como único sinal de vida
naquele inexpressivo rosto.
—Não.

A condessa havia dito que Muhamed tinha cuidado de Ramiel na
Arábia como se tivesse sido o filho que nunca pôde ter. Elizabeth tampouco
apreciaria que uma mulher chantageasse um de seus filhos.
—Não farei mal a Lorde Safyre, Muhamed. Nunca quis lhe fazer mal.
—Na Arábia você seria lapidada. O Ibn merece algo melhor que você.

A vergonha se tornou fúria viva. Não toleraria que a julgassem. Nem
lhe permitiria que menosprezasse a beleza que tinha compartilhado com
Ramiel.
—Isto não é a Arábia. Meu pai ameaçou me matar e meu marido de me
enviar a um manicômio e ontem um dos dois tentou me asfixiar com gás, mas
não conseguiu. Depois de tudo isso, não será você a me intimidar. Além
disso, é Lorde Safyre quem deve decidir o que merece ou não merece. Se
deseja me observar enquanto me banho, então faça-o.

Elizabeth se moveu até o extremo da cama, agarrando ainda a colcha
sobre seus seios. Tirou as pernas de debaixo do lençol de seda e por cima do
beirada do colchão. Seus pés nus penduravam sobre o tapete Oriental. Os
olhos cor avelã se encontraram com os olhos negros.

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Era Muhamed o que devia escolher agora. Elizabeth só esperou que ele
tivesse tão poucas vontades de ver seu corpo, como ela de mostrá-lo, mas
fosse qual fosse o resultado daquela confrontação não tornaria atrás.

Respirando fundo, Elizabeth se deslizou da cama, arrastando com ela o
lençol de seda e a colcha de cetim. Com outro suspiro ainda mais profundo,
deixou cair à colcha. Muhamed se voltou com um redemoinho de algodão
branco.
—Não saia de casa sem que eu a acompanhe ou o Ibn. Essas são suas
instruções. Lucy estará aqui exatamente dentro de vinte minutos para levá-la
a tomar o café da manhã.

A porta do dormitório se abriu e se fechou com o mesmo silêncio. O ar
frio envolveu o corpo nu de Elizabeth. O que aconteceria se o criado não se
retirasse? O que aconteceria se agora estivesse parado e contemplando sua
nudez?

No que se estava convertendo? Com os joelhos tremendo, caminhou
lentamente até a porta aonde a esperava um banho inglês. Um vapor quente e
aromático enchia o quarto coberto de mosaicos. A grande banheira de
porcelana, situada dentro de um marco de mogno, estava cheia de água e...
Flor-de-laranjeira. Uma emoção aguda penetrou em seu peito. Ramiel tinha
recordado que ela não podia usar perfume e tinha colocado flores perfumadas
em seu lugar. Para serem trituradas sob seus seios e entre suas coxas.

Uma toalha estava pendurava a um lado da banheira. Uma variedade de
sabonetes e xampus estavam a seu dispor.

Meteu-se na banheira e com cautela se inundou. A água estava muito
quente. O encarregado de enchê-la devia havê-lo feito com água fervendo
para deixá-la esfriar naturalmente e que se mantivera morna durante mais
tempo. A tática tinha funcionado. Elizabeth demorou vários segundos a se
adaptar ao calor.

Ensaboou um pano e o passou pelos seios com cuidado. E recordou as
mãos de Ramiel ensaboando-os. Depois de que ela o havia montado como
um corcel, logo a tinha levado a seu dormitório e mostrado uma caixa de
preservativos, estampada com o retrato da Rainha Vitória. Tinha sido
extranhamente reconfortante pensar que a rainha sem se dar conta, tornava
respeitável aqueles mesmos atos que a senhora Josephine Butler, da
Associação Nacional de Damas, havia menosprezado. Se realmente
permitirem que os homens pequem sem ter que sofrer por isso, só nos
oporemos a eles ainda mais.

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A carne entre suas pernas estava quase tão quente como a água do
banho. Deixou o pano de um lado e esfregou as pétalas sobre sua pele, sob
seus seios, seus braços. Atrevendo-se a fazer o proibido, querendo saber as
mudanças que Ramiel tinha realizado dentro e fora de seu corpo, ajoelhou e
tocou a delicada carne que ele tinha estirado, acariciado, beijado e sugado e
logo estirado ainda mais. Sentia-se dolorida, o orifício aberto, e dentro... Um
golpe suave ressoou dentro do banho.
— Senhora Petre?

Elizabeth tirou velozmente a mão de seu corpo, com o coração pulsando
com força. — Sim?
—Sou Lucy, senhora. Trouxe-lhe sua roupa. Quer que entre para ajudá-la?
—Obrigado, não é necessário. Estou terminando. Coloque a roupa sobre a
cama, por favor. Em seguida saia.
—Muito bem, senhora.

Rapidamente, Elizabeth tirou as pétalas e ficou em pé dentro da água
com o rosto flamejando de calor. Estirou-se para pegar a toalha, secou-se
com rapidez e depois a envolveu ao redor de seu corpo. O cabelo úmido
formava um arbusto sobre seus ombros nus e suas costas.

Precisava se ocupar de seus dentes... Uma escova de dentes estava
colocada sobre o armário do lavabo. A seu lado havia uma lata de pó para
dentes. Escovou-os vigorosamente e os enxaguou. Temendo que a criada
entrasse no banheiro, fosse sob as ordens de Ibn ou de Muhamed, sentou-se
sobre o assento de madeira do vaso e fez suas necessidades. Um cilindro de
papel sobre a parede junto ao vaso não deixava dúvida a respeito de sua
função. A maioria dos lares ingleses ocultava este tipo de papel em caixas.

Fez uma pausa com sua mão sobre a porta. Sem dúvida todo o pessoal
sabia que o Sheik Bastardo e a senhora Petre, a esposa do ministro da
Economia e Fazenda eram amantes.

“Sem arrependimentos, Elizabeth”. – Censurou-se. Disposta, abriu a
porta do banheiro. Lucy estava em pé ao lado da cama com dossel. Havia
estirado os lençóis. Uma saia de lã e seda de cor azul real fazia jogo com um
sutiã e estavam estendidos sobre a colcha vermelha junto a diferentes objetos
de lingerie. Não pertenciam a Elizabeth.

Lucy sustentou um par de calções transparentes de seda com cós de
cetim azul e sorriu, como se fosse comum atender uma mulher casada na
antecâmara de seu amo. Sem dúvida era.
— Não são bonitos estes?

253

Seriamente eram. Elizabeth jamais tinha visto algo semelhante. Não
ocultariam... Absolutamente nada.
—São para a senhora.

Elizabeth não deveria se sentir ofendida de que Ramiel lhe emprestasse
a roupa de sua amante anterior. Mas assim era. —Prefiro minha própria
roupa, Lucy.
—Milord diz que deve usar estas, senhora. Não sei onde estão suas roupas.

O dormitório de Ramiel não tinha biombo para se vestir. Plenamente
consciente de seus seios inchados, Elizabeth levou os calções, uma regata
igualmente transparente e um par de meias de seda negras ao banheiro e
fechou a porta com força na cara de Lucy. Quando saiu, coberta embora não
tampada, encontrou Lucy sustentando o que parecia um avental com
franzidos.
—São anquinhas. Nunca vi nada igual. Aqui estão suas anáguas, senhora.

Elizabeth se meteu em duas anáguas finas e as prendeu com firmeza ao
redor de sua cintura. Lucy não parecia se surpreender de que não houvesse
espartilho. Sem querer renunciar às anquinhas com franzidos, atou-o sobre as
tiras das anáguas, logo colocou a saia pela cabeça. Quando terminou de vesti-
la, deteve observá-la.
—O azul real lhe sinta estupendamente, senhora. Vai muito bem com seu
cabelo vermelho. Não sou uma criada, mas posso penteá-lo e arrumar-lhe.

Elizabeth forçou um sorriso.
—Obrigado, Lucy.

Lucy prendeu-lhe o cabelo úmido com suas presilhas. Sem querer saber
quem as tinha recolhido ou a fofoca que tinham gerado, deslizou os pés nos
sapatos negros de verniz, também dele e seguiu Lucy para tomar o café da
manhã.

Ramiel estava sentado em frente a uma mesa redonda de carvalho, num
elegante salão com paredes de vidro por onde entrava o sol da meia manhã.
Sua cabeça dourada estava inclinada sobre um jornal. Tinha uma postura
muito inglêsa e entretanto nenhum inglês faria as coisas que ele havia feito na
noite anterior.
Cada carícia e cada palavra pronunciada entre eles, foi guardada em sua
memória. Ficou fria e logo quente, temendo atrair sua atenção sentindo-se
ridicularizada, temendo ainda mais que o tempo que tinham passado juntos
não tivesse sido mais que uma conquista fácil para ele. E ela tinha sido fácil.
Não tinha guardado nada para si.

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De repente Ramiel elevou a cabeça. Olhou-a fixamente durante longo

momento, como se ele, também, recordasse cada carícia, cada palavra. Um

sorriso lento iluminou seu rosto moreno.
—Sabab o kheer, Taliba.

Os raios de sol alagaram o corpo de Elizabeth.
—Sabab o kheer.

Deixando de um lado o jornal, Ramiel ficou em pé com elegância e

jogou para trás a cadeira de seda amarela que estava junto à sua.
—Na realidade, a resposta correta é sabah e-noor.
—Desculpe-me. Sabah e-noor, Lorde Safyre.

Ele inclinou a cabeça com aqueles olhos turquesas tão familiares.
—Sente-se intimidada.

O calor pulsou em seu corpo.
—Sim.
— Dói-te?

Ela elevou o queixo.
—Um pouco. Acredito que possivelmente teria sido pior se não tivesse sido
pelas borbulhas do champanhe.

Um calor que não tinha nada a ver com a luz faiscava no ar.
—Não me importaria um café da manhã de champanhe.
—E eu prefiro que me devolva minha roupa. - Respondeu ela,

imediatamente. - Não me agrada a idéia de usar o que desprezaram seus

amantes.
Ramiel ficou imóvel.

—Essa é sua roupa, Taliba. Foi feita por madame Tusseau.

Madame Tusseau era a costureira mais famosa de Londres. Vestia os
mais ricos aristocratas... E as cortesãs.
— Sério? Como sabia minhas medidas? — Perguntou.
—Levei-lhe o traje que vestia ontem.
—E ela casualmente tinha vestidos de meu talhe, já preparados. - Disse sem

expressão.
—Digamos que se apropriou da vestimenta de um par de suas clientes. Uma
cujo o seio era similar ao teu e outra cujos quadris o eram.
— Como se explica que madame Tusseau o tenha em tão alta estima que abra
seu estabelecimento em horas tempranas? —Elizabeth se envergonhou em
seu interior. Soava exatamente o que era. Uma mulher ciumenta e insegura,

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que tinha passado a flor da vida há algum tempo, mas que queria recuperá-la

para aquele homem.
—Minha mãe é seu cliente. - Disse Ramiel em voz baixa. - Eu também lhe
enviei clientes no passado. Jamais havia trazido uma mulher a minha casa,

Elizabeth. Não rebaixe nossa relação te comparando com minhas anteriores

amantes.
—Outros farão.
—Sim.

Elizabeth não queria estar preocupada com o que os outros pensariam.

Mas era difícil. Especialmente quando não entendia por que um homem a

desejava, enquanto outro queria matá-la.
—A lingerie é muito... Engenhosa. Escolheu-a você?

Um sorriso deslocou a dureza que se instalou na sua fisionomia de

Ramiel.
—Tudo o que veste, eu o escolhi. É uma mulher formosa e sensual,

Elizabeth. Merece roupa formosa e sensual. Por que não se senta aqui a meu

lado e me mostra sua lingerie?
A respiração dela se acelerou. Ninguém a tinha chamado de formosa,

jamais. Até sabendo que era mentira, ele a fazia sentir-se formosa. —Os

criados...
—Não nos incomodarão. Disse-lhes que nos serviremos sozinhos. —Ele

estendeu sua mão... Dedos longos e bronzeados que tinham penetrado seu

corpo e mostrado um lugar especial cuja existência ela jamais havia
conhecido. Ele tinha aberto aqueles dedos dentro dela e gasto sua essência
entre eles. – Venha até mim, Taliba.

Ela foi para ele... Só para que a ajudasse sentar enquanto ele
permanecia em pé.
— O que você gostaria de tomar no café da manhã? Ovos? Rins? Arenque

defumado? Torradas? Presunto? Cogumelos? Fruta?
—Um café da manhã com champanhe, por favor. - Disse afetada.

Uma gargalhada grave alagou o salão iluminado pelo sol.
—Primeiro deve comer alguma coisa.

Elizabeth voltou sua cabeça e fixou o olhar no centro de suas pernas, a

alguns poucos centímetros de sua face. Ela o tinha tomado em sua boca e o

tinha sugado. Ele tinha um sabor... Quente e salgado.
Jogou a cabeça atrás e o olhou nos olhos.

—Eu gostaria de língua, se tiver. E logo uma ameixa fresca e amadurecida.

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Os olhos de Ramiel brilharam com aprovação. Inclinando-se, segurou
seu queixo entre o dedo polegar e o indicador. Deu-lhe sua língua e ela
tomou gostosa, com o fôlego preso em sua garganta ante a simples
intimidade do beijo de um homem. Conhecia-o a menos de duas semanas e
entretanto estavam mais unidos que ela ao homem com o que estivera casada
durante dezesseis anos. Mordiscando, chupando e aspirando com delicadeza
como ele tinha ensinado, ela provou o gosto e a textura dele... Café doce,
espesso e terso calor. Quando ficou em pé, a parte dianteira de sua calça
cinza de lã estava alterada.
—Pagará por isso, Taliba.
— Como? —perguntou ela com a respiração entrecortada. - Como me fará
pagar?

