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Olhares paralelos sobre a evolução da sociedade e da arquitetura

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Published by carolina.andrade, 2019-10-03 12:32:39

Influências

Olhares paralelos sobre a evolução da sociedade e da arquitetura

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A grande vedete dos revestimentos foi a fórmica, que já existia há algum tempo no mercado, mas passou a ser aplicada de forma mais generalizada nas cozinhas, banheiros e até nos dormitórios. Dependendo da ousadia do cliente, a fórmica vinha em branco, em tons pastel ou em cores fortes. As paredes eram, em geral, brancas, remetendo aos reluzentes caiados gregos. Alguns móveis fundiam-se à arquitetura: sofás, bancos e superfícies de apoio em alvenaria, sobre a qual dispunham-se as almofadas na medida certa: nem muito casual (não era o caso de abraçar inteiramente o mundo hippie) nem muito cuidado (muito menos reproduzir a estética burguesa da casa da mamãe).
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Esses exercícios de criatividade, que aconte- ciam paralelamente às construções dos neoclás- sicos, acabavam servindo de laboratório para os arquitetos e engenheiros da empresa, e foram aplicados em alguns neoclássicos, como as va- randas laterais desencontradas do Dom Luís de
Orleans e Bragança, na Alameda Franca, ou as largas varandas que renovaram as fachadas neo- clássicas de três dos edifícios erguidos na Rua Cristóvão Diniz, e que quebraram com o padrão de simetria paralela à rua da arquitetura fran- cesa, mas não perderam sua essência.


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Entre neoclássicos e mediterrâneos, o edifício Barão de Capanema joga com os volumes dos terraços desencontrados, uma proposta mais ousada da construtora


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Apesar da fachada mediterrânea renovada pelo terraço lateral, o interior do hall do Golden Gate é clássico


Até a década de 1960, planta dentro de casa significava um vaso de flor no centro da mesa, no máximo. Na década de 1970 caiu por terra o mito de que o gás carbônico exalado pelas plantas à noite era prejudicial à saúde. As samambaias de metro, as avencas, as costelas-de-adão conquistaram as salas e os jardins de inverno, e o verde não deixou mais o interior dos apartamentos.
O sucesso da empresa era tamanho que ela optou por expandir seus negócios para outros bairros, outras cidades, como Rio de Janeiro e Brasília, que vivia uma época de expansão fan- tástica – a primeira incorporação do Distrito Federal foi feita pela Lindenberg. E também di- versificou seus projetos construindo edifícios comerciais, hotéis e obras industriais para ter- ceiros, criando um departamento especializado
para eles dentro da empresa. Em meados da década a quantidade de edifícios residenciais e comerciais era quase a mesma. Apenas na Ave- nida Paulista, o centro financeiro da cidade, cinco dos sete bancos que estavam ali instala- dos tinham a assinatura Lindenberg. E passavam a imagem de solidez e tradição, como o pórtico do Banco Mercantil, por exemplo, que a sede de um banco deve ter.
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No edifício Paço de Sintra o primeiro andar é diferente dos demais, com gradil no lugar das colunas da varanda


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Mármore no piso empresta imponência ao corredor que termina com portão de ferro trabalhado no edifício Paço de Sintra


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Típico edifício neoclássico, o Dom Eugenio parece estar em Paris


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O estilo mediterrâneo saiu de moda em poucos anos. Muita gente considera o mediterrâneo cafo- na. Mas é importante olhar para esses prédios com o olhar da época: consumir uma arquitetura de curvas, que rejeitava um alinhamento mecânico com as ruas ou com os limites dos terrenos era, de certa forma, manifestar-se por uma modernidade não mecânica, pela liberdade possível, pelo não convencional, em uma situação de ditadura ainda forte. Na década de 1970, morar em um edifício mediterrâneo era uma forma de adequar-se ao sistema com uma pontinha de irreverência e liberda- de, só para deixar a dúvida. Dava até para colocar baixinho na vitrola um Chico Buarque, uma Nara Leão. Evidentemente, existiram exemplos bem mais radicais de inconformidade, como a famosa “Casa-Bola”, projetada e construída por Eduardo Longo, em São Paulo – mas ela não precisava ser vendida, o cliente era o próprio arquiteto.
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À frente de seu tempo, a Lindenberg lançou o primeiro flat brasileiro, um novo conceito de morar para pessoas que estavam de passagem pela cidade, que viviam em outras cidades ou estados, mas vinham muito a São Paulo, e para jovens solteiros ou casais. A Lindenberg começava a detectar o surgimento de novos formatos de família. A ideia, hoje mais do que incorporada pelo brasileiro, era simples: um edifício de apar- tamentos pequenos, decorados, e com serviço de hotelaria, restaurante e sala de ginástica.
Instalado nos Jardins, em São Paulo, o primeiro flat Lindenberg estava todo vendido antes mesmo de seu lançamento.
Mesmo que os anos 1970 tenham sido a década de ouro da construtora, os anos politicamente conturbados, a instabilidade da moeda, a queda do petróleo e a retração imobiliária do final da década abalaram a construtora que teve, como todo o País, de apertar um ponto em seu cinto. Frase repetida a cada plano econômico lançado.


