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Published by andreaires, 2019-09-05 08:34:43

O_Presente_do_Passado

O_Presente_do_Passado

como pães, cereais, sal, manteiga, refrigerantes, cervejas,
cachaça, velas, querosene para as lamparinas, sabão, sabo-
nete, gilete, bombons, cordas, vassouras, broas, mariolas,
bolos e sucos para a merenda. Ali também se trocava, se
necessário, até se emprestava dinheiro e vendia-se fiado,
para ser pago depois. Os valores eram anotados em cader-
netas do freguês e do dono da mercearia. Havia encontros
das pessoas da vizinhança para conversarem, tomarem
cerveja em pé no balcão ou uma pinga de cachaça.

Nos bairros, os prédios da Igreja Católica, com
seus padroeiros (não havia, ainda, a forte presença de cul-
tos evangélicos); terrenos baldios em que sempre uma
parte era transformada em campo de futebol pelos jovens
residentes nas redondezas (as célebres peladas de fim de
tarde e finais de semana); quase sempre uma pequena pra-
ça, para o desfile noturno dos enamorados para encontra-
rem suas namoradas. Era comum nos bairros a montagem
de circos pequenos, barracas para as festas juninas e as
chamadas quermesses, montadas em terrenos arenosos,
destinadas a festejos religiosos, com parque de diversões
(roda gigante, balanço de barcos, jogos de tiro ao alvo,
pescaria, etc.), um sistema de som (chamado de alto-
falante), oferecendo músicas românticas, antecipadas de
mensagens de “alguém para alguém e com muito amor”,
leilões de brindes (galinha assada, bolos, dentre outros) e,
algumas vezes, brigas entre rivais, nas disputas por cora-
ções apaixonados.

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Havia um número destacado de clubes sociais na
orla marítima. Várias eram as razões para se pertencer a
um clube. Uma delas era a proibição de se andar de cal-
ção, maiô, bermudas ou shorts nos coletivos. Para vestir
as roupas de banho era necessário ir às dependências dos
clubes sociais. Para participar das festas dançantes nos
clubes, era obrigatório ser associado. Praticar esportes
(basquete, voleibol, tênis, nadar nas piscinas) somente as
pessoas associadas aos clubes poderiam fazer e também
para iniciar namoros. Os clubes eram de diferentes níveis
sociais. A referência, entre outros pontos, era a situação
econômica, a tradição familiar e a posição politica-
administrativa das pessoas. O Ideal Clube, o Country Club
e o Clube Líbano Brasileiro eram da elite. O Náutico, o
Iracema, o Maguari, o Comercial, os Diários, o Massapee-
nse eram frequentados pela classe média. Existiam tam-
bém clubes situados nos bairros, especificamente o Clube
Militar, o Clube dos Oficiais da Aeronáutica, a Associação
Atlética do Banco do Brasil (AABB), o BNB-Clube, o
Clube Universitário (CEU), o América Futebol Clube.
Dizia-se que, assim como na Bahia havia 360 Igrejas, em
Fortaleza teríamos quase o mesmo número, em termos de
clubes sociais. Esses clubes ofereciam festas dançantes, as
matinês (geralmente, nas manhãs de domingo), as tertúlias
(nos fins de semana) e os bailes de final do ano, de debu-
tantes, de formaturas e de datas especiais como o de Sete
de Setembro.

Os costumes na cidade eram, entre outros, colocar
cadeiras nas calçadas à noite para conversar; dormir cedo,

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em torno das 22 h. e acordar cedo (entre 5-6 h.). Andar a
pé pelas ruas da cidade a qualquer hora do dia ou da noite;
frequentar a igreja aos domingos e dias santos; visitar os
amigos e parentes, geralmente com todos os membros da
família; fazer as compras dos gêneros alimentícios nas
mercearias, mercados públicos e nas feiras semanais que
ocorriam nos diferentes bairros; vestir as melhores roupas
para participar de aniversários e casamentos; reunir fami-
liares e amigos para almoços e jantares especiais; ler os
jornais locais e ouvir as emissoras de rádio para saber das
noticias internacionais, nacionais e locais; viajar ao interi-
or do Estado de trem ou de ônibus para passar férias; ir ao
aeroporto para ver aviões pousando ou ao Porto do Mucu-
ripe para conhecer navios; participar ou assistir os festejos
tradicionais como festas juninas, desfiles militares, procis-
sões religiosas, desfiles carnavalescos ou comícios políti-
cos; passear no centro da cidade para inteirar-se das novi-
dades expostas nas vitrines das lojas; assistir às sessões
cinematográficas principalmente, as chamadas sessões
especiais dos cinemas do centro e frequentar os clubes
sociais.

A educação na cidade era dividida nos seguintes
cursos: o Primário (4 anos), o Ginasial (4 anos), o Cientí-
fico ou Clássico (3 anos) e o Superior (variável, em termos
de anos a cursar). Do quarto ano primário, para passar para
o ginasial, havia o exame de admissão, verdadeiro vestibu-
lar. Depois de aprovado, seguia-se para curso ginasial. O
antigo primário mais o ginasial correspondem, atualmente,
ao Ensino Fundamental e o Científico/Clássico ao Ensino

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Médio. Os chamados Grupos Escolares eram quase sem-
pre estatais (Prefeitura e Estadual), todos eles oferecendo
educação primária. As Escolas Particulares eram divididas
em dois grupos, os Ginásios (que podiam oferecer o pri-
mário ou não e os cursos ginasiais) e os Colégios que, ge-
ralmente, ofereciam o Científico e/ou Clássico, podendo
também oferecer desde o primário até o científico. Havia
também os ginásios e os colégios dos Governos (Munici-
pal, Estadual e Federal), mas o domínio era dos particula-
res, principalmente dos religiosos católicos. Os colégios
eram divididos em masculinos e femininos. Os principais
colégios particulares eram Colégio Castelo Branco (católi-
co e masculino), Colégio Cearense (católico e masculino),
Colégio Dom Bosco (católico e masculino), Colégio Ima-
culada Conceição (católico e feminino), Colégio das Doro-
téias (católico e feminino), Colégio Santa Isabel (católico
e feminino), Colégio Juvenal de Carvalho (católico e fe-
minino) e dentre os não católicos tínhamos o Colégio São
João (masculino e depois também feminino), Colégio São
José (masculino), Ginásio e depois Colégio 7 de Setembro
(masculino e depois também feminino), Colégio Santos
Dumont (masculino e depois também feminino), Colégio
Santa Cecilia (feminino e depois também masculino,
comprado por religiosas de particular), Colégio Farias
Brito (masculino e depois também feminino), Colégio
Lourenço Filho (feminino e depois também masculino),
Colégio Padre Champanha (masculino) e a Fênix Caixeiral
(dos comerciários).

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Dos educandários públicos, destacamos o Liceu do
Ceará (estadual, masculino e depois também feminino), a
Escola Normal Justiniano de Serpa (estadual e feminino),
o Ginásio Municipal (masculino e depois também femini-
no), a Escola Técnica Federal do Ceará (federal masculina
e depois também feminina), as escolas militares como a
Escola Preparatória de Fortaleza (federal e masculino) e
depois Colégio Militar de Fortaleza (masculino e depois
também feminino) e a Escola de Aprendizes Marinheiros
(federal e masculino).

O ensino superior era ministrado, nos anos 40 até o
ano de 1954, em unidades isoladas como Faculdades ou
Escolas, até a fundação da Universidade Federal do Ceará,
quando são incorporadas como partes da Universidade.
Existiam em Fortaleza, as seguintes entidades e cursos
superiores: Faculdade de Direito do Ceará (fundada em
1903)- Curso de Direito; Faculdade de Farmácia e Odon-
tologia (fundada em 1913)- Cursos de Farmácia e Odonto-
logia; Escola de Agronomia do Ceará (fundada em 1918)-
Curso de Agronomia; Faculdade de Economia (fundada
em 1936)- Curso de Economia e depois, transformada em
Faculdade de Economia e Contabilidade – Cursos de Eco-
nomia e Contabilidade; Escola de Medicina do Ceará, de-
pois Faculdade de Medicina do Ceará (fundada em 1948)-
Curso de Medicina; Escola de Serviço Social (católica) –
Curso de Serviço Social; Escola de Administração do Cea-
rá (Estadual) – Curso de Administração. Depois da funda-
ção da Universidade Federal do Ceará , foram criados vá-
rios cursos, dentre outros os de Engenharia, Arquitetura,

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Educação, Física, Matemática, Química, Biologia, Letras,
Ciências Sociais, Sociologia, Biblioteconomia e Econo-
mia Doméstica.

A saúde em Fortaleza tinha, além dos Postos de
Saúde, os seguintes hospitais: Instituto José Frota, mais
conhecido como Assistência Municipal; O Hospital Mili-
tar pertencente ao Exército Brasileiro; o Hospital da Santa
Casa (filantrópico); a Casa de Saúde São Raimundo (hos-
pital de destaque social da cidade); o Hospital e Materni-
dade César Cals (estadual), o Sanatório de Messejana. A
maioria dos médicos locais era formada na Bahia, Per-
nambuco e Rio de Janeiro e só depois da criação da Facul-
dade de Medicina do Ceará, passaram a ser formados em
Fortaleza. Pobreza em termos de equipamentos hospitala-
res, deficiências de exames laboratoriais. Dizia-se que a
grande ferramenta do médico era apalpar com as mãos o
corpo do doente; carência de uma melhor qualificação dos
auxiliares médicos, poucos recursos financeiros públicos e
a não prioridade de ações públicas para com a saúde. De-
ve-se destacar que doenças modernas como estresse, ansi-
edades e outras mais, além de acidentes automobilísticos e
aéreos não faziam parte do quadro de cuidados médicos de
então.