A exigência que lhe tinha feito no dia anterior de querer saber
exatamente o quão profundo ele a tinha ocupado ressoava entre os dois.

Os olhos de Ramiel se franziram numa risada silenciosa.
—Não te direi até que descida, o que fazer especialmente contigo. Nos sirva
café enquanto a atendo, madame.

Presa no jogo... Não podia recordar ter tirado o sarro de outro adulto ou
que tirassem dela... Estendeu a mão para alcançar a jarra prateada de café
situada no meio da mesa. E cravou o olhar estupefato sobre o jornal que
Ramiel tinha deixado de um lado.

A esposa do ministro da Economia e Fazenda: A BEIRADA DA
MORTE, ocupava em letras maiúsculas a primeira página.

Elizabeth o segurou e agitada leu a história. Uma perda de gás... Uma
entre centenas... O Parlamento estuda maneiras de financiar a eletricidade...

Um prato com ovos mexidos, presunto e cogumelos grelhados deslizou
na frente a ela. Um pequeno recipiente de morangos com nata foi colocado a
seu lado.
—Foi Edward. – Ela murmurou. - Por que ficou em contato com os jornals?
—É uma mulher notável. —Sua voz era curiosamente desapaixonada. - Sua
ausência teria sido advertida. Ele necessitava de uma maneira de explicar seu
desaparecimento.
—E de rebater uma acusação de assassinato.
—Sim.

Mesmo naquilo, Edward procuraria obter o favor popular.
Com o gesto sombrio, dobrou o jornal.
—Quero visitar meus filhos. Têm que estarem seguros. Se preocuparão.

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—Iremos juntos.
—Não acredito que agora seja um bom momento para que o conheçam.

Ramiel se sentou a seu lado e lhe tirou o jornal das mãos.
—Dá-te vergonha que a vejam comigo.

Ela se ruborizou sentindo-se culpada.
—Isso é ridículo.
—Então sente vergonha por te deitar com o Sheik Bastardo.

Quando sua carne estava presa dentro da sua... Não.
—Devo explicar a Richard e a Phillip que deixei seu pai, Ramiel. Se vier
comigo, pensarão que desonrei a família somente para estar contigo.
—E é obvio, sabemos que isso não é verdade.

Havia amargura na voz de Ramiel. Seus olhos turquesas estavam
cheios de dor.

Elizabeth recordou a afirmação de sua mãe de que todos os homens são
egoístas em geral e que um homem como Lorde Safyrna particularmente não
permitiria que seus filhos, especialmente filhos que não eram deles,
interferissem em seus prazeres.
—Meus filhos devem estar em primeiro lugar.
—Não desejo não que abandone seus filhos, Elizabeth. Tudo o que quero é
que o tempo que passe comigo não esteja manchado pela vergonha ou o
arrependimento.

Vergonha. Arrependimento. Podia empregar muitas palavras para
descrever o que tinha acontecido entre eles essa noite, mas não seriam
aquelas.
—Três momentos de minha vida ficarão sempre em minha memória. O
nascimento de Richard, o nascimento de Phillip, e o que compartilhamos
ontem. Não estou arrependida, nem sinto vergonha. Mas agora devo procurar
meus filhos e espero que possa compreender. Desejo que possa conhecê-los
muito em breve... E que você goste dele. Mas não hoje.
— E quando chegará esse dia, Elizabeth?

Como reagiriam seus filhos ante um homem que não era nem oriental
nem ocidental? Como se sentiriam ao inteirar de que ela tinha jogado pela
amurada seu futuro por um bastardo que não tinha pretensões de ser
respeitável nem desejo de adquirir?
—Não sei.

258

—Queria se unir a um bastardo, Taliba. Isto é parte disso. Aceito, hoje.
Enquanto admita que tenho intenção de conhecê-los muito em breve. Não me
manterei alheio a sua vida.

Um estremecimento de temor percorreu sua coluna. De repente se deu
conta de que sabia muito pouco a respeito daquele homem que de repente
fazia exigências sobre sua vida.
—Richard e Phillip estão acostumados a que eu lhes leve alguma surpresa.
Importa-se se eu pedir a seu cozinheiro que me prepare uma cesta para eles?
—Perguntou impulsivamente, precisando escapar doao mal-estar que sentia.
Não queria ter medo, não de Ramiel, não do homem que lhe tinha mostrado
as maravilhas de ser mulher. Seus olhos turquesas eram insondáveis.
—Minha casa é sua casa. Pode tomar ou fazer o que desejar. Enquanto
recorde que alguém tentou te matar. Veio para mim para que te protegesse.
Não permitirei que se exponha ao perigo. Vai comer?

Olhou para baixo, para o círculo de óleo que rodeava o presunto sobre a
porcelana branca. Logo, olhou o suco vermelho brilhante das frutas que
sangrava sobre a nata. —Não.
—Então desçamos a cozinha e apresentarei a meu chef. Ele ficará encantado
de cozinhar para seus filhos.

O chef podia ser árabe, por seu cabelo e pele morena ou francês.
Elizabeth não pôde definir nem por seu acento nem por sua face. Usava
vestimenta européia, mas também Ramiel, a diferença de Muhamed, que não
era árabe de sangue. Nada era como devia ser, nem em casa de Ramiel nem
na de Edward.
—Étienne, você obedecerá às ordens da senhora Petre como faria com as
minhas. Ela tem dois filhos em Eton e os irá visitar hoje. Quer lhes levar uma
cesta de comida.
—Madame. —Os olhos escuros se iluminaram de prazer. - Será uma honra
preparar uma pequena surpresa para seus dois filhos. Ontem fiz uma
basboosa, uma torta feita com sêmola, banhada em calda de açúcar. Também
tenho baskaweet, bolachas que se derretem na boca. Ou se esperar,
cozinharei-lhe baklava e meu taify meu kunafa...

Elizabeth sorriu. Étienne era tudo o que Muhamed não era.
—Por favor, não se incomode. A torta e as bolachas são mais que suficiente.
Obrigado. Richard e Phillip estarão encantados.

Étienne se inclinou.
—É uma honra, madame. Lorde Safyre não faz justiça a minha confeitaria.

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—Se comesse tudo o que cozinha, não poderia passar por minhas próprias
portas. - Replicou simplesmente Ramiel.
— Do que outra maneira se pode honrar a um homem de meu talento? —
Perguntou Étienne com indignação fingida.

Elizabeth interveio solenemente:
—Asseguro-lhe, senhor, que meus dois filhos farão justiça a sua arte. Comem
como cavalos.

Étienne estudou o corpo de Elizabeth sob o sutiã e a saia azul.
—Talvez possamos pôr também um pouco mais de carne sobre seus ossos,
madame.

Os olhos de Ramiel seguiram os do chef.
Elizabeth se ruborizou.
—Esperemos que não.
—Não estamos acostumados a cozinhar para uma senhora na casa, talvez se
madame nos preparasse os menus...
Elizabeth se encontrou com o olhar de Ramiel. O que tinha contado a
seus criados sobre ela? Havia lhe dito que não podia lhe dar respeitabilidade.
Por que, então, saía de seu caminho para fazê-la sentir-se como em sua casa?
—Não estou aqui para transtornar sua cozinha, Étienne.
—Mas não a transtorna, madame. Você contribui com sua beleza, nossa
humilde morada de solteiros.
Ele conseguiu que Elizabeth esboçasse um sorriso reticente.
—Já veremos. Agora só desejo uma cesta de comida para meus filhos.
—Prepararei-lhe um piquenique que será uma obra de arte. Seus filhos
acreditarão que seus jovens paladares morreram e alcançaram o paraíso.
Ramiel estendeu uma mão para Elizabeth.
—Venha. Deixemos esta fantasia de diabo em sua cozinha.
Elizabeth subiu as estreitas escadas dos criados diante de Ramiel,
levantando a barra de sua saia para não pisá-la.
—Tem um pessoal interessante. Onde conseguiu Étienne?
—Liberei-o na Argélia.
Ela fixou o olhar em seus sapatos de verniz negro e o brilho
intermitente das meias de seda negra. Dela... E dele.
—Não é minha intenção causar moléstias a ti ou seus criados.
Mãos quentes e implacáveis, aferraram em sua cintura e a puxaram para
trás inclusive quando estava dando um passo para frente.

260

—Elizabeth, não me causa nenhuma moléstia. Nem me oponho a que visite

seus filhos. Se assim fosse, levaria-te para cima agora e veria o quanto te dói

aí abaixo.

Elizabeth se apoiou para trás contra o sólido calor de seu peito.
—Prefiro o champanhe ao preservativo.

Um fôlego quente queimou sua nuca.
— L'na!
—Diz isso freqüentemente. O que significa?
—Significa «maldita seja».
— Quais são seus planos especiais para mim?

As mãos obstinadas em sua cintura se apertaram.
—O kebachi.

Elizabeth aspirou o ar.
—Como os animais. - Sussurrou com seu corpo se contraindo.

Algo quente e úmido mediu seu pescoço... A língua de Ramiel.
—«Segundo o modo do carneiro». Te colocarei sobre suas mãos e joelhos e

te montarei de por trás. Nessa posição posso tocar facilmente seus seios e sua

vulva.
—Então é uma de suas posições favoritas.

Não era uma pergunta.

Dentes afiados mordiscaram sua nuca.
—É.

Não sentiria ciúmes das mulheres que tinham vindo antes dela. Nem se

preocuparia com as quais viriam depois.
—Estarei aguardando ansiosa por esse momento.
—Elizabeth. —Um fôlego de risada fez cócegas sua orelha. - Tome tempo

com seus filhos. Porque quando chegar em casa, eu demorarei meu tempo

contigo.

Ela expressou um temor que não sabia que existia.
— Estará me esperando?

Edward jamais a tinha esperado.
—Estarei te esperando, Taliba. E agora, eu, também, tenho coisas a atender.

Ocuparei-me de que uma carruagem te leve a estação. Quando tudo estiver

preparado, Muhamed virá te buscar. Ele te acompanhará.

Elizabeth ficou rígida. Se a seus filhos já ia ser difícil aceitar um

homem que era meio árabe, embora não o parecesse, como reagiriam ante um

homem que não era árabe mas parecia?

261

—Muhamed esperará fora. —Ramiel deu golpecitos em sua orelha com sua
língua. Uma chuva de faíscas quentes correu por suas costas. - Se não o levar
contigo, ele te seguirá.
—Não será necessário.
—Asseguro-te que é.

Ela não queria pensar na morte. O que acontecera ontem tinha sido
certamente um acontecimento que acontecia uma vez na vida. Edward não
voltaria a tentar lhe fazer mal. Não tinha tempo. Nem tampouco seu pai. A
política era uma amante muito exigente. Especialmente quando um dos dois
repartia o pouco tempo de que dispunha com uma amante de carne e osso.

Elizabeth pôs suas mãos sobre as de Ramiel com vacilação. Eram duras
e rugosas... Como seu corpo.

Tinha-lhe ofendido no café da manhã quando se negara a levá-lo a
visitar seus filhos.

Ofereceu-lhe o consolo que podia.
—Phillip acharia interessante Muhamed, acredito. E desfrutaria de sua
piscina.
— E Richard?
—Não estou segura. Richard parecia... Mudado quando o vi a última vez.
— Como?
—Não posso explicar.
— Confia em ti?
—Tudo o que um jovem de quinze anos pode fazer. Por que está interessado
em meus filhos?

A mão de Ramiel se deslizou por sua cintura, lhe pressionando a parte
inferior do abdômen.
—São uma parte de ti.

O calor de sua mão se propagou em seu ventre. Elizabeth sentiu uma
onda de gratidão.

Sua mãe estava equivocada. Nem todos os homens eram egoístas.
Especialmente um homem como Ramiel. Fechou os olhos e apoiou a cabeça
atrás.
—Obrigado pelo banho.
—De nada. Pensei que você gostaria.

O calor de suas mãos se evaporou de seu abdômen, de sua cintura. Um
suave empurrão pôs seus pés em movimento.

262

No final da escada ele não a beijou. Só a olhou da maneira
desconcertante que tinha de velar os olhos.
—Tenho que ir. Inspecione minha casa enquanto espera que Étienne prepare
sua obra de arte. Agora é sua casa.

Elizabeth mordeu o lábio para não lhe perguntar onde ia, e não muito
tarde; foi. E não havia dito nada sobre o aroma de flor-de-laranja sobre sua
pele.

Como podia ser sua aquela casa? Pensou irritada. Estava casada com
outro homem.

A decoração era uma mistura do exotismo oriental e a austeridade
ocidental, como seu dono. Elizabeth passou com tranqüilidade de um andar a
outro. Todo o tempo pensou no artigo do jornal que a tinha dado por quase
por morta, no marido que tinha tentado matá-la, e no pai que tinha ameaçado
fazê-lo. Refletiu sobre como tinha sido sua vida doze dias antes, como era
agora e como seria no futuro. Uma mulher divorciada vivendo com um Sheik
bastardo.

Era o dever de uma mulher situar as necessidades de seus filhos em
primeiro lugar.

Havia um quarto de hóspedes no terceiro andar. Pintado de amarelo
pálido com um friso de flores laranjas e verdes ao redor do teto e das portas.
Olhando de perto, uma das flores se parecia muito a uma vulva.
—Senhora Petre.

Elizabeth se virou, provocando um redemoinho de seda e lã. Muhamed
estava em pé na entrada.
— O que acontece?

Seu turbante era incrivelmente branco na penumbra. Mas o triunfo era
claramente visível em seu rosto.
—Seu marido quer vê-la.

CAPÍTULO XXII

Edward! Na casa de Ramiel. Como sabia onde podia encontrá-la?
Da mesma maneira que se inteirou de suas aulas com Ramiel, deu conta
no ato. Alguém a tinha seguido.
Um frio temor percorreu seu corpo.