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Os terraços laterais do edifício Dom Luís de Orleans e Bragança foram pensados para garantir o sol em todos os andares


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O edifício Paço de Queluz tem algo de singelo


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1980
Uma década estranha
Nunca vamos nos esquecer de Odete Roitman, a vilã da novela Vale Tudo que a Globo exibiu em 1988. Odete era carioca, mas se morasse em São Paulo era bem capaz que escolhesse um
Lindenberg, provavelmente uma das poucas coisas no Brasil que consi- derava estar à sua altura.
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Considerados como os “anos perdidos” pelos economistas brasi- leiros devido à estagnação econômica e à inflação desenfreada, a década de 1980 não teve o glamour dos anos 1960 e nem a eferves- cência dos anos 1970. E foi marcada, principalmente, pelo start da tecnologia a serviço da pessoa física. Foi nesses anos que os primeiros computadores pessoais começaram a ganhar espaço, e que a Apple e a Microsoft iniciaram sua queda de braço. Foram anos conturbados política e economicamente, o que afetou profundamente a indústria da construção, e todo o mercado.
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A cidade segue crescendo em direção ao sul
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Para além da vilã, o sucesso da novela Vale Tudo explicava-se por retratar de frente a crise da sociedade brasileira da época: um cotidiano atravessado por assaltos, arrivismos, contrabandistas, sonegação de impostos, descrença no governo, e principalmente um mundo desorganizado por uma inflação galo- pante. As grandes cidades eram a maior expressão dos problemas enfrentados pelo País. A população favelada de São Paulo, que mal chegava a 1% do total em 1970, explodiu na década de 1980, atingindo mais de 10%.
De forma geral, a escolha das elites e das classes médias foi a de buscar um modo de vida que as pro- tegesse das contradições das cidades. De outra maneira, isso significou a busca por um modo de vida mais motorizado por parte das classes média e alta. Tornou-se cada vez mais comum ver famílias de classe média alta com 3 ou 4 carros na garagem.
A Lindenberg tinha encontrado, na década anterior, uma solução criativa para driblar a inflação descontrolada: o Sistema de Cons- trução a Preço de Custo, ou melhor, uma vez fechado o empreendimento, a cada mês as des- pesas eram rateadas entre todos os proprie- tários, conforme os desembolsos necessários
para aquela obra. Os preços subiam, o dólar subia e as parcelas a serem pagas subiam, mas em compensação o prédio também subia. Era até mesmo uma forma de aplicação financeira e de proteção contra a escalada dos preços, pois o dinheiro desvalorizava, mas as funda- ções, as paredes, o elevador, não.
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Detalhes completam a imponência do Campos Elyseos


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Em um generoso terreno muito arborizado fica o Paço Higienópolis, com pátios floridos e fontes


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Em São Paulo, aumentava o êxodo na direção do Rio Pinheiros, e até mesmo a Avenida Paulista perdia posição em relação à nova centralidade na Avenida Faria Lima. O Iguatemi, que nascera no final dos anos 1960 com cara de galeria, foi crescendo e se consolidando como local do comércio elegante. A década de 1980 foi a da explosão dos shopping centers, com a abertura de vários novos em São Paulo e com a inauguração deles em várias capitais e nas cidades do interior mais ricas, como Campinas e Ribeirão Preto.
O modelo shopping center trazia algumas vantagens claras em relação ao comércio de rua: proteção do sol, do calor e da chuva, a possibilidade de resolver muitas coisas em um só lugar, a segurança, a facilidade de estacionamento em um período de acelerado aumento da motorização. Isso explica a sua multiplicação em tão pouco tempo. Por outro lado, o modelo cobrou o seu preço. Em todas as cidades onde se instalaram shopping centers, o comércio de rua sofria, principalmente as lojas mais elegantes tinham dificuldades em sobreviver fora dos shoppings. Isso significou uma grande popularização do comércio de rua em quase todas as cidades.
Com juros estratosféricos, cada dia perdi- do pelas construtoras era um grande prejuí- zo, e muitas vezes sacrificava-se a qualidade de um projeto e da construção para finalizar uma obra em menor tempo. Com o “Preço de Custo”, a Lindenberg garantia a qualidade da
construção, pois não precisava correr contra o relógio dos juros. Ao contrário: em alguns casos, as obras que andavam mais devagar eram um alívio para os proprietários que podiam di- luir seus desembolsos por períodos mais pro- longados.
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Colocar piscinas em forma de leque ao redor dos edifícios Penthouse e Roof foi desafiador para a construtora