Era prática comum de fazer consulta médica, indo
às farmácias indagar dos farmacêuticos ou atendentes o
que seria melhor para cada caso. Não podemos esquecer o
papel desempenhado pelas rezadeiras e parteiras leigas. O
fervor católico também desempenhava importante papel

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nas curas das doenças dominantes. As mais comuns, na
época, eram gripe; tuberculose; doenças venéreas, princi-
palmente a sífilis; a caxumba; o cobreiro; a apendicite; as
verminoses; o sarampo, a catapora; as torsões; fratura de
braço e/ou perna e ferimentos penetrantes causados por
facadas e tiros.

A segurança era tranquila, sendo possível andar pe-
las ruas e praças a qualquer hora do dia ou da noite. La-
drões só os de galinha e ovos, vinham sempre desarmados
e visitavam os poleiros pela madrugada. As pessoas fre-
quentavam os cinemas e clubes sociais, realizavam visitas,
olhavam as vitrines das lojas e se sentavam nos bancos das
praças à noite, sem problema nenhum.

A Guarda Civil de Fortaleza, com os seus guardas
e inspetores, era a responsável principal durante dia e noi-
te, pela segurança da cidade. Existia também o Corpo de
Vigilância de Fortaleza (CCVF), que andava à noite toda,
pelas ruas e praças, dando à cobertura à segurança de sua
população. Tanto os membros da Guarda Civil, como os
da Vigilância de Fortaleza usavam apitos cujos sons sono-
ros do piu...piu...piu, avisavam suas presenças nas redon-
dezas.

A Polícia Especial, com o seu boné vermelho era
temida (tropa de choque), usada em casos mais sérios. Do
período da Ditadura de Vargas, o destaque era a figura do
Inspetor Apolinário, tipo alto, parrudo e bom de briga.
Destaque-se o carro da Policia, chamado Madalena (pri-
mórdio dos carros radiopatrulha), que andava recolhendo

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nas ruas os vagabundos e que espantava pelo som estri-
dente de sua sirene. Uma das novidades usada no policia-
mento da cidade foi à dupla de policiais militares, chama-
dos Cosme e Damião, andando sempre com as mãos para
trás do corpo e que percorriam as ruas do centro da Cida-
de. Logo, depois surgiu a radiopatrulha que fazia o aten-
dimento às solicitações de casos policias, das pessoas das
diversas regiões da Cidade, pelo telefone 2874.

O trânsito da cidade era de responsabilidade da
Inspetoria Estadual do Trânsito (IET), mais concentrada
no centro da Cidade, principalmente orientando os moto-
ristas de veículos nos cruzamentos das ruas, uma vez que
praticamente não havia semáforos. Uma policia muito
temida na época era o Pelotão da Polícia da Aeronáutica, o
Pelotão da Base Aérea de Fortaleza, pois chegava na por-
rada.

Existia também a chamada Policia Estudantil, liga-
da ao Centro Estudantil Cearense, cuja sede era a Casa do
Estudante, situada na esquina das Ruas Nogueira Acioly e
Pereira Filgueiras, sua maior finalidade era fiscalizar a
idade e a identificação dos estudantes na entrada dos ci-
nemas da Cidade. A carteira do Centro Estudantil valia
como identidade e permitia pagar metade do valor dos
ingressos nos cinemas, nos ônibus e em qualquer casa de
diversão.

A infraestrutura da cidade era pobre. Muitas ruas
com piso de areia e a pavimentação da maioria de suas
ruas era feita de pedra tosca, poucas de paralelepípedo ou

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concreto em alguns trechos da Cidade (Praça do Ferreira,
Avenida João Pessoa em direção a Parangaba e Rua Sena-
dor Pompeu).

A iluminação pública vinha de uma usina que utili-
zava lenha, pertencente a Companhia Inglesa The Ceará
Light & Power. Foi desapropriada pela Prefeitura Munici-
pal de Fortaleza, sendo criada, em seu lugar, a Empresa
Municipal SERVILUZ na Administração Paulo Cabral. A
usina térmica se localizava no começo da descida da Rua
Barão do Rio Branco (Passeio Público), sendo depois
transferida para uma dependência maior, nas proximidades
do Porto do Mucuripe, onde funcionou até a chegada da
energia de Paulo Afonso, em 1965.

O Aeroporto de Fortaleza era pequeno, situado no
Cocorote, cuja via de acesso se dava pela Avenida João
Pessoa (concretada), que ligava o Bairro do Benfica a Pa-
rangaba. Os voos que chegavam a nossa cidade eram todos
nacionais, a maioria vinda do Rio de Janeiro, através das
companhias aéreas como a Panair do Brasil, com seus avi-
ões de motores com hélices tipos Douglas (dois motores) e
Constellation (quatro motores). A Panair foi extinta em
1965 e foi substituída pela Varig. A Cruzeiro do Sul usa-
va os famosos aviões Douglas DC-3, depois os modelos
Convairs, Douglas DC-4 e no seu final da existência
(1975), o Caravelle (a jato). A VASP e a VARIG vieram
depois, bem como a Transbrasil.

Quanto ao Porto oficial de Fortaleza, até o ano de
1952, era a Ponte Metálica e a Ponte dos Ingleses, na

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Praia de Iracema por causa do prolongado tempo de cons-
trução do novo Porto do Mucuripe, de 1938-1953. Os na-
vios ficavam ao longo da costa e barcos iam levar e buscar
mercadorias a serem exportadas ou importadas, assim co-
mo passageiros. A partir de 1953, houve a atracação do
primeiro navio (Bahia), no novo Porto do Mucuripe. Dai
em diante, o Porto do Mucuripe foi ampliado várias vezes,
acrescentando novos armazéns, cais pesqueiro, píer petro-
leiro, prolongamento do cais, aumento da profundidade de
seu calado e, recentemente, o terminal de passageiros.

O serviço de telefonia era prestado inicialmente pe-
la Companhia Telefônica de Fortaleza (CTF), empresa
municipal posteriormente absorvida pela Empresa Estadu-
al de Telecomunicações do Ceará (TELECEARÁ) e de-
pois privatizada (TELEMAR). Conseguir uma linha tele-
fônica nos anos 1940/1950 era uma verdadeira epopeia,
exigia pistolão politico, longa espera numa fila, uma vez
que os principais ramais telefônicos estavam situados no
centro da Cidade. Ter uma linha telefônica era considera-
do um bom investimento econômico e algumas pessoas
eram possuidoras de duas ou mais linhas que alugavam ou
revendiam. O prédio da sede da CTF era localizado na
Rua Sena Madureira, em frente ao parque Cidade das Cri-
anças.

Comunicar-se com outros Estados era feito pelos
Correios ou via Western, empresa inglesa de comunica-
ções, pelo telegrama (cabograma). Para o interior do Esta-
do, utilizava-se dos Correios, do sistema de comunicações

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da Estrada de Ferro da Rede de Viação do Ceará (RVC),
dos motoristas dos ônibus, através das cartas pessoais
(muito usadas na época) e, eventualmente, do suporte do
radioamador.

O rádio era uma fonte importante de tomar conhe-
cimento dos acontecimentos que ocorriam na Cidade, no
Estado, no Brasil e no Exterior até a chegada da televisão
no Ceará (TV Ceará – Canal 2- 1960), além dos jornais
locais e das noticias que corriam de boca em boca.

O serviço de abastecimento de água na cidade era
restrito ao centro da Cidade e redondezas, pois a água en-
canada que vinha do Açude Acarape do Meio (Município
de Redenção), era depositada inicialmente nas caixas
d’água existentes ao lado da Faculdade de Direito do Cea-
rá e depois distribuída. O órgão estadual responsável pelo
abastecimento era o Departamento de Saneamento e Obras
Públicas do Ceará (DSOP), cuja sede ficava localizado na
Rua Dragão do Mar (atual espaço ocupado pelo Centro
Cultural Dragão do Mar), próximo ao prédio da Alfandega
do Ceará (atual Centro Cultural da Caixa Econômica Fe-
deral).

A maioria das residências era abastecida por águas
de suas cacimbas, poços artesianos ou compra advindas de
locais específicos (ITAOCA, PIROCAIA, por exemplo) e
transportadas por carroças puxadas por animais. O sanea-
mento ficava restrito a determinados locais próximos ao
centro da Cidade. Outras residências usavam as fossas
construídas em seus quintais.

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A cidade era servida, até o ano de 1948, por bondes
elétricos da Companhia Inglesa The Ceará Tramway Light
& Power, num total de nove linhas. As principais: Aldeo-
ta, Praia de Iracema, Jacarecanga, Benfica, Joaquim Távo-
ra e Prado. A garagem dos bondes ficava no Bairro de
Joaquim Távora.