263

Do ponto de vista legal, Edward podia fazer o que quisesse com ela.
Podia arrastá-la fora daquela casa e obrigá-la a entrar na carruagem. Podia
levá-la de volta a seu lar. Ou a um manicômio. E ninguém poderia detê-lo.

Os olhos negros de Muhamed brilharam.
Que oportuno que Edward tivesse aparecido quando Ramiel não estava
ali para recebê-lo. Tinha colocado espiões vigiando a mansão georgiana e lhe
informar justo quando Ramiel saísse? Ou havia algum espião entre os criados
de Ramiel?
Era evidente que Muhamed não aprovava sua relação com o Ibn. Era
possível que estivesse colaborando com o Edward, com o fim de expulsá-la
da casa de seu amo enquanto seu marido tentava eliminála de sua vida.
Tratou de acalmar onda de pânico. Ramiel havia dito que a protegeria.
Muhamed não lhe faria mal por temor a ele. Estava a salvo.
Elizabeth endireitou os ombros.
—Diga ao senhor Petre que não estou em casa.
O rosto de Muhamed se cristalizou numa máscara sem expressão. Ele
fez uma reverência.
—Muito bem. A carruagem e a cesta estão preparadas. Iremos quando
desejar.
Elizabeth ficou olhando a túnica de algodão que desapareceu varrendo o
chão. Que simples tinha sido.
Então por que lhe tremiam as pernas?
Procurou sua bolsa no quarto de Ramiel, o olhar se deteve na mesinha
de mogno e na caixa estampada com o retrato da rainha Vitória, na enorme
cama que se agitara e movimentara sob eles. Observou seu próprio rosto de
extrema palidez refletido no espelho da cômoda.
Não gostava de ter medo.
Na parte superior da escada circular fez uma pausa.
O que aconteceria se Edward se negasse a partir de casa de Ramiel sem
vê-la? E se Muhamed deliberadamente não tivesse irradiado a mensagem de
que ela não estava ali?
Mas ninguém a estava esperando ao pé das escadas. Quase lançou uma
gargalhada de alívio.
Na mesa do vestíbulo estava a cesta. A tampa esquerda estava aberta,
esperando sua inspeção.
Curiosa, olhou seu interior... E achou o aroma saboroso do mel. Várias
bolachas estavam delicadamente colocadas em guardanapos de linho. Étienne

264

tinha feito um piquenique que era uma verdadeira obra de arte. Sem poder
resistir, Elizabeth tomou um pequeno pedaço de bolo da cesta. Basboosa, ele
o havia chamado.

A calda de açúcar se pegou a seus dedos. Uma capa negra de nozes
finamente moídas decorava a superfície.

Phillip e Richard adorariam.
Sorrindo, mordeu delicadamente uma pontinha da bolacha. Era de uma
doçura extrema.
Olhou o que restava da porção que tinha em sua mão e logo as partes
cuidadosamente dispostas envoltas no tecido de linho. Seus filhos não
gostaria de encontrar um pedaço de bolo metade em suacesta. Franzindo o
nariz, meteu o resto na boca.
Sob a doçura açucarada e as nozes rangentes havia pimenta. O bolo
deixou um rastro picante da garganta até seu estômago.
Voltando-se, topou de frente com uma túnica de lã negra. Deu um passo
atrás.
—Desculpe. Estava... A carruagem já está fora?
Muhamed inclinou a cabeça. A capa dela pendurava de seu braço; levava seu
chapéu e suas luvas na mão direita.
—Está aqui, senhora Petre.
Elizabeth podia sentir sua hostilidade, embora não a manifestasse nem
com a mais mínima piscada. Ela não queria criar um conflito no lar de
Ramiel. Nem queria provocar um enfrentamento entre os dois homens.
Engoliu seu orgulho.
—Obrigado por fazer com que meu marido partisse, Muhamed.
—Tenho que obedecer a suas ordens.
Ela engoliu novamente.
—Perdão por ter usado a intimidação para entrar na casa de Lorde Safyre.
Colouqi-o numa situação insustentável. Por favor, aceite minhas desculpas.
A emoção brilhou nos negros olhos inescrutáveis de Muhamed e foi
imediatamente velada.
—É à vontade do Alá.
Com delicadeza, ela tomou o chapéu negro de seda de suas mãos, o
colocou sobre a cabeça e se atou a cinta negra sob o queixo.
—Entretanto, queria que soubesse que não era minha intenção lhe prejudicar.
Ela aceitou as luvas de couro negro e de maneira decidida colocou as
mãos dentro. - Como tampouco prejudicaria Lorde Safyre.

265

Muhamed sustentou imperturbável a capa de Elizabeth. Ela se voltou e
deixou que a pusesse sobre seus ombros.

A pimenta tinha irritado sua boca... Embora era uma corrente de saliva,
estava morta de sede. Pensou em pedir um copo de água, mas não se atreveu.
Os serviços públicos do trem deixavam muito a desejar.
—Lamento que tenha que me acompanhar, Muhamed. Se preferir não fazê-
lo...

Muhamed abriu a porta em silêncio.
Uma carruagem puxada por dois cavalos cinzas esperava sob o sol. Um
vapor quente subia dos corpos dos animais.
Elizabeth deu um passo adiante.
Deu-se conta de duas coisas de uma vez. Muhamed fechou a cesta e a
segurou pelas asas de vime. Ao mesmo tempo, uma bola de fogo de calor
vermelho explodiu em seu ventre.
Elizabeth emitiu um grito sufocado, desconcertado pela força de um
desejo físico, sem origem alguma.
— Encontra-se bem, senhora Petre?
A voz de Muhamed era forte, como se lhe estivesse gritando no ouvido.
Ela se endireitou com esforço, envergonhada e humilhada do que estava
acontecendo a seu corpo. Sentia-se invadida por uma luxúria animal
inexplicável, um desejo que brotava rapidamente e músculos que se
contraíam, convulsionavam.
Ninfomania.
Ramiel não havia negado no dia anterior, quando tinha estado
agasalhado tão profundamente dentro dela, que não era possível penetrá-la
mais embora ela o tivesse desejado.
—Estou bem, obrigado, Muhamed.
Sua voz era muito forte, áspera. O ruído do tráfico na rua aumentou até
converter num estrondo em seus ouvidos. As vibrações das rodas que
giravam e os cascos dos cavalos que retumbavam correram diretamente por
suas fibras nervosas da carne entre suas coxas.
De maneira decidida, desceu um degrau. Se pudesse alcançar o carro e
seus a seus dois filhos...
Suas coxas embainhadas em seda se esfregaram entre si. A sensação foi
elétrica.
Deixou cair à bolsa.

266

Elizabeth podia sentir o chofer e Muhamed olhando-a. E sabia que
estava perdendo a cabeça, porque os olhos de um homem não geram calor e,
entretanto ela estava se incendiando sob seus olhares.

Um grito isolado penetrou no ar.
— Senhora... Cuidado... Os degraus!

Suas pernas se desabaram. Braços fortes a sujeitaram justo quando
devia cair ao vazio.

Suportou o contato com esforço, cada fibra nervosa dentro de seu corpo
alerta e consciente. Do tato de um homam... Do aroma de um homem.
Encolheu-se com horror ao dar conta de que queria algo mais que os braços
de um criado ao redor de sua cintura, queria...

Elizabeth se arrancou dos braços de Muhamed.
—Não me toque. – Disse numa voz baixa, ou talvez tenha gritado. Havia
olhos por todos lados, de Muhamed, do chofer, dos criados que de repente se
congregaram ao redor do pequeno degrau.
O espião de Edward. Um deles podia ser o espião de Edward e lhe informaria
a respeito daquele incidente e seu marido, seus pais e seus filhos saberiam a
verdade por fim, ela era uma ninfomaníaca.
— Que diabos está acontecendo?
—Ficou louca...
— Chamamos o médico, senhor Muhamed?

Os olhos de Muhamed lançavam fogo negro. Abriu com força a cesta e
segurou uma parte de bolacha... Étienne havia dito que a basboosa era feita
de sêmola empapada em calda de açúcar. Não tinha mencionado que tinha
nozes e pimenta, por isso ela não sabia bem o que tinha comido, pensou de
repente Elizabeth febrilmente. O árabe que não era árabe cheirou o bolo.
Como um cão. O kebachi. Animais. Eram todos animais.

E ela era um deles.
Um gesto rude e o bolo passou voando a seu lado. Muhamed devia tê-lo
provado. Tampouco havia gostado.
— Allah akbar! Mandem chamar a condessa!
Não gostava do bolo. Não gostava das mulheres que satisfaziam seus
desejos com um homem que não era seu marido.
Elizabeth se voltou, fugindo, incendiando, caindo... “Não deixarei que caia,
Taliba”.

267

De maneira difusa, olhou a calçada, a alguns centímetros e não metros
de seu rosto, logo olhou fixamente para as mãos morenas que se
aproximaram para pegá-la.
— Em nome de Alá! Se apressem, idiotas! Ajudem-me!

Elizabeth sentiu que as gargalhadas afloravam dentro de seu corpo.
Ramiel tinha gritado Alá quando tinha alcançado o orgasmo. Imediatamente,
as gargalhadas foram devoradas por um enorme muro negro de desejo
incandescente.Que quente era o sêmen de um homem arrojado dentro do
corpo de uma mulher. Necessitava daquele calor. Necessitava de Ramiel.
Necessitava-o tão urgentemente, que iria morrer.

*****

Ramiel olhou fixamente os dois homens que estavam sentados no canto
daquele escuro botequim. Um deles tinha a cabeça encurvada, sua cara
sulcada pelas rugas estava obscurecida pela asa de um poeirento chapéu de
feltro de copa baixa e asa larga. Segundo o garçom, tratava-se do jardineiro.
O outro homem levava um chapéu cogumelo, sua cara enrugada e contrariada
estava à vista de todos. Era um homem que tinha apagado os rastros atrás de
muitos homens.

Ramiel lhe atirou uma moeda ao garçom. Levantou as duas pintas de
cerveja e se aproximou dos homens da esquina.
—Tenho entendido que vocês trabalham na escola.
—Trabalhamos na escola. —O homem do chapéu cogumelo levantou a cara e
franziu o cenho. – Por que?

Ramiel se sentou na pequena mesa de madeira.
—Tenho um trabalho para vocês.
—Olhe, senhor, não me importa ganhar alguns quantos xelins extra, mas não
vou andar a caça de clientes para ninguém.

Ramiel sentiu um endurecimento no peito.
—Asseguro-lhe que tenho outras inclinações. —Arrastou as duas pintas de
cerveja para o outro lado da tosca mesa cheia de manchas. - Só quero que
lhes joguem o olho A dois jovens. E que me tragam qualquer informação que
possam conseguir sobre certa irmandade.
—Somos tipos simples... Não sabemos nada do que quer saber.

268

Ramiel sorriu cinicamente enquanto o homem do chapéu cogumelo
pegava a cerveja. Ramiel colocou a mão em sua jaqueta e tirou uma bolsa de
moedas, pondo duas meias coroas sobre a mesa frente a ele.
— Algum de vocês conhece dois estudantes chamados Richard e Phillip
Petre?
— Sim. —Agora foi o turno do jardineiro do chapéu de asa larga. Elevou a
cabeça. Seus olhos irritados eram ardilosos. - O jovem Richard estuda
engenharia, é o que diz. Ajudou-me a construir uma pequena ponte. É um
bom menino, não como os outros, que me arrancam as flores e os arbustos
para se divertir.

Elizabeth tinha bons motivos para se sentir orgulhosa de seu filho mais
velho.
—O jovem Phillip, sim o conheço. – Grunhiu o outro homem. – Ele atirou
um balde de água com sabão no dormitório para me ajudar a limpar o chão.

Ramiel reprimiu um sorriso. Elizabeth estava no certa ao considerar seu
filho menor um pouco peralta.
—Eu não gostaria que nada erradoi acontecesse ao jovem Richard. - Advertiu
o jardineiro com voz grave.
—Nem a mim. - Adicionou Ramiel de uma vez. - Quero que vigiem os dois
jovens. Todas as manhãs e todas as noites um homem se encontrará com
vocês frente à capela. Terá um chapéu com uma franja alaranjada.
Informarão a ele.
— E o que há para nós? —Perguntou o homem da limpeza.
—Meio soberano agora, para cada um, e uma coroa por cabeça ao final de
cada semana.
—Está bem. Mas sobre o que temos que informar?

Ramiel analisou em silencio os dois homens, tentando determinar
quanto sabiam e qual era a melhor forma de fazê-los falar.
—A irmandade dos Uranianos. - Disse brutalmente.

O jardineiro baixou a cabeça como uma tartaruga que se mete de novo
em sua carapaça.

Uma satisfação amarga se apoderou de Ramiel.
Então a irmandade seguia existindo. Ainda seguia abordando jovens
imaturos.
—Não sei de que fala. —O homem do chapéu cogumelo tomou um gole de
cerveja morna e limpou a boca com uma mão trêmula.

269

—Obviamente sim ou de outra maneira não haveriam dito que não se

dedicavam a busca de clientes.
—Não sei de nada. - Repetiu obstinado.

Encolhendo de ombros, Ramiel alargou a mão para pegar as duas

moedas.
—Há um membro do corpo de professores. - Balbuciou o jardineiro.

Ramiel fez uma pausa.
— Um membro do corpo de professores?

O homem levantou a cabeça lentamente.
—Um professor. Vi cavalheiros respeitáveis, como você, se reunir algumas

noites com o professor no jardim de inverno. O professor lhes leva meninos

jovens. Depois vejo os cavalheiros conduzindo suas elegantes carruagens e

levando os meninos em passeio.

Ramiel sustentou o olhar do jardineiro.
— Viu alguma vez Richard ou Phillip Petre entrar nesse jardim de inverno

com o professor?
—Sim. —A resposta saiu como um estrondo reticente de sua garganta—.

