The words you are searching are inside this book. To get more targeted content, please make full-text search by clicking here.
Discover the best professional documents and content resources in AnyFlip Document Base.
Search
Published by mvinicius.muniz, 2018-06-12 09:03:05

Livro de Economia Empresarial

Livro de Economia Empresarial

Economia: o que
você precisa saber

PAULO GONZAGA MIBIELLI DE CARVALHO
JORGE BRITTO
CARMEM FEIJÓ
FERNANDO CARLOS G. DE CERQUEIRA LIMA
MARCOS TOSTES LAMONICA

ORGANIZAÇÃO

DURVAL CORRÊA MEIRELLES
RONALD CASTRO PASCHOAL

2ª edição
rio de janeiro 2014

Comitê editorial externo  carmem aparecida do valle costa feijó, fernando carlos greenhalgh
de cerqueira lima e jorge nogueira de paiva britto
Comitê editorial interno  durval corrêa meirelles, paulo gonzaga mibielli de carvalho e ronald
castro paschoal
Organizadores do livro  durval corrêa meirelles e ronald castro paschoal
Autores dos originais  paulo gonzaga mibielli de carvalho (capítulos 1 e 2), jorge britto
(capítulo 3), carmem feijó (capítulo 4), fernando carlos de cerqueira lima (capítulo 5) e marcos
tostes lamonica (capítulo 6)
Projeto editorial  roberto paes
Coordenação de produção  rodrigo azevedo de oliveira
Projeto gráfico  paulo vitor fernandes bastos
Diagramação  paulo vitor fernandes bastos e andré renato fernandes lage
Supervisão de revisão  aderbal torres bezerra
Redação final e desenho didático  roberto paes
Revisão linguística  pricilla basilio e katia souza
Capa  thiago lopes amaral

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por quais-
quer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou
banco de dados sem permissão escrita da Editora. Copyright seses, 2014.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip)

E17 Economia: o que você precisa saber
Durval Corrêa Meirelles [organizador].
— Rio de Janeiro: Editora Universidade Estácio de Sá, 2013.
160 p

isbn: 978-85-60923-08-3

1. Economia. 2. Macroeconomia. 3. Microeconomia. 4. Desenvolvimento. I. Título.

cdd 330

Diretoria de Ensino – Fábrica de Conhecimento
Rua do Bispo, 83, bloco F, Campus João Uchôa
Rio Comprido – Rio de Janeiro – rj – cep 20261-063

Sumário

Apresentação 7

1. Conceituação Básica 9

A importância de se estudar Economia 10
Mas por que os economistas divergem? 12
O objeto de estudo da Economia 13
Questões econômicas fundamentais: escassez e necessidades 14
Quanto produzir? 15
Como produzir? 15
Para quem produzir? 16
Isso nos leva a outra questão: como definir as necessidades? 16
A curva de possibilidades de produção e custo de oportunidade 18
Bens e serviços 21
Recursos naturais 22
Fatores de produção, agentes econômicos e o fluxo circular 24
Fluxo circular 25
Economia, sociedade e meio ambiente 26
A relação entre economia, sociedade e meio ambiente 26
Próximos capítulos 26

2. Contextualização da Ciência Econômica 29

Uma introdução à História do Pensamento Econômico 30
Os Economistas Clássicos 30
Mão invisível 30
Divisão do trabalho 31
A reação alemã 35
A Economia Neoclássica 37
A Escola Austríaca 38
A economia keynesiana 39
Monetarismo 41
Estruturalismo 42
Economia Capitalista (de mercado) versus Economia Planificada 43
Economia: divisões e relação com as diferentes profissões 45
Economia e sua relação com Administração e Contabilidade 46
Economia e sua relação com Comunicação 46
Economia e sua relação com Direito 46

Economia e sua relação com Geografia 47
Economia e sua relação com História 47

3. A Abordagem microeconômica 49

Método de análise 51
A Teoria do consumidor e da demanda 53
A Teoria da Produção 56
Equilíbrio de mercado e bem-estar 58
Análise de estruturas de mercado 58
Falhas de mercado 63
Da microeconomia tradicional para a organização industrial 65

4. Abordagem macroeconômica 69

O sistema de contas nacionais e os 70
agregados macroeconômicos — Parte 1 71
Fluxo e estoque 72
Produto Interno Bruto (PIB) 73
Fluxo, Estoque, Produto Interno Bruto e Produto Interno Líquido 74
As diferentes óticas de mensuração do produto da economia 74
75
Ótica do produto 75
Ótica da renda 76
Ótica da despesa 78
PIB e PIB per capita
Renda Nacional Bruta e demais agregados 81
Medindo as transações com o resto do mundo:
Balanço de Pagamentos 84
Os determinantes do nível de produto e emprego 84
na economia: conceitos de teoria macroeconômica — Parte 2 89
Crescimento no curto prazo: flutuações do PIB
Emprego e desemprego 91
O que determina os preços, sua variação, 92
e sua relação com a moeda 94
O que é moeda, as funções da moeda, moeda e inflação 95
Inflação ou desemprego: o dilema de economias modernas
Como medir a inflação

5. Políticas Macroeconômicas 97

Política macroeconômica: definição e objetivos 98
Política monetária: definição e objetivos 99