O bonde funcionava com um total de 53 carros,
chamados de tramways. Era um carro aberto, com assento
de madeira, cujo encosto era reversivo, possuindo estribos
nas laterais, onde as pessoas podiam viajar em pé seguran-
do-se em hastes verticais de madeira. Existia uma vareta
longa que ligava os bondes às redes elétricas (cabos elétri-
cos) e o motorneiro (motorista) ia em pé à frente dos pas-
sageiros, movimentando uma alavanca horizontal que fa-
zia o bonde andar e aumentar a velocidade. No piso, uma
embreagem que, quando acionada, parava o bonde e outra
que produzia um tipo de buzina. O cobrador (condutor) do
bonde vestia farda e usava quepe. No ombro uma bolsa
guardava o dinheiro e os tíquetes de passagem e levava
entre os dedos cédulas de dinheiro para o troco. Na frente
de cada bonde, um farol, o número do carro e o nome do
destino da viagem. Havia os fiscais dos bondes.

O meio de transporte coletivo predominante em
Fortaleza eram os ônibus, de algumas empresas locais
privadas, como a Pedreira (Jacarecanga e Brasil Oiticica);
Otoch (circular da Dom Manoel); São Jorge (Cemitério e
Praça São Sebastião); José Setúbal Pessoa (Praia de Ira-
cema, Seminário e Mucuripe); Salvador (Monte Castelo e

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Açude João Lopes). Depois novas empresas foram surgin-
do: São Gerardo e Severino (Alagadiço, Benfica, Joaquim
Távora); Vitória (Parangaba, Benfica e São Gerardo) e
Autoviária São Vicente. Os ônibus menores, chamados de
caminhonetes que circulavam para os distritos (depois
bairros) de Parangaba, Messejana e Antônio Bezerra.

A estrutura da maioria dos ônibus e das caminho-
netes: carrocerias feitas de madeira, recobertas com folhas
de flandres, com os assentos de madeira revestidos de cou-
ros ou similares, recheados de plumas de algodão ou outro
tipo de enchimento e montados sobre os chassis de cami-
nhões. A grande novidade no transporte coletivo, após a
retirada dos bondes, foi à chegada dos ônibus elétricos que
tiveram pouca duração. Para se ter um retrato do cresci-
mento acelerado das empresas de ônibus e caminhonetes,
no período de 1945 – 1960 havia 62 empresas servindo a
mais de 46 linhas.

O número de automóveis na cidade de Fortaleza
era pequeno, principalmente por razões econômicas, uma
vez que aquisição de um carro exigia um bom investimen-
to (preço elevado), em que o pagamento era feito à vista.
A maioria era importada do Exterior. As pessoas de me-
lhores condições financeiras eram os potenciais comprado-
res de carros e o número deles só começou a crescer a par-
tir dos anos 1960 (4.000), com a implantação da indústria
automobilista no Brasil, no Governo Juscelino Kubitschek.

Podem ser considerados os principais fatos do pe-
ríodo 1947-1960:

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1. A perda da Copa Mundial de Futebol de 1950. Na-
quele campeonato o jogo final foi disputado entre
Brasil x Uruguai, no Estádio do Maracanã, com um
público de 200.000 pessoas (lotado), na Cidade do
Rio de Janeiro, no dia 16 de julho de 1950. O Uruguai
venceu por 2x1. Em Fortaleza, toda a cidade estava
ligada ao rádio (não havia outro meio de comunica-
ção) para ouvir e torcer pelo Brasil. Nas salas das re-
sidências, nos bares, nas mercearias e praças públicas
todos ligados na transmissão do jogo, ruas enfeitadas
com bandeiras do Brasil. Alegria total com batucadas
e a euforia da certeza da conquista do mundial. Com a
perda do jogo, houve muitas choradeiras, brigas e até
mortes. Foi uma grande frustação.

2. A construção da Casa do Português (José Maria
Cardoso), na Avenida João Pessoa, número 5094,
Bairro Damas. Era uma construção de concreto arma-
do, três andares, existindo, na parte externa e desco-
berta, uma rampa de concreto para subida de carros
até o teto. Foi inaugurada no dia 13 de junho de 1953,
sendo denominada pelo seu proprietário de Vila Santo
Antônio. O português da casa ficou rico fornecendo
lenhas retiradas da floresta da Aratanha (Município de
Pacatuba) para ser queimada nas caldeiras de energia
elétrica da Ceará Light (dos ingleses) e nas máquinas
a vapor (Marias Fumaças) dos trens da Rede de Via-
ção Cearense (RVC).

3. A montagem e o funcionamento da primeira escada
rolante em Fortaleza, nas dependências das Lojas Lo-
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brás (Lojas Brasileiras), na Rua Major Facundo, es-
quina com a Travessa Pará, no térreo do Edifício Je-
reissati, número 4400, por isso era também chamada
Lojas 4400. A loja foi inaugurada no dia 13 de junho
de 1953, tendo uma sorveteria no seu interior. As pes-
soas faziam filas para subir e descer a escada rolante.

4. Chegada a Fortaleza da imagem de Nossa Senhora
de Fátima vinda de Portugal, no ano de 1953. A ima-
gem da santa percorreu vários Estados do País e, em
Fortaleza, multidões de católicos acompanharam os
vários atos religiosos realizados (procissões, missas e
atos específicos). Na atual Avenida 13 de Maio, no
local onde existe hoje a Igreja de Nossa Senhora de
Fátima, na época, era um terreno particular, doado pa-
ra ser construída a igreja. Ali foi lançada a pedra fun-
damental com a presença da imagem e de uma multi-
dão de católicos.

5. A vinda da Miss Brasil Marta Rocha (1954), a For-
taleza. Por onde passava era rodeada de fãs em seu
encalce, tentando uma aproximação maior. O ponto
alto foi seu desfile em carro aberto (sem capota). Se
não estou equivocado, o carro era do José Alcy Si-
queira, empresário e figura de destaque da sociedade
cearense – pela Praça do Ferreira e as pessoas corren-
do atrás do carro e gritando o nome da Miss Brasil.

6. O Cine e Teatro Majestic, inaugurado em 1917,
uma construção de quatro andares, com 650 cadeiras
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no térreo. Nos dois andares restantes ficavam os ca-
marotes e a geral. A entrada era pela Rua Major Fa-
cundo – Praça do Ferreira, onde havia um bar e como
vizinhança as Lojas Brasileiras. No dia 4 de abril de
1955, ocorreu um incêndio que destruiu parcialmente
o Cine Majestic e também as Lojas Brasileiras,
atraindo uma multidão de pessoas à Praça do Ferreira.
O Majestic ficou em recuperação por determinado
tempo e quando de sua reabertura, a entrada passou a
ser pela Rua Barão do Rio Branco. Posteriormente, no
dia 1 de janeiro de 1968, outro incêndio o destruiu to-
talmente.

7. A criação e a instalação da Universidade Federal
do Ceará que foi criada pela Lei Federal nº 2373, de
16 de dezembro de 1954 e instalada em 16 de junho
de 1955, em sessão solene realizada no Teatro José de
Alencar. A sua estrutura inicial era composta pela Fa-
culdade de Direito, criada em 1903; pela Faculdade de
Farmácia e Odontologia, criada em 1916; pela Escola
de Agronomia, criada em 1918 e pela Faculdade de
Medicina, criada em 1948. No ano de 1956, foi criada
a Escola de Engenharia; a Faculdade de Filosofia, Ci-
ências e Letras, no ano de 1961; incorporada no ano
de 1962, a Faculdade de Ciências Econômicas do Ce-
ará, criada no ano de 1937. O primeiro Reitor da Uni-
versidade foi o Professor Antônio Martins Filho.

8. A eleição de Emília Corrêa Lima, como Miss Bra-
sil 1955, num baile realizado nos salões do Hotel Qui-
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tandinha – Rio de Janeiro, no dia 26 de junho de
1955, substituindo Marta Rocha. Emília, que repre-
sentou o Estado do Ceará no concurso de miss, nasceu
na Cidade de Sobral e foi indicada para participar do
concurso de Miss Ceará, pelo Clube Maguary, situa-
do, na época, na Rua Barão do Rio Branco, próximo à
Avenida 13 de Maio. Seu presidente era Egberto de
Paula Pessoa. Na volta ao Ceará, depois de eleita Miss
Brasil, Emília Corrêa Lima, foi recebida por uma ver-
dadeira multidão de pessoas que queriam conhecer e
aplaudir a nova Miss Brasil.

9. A chegada a Fortaleza dos primeiros aviões a jato.
Eram aviões de fabricação inglesa Meteor F-8 da For-
ça Aérea Brasileira (FAB), lotados na Base Aérea de
Canoas-RG. Estiveram em Fortaleza em 1955 e fica-
ram em exposição para visitação pública na Base Aé-
rea de Fortaleza, Bairro Alto da Balança (atual Aero-
lândia). Uma multidão de pessoas para ali se deslocou
para conhecer os novos aviões.

10. A inauguração do Cine São Luiz, cuja construção
demorou 19 anos (1939-1958), de propriedade da
Empresa Severiano Ribeiro. Foi inaugurado no dia 26
de março de 1958, com o filme Anastácia, com Ingrid
Bergman. O acontecimento contou com a presença
das principais autoridades do Estado. O cine e teatro
São Luiz oferecia 1.070 lugares e seu estilo é Art Dé-
cor. Após sua inauguração, filas intermináveis de pes-
soas para assistirem aos vários filmes ali exibidos.
63

11. A conquista do Campeonato Mundial de Futebol
de 1958 pelo Brasil, na Suécia. A partida final foi rea-
lizada no dia 29 de julho de 1958, com 50.000 espec-
tadores. O Brasil ganhou da Suécia de 5x2. Dia total
de festas em Fortaleza, que assistiu e torceu pelo Bra-
sil, ouvindo a transmissão por emissoras de rádio (a
televisão na cidade só chegou em 1960). Comemora-
ções nas ruas, avenidas e praças da cidade, desfile de
carros, buzinas e solta de fogos.