Uma vez. Vi o jovem Richard faz um mês. Não veio mais me ajudar após.

Ramiel tinha previsto a resposta do regulamento pela descrição de

Elizabeth da recente «enfermidade» de Richard. Mas isso não fazia com que

fosse mais fácil inteirar da verdade.
— Viu quem era o cavalheiro ao que o professor levou a Richard para que o

conhecesse?
—Não vi sua cara.
— Quem é o professor?
—Insígnia grego. É o senhor Winthrop.

Ramiel ficou em pé.
—Então o que devemos lhe dizer ao homem do chapéu de franja alaranjada?
—Perguntou o homem da limpeza, desejoso de mais dinheiro.
—Os nomes dos cavalheiros. —A voz de Ramiel produziu um

estremecimento nos dois indivíduos.
—Não está bem o que está acontecendo. - Disse o jardineiro.
—Não. —Ramiel se perguntou da dor que isto causaria a Elizabeth se alguma

vez se inteirava. - Não, não o está.

Uma vez fora do pequeno botequim, Ramiel tragou o ar fresco da

neblina de Londres. Possivelmente podia surpreender o membro do corpo de

professores, como tinha feito com aqueles dois trabalhadores.

270

Mas não foi assim. O professor, segundo o curvado secretário do
decano, estaria fora até a semana seguinte.

Ramiel queria perguntar ao secretário se Elizabeth Petre tinha visitado
seus dois filhos, mas não o fez. Não queria que se inteirasse de sua visita. De
fato, entrando no vestíbulo principal se arriscava a encontrar com ela.

Impregnou o chapéu na cabeça até cobrir suas orelhas e subiu o lenço
até o queixo, saiu do edifício e entrou no carro de aluguel que o esperava
fora.

Richard só tinha quinze anos. Outro sinal contra Edward Petre.
Dominou seu desejo de voltar a entrar na escola e levar todos dali.
Elizabeth e seus dois filhos. Mas, subiu no trem e fechou os olhos, tentando
esquecer a dor que Richard devia estar padecendo.
Repulsivo, havia dito Elizabeth sobre a tentativa de Petre de matá-la.
Esperava que ela jamais se inteirasse de quão repulsivo era na realidade
Edward Petre.
Era muito tarde para proteger seu filho mais velho, mas talvez, quando
chegasse a ocasião, podia ajudá-lo a aceitar o que tinha acontecido e seguir
com sua vida. Naquele momento tinha que concentrar em deter Edward
Petre.
A estação de Londres tinha um aroma nauseabundo, era ruidosa e
estava abarrotada. Perguntou o que pensaria Elizabeth sobre o deserto, a areia
branca e limpa e o céu imensamente azul.
Madame Tusseau não se alegrou quando chegou a sua loja e a persuadiu
com seu encanto de que lhe desse mais roupas para Elizabeth. A ansiedade o
dominava quando chegou à porta de sua mansão com os braços carregados de
caixas.
Teria gostado de ter ficado mais tempo com Elizabeth naquela manhã.
Ela tinha se ofendido de verdade quando não havia deixado falar com mais
detalhe sobre seu banho.
Ramiel imaginou sua pele, quente e suada, com o aroma de sua paixão
misturando com o doce aroma das flores de flor-de-laranja.
Sem prévio aviso, a porta de entrada de sua mansão se abriu de par em par.
Um murro invisível pegou Ramiel de cheio no peito. Acreditava que
Muhamed devia que estar com a Elizabeth, visitando seus filhos em Eton,
não ali. Só estaria ali se...
— Onde está Elizabeth? —Perguntou com a voz rasgada.
O rosto do homem de Cornualles permaneceu imperturbável.

271

—Seu marido veio visitá-la.
O temor se retorceu no estômago de Ramiel.

—Não o terá deixado entrar.
—Deixei.

Ramiel subiu os dois degraus de um salto. Várias caixas caíram ao
chão.
— Onde está?

Muhamed olhou fixamente por cima do ombro de Ramiel.
—Está com a condessa. Em seu quarto.

Ramiel sentiu uma estocada de alívio. Ela não havia voltado com seu
marido. Moveu-se para sortear ao homem de Cornualles.
Muhamed lhe cortou o passo.
—À vontade do Alá prevalecerá, Ibn. Uma vida por outra. Assim está escrito.
Ofereço-te minha vida pela da senhora Petre.

Elizabeth... Morta.
As restantes caixas que descansavam nos braços de Ramiel saíram
voando. Sua mão segurou com força o pescoço da túnica do homem de
Cornualles.
—Explique-se.
Muhamed não tentou liberar.
—Pus em risco a vida da senhora Petre. Pode fazer o que quiser com minha
vida.
— Do que está falando?
Os olhos negros de Muhamed se encontraram impertérritos com o olhar
turquesa de Ramiel.
—Foi envenenada.
A palavra envenenada atropelou Ramiel como ondas de horror.
Empurrando Muhamed para trás, correu freneticamente pelas escadas,
subindo-as de três em três degraus. Quando chegou a porta de seu dormitório,
abriu-a com brisquidão. A porta golpeou contra a parede e quase voltou a
fechar em sua cara. Só uma bota, com a velocidade de um raio se meteu na
entrada, para evitá-lo.
A condessa tinha aproximado a poltrona de veludo vermelho ao lado da
cama. Uma tênue luz penetrava pelas cortinas fechadas. Seu cabelo loiro
parecia prateado no crepúsculo artificial. Com o ruído da porta, suas costas
endireitaram bruscamente. O alívio se espalhou sobre sua fisionomia ao ver
Ramiel.

272

Levou uma mão magra e elegante a seus lábios:
—Shhh.

Ramiel devorou a distância que havia entre a porta e sua cama. O

coração lhe acelerou quando viu Elizabeth. Sua pele estava mais branca que o

travesseiro. Brilhos vermelhos e dourados cintilavam em seu escuro cabelo

cor mogno, como se tivessem consumido a vida que devia animar seu corpo.

Sombras escuras bordeavan seus olhos fechados.
—Não se preocupe, Ibnee. Ela estará bem agora.
— Como? —O murmúrio de resposta foi áspero, arranhou seu peito. Sem dar

conta, estendeu uma mão, alisou uma mecha de cabelo úmido da testa de

Elizabeth. Sua pele estava fria e pastosa.
—Vamos a outro lugar para não incomodá-la.
—Não. —A fúria e o temor lutavam dentro de seu peito. Tinha-lhe prometido

que estaria a salvo com ele e lhe tinha falhado. - Não voltarei a deixá-la

sozinha.

Sentado na beirada da cama, procurou sua mão.
—Não a toque.

Ramiel ficou imóvel. Lentamente, sem mover, voltou sua cabeça para a

condessa.
—Dei-lhe um sedativo. Sua pele está ainda muito sensível. - Explicou a

condessa. - Se a acordar, causará-lhe dor.

A mão de Ramiel ficou suspensa acima dos dedos de Elizabeth, que

jaziam curvados para cima sobre a colcha.
— O que quer dizer com que sua pele está ainda muito sensível?
—Ela foi envenenada, Ramiel.
— Que tipo de veneno faz com que o tato seja doloroso?

A condessa não se amedrontou ante a perigosa suavidade de sua voz.
— Acaso estiveste tanto tempo fora do harém que esqueceste?

A cantárida, conhecida popularmente como mosca da Espanha, era um

afrodisíaco comum usado nos haréns embora normalmente se misturava com

outros ingredientes para que excitasse e não matasse.
—Impossível. - Disse sem expressão na voz.
—Asseguro-te que não.
— Como?
—Basboosa. Estava orvalhada com cantárida em abundância. Muhamed lhe

deu um remédio para que a evacuasse do estômago. Se não tivesse atuado tão

rápido ela teria morrido.

273

Se Muhamed não tivesse admitido Edward Petrna sua casa ela não teria
sido envenenada.
—Edward Petre não saberá nada sobre o envenenamento com cantárida.
— Está seguro de que foi seu marido?
— Está insinuando que foi meu chef, Étienne? —Replicou ele cortante.
— Está seguro de que o veneno era para Elizabeth? —Repôs com
tranqüilidade a condessa.

A cesta surpresa. O bolo era para os filhos de Elizabeth.
Ninguém conhecia a intenção de Elizabeth de visitar seus filhos exceto
ele e seus criados. Ramiel tinha colocado um espião na casa de Petre. Teria
ele colocado um na de Ramiel?
Muhamed. O homem de Cornualles sabia que uma vez ingerida, não
havia antídoto para a mosca da Espanha. A única solução para uma overdose

era administrar imediatamente um remédio para o vômito. Também sabia que
freqüentemente não sortia efeito. A cantárida matava de uma vez que
excitava. A dose que provocava o desejo não era tão diferente daquela que
causava a morte.
—Não acredito que nenhum de meus criados seja culpado, mas lhe asseguro,

se algum deles foi, logo saberei. - Prometeu sombrio.
Brandamente, como para não mover a cama, ficou em pé.

— Aonde vai?
—Procurar o traidor.
—Disse que não deixaria Elizabeth.

Não podia evitar que a amargura aparecessna sua voz:
—Você pudeste protegê-la melhor que eu.
—Não poderei ajudá-la quando despertar, Ramiel.

Ramiel fez uma pausa.

Os efeitos da mosca da Espanha eram duradouros. Embora o pior do
suplício tivesse passado, quando despertasse seu desejo ainda seria enorme.

Experimentou um endurecimento no sexo, contra sua vontade. E se
desprezou por sua debilidade. Mas quando Elizabeth despertasse, iria

necessitar de sua sexualidade. Precisaria dele. Não voltaria a lhe falhar.
Catherine observou Ramiel enquanto ele olhava Elizabeth. Suas

fisionomia, tão parecidas com as de seu pai eram uma mistura de dureza e
ternura.

Um sentimento de pesar oprimiu seu peito. Pelo amor que havia

sentido. Pelo que podia ter sido e pelo que nunca voltaria a ser.

274

—Ramiel.
Os olhos turquesas que se encontraram os dela estavam tão brilhantes

que sentiu que o coração lhe oprimia.
—Serei terno. —Um sorriso travesso curvou seus lábios. - Mas não muito.

Com suavidade, ele fechou a porta do dormitório atrás dela.
Parecia que tinha sido ontem que Ramiel usara calças curtas e seduzia a
todas as criadas dos arredores, com seus olhos turquesas, o cabelo loiro e a
pele morena, brigando para lhe dar mamadeira e lhe trocar as fraldas.
A dor em seu peito aumentou.
Se se tivesse ficado na Arábia, Ramiel teria sido o menino mimado do
harém. E ela... A favorita do Sheik. A mãe de Ramiel. Seu cérebro se teria
convertido em areia do deserto rodeada pelo vazio falatório e o temor
constante de que outra mulher obtivesse os favores do Sheik. Uma mulher de
cabelo escuro em lugar de loiro. Uma mulher cuja tez fora similar a de uma
mulher nascida na Arábia. Uma mulher que pudesse se submeter num mundo
de homens e ficar feliz atrás das janelas gradeadas e véus de musselina.
Uma mulher que aceitasse um prazer físico fora deste mundo e não
confundisse o amor com a satisfação sexual.
—Madame.
O coração do Catherine deu um salto em seu peito. Um fantasma com
turbante saiu das sombras. Um resto do passado que ela tinha rechaçado.
A raiva deslocou a nostalgia. Tinha renunciado a beleza da Arábia para
não ficar presa nela, enquanto que o homem de Cornualles que agora estava
frente a ela, se inundava nas tradições que tinham provocado a ruína de sua
própria vida.
— Envenenou a basboosa, Connor?
Ele permaneceu imperturbável.
—Você sabe que não.
—Dou-me conta de que à medida que passam os anos, menos certeza tenho
sobre nada. Você me assegurou que Elizabeth Petre era uma rameira
maquinadora que tinha a intenção de arruinar meu filho. Pediu-me que me
metesse nas vidas de duas pessoas que precisavam encontrar o amor
desesperadamente.
O homem de Cornualles estremeceu, como se lhe tivessem dado uma
bofetada. De repente, Catherine entendeu tudo.
—Você tem ciúmes. - Disse brandamente.
—Estou protegendo-o, como é meu dever.

275

—Meu filho não necessita de seu amparo, Connor. Já não tem o dever de

fazê-lo. É um homem livre, mas segue com ele. Por que?
—O Sheik me ordenou velar por Ibn. Não evitarei minha responsabilidade.
—Ramiel te ama, mas também ama Elizabeth. Não converta seu amor para ti

em ódio.
—Ele é o Ibn. Só um infiel confia no amor de uma mulher.

Catherine franziu o cenho
—Você não acredita nisso, Connor.
—Devo acreditar. Devo cumprir com meu dever. —A voz do homem de

Cornualles pulsava de dor. - Se não o fizer, não há razão pela qual um eunuco

deva seguir vivendo.

De repente, quarenta anos se dissolveram e Connor foi outra vez um

menino de treze anos cujas lágrimas empapavam a areia na qual estava

enterrado para não sangrar depois de ser castrado.

Catherine tinha dezessete anos. Tinha sobrevivido a violação e a

escravidão. Quando aquele jovem lhe tinha rogado soluçando que o matasse,

ela não tinha entendido o que lhe tinham feito. Em sua ignorância, tinha-lhe

causado um mal, mas agora compreendia e possivelmente, pudesse reparar

seu engano.
—É um homem arrumado, Connor.
—Sou um homem inútil.
—Cujo rosto é jovem e seus músculos estão duros. – Ela disse bruscamente. -

Se realmente fosse um eunuco, agora teria seios e seu estômago e quadris

seriam uma montanha de graxa. Mas não são.
—Cortaram-me os testículos. – Ele chiou com uma crueldade pouco comum

nele. - Me roubaram a capacidade para criar vida.
—E por isso Ramiel é mais um filho que alguém a seu cargo.