Metas intermediárias 100
Meta intermediária (I): moeda 100
Meta intermediária (II): taxa de juros 104
Meta de inflação 106
107
Instrumentos de política monetária: introdução 107
Depósito compulsório 108
Taxa de redesconto 109
Operações de mercado aberto (ou open market) 109
110
Instrumentos diretos de política monetária 111
Política cambial 111
Regimes cambiais: vantagens e desvantagens 113
Taxa de câmbio fixa 114
Taxas de câmbio flutuantes
Taxa de câmbio administrada 115
Acumulação de reservas internacionais: 116
vantagens e desvantagens 116
Política de comércio exterior 117
Política Fiscal 117
Definição e objetivos 118
Déficit primário e déficit nominal
Dívida bruta e dívida líquida

6. Noções sobre Crescimento e Desenvolvimento Econômico 121

Crescimento econômico versus desenvolvimento econômico 122
Crescimento econômico de longo prazo 123
Acumulação de Capital (K) 124
Crescimento da força de trabalho (L) 125
Nível de desenvolvimento tecnológico (T) 125
Desenvolvimento econômico 126
Os principais indicadores sociais: índice de Gini e
índice de desenvolvimento humano (IDH) 127
Índice de Gini 127
128
Explicando o índice de Gini 129
Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) 130
Desenvolvimento sustentável 131
Políticas públicas para a promoção do desenvolvimento 132
Política de incentivo à acumulação de capital 134
Política de incentivo à Educação 135
Política de garantia ao Direito de Propriedade 136
Política de incentivo ao livre comércio 137
Política de incentivo à Pesquisa e Desenvolvimento 138
Globalização

Origem 139
Características da globalização 140
Globalização produtiva 141
Globalização financeira 142

Apêndice — Como fazer e interpretar gráficos e tabelas 145

Como fazer 146
1) Gráficos 146
146
Cuidados com o gráfico 147
2) Tabelas 147
148
Cuidados com uma boa tabela 150
Como interpretar
O que nos diz esse gráfico? Várias coisas:

Apresentação

A maior parte do que uma pessoa necessita na sua vida não é produzida por ela própria, de
modo individual. Algumas das necessidades humanas são satisfeitas no entorno imediato
da família – como a educação não formal e a troca de afeto –, outras, tanto materiais quanto
espirituais, ou de qualquer natureza, são satisfeitas pelo conjunto de indivíduos organiza-
dos em uma sociedade.

Uma questão importante que daí decorre é como cada sociedade supre as necessidades
de seus membros, ou seja, como ela organiza a produção e a distribuição dos bens e serviços
produzidos. Em sociedades menos complexas como, por exemplo, nas tribais, essa organi-
zação ocorre de modo tradicional pela produção coletiva e pela distribuição mais ou menos
igualitária dos bens. Nessas sociedades, embora possamos identificar um local onde eventu-
almente trocas sejam feitas, o que chamaríamos de mercado, este não ocupa um lugar fun-
damental na organização econômica. Mesmo em sociedades onde o comércio assume papel
relevante na geração de riquezas, como ocorreu com a civilização fenícia, na Antiguidade, a
distribuição dos recursos materiais não era inteiramente regulada pelo mercado.

Apenas na sociedade do tipo capitalista, que se desenvolveu a partir do século XVIII,
encontraremos uma economia construída em torno do mercado. Uma economia de mer-
cado pode ser definida como um sistema autorregulável de mercados, isto é, uma econo-
mia onde bens, serviços e fatores de produção (recursos naturais, trabalho e capital) são
distribuídos e alocados, exclusivamente, pela troca. Na verdade, isso não se aplica de modo
absoluto a nenhuma sociedade, pois existem imperfeições em tal sistema que exigem in-
tervenções externas a ele, como, por exemplo, através da ação governamental.

Quando pagamos impostos, esperamos que o Estado os utilize bem, gerando uma con-
trapartida em termos de proteção e de prestação de serviços públicos. Contamos com isso
porque o Estado, por meio dessas atividades, desempenha o papel necessário de organizar
o funcionamento de uma sociedade. Assim, os mercados suprem as necessidades econô-
micas dos indivíduos e das empresas, cabendo ao Estado as múltiplas funções que garan-
tam o melhor desempenho da sociedade como um todo, através das políticas que propi-
ciem as condições de vida ao indivíduo e de desenvolvimento social e econômico ao país.

A compreensão desses aspectos, fundamentais para o nosso dia a dia, são o objeto das
Ciências Econômicas, um conjunto de disciplinas que procuram entender como as socie-
dades organizam a produção e a distribuição da riqueza. As respostas às questões que daí
decorrem – O que e quanto produzir? Como produzir? Para quem produzir? – constituem o
principal objetivo do estudo da Economia.

A finalidade deste livro é propiciar aos alunos de diversos cursos uma visão introdutó-
ria, porém abrangente, dos principais problemas econômicos que nos afetam nos dias de
hoje. Para tal, procuramos abordar de forma simples - mas não excessivamente simplifica-
da, pois aí perderia efetividade - os instrumentos de que a Economia dispõe para entender
e atuar sobre nossa realidade.