12. A atracação no Porto do Mucuripe (1960) do navio
que trazia a exposição flutuante dos resultados alcan-
çados pelas metas governamentais do Governo Jusce-
lino Kubitschek (JK). Eram enormes filas para visita-
rem a exposição. O Brasil vivia então forte clima de
otimismo, elevada autoestima e confiança no futuro,
decorrente da construção de Brasília, da implantação
de novas fábricas (carros, navios), novas usinas side-
rúrgicas, da construção de estradas desafiadoras (Be-
lém-Brasília), de novos açudes (Orós, por exemplo),
da criação da SUDENE, ao lado de novos ritmos mu-
sicais como a Bossa Nova, o surgimento do cinema
novo e a conquista do Campeonato Mundial de Fute-
bol pelo Brasil, em 1958.

13. A inauguração da TV-Ceará - Canal 2, ocorrida na
data de 26 de novembro de 1960, pertencente à cadeia
dos Diários Associados. A TV-Ceará era em preto e
branco, toda a sua programação era produzida local-
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mente, com os artistas da terra e muitos deles, poste-
riormente, tiveram projeção nacional (Renato Aragão,
por exemplo). Com a vinda da televisão, começou a
mudança dos costumes locais, como a diminuição das
cadeiras nas calçadas e a mudança das conversas para
o interior das casas, principalmente para as salas dos
vizinhos que tivessem aparelhos de televisões, para se
assistir à programação da televisão, que terminava em
torno das 23 horas. O custo elevado dos aparelhos de
televisão no inicio da TV limitava o número de teles-
pectadores.

65

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:

ADERALDO, Mozart Soriano. História abreviada de
Fortaleza e crônicas sobre a cidade amada. Fortaleza,
UFC. Casa de José de Alencar, 1993. 254 p.

-_________. A praça. Fortaleza, Gráfica. Editora. R. Este-
ves Tiprogresso LTDA, 1989. 148 p.

VELOSO, Patrícia. Ah, Fortaleza! 1880 -1950. Fortaleza,
Terra da Luz Editorial, 2009. 180 p.

ANDRADE, Mundinha Negreiros. Trilhas da Saudade.
Fortaleza, RBS Editora, 2005. 404 p.

AZEVEDO, Otacílio de. Fortaleza descalça. Fortaleza,
UFC. Casa de José de Alencar, 1992. 320 p.

GIRÂO. Blanchard. O Liceu e o Bonde: na paisagem sen-
timental da Fortaleza- Província. Fortaleza, Ed. ABC.
Fortaleza, 1997. 299 p.

___________. Sessão das quatro: cenas e atores de um
tempo mais feliz. Fortaleza, Ed. ABC. Fortaleza, 1998.
340 p.

LIMAVERDE, Narcélio. Fortaleza, história e estórias:
memórias de uma cidade. Fortaleza, Ed. ABC. Fortale-
za, 1999. 227 p.

LUSTOSA DA COSTA, Francisco José. Louvação de
Fortaleza. Fortaleza, UFC. Casa de José de Alencar,
1995. 183 p.

66

Fardado com o uniforme
do Colégio Castelo Branco.

67

RUA PINTO MADEIRA

A nossa casa da Rua Pinto Madeira, nº 683, era um
sobrado construído com tijolos brancos. A parte térrea
possuía um pequeno recuo onde, antigamente, existira um
pequeno jardim, posteriormente cimentado. Havia um mu-
ro baixo na frente, com um portão de madeira. A fachada
possuía uma característica usada em algumas residências
de Fortaleza. Quando do reboco, enquanto a massa estava
fresca, pressionava-se com a ponta da colher de pedreiro o
reboco recém-feito deixando nele suas marcas (tipo esca-
ma de peixe) e depois pintava – se.

Ainda na parte térrea havia, na entrada, um terraço
coberto, seguido de uma sala de visitas e duas salas late-
rais que terminavam na larga sala de jantar. Depois, cozi-
nha e despensa, banheiro, duas outras salas e áreas de ser-
viço. O quintal era de bom tamanho, com um quarto de
depósito e um sapotizeiro que costumava ficar muito car-
regado na época da safra. Uma entrada lateral dava acesso
ao quintal e à área de serviço.

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Na parte superior havia um banheiro, quatro quar-
tos e uma pequena varanda que dava para a rua principal.
Apenas em um dos quartos, no banheiro e no terraço o
piso era de concreto armado. Nas demais dependências, de
madeira.

Excetuando-se as duas salas do andar térreo que
antecediam a sala de jantar e os três dos quatro quartos do
andar superior, o piso da casa era de mosaico, hoje conhe-
cido por ladrilho hidráulico. No local da nossa casa, atu-
almente, existe um edifício residencial.

No quarteirão da Rua Pinto Madeira, compreendi-
do entre as ruas Dona Leopoldina e J. da Penha, no lado
em que estava localizada a nossa casa, havia um terreno
baldio e murado; a casa residencial do Deputado Estadual
Vicente Augusto, de Lavras da Mangabeira; a casa peque-
na de Dona Chiquinha, engomadeira que vivia com três
sobrinhas: Maria Luiza, Maria de Lourdes e Margarida
(esta suicidou-se com veneno de rato, após terminar um
namoro); a nossa casa, número 683; a casa do Padre Pita,
de número 695, vigário da Igreja de Santa Luzia e profes-
sor da Escola Preparatória de Fortaleza, cuja governanta
chamava-se Severa. A casa do Padre Pita era a única, na
rua que tinha telefone, geladeira e um pé de laranja. A
vizinhança pagava ao Padre Pita, através da Severa, tele-
fonemas, folhas de laranjeira para fazer chá e pelas pedras
de gelo quando solicitadas. Depois da casa do Padre Pita,
já na esquina com a J. da Penha, morava o Senhor Antônio
Lima, diretor do Serviço de Identificação da Secretaria de

69

Segurança do Estado e casado com dona Stela, irmã do
Padre Pita.

Com o tempo, Padre Pita mudou-se para outra casa
por ele construída na esquina das Ruas Costa Barros e
Nogueira Acioli, ao lado da Escola Preparatória de Forta-
leza, onde ele era professor. Sua casa da Rua Pinto Madei-
ra foi alugada para o fiscal de Receita Federal José Arima-
téia Farias da Silva, casado com Maria Barreira Fontenel-
le, prima legitima de minha mãe Beatriz. O casal Arima-
téia-Maria tinha os seguintes filhos: Maria Luiza, Paulo,
Sérgio, Marta e Cristóvão. Tempos depois Arimatéia foi
transferido para Salvador-Bahia e a casa foi novamente
alugada para outro fiscal da Receita Federal transferido de
São Paulo. Alguns anos depois, veio residir nela o médico
Expedito Pita, irmão do Padre Pita.

Do outro lado do quarteirão, na esquina com a Rua
Dona Leopoldina, existia uma vacaria do Senhor Pires,
num extenso terreno plantado com capineiras para a ali-
mentação das vacas leiteiras, um galpão de máquinas para
o corte dos capins e um baixio onde passava o Rio Pajeú.
Pela manhã, pessoas da redondeza iam com panelas e gar-
rafas, comprar leite, que era distribuído para outros locais,
através de trabalhadores da vacaria, com cavalos condu-
zindo grandes botijões de alumínio com leite medido nas
portas das casas com canecas de alumínio de 1 litro. Poste-
riormente, com a saída da vacaria, foi aberta a continuação
da Rua Dona Leopoldina até a Avenida Heráclito Graça,
feito o loteamento do restante do terreno e, posteriormen-

70

te, a construção da várias casas na Rua Pinto Madeira, Rua
Dona Leopoldina e numa ruela Ubajara, vizinha ao muro
da casa do Senhor Messias.

A casa do Senhor José Messias, ficava em frente à
nossa casa, número 684. Era proprietário e motorista de
um automóvel de praça e dono do restante dos terrenos até
a esquina da Rua J. da Penha. O casal Messias tinha uma
prole numerosa, constituída pelos filhos José Américo,
Luiz, Fernando, Flávio, Messias Filho, Miriam, Osmarina,
Vanda e Lucinha.

A família do Senhor José Cajuaz e Maria Moreira
Lima (Dona Pichula), morava em casa alugada do Sr.
Messias, de quem eram vizinhos, número 688. Senhor
Cajuaz confeccionava colchões para camas, feitos de teci-
dos de algodão costurados e com enchimentos de crina,
algodão ou capim. Dona Pichula trabalhava como bilhetei-
ra do Cine Dioguinho (Cine Santos do Dumont), perten-
cente à Igreja de Cristo Rei (Diocese de Fortaleza) e situa-
do na Praça da Igreja do Cristo Rei. Eram filhos do casal:
José Maria, Maria Consuelo, Maria Albaniza, Maria Car-
mem e Maria Carmelita (gêmeas), José Mauricio, José
Cajuaz Filho, José Mauro (faleceu jovem de paratifo),
Maria Evanise, José Marcelo e José Mardônio. José Maria
trabalhava numa cooperativa, Consuelo era professora,
Maurício médico, Cajuaz Filho foi padre e abandonou a
batina para ser professor da Universidade Estadual do Ce-
ará, da Escola Técnica e da Escola de Aprendizes Mari-
nheiros, Marcelo, professor de escolas estaduais e da Es-

71

cola de Aprendizes Marinheiros, Evanise, funcionária do
Colégio Castelo Branco e Mardônio, coronel da Policia
Militar do Piauí.