Quem podia buscava afastar-se das regiões mais congestionadas da cidade. Até mesmo a Avenida Pau- lista sentia a crise, perdendo espaço para edifícios mais modernos da Avenida Faria Lima. O transporte coletivo não era uma hipótese para os mais ricos, e os novos apartamentos eram vendidos para abrigar 3 ou 4 vagas nas garagens. O futuro parecia apontar para o outro lado do rio. Foi o período em que começou a verticalização do Morumbi, em São Paulo, e na Barra, no Rio.
Nenhuma cidade sentiu mais do que São Paulo a crise de sua região central. A Rua Augusta, que desde a década de 1960 era o local das lojas chiques, sentiu o baque. É verdade que o poder público teve a sua parcela de culpa. Desde o final da década de 1960 uma série de intervenções selaram o destino da re- gião central como um nó de articulação do transporte metropolitano: o Minhocão, a Praça Roosevelt, um emaranhado de viadutos no Parque Dom Pedro. Foram instalados no Centro grandes terminais de ônibus no Parque Dom Pedro, na Praça da Bandeira, na Praça dos Correios.
Aquela teria sido a época de se investir pesadamente em uma rede de transporte de massa, que liberaria a superfície da cidade de uma parte dos deslocamentos cotidianos e evitaria a degradação de uma série de espaços públicos. Mas por falta de recursos e pela priorização do espaço para os automóveis, isso só aconteceu muito lentamente. Após a inauguração da linha Norte-Sul do Metrô, em 1974, a linha Leste-Oeste foi sendo inaugurada aos poucos, entre 1979 e 1988. As duas linhas em cruz, com bal- deação na Sé, eram muito pouco para uma metrópole que chegava a 1991 com mais de 15 milhões de habitantes. O outro metrô subterrâneo do País, o do Rio, era ainda mais diminuto.
Adolpho ressalta que o lucro não era a principal preocupação da construtora, mas sim a qualidade de sua construção. “Alguns trabalhos deram pre- juízo, tamanho o cuidado com a construção e os
acabamentos”, e da satisfação que sentia em saber que ele oferecia moradia de qualidade para tan- tas famílias. No portfólio da empresa constavam, nessa década, cerca de 400 empreendimentos.
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Seguindo a linha “dois em um”, dois edifícios em um terreno, o Saint Patrick e Saint Louis


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A inflação requeria estratégia: assim que as pessoas recebiam o salário, corriam para o supermercado para fazer as compras do mês, disputando os segundos com as vorazes máquinas remarcadoras de pre- ços. Para dar conta disso, os apartamentos precisavam de espaço para as despensas e os freezers cheios de comida congelada.
Se nas décadas anteriores a prioridade para os grandes apartamentos era a existência de grandes áreas de visitas, na década de 1980 elas mudaram bastante. A busca por segurança e os próprios avanços tecnoló- gicos significaram a procura pela realização de atividades de lazer dentro de casa. Esse lazer era diferente para cada faixa etária: os pais agora podiam ver filmes em videocassete, os filhos jogar com aparelhos como o Atari conectado à TV. Dependendo da idade, as crianças tinham interesses diferentes, e ficava difícil compatibilizar isso tudo com uma só televisão em casa. Dessa forma, cada quarto foi recebendo seus equipamentos, os ambientes foram se multiplicando e também reduzindo de tamanho. Sai de cena a biblioteca dando lugar para a sala de TV.
A década de 1980 foi o auge da demanda pelo neoclássico. A Lindenberg ergueu novos pro- jetos residenciais e entregou dezenas de edi- fícios que tinham sido iniciados no final dos anos 1970. Em 1983, a construtora lançou com toda a pompa e circunstância o Edifício Cam- pos Elyseos, na Rua Padre João Manoel, em um terreno de quatro mil metros quadrados, tal- vez uma das últimas áreas com essas proporções na região dos Jardins. A estrutura de concre- to armado do edifício tinha sido calculada
prevendo possíveis alterações na planta, e a própria construtora oferecia sugestões dife- renciadas para banheiros, copas e cozinhas, para que o apartamento fosse perfeito para o jeito de viver do morador. O edifício, um neoclássico com apartamentos de mais de mil metros quadrados de área útil, estava incrus- tado como uma joia em um exuberante jardim de 3.400 metros quadrados. Desde a sua inau- guração, a Lindenberg foi defensora do verde, e cercava suas obras com jardins.
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As formas abauladas do edifício Quinta da Boa Vista atualizam o estilo neoclássico