Esperamos que a leitura deste livro seja agradável e útil ao leitor, contribuindo como
base efetiva para a sua atuação profissional e de cidadão.

ronald castro paschoal

• 7capítulo 1



1 Conceituação
Básica
paulo gonzaga mibielli de
carvalho

1 Conceituação Básica

COMENTÁRIO A importância de se estudar Economia

Outras questões É importante estudar Economia para melhor entender o mundo que
nos cerca. Conhecer a questão do desemprego é importante, por exem-
Neste livro não vamos abordar todas plo, para se entender o que é discutido nos jornais, na televisão e nas
essas questões, mas esperamos des- redes, mas também porque isso ajuda o indivíduo em questões tais
pertar em você o interesse pela Econo- como decidir qual a melhor hora de trocar de emprego e pedir aumen-
mia, possibilitando que continue seus to de salário...
estudos da forma que lhe for mais con-
veniente, em um curso formal ou não. Outras questões que a Economia estuda, presentes na mídia e que
Uma forma simples de fazer isso é lendo afetam o consumidor, o trabalhador e o empresário, entre outros, são:
a editoria de economia de um jornal de Por que a inflação está alta? Por que a Economia cresce pouco? A crise
grande circulação, pois esses têm a pre- econômica mundial já acabou? A importação de produtos chineses vai
ocupação de explicar os fatos econômi- acabar com a indústria nacional? Paga-se muito imposto no Brasil? É
cos em uma linguagem mais simples. necessária uma reforma na Previdência? A renda no Brasil é muito con-
centrada? O que é desenvolvimento sustentável? O estudo da Economia
nos ajuda a responder a todas essas perguntas.
COMENTÁRIO
Apesar dessa relevância, é muito comum ouvir dos estudantes co-
Economista mentários relacionados à dificuldade de se estudar e compreender Eco-
nomia. Sendo assim, vamos levantar os questionamentos mais comuns
Deve-se desconfiar dos economistas e procurar respondê-los de forma prática.
que só conseguem se expressar por
meio de fórmulas matemáticas e não REFLEXÃO
conseguem apresentar suas ideias sem
economês (aquelas palavras difíceis Economia é uma matéria muito complicada, pois exige muito conhecimento
que só os economistas conhecem). de matemática...

Um economista precisa ter uma boa base em Matemática, mas não
é necessário grande conhecimento dela para se entender os princípios
básicos de Economia. Este livro pretende demonstrar isso.

Os economistas só trabalham com modelos, por isso o que eles dizem
é incompreensível.

Nem todos os economistas trabalham com modelos matemáticos, mas
seu uso muitas vezes é imprescindível. Modelos nada mais são do que uma
simplificação da realidade, o que é necessário, já que a realidade é muito
complexa. Por exemplo, um economista pode afirmar que o nível de renda
das pessoas é consequência da sua escolaridade e idade (experiência). Isso é

10 • capítulo 1

uma simplificação da realidade, pois outras variáveis têm impacto sobre o COMENTÁRIO
nível de renda. Mas para que complicar demais? Se o poder explicativo des-
sas duas variáveis (escolaridade e idade) for elevado, podemos ficar por aqui. Simplificação da realidade

Claro que há modelos de difícil compreensão, alguns não podem ser Em uma segunda etapa, podemos sofis-
testados por falta de dados. Diferentes escolas de pensamento econô- ticar um pouco mais e agregar outras va-
mico irão utilizar diferentes modelos para explicar o mesmo fenômeno, riáveis. Portanto, um economista iria criar
mas o uso de modelos é inevitável. uma relação matemática entre essas
variáveis, formulando assim um mode-
EXEMPLO lo econômico, para em seguida testá-lo
com os dados existentes (supondo que
Um bom exemplo de como a simplificação é necessária para a compreensão da não seja um modelo apenas teórico). No
realidade são os mapas. No google maps de uma cidade, todas as ruas transversais capítulo 3 veremos mais sobre a constru-
às grandes avenidas só surgem quando se aplica um bom zoom. Com pouco zoom, ção de modelos teóricos na microecono-
apenas as grandes avenidas são visíveis, mas isso é exatamente o mais relevante. mia e o uso do método lógico-dedutivo e
Se nessa escala aparecessem também as ruas transversais, ficaria difícil visualizar o de hipóteses simplificadoras.
mais importante, que são as avenidas. Detalhe demais atrapalha.

REFLEXÃO

O conhecimento de Economia de pouco adianta no dia a dia.

Conhecimento de Economia é muito útil no dia a dia. É tão útil, que
vários desses conhecimentos você já tem e não se deu conta disso. Veja-
mos um exemplo:

EXEMPLO

Seu time de futebol, que tem uma grande torcida, vai ter um jogo decisivo no sába-
do. Você vai deixar para comprar o ingresso no próprio sábado um pouco antes da
partida? Claro que não. Pois nesse caso você iria comprar de cambista e pagar muito
caro. O cambista vende caro, porque a essa altura não há mais ingresso disponível
nas bilheterias, mas ainda existem pessoas querendo comprar. Dito de outra forma,
há pouca oferta de ingressos – o que tem está com os cambistas – mas há procura
por ingressos. Os cambistas sabem disso e por isso vendem caro. Se você entende
a lógica de situações desse tipo, você conhece os princípios básicos da chamada
lei da oferta e da demanda. Foi a escola da vida que te ensinou, não foi um curso de
Economia. Ensinou e você aprendeu, porque é algo útil no dia a dia.