A Consuelo tinha uma escola na casa de seus pais
e preparava alunos para entrarem nos colégios, através do
exame de admissão. Fui seu aluno até o correspondente ao
terceiro ano do primário. Depois ela me levou para estudar
no Colégio Castelo Branco, donde era professora. Ali en-
trei no quarto ano primário até terminar o terceiro ano ci-
entífico. A escola da professora Consuelo teve vários es-
tudantes que depois se projetaram, como Edson Pontes,
residente nos Estados Unidos, afamado médico urologista,
de renome mundial.

Quando Maurício passou no vestibular para medi-
cina, cuja Faculdade funcionava na Praça José de Alencar,
um grupo de amigos da rua foi conhecê-la. Em lá che-
gando, foram ao setor que guardava corpos humanos em
tanques com formol, para estudo dos alunos, provocando
náuseas em todos. Fui um dos que passaram semanas sem
comer carne.

Vizinho à casa do Sr. Cajuaz morava Wilson Mar-
tins, nº 696 que trabalhava na Companhia SHELL. Depois
que fomos morar na Gentilândia (Benfica), ele foi inquili-
no da casa dos meus pais.

Na esquina da Rua Pinto Madeira com a Rua J. da
Penha existia uma bodega do Almir Mitoso que depois
passou a ser propriedade do Luiz, filho do Sr. Messias.

72

No trecho da Rua Pinto Madeira, compreendido
entre as ruas Rodrigues Junior e Nogueira Acioli, mora-
vam dentre outras, as famílias do advogado e professor da
Faculdade de Direito Álvaro Costa; do professor da Escola
de Agronomia Afrânio Fernandes; do advogado, secretário
de Estado e deputado Martins Rodrigues; do professor de
inglês Waldemar Barros; do advogado e professor da Fa-
culdade de Direito João Batista Fontenelle, cuja esposa
Marina, era filha de um irmão de minha mãe, Humberto
Fontenelle; do Senhor Waldery Botelho, que entre os seus
filhos, o Valdez Botelho seria professor da Universidade
Federal do Ceará, ocupando os cargos de Diretor do Cen-
tro de Tecnologia e de Vice-Reitor da referida Universida-
de; do Deputado Estadual Francisco Ferreira do Vale, cuja
filha Iracema do Vale seria Desembargadora e Presidente
do Tribunal de Justiça do Ceará; do advogado e tabelião
Wilson Fontenelle, também filho de Humberto Fontenelle
da Silveira, irmão de minha mãe.

Em torno do quarteirão da Rua Pinto Madeira, on-
de morávamos, no trecho compreendido pelas Ruas J. da
Penha, Franklin Távora e Dona Leopoldina, residiam fa-
mílias com quem tínhamos aproximação maior. Na Rua J.
da Penha, indo até a esquina com a Rua Franklin Távora,
Senhor Perboyre casado com Suzete, irmã do Padre Pita.
Tinham dois filhos de criação; José Vidal, cuja casa foi
vendida para Audísio Mosca, de cujos filhos destaco o
Paulo Acioly, que seria oficial do Exército, engenheiro e
professor da Universidade Federal do Ceará e Didi que se
formou em agronomia.

73

Seguia a casa de número 72, pertencente a Artur de
Albuquerque, primo e cunhado de meu pai. Este teve dois
casamentos: o primeiro com sua prima Diva, irmã de Ar-
thur, depois de viúvo, casou-se com minha mãe Beatriz.
Nós o chamávamos de Tio Arthur. Pessoa muito querida.
Formava com sua esposa, a Tia Alice, um casal adorável.
Tinha uma rica história de vida. Fora funcionário do De-
partamento de Obras Contra a Seca (DNOCS) teve de
aposentar-se cedo, devido um grave problema de circula-
ção nas pernas que o impossibilitava de ficar muito tempo
em pé e ter que andar com apoio de uma bengala. Como
tinha uma família numerosa composta pelos filhos Maria,
João, Edmilson, Alba, Diva, Edmundo e Ilka teve que
buscar melhoria para sua renda, dado que a aposentadoria
era insignificante. A saída encontrada foi fazer bolos. Ele
e Tia Alice começavam a labuta de madrugada com tare-
fas distribuídas, cabendo ao Tio Arthur ficar sentado, ba-
tendo os ovos numa bacia grande de alumínio, com um
batedor manual, colocar lenha e as formas de bolos e reti-
rá-las do forno do fogão de barro. A Tia Alice misturava
as massas dos diferentes tipos de bolos numa mesa grande
e passava o maior tempo em pé.

A casa do Tio Arthur era alegre. Ele ensinava co-
mo saber viver com as adversidades, superar os obstáculos
e criar inovações na ausência de recursos financeiros. Pre-
senciei algumas vezes até falta de alimentos básicos,
quando Tia Alice criava alternativas com os poucos recur-
sos existentes. É bom que se diga que os filhos do casal
cresceram fortes, saudáveis, inteligentes e bem humora-

74

dos. Os produtos para a elaboração dos bolos quase sem-
pre eram adquiridos na bodega próxima à sua casa, para
pagamento posterior e os bolos eram vendidos, em grande
parte, como forma de pagamento da educação dos filhos.
Tio Arthur nunca deixou de dar uma soneca depois do
almoço, de reunir todas as noites, na calçada de sua casa, e
sob a iluminação pública da luz de um poste, seu grupo de
vizinhança para o animado jogo de gamão.

Quando elogiado por seu bom humor, costumava
dizer: “Aqueles a quem devo passem a noite sem dormir,
porque não sabem se eu vou pagá-los, enquanto eu dormi-
rei.” Sempre pagou suas dividas corretamente. O quintal
de sua casa dava para a nossa cujo muro era baixo o que
permitia passarmos, constantemente, para convivermos
com sua casa tão animada.

Tio Arthur vivia aprontando, com seu espirito ale-
gre, muitas brincadeiras com o meu pai. Um dia, o limoei-
ro do Tio Artur amanheceu carregado de limões. Papai foi
chamado para apreciar a carga do limoeiro e ficou se re-
moendo porque o seu limoeiro não dava tantos limões. Só
que os limões haviam sido cuidadosamente amarrados
com linhas pelo Tio Artur, que dava sonoras gargalhadas.
Outra vez, Tio Artur carregou e escondeu um peru lá de
casa, que estava sendo engordado para o Natal e só foi
devolvido na véspera da data natalina. Considero Tio Ar-
tur o meu tipo inesquecível.

Vizinho à casa do Tio Arthur morava o Zezinho
que trabalhava como técnico de bombas da Companhia

75

SHELL e era casada com a Onélia, parenta da Tia Alice.
Vinha em seguida a do Padre Vicente Matos, professor e
diretor do Colégio Castelo Branco depois, Bispo do Crato,
na Região do Cariri Cearense; a do Senhor José Barbosa,
irmão do Governador do Ceará Raul Barbosa e assíduo
participante da roda do jogo de gamão na calçada do Tio
Arthur. A seguinte era a do Senhor José Reis Júnior e na
esquina com a Rua Franklin Távora, morava o advogado
Walmir Magalhães.

Do outro lado da Rua J. da Penha, na esquina com
a Rua Franklin Távora, o Convento das Freiras Carmelitas
que, depois, se mudaram para novo endereço, sendo uma
parte de seu prédio ocupado pelas Freiras de Santa Tereza
e a outra transformada em apartamentos para aluguel. No
que sobrou do terreno, até a esquina com a Rua Pinto Ma-
deira, foi construído o Colégio Monsenhor Luiz Rocha.

Na Rua Franklin Távora, até a esquina com a Rua
Dona Leopoldina, moravam as famílias do Tio Gilberto,
irmão do Tio Arthur, que tinha como filho o Vicente; o Sr.
Vieira Costa, pai do advogado Álvaro Costa; a família do
professor Prisco Bezerra, diretor da Escola de Agronomia
e o Senhor Abílio Lemos de Oliveira, português, dono das
casas situadas na Rua Dona Leopoldina a partir da esquina
da Rua Franklin Távora até a Rua Pinto Madeira, incluin-
do, a casa em que morava o deputado Vicente Augusto e o
Dr.Prisco Bezerra.

Na esquina das Ruas Franklin Távora e Dona Leo-
poldina, a bodega do Romildo Barreto, a maior existente

76

nas proximidades, a mais movimentada, com grande vari-
edade de produtos, inclusive lenha e carvão usados nos
fogões.

Na Praça do Cristo Rei, próximas à igreja, estavam
as residências do Professor de francês José Albano, vizi-
nho ao Cine Dioguinho, do comerciante Gabriel Leônidas,
do professor da Faculdade de Direito, jornalista e Diretor
Presidente do Jornal Católico O Nordeste, que foi o pri-
meiro Vice-Reitor da Universidade Federal do Ceará Dr.
Andrade Furtado.