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Não foram só as plantas internas dos apartamentos que sofreram transformações. A busca por segurança significou também a expansão das áreas de lazer e esportes nos prédios, o condomínio começou a tomar o lugar do clube, e vão aparecendo cada vez mais piscinas, saunas, salas de ginástica.
Olhando para os apartamentos da década de 1980 com nossos olhos atuais, percebemos alguns passos desajeitados da nossa sociedade. Mesmo com espaço mais escasso, insistia-se em uma estrutura residencial tradicional. As mudanças a passos largos da estrutura familiar, com novos hábitos, e a aprovação da lei do divórcio no final da década de 1970 não se refletiram em uma revisão do imaginário das classes médias.
A elite brasileira, perplexa com o presente e insegura em relação ao futuro, elegia o passado como o seu refúgio. Se para os arquitetos modernistas a década de 1980 foi um desastre de público, para a Lindenberg foi o oposto. A década de 1980 significou o auge da demanda pelo neoclássico. Era como se a elite, sem lastro monetário, buscasse a segurança na estabilidade das linguagens arquitetônicas tradicionais do velho continente. Até mesmo prédios comerciais começaram a ser propostos em estilo neoclássico, algo inédito até então.
Uma proposta interessante, e que agradou ao cliente, era construir, em um mesmo terreno grande, duas torres gêmeas, de dimensões di- ferentes, cercadas por muitos jardins. Alguns exemplos são o Dona Veridiana e o Dona Maria Angélica, em Higienópolis, bairro com quem a Lindenberg tinha uma forte ligação, o St. Louis e St. Patrick, no Jardim Paulista, com apenas oito pavimentos, por conta da legislação do bairro onde estava instalado e a garantia de ter, eter- namente, o verde dos Jardins em seu horizonte.
Em uma sacada genial, a construtora convi- dou a revista Vogue, então a única revista de
luxo do País, para lançarem o Studium Vogue, uma nova proposta situada em um novo ende- reço: a Avenida Giovanni Gronchi, no Mo- rumbi. As grifes Lindenberg e Vogue tinham tudo a ver. O Studium Vogue foi projetado para gente jovem, moderna. Tinha a sala com pé-direito duplo e um mezanino, o que pos- sibilitava a criação de três ambientes em um único espaço, e dois tipos de apartamento de tamanhos diferentes, com duas ou três suítes. Eram apartamentos mais compactos para os pa- drões da época, tendo o menor deles 277 me- tros quadrados.
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No edifício Largo do Boticário houve uma nítida fusão entre o neoclássico e o mediterrâneo


Mas a história provou que os anos 1980 não eram o fim do mundo, e sim um período de transição – ain- da que turbulenta. Se do ponto de vista econômico a década parecia um beco sem saída, do ponto de vista político a história foi outra. O País conseguiu superar um contexto autoritário, ganhou nova Constituição e uma sociedade civil vibrante, responsável pela volta do País à democracia.
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“Apesar de seguir construindo edifícios neoclássicos, a Lindenberg estava sempre procurando novidades, diversidade. Depois do desafio estrutural de colocar uma pisci- na em leque em um edifício, tudo seria pos- sível”, relembra Adolpho Lindenberg Filho, ele fala dos edifícios Penthouse e Roof, no Morumbi, que tinham piscinas em todos os andares, construídas em leque ao redor dos dois prédios, para que o terraço de um não roubasse o sol do outro. Eles foram os dois últimos exemplares da arquitetura mediter-
rânea que deixava de ser moda.
O que os anos 1990 guardavam para o País
ainda era uma incógnita. No final da década aconteceram as primeiras eleições democráti- cas para presidente, venceu Fernando Collor, que sequestrou as poupanças e investimentos da população para um plano econômico desas- troso. Para a Lindenberg seriam anos de revi- são, de revitalização, de reposicionamento. A elite já não era a mesma, o modo de viver tam- bém não, era necessário rever o que o mercado desejava. Sentir para onde “soprava o vento”.