Mas a escola da vida não ensina tudo, caso contrário, ninguém estu-
daria nem faria faculdade. Vejamos agora um tipo de situação em que o
conhecimento de Economia é importante.

capítulo 1 • 11

COMENTÁRIO EXEMPLO

Divergências Suponha que você queira comprar uma televisão nova e existam duas opções: à vista ou
em 24 vezes com juros de 2% ao mês, mas com uma prestação baixa. Suponha também
Veja o caso dos médicos que, no dia a que a inflação seja de 0,5% ao mês e a caderneta de poupança renda 0,6% ao mês. A
dia, para todos nós, são mais importan- maioria das pessoas optaria por pagar a prazo, afinal a prestação é baixa e cabe bem
tes que os economistas. Em muitas si- no salário. Essa solução é a mais cômoda, mas não é a melhor. Você estará pagando
tuações, não é incomum consultar três de juros o equivalente a quatro vezes o valor da inflação, e durante 24 meses! Não é
médicos sobre uma operação e ter três necessário fazer cálculos para confirmar, é evidente que nesse caso o barato sai caro.
diagnósticos diferentes: a) não precisa Para chegar a essa conclusão você comparou a taxa de juros com a taxa de inflação
operar; b) não precisa operar agora, mas e rendimento da caderneta de poupança e (implicitamente) confrontou o preço à vista
talvez precise operar no futuro; c) tem com o preço a prazo. Com noções de economia é mais fácil fazer esse tipo de raciocínio.
de operar e tem de ser agora. Se algum
deles for homeopata ou praticante da REFLEXÃO
medicina chinesa, as divergências se-
riam ainda maiores. Os economistas não se entendem, cada um diz uma coisa diferente. É tudo muito confuso.


Os economistas têm discordâncias entre si, mas divergências exis-
tem em várias ciências e profissões e são parte da vida. Ainda mais na
Economia, que é uma ciência social e não uma ciência exata. Você con-
corda com todas as ideias de seus pais, de seu filhos, irmãos ou amigos?
Com certeza não, e isso, na maioria das vezes não impede a convivência.

Mas por que os economistas divergem?

Em primeiro lugar existem diferentes escolas de pensamento dentro da
Ciência Econômica. Fazendo uma analogia com a Medicina, um médico
com formação tradicional e outro com formação em Medicina Chinesa
vão olhar o paciente de forma muito diferente e, portanto, o diagnóstico
e, principalmente a terapia, serão divergentes.

Comparando um economista neoliberal e um economista keynesia-
no (mais adiante falaremos mais detidamente dessas correntes de pen-
samento), veremos que o primeiro acredita que a intervenção do Estado
só atrapalha o funcionamento da economia. Já o segundo, acredita que a
economia só vai funcionar adequadamente com intervenção do Estado.

REFLEXÃO

Os economistas vinculados a essas correntes nunca vão se entender, caso se ati-
verem rigidamente a seus princípios, pois partem de premissas e teorias diferentes.
A situação se complica ainda mais se esses economistas estiverem vinculados a
partidos políticos ou associações de classe divergentes.

12 • capítulo 1

Pode haver divergências também porque um dos lados usou de forma inadequada uma
teoria ou um modelo, por exemplo, deixando de lado variáveis importantes. Pode haver tam-
bém divergências de ordem empírica.

EXEMPLO

Por exemplo, se há falta de dados e informações, qualquer avaliação fica muito subjetiva e, portanto, as
divergências são grandes. Se há dados suficientes, pode haver divergência quanto à escolha da base
de dados – por exemplo, a do IBGE ou do Ministério da Agricultura para estimativas de safra – e no
tratamento/uso desses dados.

De que lado ficar em uma polêmica? Há duas alternativas. Pode-se assumir uma postu-
ra sectária (e equivocada) e sempre considerar que estão corretas as posições defendidas
pelos economistas com os quais você simpatiza e que as demais estão erradas. Ou adotar
uma postura aberta e democrática ouvindo o que todos têm a dizer e depois se posicionar.
Essa é a postura correta.

REFLEXÃO

É só assim, com o livre debate de ideias, que o conhecimento avança, não só na Economia como em todas
as áreas do saber. É mais trabalhoso, sem dúvida, mas ser guiado por preconceitos é muito pior.

O objeto de estudo da Economia

Mas afinal, do que trata a Economia? Qual é o seu objeto de estudo? A definição mais tra-
dicional, formulada em 1932 por Lionel Robbins, afirma que “a economia é uma ciência
que estuda o comportamento humano, como uma relação entre meios e fins. Sendo os
meios escassos e com usos alternativos”. Dito de outra forma, a economia estuda como
se usa a racionalidade (do comportamento humano) para solucionar problemas como
orçamento apertado.

EXEMPLO

Por exemplo, temos um fim — pagar as contas, ter algum lazer e, se possível, poupar —, mas o salário é
curto (meio escasso). O dinheiro pode ser utilizado de diferentes formas, pois há várias contas a pagar –─
algumas podem ser adiadas com pouco custo e outras não –, há diferentes tipos de lazer e de aplicações
financeiras. Qual seria a escolha racional a se fazer nessa situação? Essa escolha seria a que daria maior
satisfação (maximizaria o bem-estar).
Tendo as informações necessárias, a teoria econômica indica o caminho a tomar. Situações desse tipo
não ocorrem apenas com consumidores e famílias, mas também com empresas, governos, instituições etc.

Note que essa definição pressupõe que o agente econômico (basicamente famílias e
empresas) aja com racionalidade. Mas a propaganda nos leva a agir com racionalidade?

capítulo 1 • 13

COMENTÁRIO No intuito de obter maiores ganhos, as famílias e empresas agem sem-
pre com racionalidade ou muitas vezes são otimistas em excesso e in-
Otimistas fluenciadas por boatos?