Na Praça do Cristo Rei, em frente ao prédio da Es-
cola Preparatória de Fortaleza, existia um campo de fute-
bol. Na época, não era gramado e sem muro em seu en-
torno onde, nas tardes, ocorriam às peladas, se destacavam
os jogadores Fernando Maia, depois jornalista político;
Tarquínio Prisco, posteriormente formado em agronomia e
professor da Universidade Federal do Ceará; José Gerardo
Bezerra, depois formado em agronomia e professor da
Universidade Federal do Ceará; Alves, Isaac Meyer, Alti-
no, Titico, Rui, Geraldo Vasconcelos, Evandro, Gradim, e
o Português entre outros.

Era costume, vendedores de carne, verduras, pei-
xes, leite, pães e água passarem na rua, ofertando seus
produtos. As pessoas faziam compras diariamente, pois
poucas casas possuíam geladeiras para armazenarem os
produtos perecíveis. Em torno do Mercado Público dos
Pinhões, situado na Rua Nogueira Acioly, depois da Rua
Pereira Filgueiras, havia uma feira semanal, às sextas-

77

feiras, onde era possível comprar carnes, verduras, frutas e
cereais. As demais necessidades para o consumo de casa
eram adquiridas nas bodegas existentes nas proximidades.

Tradicionalmente, após o jantar, era comum colo-
car cadeiras nas calçadas para as conversas com os vizi-
nhos, assistir ao movimento de rua e comentar as tarefas
dos próximos dias. Certa vez, estávamos sentados na cal-
çada, quando veio correndo um homem que entregou um
pequeno embrulho nas mãos do papai, dizendo que vinha
logo buscar de volta. Papai esperou pela volta do dono da
encomenda e o mesmo não apareceu. Quando abrimos o
pequeno pacote, era um par de dentaduras. Tempos depois
tivemos uma empregada doméstica novata, que não tinha
dentes e sonhava em ter uma dentadura. Imediatamente,
fui à gaveta do móvel que guardava a tal dentadura, entre-
guei-lhe e ela passou a usá-la mesmo sendo um pouco
maior do que a medida necessária.

Eu e meu irmão Albi gostávamos de assistir a fil-
mes, geralmente de cowboys, no Cine Dioguinho ou no
Centro da Cidade indo e voltando a pé, com total seguran-
ça, nos cines Moderno ou Majestic, depois ir ao abrigo
central tomar uma bananada ou abacatada na cantina do
Pedão ou beber caldo de cana gelada com pastéis, na Leão
do Sul. Muitas vezes íamos passear pelas ruas centrais
para ver as vitrinas das lojas, iluminadas e cheias de atra-
tivos. Também participávamos dos torneios dos jogos de
futebol de botão, realizados em nossa casa, tendo grandes
jogadores como o Marcelo Cajuaz. Frequentávamos as

78

missas na Igreja do Cristo Rei, administrada pelos Padres
Jesuítas, onde estavam os Padres Barbosa, Monteiro,
(grande orador sacro), Conceição, responsável pelas Con-
gregações Marianas, Paulinho, Alcântara, Freire e o sacris-
tão-mor, o irmão Martins.

As quartas-feiras, havia na Praça do Cristo Rei, no
horário das 16.30 h. às 17.30h uma retreta a cargo da
banda de música da Escola Preparatória de Fortaleza e, à
noite, nos fins de semana, grupos de jovens, circulavam
pela praça (rapazes num sentido e as moças, noutro), em
busca de namorados.

Tive a oportunidade de andar nos bondes, tão logo
cheguei do interior do Estado, principalmente, no que fa-
zia a linha Aldeota. O seu ponto inicial era no centro da
Cidade na Travessa Morada Nova, por trás da antiga sede
da Assembleia Legislativa (atual Museu do Ceará). O pon-
to final era na esquina das Avenidas Santos Dumont e Ba-
rão de Studart. O bonde, no seu trajeto até a Praça do Cris-
to Rei, passava ao lado e na frente da Igreja do Pequeno
Grande, da Escola Normal, do Colégio da Imaculada Con-
ceição, cruzava a Rua 25 de Março, a Avenida Dom Ma-
nuel, as Ruas Gonçalves Ledo e Dona Leopoldina e parava
em frente ao portão de entrada da Escola Preparatória de
Fortaleza.

79

COLÉGIO CASTELO BRANCO

A sede do Colégio Castelo era na Avenida Dom
Manoel, nº 339, com fundos para a Rua Rodrigues Junior
e lateral para a Costa Barros, no Centro da Cidade. Per-
tencia à Arquidiocese de Fortaleza, oferecendo os cursos
primário, ginasial e científico.

Estudei no Colégio Castelo no período de 1950-
1957. Comecei no quarto ano primário, fiz o exame de
admissão (necessário para ir para o ginasial), cursei os
quatro anos do ginásio e os três do científico. O Colégio
tinha alunos, distribuídos nos turnos da manhã (estudantes
do ginasial e científico) e da tarde (curso primário).

O diretor, na época, era o Padre Vicente Matos que
ensinava latim. Depois de nomeado Bispo do Crato, foi
substituído pelo Padre Jorgelito Cals, e vice-diretor o Pa-
dre Jonas Barros.

80

Lembro-me bem dos professores Aníbal Craveiro
e Consuelo Cajuaz, no primário; Antônio Soares e Joel
Linhares (Português); Maestro José Lisboa (Música); Tar-
císio Mota e Padre Paixão (Francês); Garcia (peruano) –
Inglês; Nogueirinha, Raimundo de Paula Barros e João
Hipólito Campos (Geografia); Padre Hortêncio e Luiz
Barros (História); Tito (Ciências); Diógenes Cabral do
Vale e Leopoldino Neto (Química); Álvaro Craveiro (Fi-
losofia); Valdo Rios (Física, Matemática e Desenho); Ag-
nelo Alves (Desenho). Os professores padres usavam bati-
nas.

O Professor João Hipólito Campos de Oliveira es-
timulava seus alunos a escreverem. Como ele tinha um
irmão diretor dos jornais dos Diários Associados (Antônio
Carlos Campos), conseguia publicar, no O Unitário, os
escritos selecionados de seus alunos. Assim sendo, o meu
artigo intitulado Caxias, foi publicado no mês de agosto de
1956, ilustrado pela figura de Duque de Caxias, a nan-
quim, pelo aluno do Colégio São José, José Irajá da Costa
e Silva. Em outras duas oportunidades ele publicou, no
mesmo jornal, duas enquetes feitas com os seus alunos,
em forma de perguntas: “Pode o homem habitar em qual-
quer lugar da terra?.” A resposta foi dada pelos alunos
Wagner Vieira Ramos, Antônio de Albuquerque, Walder
Ary e Paulo Morais (!956); a segunda: “Que país america-
no desejaria conhecer?” pelos alunos Waldir Ary e Antô-
nio de Albuquerque (1956).

81

Dos funcionários do Colégio Castelo, lembro-me
do Chiquinho, que trabalhava na secretaria e era responsá-
vel por carimbar diariamente a carteira estudantil dos alu-
nos com o famoso carimbo de “frequentou ou faltou” que
só era devolvida ao final das aulas. No rol dos bedéis,
lembro o Antônio.

A entrada principal do Colégio era uma porta larga,
na Avenida Dom Manoel. No hall de entrada, à esquerda,
funcionava a secretaria, à direita, a sala da diretoria. Na
parte de cima, correspondente aos ambientes da secretaria,
do hall e da diretoria estava situado o auditório, cujos de-
graus de subida estavam logo na entrada do pátio, do lado
direito. Depois do hall, vinha uma segunda porta que dava
entrada para um grande pátio interno e aberto, tendo aos
dois lados, as salas de aula e no final, o banheiro do lado
esquerdo e do direito uma grade de ferro, encaixada que
deslizava para cima, para permitir a passagem para o setor
de educação física. As aulas de educação física eram mi-
nistradas por um sargento do Corpo de Bombeiros do Cea-
rá. A área destinada às práticas de educação física com-
preendia um campo de futebol, uma pista de corrida e al-
gumas barras para exercícios físicos, banheiros e um por-
tão que dava saída para a Rua Rodrigues Junior. Antes da
entrada para a área da educação física, do lado direito do
pátio, existia uma escada que conduzia para o segundo
andar, onde havia três salas de aula, destinadas aos alunos
do curso científico.

82

A farda era obrigatória apenas para os alunos do
primário e ginasial. A calça e a túnica eram da cor cáqui.
A túnica tinha mangas compridas, quatro bolsos (dois na
parte de cima e dois na de baixo), sete botões pretos e, nas
extremidades da gola, duas aplicações sobre tecido azul-
marinho com o símbolo do colégio (um castelo) bordado
na cor branco. Os sapatos, de cor preta. O aluno era obri-
gado a ter todos os botões da túnica fechados.

O Colégio desfilava nas paradas de Sete de Setem-
bro, com os alunos vestindo calça e camisa brancas, com
um círculo azul com o símbolo do Colégio. Os sapatos
“fanabor” branco, com meia “soquete”. No dia do desfile,
que era antecedido por vários treinamentos pelas ruas cir-
cunvizinhas ao Colégio, saíamos pela Avenida Dom Ma-
noel até a Duque de Caxias. Na Praça do Carmo, ficava o
palanque com as principais autoridades do Estado. Depois
passávamos pela Praça do Ferreira, na cadência estabele-
cida pela grande banda de tambores do Colégio. Os alunos
eram distribuídos em pelotões de acordo com suas alturas.
Eu estava sempre entre os alunos do 1º pelotão.