O homem de Cornualles permaneceu em silêncio.
— Estiveste alguma vez com uma mulher, Connor?

Um breve sorriso iluminou o rosto de Catherine ante a expressão de

furiosa indignação de Muhamed.
—Sou um eunuco.
—Mas usa seu membro. —Se a luz tivesse sido mais forte, teria jurado que

ele se ruborizara.
—Necessito de um cano para urinar. - Disse ele, com rigidez.
—Há eunucos raspados como uma menina que usam argolas.
—Riem deles nos haréns.

276

—Mas ao menos alcançam um grau de felicidade. Era muito jovem quando
lhe tiraram os testículos, Connor. Se tivesse sido um menino que ainda não
lhe tinha crescido os pêlos do corpo, poderia entender este... Este martírio.
Afeta os meninos de maneira diferente que os jovens. As mulheres no harém
valorizam os eunucos como você, porque podem ter uma ereção e lhes
agradar sem deixá-las grávidas. Acaso alguma vez desejaste uma mulher?
Jamais desejaste encontrar o amor no corpo de uma mulher?
—Não deveria estar comentando estas coisas comigo. —A voz do homem de
Cornualles estava áspera de fúria. - Você é a mulher do Sheik.
—Não, Connor, eu sou proprietária de mim mesma. E não ficarei de braços
cruzados vendo como afasta meu filho da mulher que escolheu.
—Jamais faria mal ao Ibn.
—E, entretanto possui conhecimentos sobre a cantárida.
—Se quisesse matar Elizabeth Petre, não teria envenenado a comida da cesta.
Era para seus filhos. Nunca faria mal a seus filhos.
— Nem sequer para salvá-los de um destino pior que a morte?

Os olhos negros do Connor nem pestanejaram: —Nem sequer para isso.
— Veio realmente Edward Petre hoje aqui?
—Sim.
— Estava sozinho?
—Não.
— Quem estava com ele?
—Não sei.

O delicado arco das sobrancelhas do Catherine se uniu bruscamente.
—Connor, por favor, não me minta.
—Não minto, madame. Era uma mulher. Estava totalmente coberta. Não
disse nada. Não sei quem era. Sequer estou seguro de que fosse uma mulher.

CAPÍTULO XXIII

Elizabeth despertou com um grito sufocado. A mesma escuridão que a
rodeava palpitava. Durante um segundo não compreendeu a simples e
incontrolável necessidade que formigava sobre a superfície de sua pele como
o fogo de São Elmo. E então recordou. A dor maior que qualquer dor. O calor

277

que não cessava. Muhamed obrigando-a a tomar um xarope. A condessa
jogando água em sua garganta.

Tinha vomitado, tinha urinado e continuou ardendo. Como agora.
A parte de bolacha que tinha comido não estava polvilhado com nozes
picadas mas com um inseto triturado. Um escaravelho abrasador havia dito a
condessa, cuja venda estava muito difundida tanto no Oriente como no
Ocidente.
Meu deus. Alguém tinha tentado envenenar seus filhos. Mas em lugar
disso, envenenam a ela.
A escuridão palpitante a rodeou. Era tão negra como o escaravelho que
tinha comido. Sentindo arcadas, jogou para trás a colcha e deslizou as pernas
fora do colchão.
Elizabeth ficou imóvel.
Uma mão tocou suas costas através da fina seda, deslizando sob o
volumoso peso de seu cabelo e lhe acariciando brandamente a nuca.
—Fique.
Ela se sobressaltou. A voz de Ramiel destroçou seus nervos enquanto o
calor de sua mão viajava a lugares que nada tinham a ver com seu pescoço.
—Tenho que ir... —Ela mordeu o lábio. - Tenho que ir ao quarto de banho.
— Necessita de ajuda?
Elizabeth se afastou bruscamente da tentação de sua mão.
—Não, obrigado.
Em silêncio, ela caminhou descalça ao banheiro e fechou a porta atrás
dela. Quando voltou, Ramiel estava sentado na beirada da cama, sustentando
um copo e despreocupadamente nu. Havia acendido o abajur da mesinha. Ela
piscou.
O tato, o olfato, a vista... Todos os seus sentidos pareciam estar
enfocados para um único lugar entre suas pernas. Era humilhante. Não
cederia ante ele, não importava quão grande fosse sua necessidade. Ela não
era um animal.
De repente, os anos sem paixão que tinha passado casada com Edward
lhe pareceram um refúgio. Talvez os de sua classe estivessem certos e as
mulheres não fossem feitas para desfrutar dos prazeres da carne. Ramiel lhe
estendeu o copo.
—Tome isto.
Ela olhou fixamente o copo em vez daquela musculosa e morena pele.
—Sabe o que aconteceu.

278

—Sei o que aconteceu. – Ele assentiu com calma.
—Tome-o. Necessita de líquidos.
—Não tenho sede.
—Quanto mais água beber, mais rápido sairá a cantárida de seu corpo.

Ela evitou seus olhos turquesas, tão solenes e peritos. Era evidente que
ele conhecia o veneno que ela tinha ingerido. Que ele soubesse as
conseqüências que provocava, tornava sua experiência ainda mais
humilhante.
—Bebi litros de água e ainda... —Ela engoliu a saliva. - Me sinto arder.
—Então me deixe aliviar seu ardor.

O coração de Elizabeth bateu forte.
—Quero partir.

Em algum lugar da casa, uma porta se fechou de repente. Seguiu-lhe o
ranger da cama com dossel.

Ramiel atravessou o dormitório com os pés nus até ficar em pé frente a
ela.
—Toma a água, Elizabeth. Conversaremos pela manhã.

Seu olhar deslizou do copo que estava em sua mão até o hirsuto arbusto
de pelos dourados que cobria seu peito. Formava uma flecha, que corria
ventre abaixo até seu estômago. Seu corpo estava duro. Uma gota de umidade
brilhava na ponta de seu membro viril e arroxeado como a fruta amadurecida.
Como uma suculenta ameixa beijada pelo rocio. O fruto proibido.

O calor subiu pelo corpo de Elizabeth até que sentiu como se fosse
incendiar. Não queria água. Não queria conversar. Estalando de fúria, atirou
o copo longe.
— Eu disse que não tinha sede!

A água cristalina fez um arco no ar enquanto o copo caía no tapete,
ricocheteando. Uma mancha escura se estendeu sobre a lã de brilhantes cores.

Durante um segundo eterno pareceu como se Elizabeth não estivesse
ali, como se outra pessoa tivesse perpetrado aquele pequeno e absurdo ato de
violência. Logo a vergonha, a fúria, o temor e todas as emoções acentuadas
pelo desejo que queimava e palpitava em seu corpo a cobriram como uma
onda.

Ramiel não se escandalizou ante seu estalo de violência. Notava como
se tivesse por diante uma árdua tarefa. Seu olhar dizia que Elizabeth não
estava agindo como uma filha disciplinada, como uma esposa total e sequer
como uma amante obediente.

279

—Mentiste-me. – Ela disse glacialmente.

Seus olhos turquesas se obscureceram.
—Sim.
—Disse-me que estaria a salvo contigo.
—Sim.
—Então não há necessidade de esperar até manhã. Não temos nada do que
falar. Se for muita moléstia despertar os criados, procurarei um carro de

aluguel.
—Sabia quando veio para mim, Elizabeth, que eu não a deixaria partir.

O calor de seu interior explodiu com um estalo.
—Então mataria meus filhos para que não inteferissem em seu prazer.

Ele piscou incrédulo enquanto suas mãos saíam como uma chicotada.

Seus dedos se afundaram nos ombros dela.
— Como disse?
—Minha mãe me advertiu disso. —Elizabeth teria que estar atemorizada,

mas tudo o que podia sentir era o calor daqueles dedos transpassando a seda

da camisa e a lembrança de quando tinham estado alojados no mais profundo
de seu corpo ao encontrar seu lugar especial. – Ela disse que você não

aceitaria os filhos de outro homem. Você tentou matar meus filhos!

O ar saiu como uma rajada de seus pulmões ante a força com a qual ele
a atraiu para seu peito.
—Você não pode pensar isso. – Ele gritou.

Sua respiração estava quente, avivando o fogo que já a consumia.
Pouco importava se lhe acreditasse ou não. No dia anterior, havia perguntado

se teria vindo a não ser por seus filhos. Aquele mesmo dia ele havia dito que

não ficaria à margem de sua vida quando ela insistiu em visitar seus filhos...
Sozinha. O veneno era comum no Oriente. Ramiel conhecia suas

propriedades. Sabia que a cesta estava destinada a seus filhos, e que estes

obstaculizavam seu prazer. Podia ter sido ele, pensou ela agitada.
Desviando a cara, tentou afastar de seu peito, mas o hirsuto pêlo loiro

que o cobria picava em seus dedos e o calor de sua pele era abrasador. Uma

gargalhada nasceu e morreu em seu interior. Todo este ardor, desejo
atormentado... Por causa de um maldito inseto. Elizabeth afastou as mãos. —

Me deixe partir.

Ele a atraiu ainda mais, pressionando seu peito contra os seios dela,
com o membro palpitante cravando em seu estômago e os lábios a um passo

de sua boca.

280

—Me diga que não acredita nisso.
Elizabeth morreria se ele não a deixasse partir, mas sabia que ele nunca

o faria e não podia suportar que a tocasse nem um minuto mais.
— Me deixe! —Gritou, querendo feri-lo tanto como ela se sentia ferida. -
Não quero que me toque nunca mais! Não estava aqui quando precisei de
voce! Não quero te desejar!

O olhar de Ramiel era inconfundível. Tinha obtido seu objetivo. Havia
ferido o Sheik Bastardo. Por que não a deixava partir?
—Me diga que sabe que eu não faria mal a seus filhos. – Ele gritou com sua
respiração incendiando o rosto de Elizabeth.

Se ela reconhecesse, teria que admitir que seu marido tinha tentado
matar seus filhos. Seus filhos. Como seu pai tinha tentado matá-la. Ela era
uma pessoa adulta. Possivelmente suas ações justificassem algum tipo de
castigo, mas seus filhos só eram duas crianças. Era impossível que um pai
fosse tão depravado para querer fazer mal aos próprios filhos!
— Jamais! —Elevou o joelho para adicionar maior impacto a sua negação.

Os olhos de Ramiel aumentaram. Soltou-a de repente.
Elizabeth não sabia o que tinha feito para liberar, mas não se deteve
comprová-lo. Voando Através do tapete oriental, abriu o armário
transbordante de trajes masculinos exceto dois únicos objetos femininos, a
saia azul real e a jaqueta que a condessa tinha pendurado ali quando
Elizabeth só conseguia tragar ar e tentava não expressar a gritos seu desejo.
Histéricamente, tirou uma camisa de seda que não era dela. Nada lhe
pertencia, nem em casa de Ramiel, nem em casa de Edward.
De repente, seu corpo foi levantado no ar. O pêlo encaracolado lhe
raspava as costas e a carne dura e úmida empurrava suas nádegas. E por
debaixo estava o calor inesgotável.
—“Bahebbik”. —A voz de Ramiel era um grunhido escuro. As sílabas árabes
soavam como se tivessem sido extraídas do mais fundo de sua alma.
Elizabeth apertou as pálpebras. Os batimentos do coração dele estavam
fortes contra sua omoplata esquerda. Palpitava ao ritmo de seus próprios
batimentos. Por favor, Deus, que não perdesse o frágil controle que ainda
pendia de um fio.
— O que significa isso?
—Fique para averiguá-lo.
As lágrimas derramaram por sua face.

281

—Você não te surpreendeu quando meu marido tentou me matar. Tampouco

se surpreendeste por isso. O que precisa para que sinta alguma coisa?
—Eu sinto, Taliba. —Sua voz pulsava em seu ouvido. Um Sheik bastardo

rechaçado primeiro pela sociedade e agora por ela.

Ela não queria sentir suas feridas.
—Pensei que morreria sem ti.
—Estou aqui agora.
—Senti-me como um animal. —Sua dor e seu desejo estalaram num discurso

agônico. - Meu corpo... Não me importava. Não compreende? Poderia-me ter

deitado com qualquer homem!
—Mas não o fez.

Elizabeth abriu os olhos e fixou o olhar sobre uma fileira de coletes,

camisas e smoking.
—Não quero sentir esta... Esta luxúria. Quando me toca, só quero tomá-lo em

meu interior. Como sei que algum dia não sentirei o mesmo, por cada homem

que ver?
—Não deixarei que aconteça.
—A luxúria não é amor.
—Talvez não, Taliba. Mas posso satisfazer sua luxúria até que esteja muito

esgotada para notar a diferença.

Uma risada histérica surgiu do peito de Elizabeth. Junto com o calor de

seu corpo. Não havia lugar para a alegria.
—Por favor, me deixe partir. Não sou... Eu mesma neste momento.
—A luxúria é uma parte da união, Taliba. Compartilhe-a comigo.

Ela não queria unir. Queria copular.
—Meus filhos...
—Estão seguros. Deve confiar em mim, Elizabeth.

Ela tentou abrir os braços, bloqueados ao redor de sua cintura.
—Isso já disse antes.
—Elizabeth, hoje fui a Eton. Contratei pessoas para que cuidasse de seus

filhos.

Elizabeth permaneceu quieta.
— Por que não me disse esta manhã o que foste fazer?
—Não queria te alarmar.
— Acredita que meu marido faria mal a seus próprios filhos?
—Acreditei possível.

OH, Deus, era certo. Edward tinha tentado matar seus próprios filhos.

282

—Sei que está sofrendo, Elizabeth. Deixe-me que te faça sentir melhor.
Deixe-me te amar.