Uma das causas da crise financeira A definição de Robbins também restringe a Economia ao estudo da
internacional de 2008 foi uma combi- Psicologia Humana, quando, na verdade, ela é muito mais do que isso.
nação de endividamento elevado com Não há referência à história ou à sociedade, portanto, a teoria econômi-
otimismo desmesurado sobre ganhos ca daria conta de qualquer situação de meios escassos e fins alternativos
financeiros. que envolvam seres humanos. Mas uma tribo indígena e o homem mo-
derno têm a mesma racionalidade?

Uma definição alternativa seria: A Economia é a ciência social que es-
tuda a produção, distribuição e consumo de bens e serviços. As principais
diferenças frente à definição anterior são a menção da Economia como
ciência social, e não se fazer referência ao comportamento humano.

REFLEXÃO

Cabe destacar dois pontos. Em nenhuma das duas definições há valores éticos ou
morais envolvidos. Portanto, a Economia pode ser utilizada para o bem (exemplo: para
a paz) ou para o mal (exemplo: para a guerra). Os agentes econômicos, porém, no dia
a dia, têm valores éticos e morais e fazem suas escolhas também com base nisso.

Não se falou nada até agora sobre quais seriam os fins. Esses seriam,
pelo enfoque tradicional, tornar máximo (maximizar) o lucro das em-
presas e a satisfação dos indivíduos. Entretanto, os agentes econômicos
(famílias, empresas) procuram fazer o que é melhor para eles individu-
almente, o que não necessariamente é o melhor para a coletividade ou
para o país, como você verá no capítulo 2.

Questões econômicas fundamentais: es-
cassez e necessidades

As questões econômicas fundamentais, do ponto de vista do agente in-
dividual, são:

ATENÇÃO

O que e quanto produzir — quais os produtos a serem produzidos e em
que quantidades;
Como produzir — que tecnologia utilizar;
Para quem produzir — que mercado consumidor se pretende atingir.

Essas questões só existem porque há escassez e necessidades a se-
rem atendidas. Estamos tratando aqui apenas dos bens econômicos,

14 • capítulo 1

que são aqueles relativamente escassos e que precisam ser produzidos, COMENTÁRIO
e, portanto, não são abundantes e oferecidos gratuitamente pela nature-
za, como é o caso dos bens livres. As necessidades vão definir o tamanho Bens livres
do mercado consumidor de um produto.
Exemplos de bens livres são o ar, água,
Quanto produzir? luz solar etc. Como você já deve ter pen-
sado, alguns bens livres, devido ao mau
O quanto produzir vai depender do tamanho do mercado e da capaci- uso feito pelo homem, já estão se tornan-
dade da empresa em atendê-lo. Suponha que em um país com 10 mi- do escassos, como é o caso da água.
lhões de habitantes, metade deles tenha algum tipo de deficiência visual
(miopia, astigmatismo etc.) e necessitem de óculos. Suponha que todos
tenham recursos para comprar óculos. Nesse caso, o mercado consumi-
dor de óculos seria de 5 milhões de pessoas. Até aqui já estão definidos
para quem produzir (pessoas com deficiência visual), o que produzir
(óculos) e quanto produzir (5 milhões de óculos).

Como produzir?

No exemplo dos óculos, várias empresas vão disputar esse mercado. Ven-
derá mais quem utilizar uma tecnologia que possibilite produzir óculos
de boa qualidade, com um preço atrativo para o consumidor (bom e ba-
rato). Estamos falando, portanto, do como produzir, ou seja, refere-se à
tecnologia utilizada no processo produtivo. A questão da escassez entra
na escolha da tecnologia. As matérias-primas mais escassas são as mais
caras e determinam a escolha da tecnologia. Os empresários vão fugir
da tecnologia que tem altos custos de produção, pois isso significa preço
elevado e poucos consumidores.

REFLEXÃO

Não se pode produzir sem que haja alguém ou alguma máquina trabalhando em
algum lugar. Portanto, precisamos para produzir, pelo menos, de trabalho, capital
e recursos naturais. Esses são os fatores de produção, que são os recursos indis-
pensáveis para viabilizar um processo produtivo. Alguns avaliam que capacidade
empresarial e capacidade tecnológica também devem ser consideradas fatores
de produção. Para simplificar, trabalharemos nesse capítulo apenas com os dois
fatores produtivos mais utilizados pelos economistas nos seus estudos, que são
capital e trabalho.

Há sempre diferentes formas de se produzir um mesmo produto, a
partir de diferentes combinações dos fatores produtivos. Por exemplo,
no passado as agências bancárias faziam seu serviço de atendimento
ao público utilizando muito fator trabalho (muitos caixas humanos) e

capítulo 1 • 15

COMENTÁRIO pouco fator capital. Hoje é o inverso, pois predominam os caixas ele-
trônicos.
Comprado pelos consumidores
Para quem produzir?
Estamos nos referindo aqui apenas ao
que é produzido com fins de lucro, pois As questões econômicas fundamentais não são fáceis de serem respondi-
o governo, por exemplo, pode oferecer das. O ponto de partida de tudo é o para quem produzir. Só faz sentido pro-
serviços gratuitos para a população. duzir algo que venha a ser comprado pelos consumidores. Se for um produ-
to ou serviço já estabelecido no mercado, não há muito como errar, mas se
for um produto novo ou substancialmente modificado, como os consumi-
dores vão reagir? Basta a propaganda para solucionar esse problema? Com
propaganda se cria mercado para qualquer produto? Com certeza não.