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1990
Diminuir para somar
Para o Brasil, a década de 1990 iniciou-se tão desafiadora quanto a anterior. Em dezembro de 1989 foi realizado o segundo turno da primeira eleição presidencial direta em
quase trinta anos. O vencedor, Fernando Collor de Mello, tinha a bandeira do combate à corrupção e da moralização das instituições do País, mas seu mandato foi marcado pela instabilidade, escândalos e finalmente um impeachment decorrente de denúncias de várias ordens. Com a queda de Collor subiu ao poder o seu vice, Itamar Franco, que iniciou o processo de estabilização monetária. A partir de Itamar a hiperinflação foi combatida, mas isso ocorreu mediante um doloroso ajuste econômico e fiscal repleto de vítimas, inclusive dentre as construtoras.
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No início dos anos 1990, o portfólio da Construtora Adolpho Lindenberg reunia mais de 400 empreendimentos, sendo 70% desti- nados para uso residencial. Um feito e tanto para uma construtora que sobreviveu a todas as turbulências políticas e econômicas das décadas anteriores. Ao se dar conta dos números de empreendimentos construídos, Lindenberg se emociona: “Saber que construí lares confortáveis para tantas pessoas me deixa muito feliz. Sempre encarei cada projeto como uma pedra preciosa que ia lapidando aos poucos”.
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Avenida Brigadeiro Faria Lima foi importante para o crescimento de São Paulo
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O cenário das cidades era tão turbulento quanto o do País. A escalada da violência urbana pros- seguia, atingindo seu auge no final da década de 1990. Os dados do Censo de 2000 revelaram uma situação urbana bastante perturbadora: em várias cidades as áreas centrais e mais bem providas de infraestrutura perdiam população, enquanto as periferias desequipadas inchavam sem parar. A população moradora de favelas aumentava, cidade parecia ser sinônimo de problema. E São Paulo parecia ser o exemplo máximo dessa crise.
A região central apresentou-se naquele momento como grande desafio. Cerca de 30% dos imóveis estavam desocupados por razões variadas: falta de interesses econômicos dos proprietários, pro- blemas com a documentação, más condições físicas. Os calçadões, repletos de dia e abandonados durante a noite. O espaço público degradado por falta de manutenção.
Nesse momento, uma série de grupos percebeu que o Centro era problema, mas podia também ser solução. A iniciativa privada organizou-se em uma associação que buscava recuperar o Centro para os usos culturais e turísticos. Por outro lado, movimentos sociais de luta por moradia identificaram o grande número de imóveis desocupados como uma oportunidade, e passaram a pressionar o poder público para a realização de políticas habitacionais para a baixa renda na região central.
Foi feito um pouco de cada coisa. Foram recuperados edifícios como a Pinacoteca e a Estação Júlio Prestes, que se transformou em uma luxuosa sala de espetáculos. Espaços públicos foram recupera- dos e reformados, como o Mercado Municipal e a Praça do Patriarca. Foram também reformados vários edifícios para a população de baixa renda, que pela primeira vez conquistava o direito de viver em boas condições na região central da cidade.
O assunto na primeira metade dos anos 1990 era a economia. Analistas procuravam enten- der o que aconteceria naqueles anos. Com o impeachment do presidente, a gestão de Itamar Franco, a estabilidade do real, parecia que o País iria navegar em mares de calmaria nunca antes navegados. Esses foram os anos da tec- nologia da comunicação, da internet, dos computadores pessoais, da telefonia celular e da terceirização de mão de obra, abrindo as portas de casa para os home-offices. Com toda
a tecnologia disponível, era possível traba- lhar em casa e estar conectado. As tecnolo- gias aplicadas aos eletrodomésticos raciona- lizaram a vida doméstica, pedindo um novo formato para a antiga cozinha, e a chegada da TV por assinatura convidou as pessoas a ficarem mais em casa, melhor, em seus respec- tivos quartos, com seu banheiro, sua televi- são, seu som, seu computador, seu videogame. A sociedade mudava de feição e a arquitetura precisava se alinhar às novas necessidades.
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Janelas de pele de vidro azuladas renovaram a fachada do edifício Paço Grão Pará


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A ideia de “casas sobrepostas” é bastante evidente no edifício Grão Pará

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A entrada para carros do Paço Grão Pará remete aos casarões dos tempos dos barões do café


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