Amor. Toda sua vida tinha desejado ser amada.
Mas isto não era amor. Era luxúria.
E ela também queria aquilo.
Apoiou a cabeça para trás, para que descansasse contra a dele.
—Sentirá repugnância por mim. – Ela sentia repugnância por si mesma.
Ramiel mordiscou-lhe a orelha. A pequena dor cravou em seus
mamilos.
—Talvez antes que termine a noite seja o que te inspire repulsão.
—Não. —As coisas que lhe tinha feito jamais lhe teriam causado
repugnância.
Lentamente, ergueu com seus braços ainda ao redor dela e se voltou.
Ela olhou para a cama desfeita.
—Quando te baixar coloque-se sobre suas mãos e joelhos.
“O kebachi. Como os animais”.
Mentiria a si mesmo se dissesse que não desejava aquilo. De repente se
sentiu enojada de tantas mentiras.
Tremendo, Elizabeth fez o que lhe tinha ordenado. O ar fresco
acariciava suas nádegas. Sentia-se... Exposta e vulnerável. Pela postura. Por
saber que ele conhecia seu enorme desejo... E não a julgava.
Mas ela o havia julgado. Havia sentido vergonha de levá-lo a visitar
seus filhos. Vergonha por aquilo. Como poderia ser uma boa mãe e uma
mulher libertina?
O colchão afundou A suas costas. Ramiel pousou a mão sobre suas
nádegas, Numa impressão aguda.
—Abra as pernas... —Ela tremeu ao sentir o empurrão de uma coxa dura e
peluda. - Assim.
Um calor abrasador pegou seu traseiro e entre as pernas. Logo ele se
encontrava dentro dela e houve uma pequena explosão interna. Achava
agasalhado tão profundamente que ela quase não podia respirar.
— Ramiel!
—Shhh.
Ramiel elevou um pouco seus ombros... OH, Deus, a sensação era como
ter um tronco parecido em seu interior do qual brotava de repente uma árvore
e logo ela se encontrou erguida de joelhos e eram um só corpo, um só pulsar.
As costas dela estavam contra o peito dele, uma parede viva, palpitante de

283

calor e músculos tensos. Bem dentro dela, a membro dele palpitava. Ou
talvez fosse seu ventre palpitando ao redor dele.
—Conhece os diversos nomes que recebe o órgão sexual de um homem.

Um fôlego quente e úmido roçou seu cabelo. Uma mão rugosa acariciou
seu ombro. Podia sentir cado atrito áspero à medida que deslizava por seu
peito e roçava um mamilo duro como a rocha... Contraiu ao redor dele, um
prelúdio relampejante do orgasmo que atravessava seu corpo como um raio.
Logo cavou sua mão sobre seu ventre, adaptando a carne situada no mais
profundo de seu corpo, convertendo-se em parte dela. Enquanto mordiscava
sua orelha, ele baixou sua outra mão e enredou seus dedos nos cachos úmidos
de suas pernas, murmurando:
—Agora devemos aprender os nomes das partes de uma mulher. —E com um
só dedo roçou seus clitóris inchado.

Elizabeth gritou de êxtase.
—Me perdoe. —Ela segurou suas mãos para mantê-las em seu lugar
enquanto seu corpo se apropriava da essência dele e as lágrimas deslizavam
por sua face. - Por favor, me perdoe.

Por não ser a dama que aparentava ser. Por complicá-lo na sórdida
realidade de sua vida. Por tomar mais do que ele estava dando.
—Nunca se arrependa por experimentar prazer, Taliba. Me dê sua mão...
Não, não resista. —Sua mão cavada sobre seu ventre a apertou contra ele
enquanto a outra, que tinha conseguido levá-la ao orgasmo, segurou a dela. -
Eu fantasio te ensinando tudo isto, te tendo nua, me tocando, te tocando. Isto
é abou khochime, «a que tem o nariz pequeno». —Com os dedos
entrelaçados aos dela, dirigiu o movimento de sua mão, afundando entre os
lábios inchados com um calor líquido, recolhendo a umidade para deslizar e
escorregar para o coração palpitante de seus clitóris. - Também é chamado
abou djebaba, «a que se sobressai».

O calor cresceu como um cogumelo dentro de Elizabeth, mas ele não a
deixava ir e ela não podia brigar contra ele e contra seu corpo. Ofegando para
tomar ar, golpeou sua cabeça para trás contra o ombro dele ao mesmo tempo
em que outro orgasmo rasgava seu corpo.

Ramiel afundou sua cara no oco de seu pescoço com a mão
pressionando com firmeza e registrando as contrações de seu ventre, as
convulsões de sua vagina ao redor da corpulência de seu membro viril.

284

—Isso está bom... Muito bom —Sussurrou. – Você também está “abou
tertour, a que tem crista”. Usa-se esse nome quando o clitóris da mulher sobe
no momento do prazer.

Como havia feito o dela, duas vezes. E ainda não era o bastante.
Elizabeth girou a cabeça para seu espesso cabelo dourado. Ele cheirava
a sol, a calor e a um tênue rastro de sabonete. Aferrou-se a prudência de sua
voz.
— Fantasia realmente comigo? —Ofegou.
Seus dedos voltaram a lhe oprimir enquanto a carne dela pressionava-se
contra as pontas de seus dedos unidos. Dentro de seu corpo sua vagina se
crispou num espasmo ao redor de seu membro, enquanto seu ventre tremia
contra a palma de sua mão.
—Oh, sim. Fantasio contigo. Fantasio sobre seu cabelo, seus seios, seu
delicado pêlo aqui que é da mesma cor que seu cabelo, seu miúdo casulo que
se aumenta tão deliciosamente...
Jamais tinha sonhado que um homem pudesse fantasiar com ela. Antes
de Ramiel, nunca tinha imaginado que um homem pudesse desejar sua
satisfação.
Elevou a cabeça, roçou sua face com seu nariz, ajustou sua posição até
que encontrou sua boca. Sua língua estava tão quente e úmida como aquela
outra parte dela que a penetrava. Ela se convulsionou, gemendo em sua boca
com o corpo contraindo e estremecendo-se independentemente, enquanto ele
girava os dedos de ambos uma e outra vez.
—Três orgasmos... - Murmurou contra seus lábios. Temos que suavizar o
desejo até que possamos terminar a lição.
Ofegando para tomar ar, Elizabeth sentiu que seus dedos eram
conduzidos para baixo, através das dobras suaves e úmidas até que de repente
sentiu uma dura lança. Ele era parte dela. Profundamente em sua vagina ele
se flexionou, ao mesmo tempo, ela sentiu o movimento com a ponta de seus
dedos.
—Keuss é uma palavra comum para a vagina de uma mulher. —Pressionou
as pontas dos dedos contra o aro de carne que se aferrava a seu membro
como uma segunda pele. - E logo está o taleb, que ofegante arde pelo
membro de um homem. Você queima por mim, Taliba?
Elizabeth girou a cabeça para frente e observou o baile de luzes e
sombras sobre a parede verde pálido. As brasas ardiam na lareira de mármore
branco.

285

— Sabe que sim.
—Mas necessito que diga.

Havia lhe dito palavras muito mais explícitas. Então por que lhe
resultava tão difícil?
—Queimo por ti, Ramiel. - Disse com voz afogada.

Ramiel massageou seu estômago.
— Por mim... Ou por um homem?

Ela fechou os olhos e não pôde escapar a verdade.
—Por ambos.
—Podia ter tomado outro homem hoje. A um lacaio. A Étienne.

As pálpebras dela se abriram de repente:
—Jamais faria isso.
—Mas faz comigo.
—Não é o mesmo.
—Não, não o é. Minha palavra favorita para isto sabe qual... É? - Ele
pressionou mais forte, os dedos de ambos contra a carne estirada ao redor de
seu membro, como se procurasse entrar ao lado desta.

Ela se concentrou no escorregadio calor externo no lugar que fundia sua
coluna vertebral com o peito dele.
— Qual?
—O hacene, a formosa. Mas é o ladid, a deliciosa, a vagina mais maravilhosa
de todas. O prazer que dá se compara com aquele que sentem as feras e aves
de rapina. Um prazer pelo qual se combatem batalhas sangrentas. O Sheik
escreve que uma mulher que possui tal vulva dará ao homem uma
antecipação do paraíso que lhe espera. Dê-me uma antecipação do paraíso,
Taliba. Não há nada errado em se sentir como um animal. Incline-se e
compartilhemos o mesmo prazer de que gozam uma ovelha e um carneiro.

Elizabeth se inclinou... E se aferrou a colcha de cetim com as duas mãos
para manter o equilíbrio quando o corpo dele investiu contra o dela.

Uma mulher não era capaz de tomar um homem tão profundamente,
pensou confusa. De repente, uma ardência quente curvou todas suas costas e
as mãos ásperas que sustentavam seus quadris deslizaram para baixo, ao
redor dela, uma para cavar contra seu ventre enquanto a outra deslizava
debaixo de suas pernas, tocava-a e esfregava enquanto ela se esforçava por
tomá-lo mais profundo, mais duro. “Por favor, me dê mais. Por favor, não se
detenha...” Suas súplicas interiores ressoaram no dormitório.

286

—Mantenha os quadris inclinados para mim, Taliba. —Ele pressionou
entrando e saindo, colocando-a, dirigindo-a, moldando sua carne ao redor da
dela. - Não fique tensa. Relaxe. Tome, Elizabeth. Geme para mim. Faça-me
saber que me deseja. Tome. Assim. Mais profundo. Sim. Deus. Sim...

Dentes afiados afundaram no ombro dela. Recordou, de maneira
incoerente, quando dizia que o Sheik não propiciava o canibalismo e logo
não soube nada mais. Convertera-se no animal que sempre tinha temido ser,
gemendo, soluçando e implorando, perdida em seu prazer, no prazer dele, no
prazer de ambos, a selvagem beleza que ambos criavam, carne contra carne,
fôlego com fôlego, pulsar com pulsar. Quando seu orgasmo rasgou seu
corpo, não soube quem tinha gritado, nem de quem era o prazer que tinha
explodido dentro de seu corpo em ondas palpitantes de plenitude.

Elizabeth e Ramiel. Ramiel e Elizabeth.
Deixou-se cair sob o peso do corpo de Ramiel e ficou estendida durante
segundos longos, saboreando a sensação etérea dele pressionando-a contra a
colcha de frio cetim. Seus corpos palpitavam em união, por dentro e por fora.
Uma poça de esperma quente os banhou.
—Quero champanhe. - Murmurou ela.
Ramiel grunhiu. Era um som tão puramente masculino que ela sorriu. O
sorriso se tornou instantaneamente numa corrente de gratidão. Tinha-lhe dado
tanto.
—Quero te banhar nele.
A carne branda dentro dela teve um espasmo Os dedos dele se
apertaram convulsivamente sobre seu estômago e seu púbis.
—E logo quero te secar com minha língua. - Seu membro enterrado dentro
dela deixou de estar brando.
—E logo quero que ejacule dentro de minha boca para poder provar seu
prazer.

****
Ramiel olhou para Elizabeth.
Seu rosto estava ruborizado de saciedade e sono. Seus cílios estavam
molhados pelas lágrimas, o suor e o champanhe. Suave, reticente, levantou o
lençol de seda sobre seus seios nus, até seu pescoço. Ela suspirou e girou para
sua mão. O peito de Ramiel se contraiu. Não deixaria que Edward Petre
voltasse a lhe fazer mal.

287

Rápida e silenciosamente, vestiu-a com cuidado para não despertá-la. Ao
apagar a chama do abajur de azeite, não pôde resistir descer sobre ela e
prová-la Ela abriu os lábios inconscientemente. Com pesar, tornou-se atrás.

Havia outro nome que não havia lhe ensinado durante sua lição.
“eltsequil, a vulva de uma mulher que se cansa de seu homem”. Elizabeth
não se cansaria dele. Alá e Deus sabiam que ele jamais se cansaria dela!

A noite nebulosa era fria depois do calor do corpo de Elizabeth. O Big
Ben ressoava sobre os telhados. Era uma hora da madrugada. As sessões do
Parlamento duravam até as duas. Ramiel se moveu com sigilo na escuridão,
assobiou agudamente quando um carro de aluguel se aproximou dele.
Deteve-o.
— Aonde vamos, patrão?
—Ao edifício do Parlamento.

O carro cheirava a genebra e almíscar. Elizabeth tinha cheirado a
laranja e ao desejo quente de uma mulher. No dia anterior tinha vindo a ele
cheirando gás e horror.

O chofer conduziu com destreza Através das nebulosas ruas londrinas.
Quando o carro se deteve, Ramiel saltou fora e pagou a viagem.
—Obrigado, senhor. —O condutor snabolsou a generosa gorjeta.
—Haverá mais dinheiro se ocultar o carro e me esperar. Devo me encontrar
com alguém.
—Sairá caro.

Ramiel sorriu sombrio:
—Valerá a pena.

Esperou no exterior do edifício do Parlamento, com o chapéu para
baixo e embuçado no lenço de lã. Doíam-lhe prazerosamente as costas, as
coxas e as pantorrilhas, lhe recordando momentos mais agradáveis. Elizabeth
lhe tinha agradado com três orgasmos e ele tinha perdido a conta da
quantidade que tinha dado a ela. Um estranho sabor persistia em sua língua,
uma combinação da doçura dela, da salobridade dele e do champanhe
borbulhante.

Observou vagamente as carruagens alinhadas na rua e se perguntou se
alguma vez voltaria a provar champanhe sem ficar imediata e dolorosamente
duro. O pangaré do chofer, fora do alcance da luz, relinchou brandamente.
Imediatamente, as portas do Parlamento se abriram e começaram a sair
homens. Alguns falando brincadeiras, outros com trajes de ornamento.