EXEMPLO

Por exemplo, no início dos anos 1990, no Brasil, houve muito propaganda dos carros
da marca Lada, que eram importados da antiga União Soviética. Essa marca era des-
conhecida aqui, mas com a propaganda muitos carros foram vendidos, até porque
o preço era convidativo. O problema é que em pouco tempo ficou claro que o carro
não era adaptado às ruas, estradas e ao clima brasileiro. As vendas despencaram e
o Lada deixou de ser importado. Moral da história: propaganda não faz milagre; se o
produto é ruim, não vende.

Vejamos o caso do telefone celular. Qualquer pesquisa junto aos con-
sumidores nos anos 1980 diria que eles não necessitavam desse produ-
to. O que todos queriam era um telefone fixo em casa, o que não era fácil
de conseguir. Com telefone no trabalho, em casa e cabines telefônicas
(orelhões) na rua, qual a necessidade de um telefone portátil? Mas o pro-
duto foi introduzido no mercado e aos poucos foi conquistando espaço,
ainda sem os recursos que existem hoje. Atualmente, para muitos, já é
um produto de primeira necessidade. Moral da história: as necessida-
des podem ser criadas. Todo produto que torna a vida mais fácil, por ser
mais prático, por exemplo, leva vantagem.

Isso nos leva a outra questão: como defi-
nir as necessidades?

As necessidades individuais podem ser divididas em corporais, espiritu-
ais e de consumo suntuário (de luxo). As necessidades corporais podem
ser biológicas, que são as relativas ao vestuário, alimentação, reprodu-
ção e habitação, e sociais, que são dadas pela vida em sociedade.

16 • capítulo 1

EXEMPLO COMENTÁRIO

Por exemplo, certas empresas exigem que seus funcionários trabalhem de terno, Consumismo
pois isso é uma norma social; logo, é forçoso adquirir esse tipo de roupa.
Com certeza você já comprou produtos
As necessidades espirituais são as referentes ao conhecimento, cria- que nunca utilizou ou utilizou muito pou-
ção artística e a religião. O consumo de luxo tem servido historicamente co, o que não justificaria a compra. Se
para diferenciar classes sociais, pois o preço de seus produtos costuma isso acontece com frequência você é um
ser muito elevado. consumista. Responda com sinceridade:
você consegue viver sem consumir pro-
Vivemos em sociedade e, portanto, temos também necessidades cole- dutos supérfluos (não essenciais)? Para
tivas, que são aquelas derivadas da vida em comunidade e que só podem, você é fácil definir o que é um produto
na maioria das vezes, ser atendidas, de forma coletiva. Esse é o caso dos supérfluo? O telefone celular é um pro-
serviços de transporte, habitação, saúde, educação (CANO, 2007). duto supérfluo? Sua resposta se refere
a todos os celulares ou só para alguns
ATENÇÃO tipos de celulares? Essas não são ques-
tões fáceis de serem respondidas.
O atendimento das necessidades básicas depende, em boa parte, dos indivíduos.
Tendo um bom emprego podemos pagar por uma boa alimentação, comprar roupas
etc. Já as necessidades sociais dependem, em boa medida, do governo e suas polí-
ticas públicas, pois é ele que constrói grande parte das estradas, hospitais, escolas e
grandes espaços de lazer (estádios, por exemplo).

As necessidades das pessoas são diferentes (região, classe social,
sexo etc.) e mudam ao longo de tempo. Esse é um grande desafio, se o
objetivo for alcançar o desenvolvimento sustentável, que pode ser de-
finido como o desenvolvimento que visa atender às necessidades da
geração presente, sem comprometer o atendimento das necessidades
das futuras gerações.

ATENÇÃO

Esse já é um problema do presente, nosso planeta não suporta o atendimento de nos-
sas necessidades atuais. Um bom exemplo disso é o problema das mudanças climá-
ticas. A temperatura do nosso planeta tem aumentado, em boa medida, por causa do
aumento do consumo de combustíveis fósseis (exemplos: carvão e derivados do petró-
leo). Em virtude disso, o clima está ficando cada vez mais instável e a altura dos mares
aumentando. Para enfrentarmos esse problema não basta trocarmos combustíveis
fósseis por fontes de energia renováveis (energia hidrelétrica, solar, eólica — ventos
etc.), precisamos mudar nosso padrão de consumo e, portanto, nossas necessidades.

Não é nada fácil, dado o consumismo da sociedade em que vivemos. So-
mos consumistas quando compramos mais do que necessitamos. Todas as
necessidades atuais podem ser atendidas? Com certeza não, pois não ha-
veria recursos naturais suficientes, nem capacidade de absorver os dejetos
gerados pela poluição do ar, da água, de resíduos sólidos (lixo). Se todos os

capítulo 1 • 17

habitantes do planeta tivessem o mesmo padrão de vida de um norte-americano de classe mé-
dia, seria o caos. Só tendo outros planetas para importar matérias-primas e exportar poluição.

Na sociedade em que vivemos, é difícil não ser consumista de alguma forma. O consu-
mismo é algo sobre o qual se deve refletir e não apenas aceitar passivamente.