As aulas do Colégio obedeciam ao horário das
7.00h da manhã até as 11.00h para os alunos dos cursos
ginasial e científico, de segunda à sexta-feira.

Era comum, a maioria dos concludentes do curso
ginasial fazerem exames para entrarem na Escola Prepara-
tória de Fortaleza (Exército) e dois fatores concorriam
para isto: a certeza de ter o futuro garantido por uma car-
reira estável, com bom salário e também por ser a farda

83

um atrativo para as moças da sociedade. Assim sendo,
mais de 50% dos meus colegas de ginásio seguiram a car-
reira militar. Isso mudou com o funcionamento do Banco
do Nordeste e a instalação da Universidade Federal do
Ceará.

Dos colegas com quem terminei o curso científico,
recordo-me dos seguintes nomes: Mauro Camurça (médi-
co), Roberto Gradvohl (economista e professor da Univer-
sidade Federal do Ceará), Jorge Furtado (engenheiro civil
e da Rede de Viação Cearense), Armando Cavalcante (ad-
vogado), Moacir Ajuricaba Leite (comerciante), Fabiano
Costa (advogado e professor da Universidade Federal do
Ceará), Paulo César de Morais (representante comercial),
Anchises Nogueira (funcionário da Universidade Federal
do Ceará), Roberto Costa (advogado). Posteriormente,
cursou o Instituto Rio Branco, seguindo carreira diplomá-
tica), Caubi Chaves (dentista), Narcélio (economista e
comerciante), Caldas (engenheiro) e Assis (funcionário
dos Correios e Telégrafos). Ficaram com a nossa turma,
nos dois primeiros anos do científico, transferindo-se no
terceiro, para outro colégio, Walder Ary (engenheiro e
empresário) e Wagner Vieira Ramos (engenheiro).

84

Conclusão do Curso Ginasial
no Colégio Castelo Branco.

85

MUDANDO DE ENDEREÇO

Com o falecimento de meu pai em 1955, minha
mãe resolveu mudar de endereço, indo morar na Avenida
13 de Maio, nº 2286, no Bairro do Benfica, na Gentilân-
dia, quase em frente à praça de mesmo nome. Dentre as
razões para a mudança de endereço estava a nossa situação
financeira que seria amenizada pelo valor maior do alu-
guel de nossa casa em relação ao aluguel da nova morada
de preço menor. A outra razão era que iríamos ficar pró-
ximos à família do meu pai.

A casa que alugamos pertencia à família Espíndola
como outras casas na Avenida 13 de Maio e Rua Marechal
Deodoro. Vizinho a nossa casa do lado esquerdo, morava
o dentista França, que fora jogador famoso do futebol cea-
rense. A vizinha da direita eram duas irmãs solteiras do
papai, tias Zilda e Neném. Tia Neném era funcionária do
Tribunal Regional Eleitoral e Tia Zilda herdara a pensão
de seu pai José Libânio de Sousa que fora coletor federal.

86

Depois vinha à casa do advogado José Augusto Barcelos
Espíndola que tinha como vizinha sua irmã Alaíse Barce-
los Espindola. Em frente a nossa casa, do outro lado da
Avenida !3 de Maio, morava um irmão do pintor Antônio
Bandeira.

Na esquina com a Rua Waldery Uchôa, seguindo
na direção da Avenida da Universidade, morava o advo-
gado, vice-prefeito na época, jornalista e professor da
Universidade Federal do Ceará, Luiz Campos. Do outro
lado da esquina da mesma rua residia o gerente da Firma
Comercial Casa Lima Myrtil, Afonso Caminha Fiúza,
casado com Ilda Barcelos Fiuza, que tinha os filhos Ben-
jamin, Silvio, Gláucia e Sandra, futura esposa do Conse-
lheiro do Tribunal de Contas dos Municípios e Professor
da Universidade Federal do Ceará, Luiz Sérgio Gadelha
Vieira.. Eram seus vizinhos na Rua Waldery Uchôa o ad-
vogado e pintor Mário Barata e o ex-jogador de futebol
José Onofre.

Passando a esquina da Rua Waldery Uchôa e em
continuidade à Avenida 13 de Maio, morava Tia Petra,
casada com seu primo legítimo Afonso de Albuquerque,
funcionário aposentado do DNOCS, cujos filhos eram
Crispiana, casada com Paulo Almeida; Fausto casado com
Leonice; Cleide; Faustino casado com Enir, e Diva, poste-
riormente casada com Rumelyo Lordão. Fausto estudara
no Seminário de Baturité, da Ordem dos Jesuítas e preten-
dia ser padre. Quando desistiu, formou-se em Letras e
Administração Escolar pela Faculdade Católica do Ceará e

87

em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade
Federal do Ceará. Ensinou em vários colégios particulares
de Fortaleza, no Liceu do Ceará e foi diretor da Fênix Cai-
xeiral. Depois foi residir em Belo Horizonte, onde foi pro-
fessor do Colégio Militar de Belo Horizonte, de colégios
estaduais mineiros e da Academia das Agulhas Negras, no
Rio de Janeiro. Faustino, que era funcionário do Departa-
mento Autônomo Estadual de Rodovias (DAER), formou-
se em agronomia, indo trabalhar na Paraíba e no Rio
Grande do Norte no Serviço de Extensão Rural (ANCAR),
atual EMATER e depois professor da Universidade Fede-
ral do Ceará (Curso de Agronomia), sendo diretor do Cen-
tro de Ciências Agrárias e Vice- reitor da UFC; Crispiana
foi funcionária do Exército, lotada no Quartel General da
10ª Região Militar (Fortaleza); Cleide funcionária do De-
partamento Estadual de Estatística e Diva, professora em
colégios particulares.

Vizinho à casa de Tia Petra, do lado direito, mora-
va outra irmã do papai, Tia Souzinha, casada com José
Mendes e que teve os filhos: Maria José (professora de
escola pública) casada com Antônio Bomfim (dentista);
Mariana, religiosa da Ordem das Irmãs de Caridade; Mari-
sa, casada com Wilson Dias (comerciante) e José Luiz
(Deim), funcionário do Departamento de Saneamento e
Obras Públicas, onde exercia o cargo de tesoureiro. Depois
formou-se em medicina e casou-se com Diva Façanha de
Albuquerque. Residia com Tia Souzinha uma empregada,
que diziam ter descendência de escravos, Sinhá Maria,
muito interessante e querida da família.

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Depois da casa de Tia Souzinha, vinha a casa em
que morava o jornalista Antônio Pontes Tavares, junta-
mente com suas irmãs Maria Helena, Dora e Elza. Do ou-
tro lado da avenida, a casa da Família Caminha, constituí-
da pelos irmãos Cleide, Zuleide, Neide e Maurício.

Na continuidade da Avenida 13 de Maio, indo na
direção da Avenida da Universidade, residiam o Deputado
Estadual Murilo Aguiar, Prefeito Municipal de Camocim,
pai do futuro Deputado Estadual Francisco Aguiar e avô
do também deputado Estadual Sérgio Aguiar. Vizinho à
casa do Deputado Murilo Aguiar morava a família do co-
merciante Francisco Oliveira, de cujo primeiro casamento
eram os filhos Carlos Eduardo, Carlos César, Madalena,
Marta, Gercelina e Oliveira Filho. O Senhor Oliveira ca-
sou-se, em segundas núpcias, com a Senhora Maria Yan-
nie Fontenelle que trazia, do seu primeiro casamento, a
filha Miriam, que seria, no futuro, primeira dama do Esta-
do, por seu casamento com o Governador do Ceará Luiz
Gonzaga Mota. Do casamento de Francisco Oliveira e
Yannie Fontenelle nasceu João Fontenelle de Oliveira.

As casas em que moraram as famílias Oliveira e
Aguiar foram depois desapropriadas pela Universidade
Federal do Ceará e passaram a fazer parte das dependên-
cias das Casas de Cultura Estrangeira. O trecho da Aveni-
da 13 de Maio entre a Rua Marechal Deodoro e Avenida
da Universidade que era estreito, foi depois alargado, com
derrubadas de casas e recuo do muro do prédio da Reitoria
da Universidade Federal do Ceará.

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Na Rua Nossa Senhora dos Remédios, atrás do
prédio da Reitoria da Universidade Federal do Ceará, bem
como nas ruas circunvizinhas, existia, na época, um con-
junto de casas conjugadas, com fachadas e divisões inter-
nas iguais, que faziam parte do conjunto de casas constru-
ídas pela Família Gentil, donde a denominação de Genti-
lândia. A mansão da Família Antônio Gentil foi adquirida
pela Universidade Federal do Ceará para ser a sede da
Reitoria.

Entre as Ruas Paulinho Nogueira e Padre Francisco
Pinto, na Rua Nossa Senhora dos Remédios morava o Pro-
fessor Osvaldo Cavalcante, que ensinava latim no Liceu
do Ceará e no Colégio Santa Cecília. Era casado com
Margarida Albuquerque, filha do Tio Chagas, irmão do
papai. O casal tinha 11 filhos. Na esquina das Ruas Nossa
Senhora dos Remédios e Padre Francisco Pinto, morava
Isagela, casada com Mauricio Mendes e filha de Isaac
Campos, filho de Tia Naninha, outra irmã do papai.