288

Ramiel procurou entre a multidão... Ali. Edward Petre falava e ria com
um grupo de membros do Parlamento. Com o corpo tenso e preparado para a
ação, Ramiel esperou o momento adequado.
Animada, a discussão se interrompia à medida que cada homem procurava
uma carruagem, fosse só ou acompanhado. Ramiel se moveu com rapidez.
Segurou o braço de Edward Petre justo quando se estava pondo a cartola.
—Uraniano, Petre. —A voz de Ramiel era apagada, mas nítida através do
lenço. - Venha comigo agora ou todos os que estão aqui se inteirarão logo de
suas pequenas distrações. Embora esteja a par de que alguns deles
compartilhem suas inclinações, não lhe apoiarão quando o público tiver
conhecimento disso.

O rosto de Edward Petre se voltou de um branco pastoso à luz dos
abajures de gás. Sua respiração, uma rajada de vapor prateado, perfurou o ar.
—Tire as mãos de cima de mim.
—Em seguida. Espera-nos um carro de aluguel. Você e eu iremos em sua
casa para conversar um momento. Ou posso matá-lo e jogá-lo no Tâmisa.
Dado que isto último me simplificaria as coisas, sugiro-lhe que feche a boca e
venha comigo. Agora.
—Você não se atreveria. Alguém me está esperando.
—Atrevo-me, sim. Fui banido da Arábia por matar meu meio-irmão.
Asseguro-lhe, Petre, que me atreverei.

Um temor animal alagou os olhos castanhos de Petre.
—Não faria. Está se deitando com minha esposa. Nem sequer ela iria querer
um homem que tivesse matado o pai de seus filhos.

Um sorriso cínico torceu a boca de Ramiel.
—Ao melhor a surpreenderia. De qualquer modo, você estaria morto. Livre
de preocupações terrestres. Vamos?

Petre não seguiu protestando. Ramiel o guiou para o carro, enterrando
seus dedos na lã de sua jaqueta e deu ao chofer a direção que devia dirigir.
Uma opaca luz amarela penetrava pelas sujas janelas da carruagem. O aroma
sufocante da colônia de Petre e do azeite de macasar que usavam os europeus
preponderava sobre o resto dos aromas.
—Elizabeth se cansará de você. —A voz do ministro da Economia e Fazenda
era assombrosamente tranqüila. - E logo voltará para mim.

Ramiel lutou por manter a raia um perigoso estalo de fúria. Queria
matá-lo.
—Com calma, Petre. Falaremos quando chegarmos em sua casa.

289

— Tem medo do escândalo? — Zombou Petre.
Ramiel contemplou o brilho das luzes sobre o rio.

—Não. O Tâmisa está muito perto. Temo cair na tentação.
O resto da viagem transcorreu em tenso silêncio. Petre estava furioso,

mas era um homem ardiloso. Tinha medo que o Sheik bastardo que tinha
matado seu meio-irmão poderia fazer a um homem que o mantivesse afastado
de sua mulher. E com razão.

Enquanto Ramiel pagava ao chofer, Petre procurou a chave de sua casa,
esperando, sem dúvida, poder entrar correndo e deixar fora o Sheik Bastardo.

Com tranqüilidade, Ramiel pegou a chave da mão enluvada de Petre e a
inseriu na fechadura. Mordazmente inclinou sua cabeça:
—depois de você.

Os criados tinham deixado um abajur de gás aceso. Uma cortesia
perigosa, tendo em conta o que tinha acontecido a Elizabeth.

Não havia nenhum vestígio de Elizabeth e de sua maravilhosa paixão na
casa. Não havia mesas em cada canto e nem adornos em cada superfície, mas
mesmo assim era um típico lar Vitoriano, com seu empapelado monótono e
seus clássicos móveis cobertos de tecidos para evitar que a visão de seus pés
excitasse um homem.

Petre caminhou rígido pelo vestíbulo de paredes empapeladas com
flores e abriu com força uma porta. Ramiel o seguiu. Edward acendeu um
abajur de gás com mais delicadeza, que a que tinha utilizado para abrir a
porta de entrada. Por outra parte, era muito consciente dos perigos do gás.

Ramiel se encontrou numa estadia masculina, sobriamente
conservadora. Uma pesada mesa de nogueira ocupava um extremo, enquanto
que um escritório de uso Carlton destacava-se no meio da sala.

Em silêncio, Ramiel fechou a porta. Petre se voltou, encarando-o. Sua
alta cartola negra se curvava sobre suas orelhas e ele apertou a fortificação
com manga de ouro em sua mão direita.

Atirando seu próprio chapéu de feltro sobre uma mesa, Ramiel
afrouxou o lenço de seu pescoço.

De repente, o temor superou a raiva do Petre. Deixando cair a
fortificação, correu como uma flecha para o outro lado da mesa.
Ramiel correu atrás dele. Fechou com força a gaveta sobre a mão do Petre,
que tentava desesperado apoderar da arma que havia dentro.

290

— Por que não disparou em Elizabeth? —Gritou. – Teria sido mais efetivo.
Os criados são propensos a notar o gás. Como o são também a reconhecer
venenos.
—Não sei do que me fala.

Ramiel empurrou a gaveta ainda mais. Teve a satisfação de ver como a
escassa cor que do rosto do marido de Elizabeth escapava por completo.
—Me diga, Petre. Por que um político pensaria que o assassinato é menos
prejudicial para sua carreira que um divórcio?

O bigode do Petre tremeu:
—Insisto, não sei do que me fala.
—Você tentou matar Elizabeth asfixiando-a com gás. E logo tentou matar
seus filhos, com mosca da Espanha.

Petre conhecia a cantárida. O conhecimento era patente em seus olhos.
—Não tive nada a ver com que seu abajur se apagasse. Ela tentou se suicidar.
—Que conveniente para você, especialmente tendo em conta que ela estava a
ponto de lhe deixar.
—Está me destroçando a mão.
—Muito bem. Talvez a próxima vez pense duas vezes antes de tentar fazer
mal a Elizabeth ou a seus filhos. Mas me intrigou. Por que tentaria matar sua
esposa quando era muito mais fácil mandá-la a um manicômio? Deveria
saber que eu jamais teria perdoado sua morte.
—Pelo amor de Deus, nunca quis lhe fazer mal. —Petre aferrou com a mão
esquerda a mão de Ramiel tentando arrancá-la da gaveta. Mas Ramiel era
muito mais forte.
—Elizabeth não teve a coragem de enfrentar a mim em sua casa. Não me
aproximei de Eton nem dos meninos. Solte-me!

Ramiel segurou a mão esquerda de Edward, pressionando mais forte
sobre a gaveta.
— Quanta vontade tem de que o solte, Petre? Tantas como as que tinha
Elizabeth de obter o divórcio?

O suor jorrava pelo rosto pálido do Petre, gotejando de suas
sobrancelhas e de seu bigode encerado.
—Concederei o divórcio aquela puta. Mas me solte!
—Não é suficiente. Não permitirei que difame seu nome por todo Londres.
Além disso, outorgará-lhe a custódia de seus filhos.
—Ela cometeu adultério.

291

— E você o que tem feito, Petre? Ofereceu seu próprio filho para se
prostituir. Asseguro-lhe que os tribunais estarão mais interessados em sua
conduta que na dela.

Petre deixou de lutar.
—Carece de provas.
—Estive em Eton. Tenho todas as provas que necessito.
—Me solte. —A voz do Petre era opaca.
—Faça com que mereça minha pena.
—Darei-lhe o divórcio. Em particular. Ela pode ficar com seus dois filhos.

Lentamente, Ramiel soltou a gaveta, tirando rapidamente a arma dos
débeis dedos de Petre. O sangue jorrava pela parte de atrás de sua mão. Seus
dedos já tinham começado a inflamar.
—Nem você nem Andrew Walters se aproximarão de Elizabeth ou de seus
filhos novamente.

Petre tocou a mão.
—Se chegar... Ou seja, se algo sobre minhas... Pequenas distrações, como
você as chama... Assegurarei-me de que Elizabeth perca a custódia de
Richard e Phillip.

Outro segredo. Outro pacto.
Petre tinha o poder de tirar os filhos de Elizabeth. Ramiel tinha o poder
de evitá-lo. Mas não mediante a morte...
Pelo bem de Elizabeth, não mataria o pai de seus filhos. E
possivelmente também pelo seu próprio. Porque não estaria matando Edward
Petre. Estaria matando seu meio-irmão novamente.
Deslizando a arma no bolso de sua jaqueta, afastou-se. De um passado
repulsivo. De um presente repulsivo. Tinha um futuro por diante e não o
colocaria em perigo.
—Você tinha razão. É um bastardo ardiloso. Internar Elizabeth era a solução
perfeita. Na manhã que seu abajur se apagou fui obter uma ordem de
internamento por loucura. Não tinha necessidade de asfixiá-la. Nem
tampouco tentei matar meus dois filhos. Não necessitei da mosca da Espanha
desde que me deitei com minha esposa, sua puta.
Petre não era tão ardiloso como devia ter sido. Um homem não
denegreria a mulher de um bastardo que era o filho de um Sheik.
Especialmente não evocava intencionalmente imagens da mulher deitada com
outro homem.

292

Ramiel esteve muito perto de esquecer seu propósito de não matar A
Petre.
—Então contratou alguém para fazê-lo. Como contratou alguém para
ameaçá-la na quinta-feira passada de noite quando deu um discurso numa
reunião. - Disse Ramiel tenso, plenamente consciente de que aquela solução
não explicava o envenenamento com cantárida, mas que Petre tivesse
colocado um espião em sua casa. Mas a diferença do detetive particular que
tinha pagado ao lacaio dos Petre para que deixasse de trabalhar e ocupar
assim seu lugar, não tinha criados novos na casa de Ramiel.
—Sou uma pessoa conhecida. Não contrataria alguém para assassinar ou
ameaçar minha esposa por temor a que falassem. —Toda a arrogância do
Petre havia voltado. - Havia névoa na quinta-feira passada de noite. Elizabeth
se atrasou. Avisei ao delegado por acaso, no caso de que lhe tivesse ocorrido
algum acidente e ele se referisse para mim como um marido carinhoso e
preocupado.

Ramiel estirou a mão para alcançar seu chapéu sobre a mesa junto à
porta. Notou que sua mão tremia.
—Então foi Andrew Walters que concebeu tudo.
—Então ela lhe contou o lamentável acesso de cólera de Andrew. Ele teria
tão pouca inclinação a matá-la como eu. Não enquanto existisse um método
mais seguro para controlá-la. Andrew estava comigo a manhã que assinei a
ordem de demência.

Ramiel não se voltou.
—Então, quem sugere que tentou matá-la?
—Talvez Elizabeth não seja a mulher que você acredita que é, Safyre. Talvez
tentou se suicidar. E ao não obtê-lo, tentou matar seus filhos em lugar de
enfrentá-los num julgamento de divórcio.
—E talvez você esteja mentindo Petre, porque não quer lhes dar de comer aos
peixes do Tâmisa.
—Talvez. - Assentiu mofando, Petre.

Mas não estava mentindo. De repente, Ramiel teve a certeza quase
absoluta de que Edward Petre não tinha tentado matar Elizabeth. Um político
não matava quando existiam vias menos arriscadas. Ele teria confinado
Elizabeth num manicômio sem pestanejar, mas um assassinato seria
investigado.

L'na. Quem tinha tentado matá-la... Se não tinham sido nem seu marido
nem seu pai?

293

Ramiel abriu a porta e a fechou brandamente atrás de si para evitar dar a
satisfação de Petre ver que lhe tinha tirado limpamente o controle de suas
mãos. Um homem alto, envolto em sombras, esperava-o no vestíbulo
tenuemente iluminado. Ramiel apalpou a arma em seu bolso.
—Sou eu. Turnsley.

O detetive particular que Muhamed tinha contratado. Que, segundo
Elizabeth, deitava com sua criada.
— O que quer?
—Conversar.

Ramiel não queria falar. Estava atormentado por um desejo
incontrolável de voltar junto para junto de Elizabeth para assegurar de que
estava a salvo. Não a perderia.
—Apresentou um relatório a Muhamed ontem. – Ele disse bruscamente. - E o
relatório era... Que não sabia quem tinha apagado o abajur de gás.
—Informei sobre o que sabia naquele momento. - Respondeu Turnsley sem
alterar a voz. - Mas há alguém que sabe mais que eu. E está disposta a contar
algumas coisas.

CAPÍTULO XXIV

Elizabeth observou o rosto adormecido de Ramiel. O pêlo escuro da
barba por fazer formava uma sombra em seu queixo. Suos cílios quase
femininas suavizavam a esculpida dureza de seus rasgos.

Ele a tinha forçado a reconhecer o lado escuro do desejo e lhe tinha
mostrado que não era uma pessoa imoral, mas simplesmente uma mulher. A
união entre ambos tinha sido primitiva e física. Havia destroçado para sempre
suas convicções sobre o que estava bem e o que estava mal.

Um calor abrasador saiu dos lençóis, envolvendo sua coxa.
Imediatamente, o cenho franzido no rosto de Ramiel se afrouxou. Suspirou.

Elizabeth apertou a garganta.
Não viveria com temor durante o resto de sua vida. Não podia suportar
a fria e estéril vida que lhe havia tocado como esposa respeitável. Se Edward
não lhe concedesse o divórcio com a custódia de seus dois filhos, teria que
encontrar uma maneira de forçá-lo a dar seu braço a torcer. A lei, conforme
lhe tinha informado ele, permitia a mulher pedir o divórcio a seu marido se

294

ele possuía uma amante ou a maltratava fisicamente. O intento de assassinato
podia qualificar de abuso, especialmente quando o homem em questão
também tinha tentado matar seus próprios filhos. Tudo o que tinha a fazer
agora era apresentar sua querida ou amante, como Edward chamava aquela
mulher, membro da irmandade dos Uranianos.