A curva de possibilidades de produção e custo
de oportunidade

O dilema entre recursos limitados versus fins alternativos é muito bem apresentado na cur-
va de possibilidade de produção (também chamada de curva de fronteira produtiva ou de
transformação da produção). Essa curva, que é uma representação simplificada de uma
economia, é sempre côncava e em cada eixo há um produto. Vejamos:

Quantidade produzida de Canhões10
9
8 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5
7 Quantidade produzida de Manteiga
6
5
4
3
2
1

0
0

ATENÇÃO

A área delimitada pela curva é a de possibilidades de produção para aquela Economia em relação aos
dois produtos, que são os únicos produzidos, no caso, manteiga (em toneladas) e canhões (quantidade).
Isso significa que qualquer ponto além da curva é impossível de ser alcançado. A produção máxima é
alcançada quando a economia está em algum ponto da borda da curva. Esse é o seu limite, o limite das
possibilidades de produção.

18 • capítulo 1

Produto BA área delimitada pela curva é dada pela capacidade produtiva da Economia, que por
sua vez, depende da disponibilidade de fatores produtivos (capital e trabalho). Portanto,
quanto maior a população, o número de máquinas e fábricas no país, ou quanto maior a
produtividade dos operários ou das máquinas, maior a sua capacidade produtiva. Haven-
do maior produtividade ou disponibilidade de fatores, a curva se desloca para a direita
(para fora). Havendo menor produtividade ou disponibilidade, o deslocamento é para a
esquerda — para dentro.

3,5

3

2,5

2

1,5

1

0,5

0
0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5
Produto A

ATENÇÃO

Por exemplo, a curva irá se deslocar para a direita se a população crescer ou se, com o progresso téc-
nico, as máquinas velhas forem substituídas por novas, que são mais produtivas. Se a população do país
diminuir em razão da emigração, queda da taxa de natalidade ou por guerras ou terremotos, a curva irá
se deslocar para a esquerda.

A curva expressa o dilema clássico da Economia. Não há recursos para se produzir tudo
o que se deseja e é necessário fazer escolhas. Para se produzir mais de um produto é neces-
sário, sempre, se produzir menos de outro, até a situação limite, em que toda a capacidade
produtiva da Economia está voltada para a produção de apenas um produto.

capítulo 1 • 19

COMENTÁRIO Quantidade produzida de Canhões10

Custo de oportunidade 9
8 AD
É o de que se abre mão ao se fazer uma
escolha. É o custo de uma escolha. À 7
medida que se avança na produção de
manteiga, o custo de oportunidade au- 6
menta. Para mais uma tonelada de man- 5 CB
teiga, abre-se mão de 5 canhões.
O conceito de custo de oportunidade se 4
aplica a várias situações. Em um filme
do cineasta Domingos de Oliveira, o per- 3
sonagem principal — um conquistador
inveterado — afirma que o difícil não é 2
escolher uma mulher, o difícil é deixar de
lado todas as outras mulheres do mundo. 1
Nesse caso, o custo de oportunidade são
todas as outras mulheres do mundo. O 0
filme se chama Todas as mulheres do 0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5
mundo e foi estrelado por Paulo José e Quantidade produzida de Manteiga
Leila Diniz, em 1966. É considerado um
clássico do cinema brasileiro. No exemplo dado, 9 é a quantidade máxima que se pode produzir de
canhões; e 3 toneladas, o máximo de manteiga. Suponha que se esteja no
ponto A (8 canhões e 1 tonelada de manteiga) e se passe para o ponto B (5
COMENTÁRIO canhões e 2 toneladas de manteiga). Nesse caso, a produção de mantei-
ga aumentou de 1 tonelada para 2 toneladas, mas, em compensação, a
Recursos ociosos produção de canhões caiu de 8 para 5. Para se produzir 1 tonelada a mais
de manteiga foi necessário abrir mão de 3 canhões. Esses 3 canhões que
Um exemplo seria a situação de desem- deixaram de ser produzidos representam o custo de oportunidade.
prego. Parte da mão de obra não está
trabalhando, e, por isso, a produção é Note que o ponto D é impossível de ser atingido. Esse não é o caso
menor do que poderia ser. do ponto C. Esse último ponto representa uma situação em que se está
produzindo menos do que poderia, pois estamos dentro da curva e não
na sua borda. No ponto C estamos produzindo 1 tonelada de manteiga,
mas apenas 5 canhões, quando poderíamos produzir 8. Isso ocorre por-
que, por algum motivo, não estamos utilizando todos os recursos que
temos e, portanto, estamos com recursos ociosos.

Em nosso exemplo, os dois produtos selecionados foram canhões e
manteiga para destacar um dilema econômico clássico. Ao se desviar mui-
tos recursos para a guerra (canhões), as necessidades da população (man-
teiga) ficam em segundo plano. Esse é um dos muitos custos de uma guerra.

EXEMPLO

Durante a Segunda Guerra Mundial, a venda de manteiga nos Estados Unidos foi ra-
cionada, havendo um limite máximo de manteiga que as famílias podiam comprar por
mês. A venda de automóveis para civis chegou a ser proibida, exceto em situações
especiais — exemplo: médicos podiam comprar automóveis por ser considerado ne-
cessário para o exercício de sua profissão. As fábricas de automóveis passaram a
fabricar tanques e diversos tipos de armamentos.