Na Rua Padre Francisco Pinto, entre a Rua Nossa
Senhora dos Remédios e a atual Avenida da Universidade,
existia a Vila Santa Cecília, com quatro casas conjugadas,
um terreno em frente às mesmas, com uma pequena área
de lazer, calçada com pedras toscas e sombreada por uma
mangueira. Morava na ultima casa da vila, encostada no
muro que dava para os prédios dos Institutos Básicos da
Universidade Federal do Ceará, o Professor José Bastos,
docente do Curso de Agronomia. Vizinha ao professor
Bastos, era a casa de Tia Naninha, outra irmã do papai,

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viúva e mãe dos seguintes filhos: Isaac Campos (tabelião e
político), Zeca Campos (padre), Antônio Pádua Campos
(jornalista e Conselheiro do Tribunal de Contas), Lúcio
Campos (padre, depois deixou a batina e formou-se em
Psicologia), Francisco Campos (funcionário do BNB),
Irmã Luíza (da Ordem das Irmãs de Caridade), Lúcia
Campos e Rita Campos (funcionárias públicas). A casa
seguinte pertencia ao Antônio Pádua e outra cuja família
não estou a me lembrar do nome.

Na Avenida da Universidade, nas proximidades da
Rua Francisco Pinto, moravam minhas irmãs Aglais e
Dionê, ambas solteiras. Dionê era professora de educação
física em escolas públicas e particulares.

Aos sábados, numa outra praça existente ao lado
do prédio da Escola Técnica Federal (atual Instituto Fede-
ral de Educação, Ciência e Tecnologia), na Rua Marechal
Deodoro e nas proximidades do Estádio de Futebol Getú-
lio Vargas, era realizada uma feira pública, onde se com-
prava de tudo: cereais, frutas e verduras, carnes, queijos,
doces, sucos e refrigerantes, material de limpeza, dentre
outros produtos. A feira começava a ser montada na sexta-
feira à tarde e era desmontada após o meio dia de domin-
go. Ali era um momento para encontrar amigos e conver-
sar com os vendedores da feira, com suas estórias, lingua-
jar peculiar e começar novas amizades.

O lazer maior dos que moravam na Gentilândia era
assistir às partidas de futebol no Estádio Presidente Getú-
lio Vargas. Participar das tertúlias, aos domingos, no Clu-

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be Maguary, que ficava na Rua Barão do Rio Branco, nas
proximidades da Avenida 13 de Maio e do Quartel do 23º
Batalhão de Caçadores (23 BEC) do Exército. O Maguary
marcou a vida de todos aqueles que participaram, em suas
festas animadas pelo conjunto musical do Ivonildo, com a
figura inesquecível de seu porteiro, o Seu Manuel, com
seus casos dos furadores de entrada no Clube (a maioria
pulava os muros), a eleição de sua candidata Emília Cor-
rêia Lima, Miss Ceará e, posteriormente, Miss Brasil. As
festas carnavalescas do Maguary marcaram época pela sua
animação.

Quem morava no Benfica e já era universitário po-
dia participar das festas realizadas no Clube Universitário
(CEU), inicialmente localizado na Rua Senador Pompeu,
ao lado do prédio da Faculdade de Direito, num imóvel
alugado pela Universidade Federal do Ceará para sediar
alguns de seus setores administrativos. As tertúlias do
Clube Universitário eram realizadas às sextas-feiras e,
após o término de suas festas, era comum virmos a pé da
sede do clube até à Gentilandia, com total segurança.

Quem morava em torno do prédio da Reitoria da
Universidade Federal do Ceará pôde assistir o seu desen-
volvimento e sentir a sua importância. Vimos a construção
da Concha Acústica da Universidade, na época considera-
do um projeto arrojado e inovador, idealizado pelo Reitor
Martins Filho, cuja construção coube ao Engenheiro Fer-
nando Alcântara Mota, professor da Universidade e futuro
Deputado Estadual. Assistimos ainda à instalação do pré-

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dio da antiga Escola de Engenharia, na antiga residência
da família Saboya, a implantação das Casas de Cultura, a
construção dos prédios dos Institutos Básicos, a transfor-
mação da sede do Colégio Santa Cecília no Museu de Ar-
tes da Universidade e a construção da quadra de Esportes
do Clube Universitário.

O deslocamento do Bairro do Benfica e da Genti-
lândia para o Centro da cidade era feito através de camio-
netes da Parangaba e de ônibus das linhas do Benfica, Po-
rangabuçu, Itaoca que passavam pelas Avenidas João Pes-
soa e da Universidade.

Eram costumes dominantes no bairro: ficar nos ter-
raços ou nas janelas das casas para ver o movimento dos
que passavam pela Avenida 13 de Maio; conversar e man-
ter amizades com os vizinhos; fazer compras na feira; fre-
quentar o Estádio Presidente Vargas; ir ao centro de Forta-
leza para assistir a filmes, aos atos religiosos na Igreja de
Nossa Senhora dos Remédios e aos espetáculos realizados
na Concha Acústica da Universidade Federal do Ceará;
ver televisão, tomar cerveja nos bares existentes na redon-
deza; frequentar o Maguary Clube e visitar familiares.

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DEPARTAMENTO DE SANEAMENTO
E OBRAS PÚBLICAS (DSOP)

O meu primeiro emprego foi no Departamento de
Saneamento e Obras Públicas (DSOP) do Governo Esta-
dual do Ceará, localizado na Rua Dragão do Mar, nº 81,
nas proximidades do prédio da Alfândega Federal, na
Praia de Iracema, cujo espaço foi ocupado em grande par-
te, pelo Centro Cultural Dragão do Mar.

O DSOP tinha como funções básicas cuidar do
abastecimento de água e saneamento de Fortaleza, elabo-
rar projetos e acompanhar as grandes construções civis do
Estado, dar manutenção aos veículos oficiais do Estado,
em sua enorme oficina mecânica e também confeccionar
placas de bronze para afixação nos prédios públicos, em
fundição existente nas suas dependências. O DSOP tinha
um dos maiores quadros de servidores estaduais.

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A água para o abastecimento de Fortaleza vinha do
Açude Acarape do Meio, Município de Redenção, numa
distância de mais de 76 km, através de grandes tubulações
de ferro fundido, que passavam pelos Municípios de Aca-
rape e Pacatuba (na época não existia o Município de
Guaiúba, desmembrado de Pacatuba) chegando a Fortale-
za. No Município de Pacatuba a tubulação passava pelas
localidades de Água Verde, Guaiúba e Monguba. Em For-
taleza, as Caixas d’água existentes ao lado do prédio da
Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará,
eram os grandes reservatórios de onde saia a rede de dis-
tribuição para os principais pontos da capital, por gravida-
de.

A rede de esgotos, na época, era diminuta e distri-
buída principalmente em torno do Centro de Fortaleza e
sua estação de descarga era pequena, situada por trás do
prédio da Secretaria Estadual da Fazenda.

Quando entrei como servidor do DSOP (1956), o
diretor geral era o engenheiro Argeu Romero que, com a
mudança de governo, foi substituído pelo engenheiro Pau-
lo Ferreira, diretor perpétuo, determinado por portaria do
Interventor Menezes Pimentel. O diretor administrativo
era Moacyr Alcântara, que tinha a capacidade impressio-
nante de realizar operações matemáticas de cabeça, com
rapidez e sem erros. O dirigente das várias equipes de tra-
balhadores que cuidavam da manutenção dos sistemas de
água e esgotos era Antônio Gouveia.

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O Departamento tinha uma equipe de engenheiros,
arquitetos e desenhistas que elaboravam projetos de arqui-
tetura, faziam os cálculos estruturais, as partes relativas às
instalações elétricas e hidráulicas das construções e apre-
sentavam os orçamentos. As construções eram licitadas e
construídas por firmas particulares de engenharia. Eram
seus engenheiros Jaime Verçosa, Lauro Vinhas Lopes,
Luciano Pamplona, Celso Coelho, Muniz Alencar de Ara-
újo, Santana Júnior, Argeu Romero, Luiz Gonzaga Gou-
veia, Agatônio Romero (todos engenheiros civis); arquite-
tos Ivan Britto e Roberto Vilar; Auricélio Pontes (químico
e responsável técnico pelo controle da dosagem de cloro
da águas vindas do açude Acarape do Meio); desenhistas
Nelson Cruz de Moura e Edgar Vieira Perdigão.

Dos funcionários do DSOP, destaco: Pedro Alcân-
tara, depois terminou o curso de matemática e foi profes-
sor de colégios particulares de Fortaleza, da Escola Técni-
ca Federal do Ceará e da Universidade Estadual do Ceará;
Vicente Menezes, formou-se em Direito, Prefeito Munici-
pal de Pacajus por duas vezes e vereador por anos naquele
município; José Luiz de Albuquerque Mendes, tesoureiro
oficial da repartição, graduou-se em medicina; Expedito
Luiz de Figueiredo, por anos coordenou equipes de manu-
tenção dos sistemas de água, esgotos e acompanhou a fis-
calização de muitas das obras públicas; Miguel Martins,
responsável pela supervisão do Açude Acarape do Meio;
Maria Alice Barros dos Santos, chefe de secção; Fernando
Ferreira, chefe do almoxarifado; Dayse Pedrosa Moreira,
agente administrativa; Roque da Rocha Moreira, auxiliar

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