Por um segundo considerou despertar Ramiel. Ele sabia quem era a
amante de Edward.

Mas ele havia protegido seus filhos. Não podia lhe pedir mais. Talvez
estivesse certo. Quando se sentisse preparada seria capaz de compreender a
verdade por si mesmo.

Lenta e cuidadosamente, afrouxou os longos e grossos dedos que tão
perfeitamente encaixavam em seu corpo, tanto por fora como por dentro.
Ramiel resmungou protestando entre sonhos. Uma avalanche de prazeres
evocados derramou sobre seu corpo. Ramiel tinha gritado quando ela o tinha
tomado em sua boca e o sugara como ele tinha feito em seus seios, até que
seu corpo inteiro ficara tenso e ele se aferrou a sua cabeça para sustentá-la,
enquanto se contraía num espasmo de êxtase. “Bahebbik”. Ela havia repetido
com uma voz extranhamente rouca quando ela fez com que sua língua ao
redor da coroa que se desinflava procurando um pouco mais do fluido
salgado que ela tinha disparado no interior de sua garganta.

Elizabeth lambeu os lábios, saboreando-o, saboreando a si mesma,
saboreando a essência combinada de ambos. Acima daquele sabor salgado e
glandular estava a borbulhante efervescência do champanhe.

Alguns músculos que até então não conhecia se manifestaram
asperamente com o impacto do tapete frio de lã e o chão duro de madeira.
Perguntou se o corpo de um homem também doía e palpitava depois de uma
noite de sexo intenso.

Sua bolsa descansava sobre a mesinha ao lado da caixa gravada com o
retrato da rainha Vitória. Em silêncio, decidida e com a bolsa na mão,
atravessou descalça o tapete oriental para o armário. As portas estavam
fechadas. Havia umas caixas amontoadas entre a poltrona de veludo
vermelho e o enorme armário de mogno. Não estavam ali antes. Teria entrado
Muhamed no dormitório de Ramiel enquanto dormiam?

Imediatamente, surpreendeu-se, pelo sangue quente que se acumulava
em seu rosto. Muhamed tinha visto seu corpo enquanto ela dormia
agasalhada sob os lençóis. Além disso, tinha-lhe salvado a vida, segundo a
condessa, fazendo tomar um remédio. Era ridículo se envergonhar porque ele

295

teria visto dormindo com Ramiel, quando havia sustenido sua cabeça sobre
um urinol.

Segurou com rapidez a saia azul real e o sutiã que Ramiel tinha
comprado para ela... Oh, não. Não havia roupa interior exceto as anquinhas
de renda... Ah, ali estavam seus sapatos. Caminhou nas pontas dos pés para o
quarto de banho. Alguns minutos mais tarde, depois de escovar os dentes, se
lavar e vestir apressadamente abriu sigilosamente a porta.

Ramiel seguia dormindo. Sua respiração era um suave barulho no turvo
silêncio. Sorrindo outra vez, perguntou se alguma vez roncava. Seu sorriso se
transformou numa careta de preocupação. Roncaria ela alguma vez?

Fechando brandamente a porta do dormitório atrás dela, Elizabeth se
deu conta de que estava morta de fome. Além do jantar ligeiro que tinha
orvalhado com champanhe a primeira noite que tinha passado com Ramiel,
não havia comido muito naqueles dois dias.

Com cautela, desceu a curva escada de mogno com seu brilhante tapete.
Os sapatos de baile não eram feitos para serem usados sem meias. Nem
anquinhas para estar em contato com a pele nua. Tampouco o sutiã e a saia
amplamente forrados. A carne sensível entre suas pernas palpitava lhe dando
a razão.

Colocando um pé no patamar da escada, girou em direção a sala de café
da manhã. Um redemoinho de túnicas brancas saiu da parte traseira de um
vaso do tamanho de um homem.

Refreando um grito, olhou fixamente a enigmáticos olhos negros.
—Sabah o kheer, Muhamed. Eu gostaria de tomar o café da manhã, por
favor.

O criado resistiu:
— Onde está o Ibn?
—Dormindo. —Elizabeth elevou o queixo em sinal de rebeldia. - Não desejo
que o incomodem. Ele teve uma noite exaustiva.

Ela fechou os olhos ao registrar o significado real de suas palavras em
sua cabeça. O Ibn tinha tido uma noite exaustiva porque a tinha feito alcançar
o orgasmo mais de uma dúzia de vezes, para aliviar o ardor do veneno. Um
efeito colateral do qual Muhamed devia estar a par.
—Me acompanhe. —A voz de Muhamed era tão inexpressiva como tinha
sido no dia anterior. - Eu o servirei.

296

Elizabeth abriu os olhos e fixou o olhar nas dobras da túnica branca que

rodeavam seu pescoço desprovido de rugas.
—Tampouco sei onde está minha roupa de baixo. Talvez a tenham lavado. Se
tiver a gentileza de... Olhar onde se encontra.
—Muito bem. Siga-me ao salão do café da manhã.

Ela não teve a coragem de levantar a cabeça e ver se Muhamed estava
tão envergonhado como ela. A saleta brilhava com os raios de sol refletidos

sobre as janelas reluzentes e a madeira polida. Toucinho, ovos, arenque
defumado, rosbife, cogumelos grelhados, tomates fritos, rodelas de frutas e

pãozinhos recém feitos perfumavam o ar. Elizabeth deixou que Muhamed a

sentasse a mesa redonda para poder contemplar pelas janelas um verde
jardim com arbustos de formas exóticas.
— O que gostaria de tomar, senhora Petre? Sob o efeito de que seu apetite
agora, como havia sido a noite anterior, era pura gulodice: —De tudo, por
favor.

Ouvindo com avidez o ruído metálico dos pratos e utensílios atrás dela,

serve uma xícara de café. Apenas o teve aproximado dos lábios, dois pratos
transbordantes de comida foram depositados frente a ela.
—Confio em que isto a manterá entretida enquanto eu me ocupo de sua roupa

intima.
Elizabeth conteve uma nova onda de vergonha. —Sim, obrigado.

Ele se virou para sair, criando uma súbita brisa.
—Muhamed.
-Sim?

O café era negro como o carvão. Um grão flutuava na superfície. Como

um escaravelho moído. Apoiou a xícara sobre a mesa.
—Obrigado por me salvar a vida ontem.
—Alguns dirão que fui eu quem lhe dei o veneno.

Um frio tremor lhe percorreu a coluna. Sim, ela tinha suspeitado que ele
podia ser um espião de Edward. Tampouco duvidava agora de que conhecia a

cantárida e tinha tido a oportunidade de administrar-lhe E, entretanto...
—Se tivesse envenenado a cesta, não acredito que tivesse me salvado. Não te
acredito capaz de fazer mal a crianças inocentes.

Mas falou ao vazio.

Quando o árabe que não era voltou, ela tinha terminado um dos pratos e
começado o seguinte.
—Não tomou o café.

297

—Não. —Baixou o garfo e a faca. - Está... Negro.
Uma onda de náusea subiu em sua garganta. Os escaravelhos triturados

ramgiam como nozes.
O ondular de túnicas as suas costas a advertiu da proximidade dos

criados. De repente, uma mão apareceu em frente seu rosto. Muhamed verteu
nata no café.
—Beba. Necessita de líquido.

Tal professor, tal criado, pensou ressentidamente. Ramiel tinha agido
igual a Muhamed, quando havia dito que bebesse o copo de água.

Recordando o resultado de sua rebelião, bebeu.
Muhamed voltou a encher a xícara com café e nata.
—Sua roupa intima está na biblioteca. Pode terminar de se vestir quando
acabar o café da manhã.
—Obrigado. —Elizabeth brincou com a asa da xícara. Era azul celeste, com
beirada prateada. - Por favor, ordene que tragam uma carruagem dentro de
uma hora.
—Você não sairá da casa até que o Ibn se levante.
A resposta do mordomo não era inesperada.
—Muito bem. - Mentiu ela. E empurrou para trás o segundo prato de comida
e atirou o guardanapo de linho sobre a mesa. - Não posso comer mais.
Obrigado por me servir. O café da manhã estava delicioso.
Elizabeth permitiu a Muhamed que lhe afastasse a cadeira e a
acompanhasse até a biblioteca. A roupa interior de seda e de fino linho estava
dobrada pulcramente sobre o maciça mesa de mogno aonde Ramiel lhe tinha
dado as cinco aulas. Mas não a sexta.
Encolheu-lhe o estômago através da grossa saia, recordando-se... Tudo.
Ele havia sentido a contração de seu ventre, dentro e fora.
O ouro cintilava na parede de livros. Em todos os lados se encontrava a
beleza da Arábia. O aparador com incrustações de madrepérola. Os painéis
de seda sobre as paredes. Os enormes ventanales com as cortinas de seda
amarela e a barra de bronze curva das cortinas. Onde Edward e seu pai
tinham ameaçado matá-la era escuro e austero. Não possuía nenhum tipo de
beleza nem lembrança prazeirosa.
Rapidamente, Elizabeth colocou os calções transparentes e as anáguas
de linón. Não tinha intenção de se despir para colocar a regata. Amassou a
tênue encharca de seda e a meteu na última gaveta da mesa.

298

Uma onda estranha de ternura a embargou ao ver um livro de couro de
contabilidade. Recordou-se que apesar de seu aspecto e origem exóticos,
Ramiel não era diferente de qualquer outro homem inglês. Comia. Dormia.
Era responsável pelas tarefas cotidianas que traziam consigo a supervisão de
um lar e a gestão de suas finanças.

Sua cadeira era de madeira, com respaldo reclinável e braços que se
ativaram quando se sentou... Segurou na beirada da mesa para evitar sair
disparada para a parede. Com pressa, embainhou as meias de seda negras.

Muhamed a esperava a porta da biblioteca.
Seu plano não ia funcionar se o criado a seguia até seu mínimo
movimento.
—Esta é uma casa grande, Muhamed. Ontem não pude explorá-la inteira.
Elizabeth passou ao lado do criado. Ele a seguiu.
Ela se deteve bruscamente.
—Muhamed. Não sou uma menina. Não tenha medo, não roubarei nada das
gavetas. Não precisa me seguir a todas partes.
—Não voltarei a falhar ao Ibn.
—Não lhe falhou ontem. Em lugar de se culpar pelo acontecido, deveria estar
agradecido. Se eu não tivesse ingerido o veneno, teriam meus filhos. E você
não teria estado lá para salvá-los. Além disso, por causa desse incidente, sei o
que devo esperar de meu marido. Não deixarei que me faça mal e nem
tampouco a meus filhos. Por favor, me conceda a gentileza de me deixar a
sós para pensar.
—Como desejar.
Elizabeth respirou aliviada. Fora do alcance de Muhamed, explorou o
terceiro andar e os aposentos para convidados. Quando se assegurou de que
ele já não a seguia, se escauliu pelas escadas de serviço.
Muhamed não apareceu atrás de um vaso. Nem quando abriu a porta do
guarda-roupa do vestíbulo, pegou sua capa, chapéu e luvas e fugiu da casa. A
apreensão roía suas vísceras. Sentia que estava traindo Ramiel ao sair às
escondidas. Mas tinha a obrigação de proteger a si mesma e a seus filhos.
Andou durante muito tempo. Os sapatos de baile não eram feitos para
aquelas caminhadas. Machucavam-lhe os pés. Seu primeiro impulso, quando
viu um carro de aluguel, foi voltar correndo junto a Ramiel, que, sem dúvida,
continuaria dormindo. Queria se meter na cama e aconchegar-se contra o
calor de seu corpo. Quando despertasse, podiam abordar a sétima lição.

299

Não queria voltar para lugar onde um homem tinha ameaçado mata-la e
outro tinha tentado levar a cabo tal ameaça.

Respirou fundo, endireitando os ombros. Não era uma pessoa covarde.
Levantando a mão, deu um passo na calçada.

O carro de aluguel se deteve:
— Aonde, madame?

Elizabeth lhe deu a direção de Edward.
A viagem foi muito curta. Quando o carro parou, seu corpo estava
suado. Sem o espartilho e nenhuma regata para absorver a umidade, esta
escorria entre seus seios.
Saiu e pagou o chofer... Enquanto lhe invadia onda de temor.
—Por favor, espere. Vou necessitar de um transporte de volta. Se por algum
motivo não retornar em trinta minutos, quero que vá a casa de Lorde Safyre e
lhe diga onde estou. —Deu-lhe a direção de Ramiel e uma moeda. – Faria
isto?
O chofer tocou ligeiramente seu chapéu. Sabia que não fazer perguntas
quando havia dinheiro no meio:
—Sim, madame.
Com as mãos trêmulas e o mesmo tremor percorrendo todo seu corpo,
aproximou-se do degrau de entrada e tocou o sino, de recente instalação. Um
moderno timbre que substituía a antiquada aldaba.
Ninguém respondeu a sua chamada.
As sextas-feiras os criados tinham meio-dia livre a partir do almoço.
Mas ainda não era essa a hora. Alguém tinha que estar em casa.
Impulsivamente, Elizabeth colocou a mão em sua bolsa. A chave da
casa estava ali, como sempre. Seus dedos, notou sombria, tremiam. Teve que
usar as duas mãos para colocar a chave na fechadura.
Abriu uma fresta da porta, colocando a cabeça dentro:
— Beadles?
O nome Beadles ressoou oco no vestíbulo.
Respirando fundo, empurrou a porta até que ficou totalmente aberta e
entrou. O vestíbulo estava sombriamente escuro em contraste com a
luminosidade do sol exterior.
Cada fibra de seu corpo lhe advertia que fugisse. Ao mesmo tempo, o
sentido comum burlava de sua covardia.
Beadles podia observá-la, mas não lhe faria mal. Precisava ver Emma.
A jovem sabia quem tinha apagado o abajur de gás. Era provável que também

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