20 • capítulo 1

Bens e serviços COMENTÁRIO

Numa Economia são produzidos bens e serviços. Bens são produtos que Bens finais
têm forma física — como ferro, automóvel e sapato, por exemplo — e
existem para satisfazer alguma necessidade. Os serviços não têm forma Os bens finais podem ser de dois tipos:
física — como uma consulta médica, o serviço de um eletricista, uma bens de consumo e bens de capital. Os
aula de professor. bens de consumo, como o próprio nome
diz, são os utilizados no consumo das fa-
A produção provém dos três setores que compõem uma Economia: mílias. Por exemplo, o móvel e o sapato.
primário (agricultura e pecuária), secundário (indústria) e terciário (co- São subdivididos em bens duráveis, bens
mércio e serviços). não duráveis e bens semiduráveis. Su-
pondo que sejam utilizados com frequên-
EXEMPLO cia, os bens duráveis duram muitos anos
(exemplos: geladeiras e televisores), os
Quando um país é pobre, é o setor primário o mais importante, quase não existe in- semiduráveis, poucos anos (exemplos:
dústria, e o terciário tem pouco peso. O Brasil era assim até o século XIX. Com o de- roupas) e os não duráveis, menos de um
senvolvimento, a indústria ganha peso e, em seguida, o setor terciário. A economia, ano (exemplos: alimentos e bebidas).
portanto, se diversifica. Em 2013, no Brasil, a agropecuária representava apenas
5,7% da produção do país, a indústria 24,9% e o terciário 69,4% (Fonte: indicadores
do IBGE - Contas Nacionais trimestrais, outubro/dezembro 2013). COMENTÁRIO

Os bens podem ser de dois tipos: bens finais ou bens intermediá- Bens de capital
rios. Os bens intermediários são matérias-primas (insumos) que serão
transformadas em um produto, por meio de um processo produtivo. Por Por exemplo, para produzir automóveis
exemplo: o ferro e carvão transformados em aço; madeira se torna um não bastam máquinas, é necessário ter
móvel; couro vira um calçado. uma fábrica, que é uma construção. Da
mesma forma, para produzir transporte
Os bens finais são os que não sofrem transformações e são utilizados na marítimo, não basta ter navios, é necessá-
forma como se apresentam. Por exemplo, você pode sair da sapataria já com rio ter portos e também estradas, sem as
seu sapato novo no pé. O móvel, logo que chegar à sua casa, você irá utilizar. quais a produção não chega até o porto.
Já o ferro, tem apenas um uso, que é ser transformado em outro produto.

Os bens de produção ou bens de capital são aqueles utilizados na
produção de outros bens, como máquinas, equipamentos ou constru-
ções. Máquinas podem, com maior ou menor intervenção humana, pro-
duzir sapatos, refrigerantes, automóveis etc. Também se incluem nos
bens de capital todas as construções e infraestrutura de um país, pois
contribuem para a produção de bens.

Nem sempre é fácil classificar um bem ou serviço nessas diferentes
categorias, pois isso depende do uso que se dá. Por exemplo, para a
maioria das pessoas o automóvel é um bem de consumo durável. Mas
para um taxista é um bem de capital, pois produz um serviço, o trans-
porte de passageiros. Da mesma forma, uma laranja é um bem de con-
sumo não durável quando comprada na feira com o objetivo de fazer
suco de laranja para tomar no café da manhã. Mas é um insumo, se é
uma empresa que compra a laranja com o objetivo produzir suco de
laranja para exportação.

capítulo 1 • 21

COMENTÁRIO Os setores são interdependentes, pois compram e vendem entre si.
Por isso é muito comum quando estudamos a Economia por meio de ca-
Cadeias produtivas deias produtivas e se incorporamos a dimensão ambiental, chegamos
ao ciclo de vida do produto.
Cadeia produtiva é um conjunto de eta-
pas consecutivas pelas quais passam e O conceito de cadeia produtiva, incorporando a preocupação am-
vão sendo transformados e transferi- biental, evoluiu para o de ciclo de vida do produto. Nesse caso, se inclui
dos os diversos insumos (PROCHNIK, uma penúltima etapa, que é a do descarte (morte do produto), e a etapa
2002). Por exemplo, o minério de ferro é final é a reciclagem, quando o produto retorna a uma etapa anterior.
extraído da natureza (primeira etapa), em
seguida se transforma em aço (segunda EXEMPLO
etapa), o qual é utilizado na fabricação do
automóvel (terceira etapa). Nesse caso, Por exemplo, sucata de automóvel pode ser utilizada na fabricação de aço. Latas
foram três etapas consecutivas. Entre de cervejas usadas podem ser utilizadas na fabricação de novas latas de cerveja.
elas houve transporte e, em cada uma Outra diferença com relação ao ciclo de produto é que agora há uma preocu-
delas, pagamento de impostos. pação com a mensuração dos impactos ambientais e sociais em cada uma das
etapas. Por exemplo, um automóvel não gera poluição apenas quando é utilizado.
Gera também quando é produzido e quando é descartado de forma inadequada.
De forma indireta, é responsável pela poluição produzida na produção de aço
e ferro e no transporte entre essas etapas. No caso da extração do minério de
ferro, ainda há a questão de se estar diminuindo o estoque de um recurso natural
não renovável.

Recursos naturais

Recursos naturais podem ser definidos como o conjunto de riquezas na-
turais em estado bruto de um país. É portanto, tudo que a natureza for-
nece e dá de suporte à vida humana na terra. Inclui, portanto, recursos
tais como terra, água, ar, minerais, florestas, peixes e demais recursos
marinhos, flora, fauna e clima. Os recursos naturais são tradicional-
mente divididos em renováveis e não renováveis.

COMENTÁRIO

Recursos naturais renováveis são aqueles repostos pela natureza em um curto espa-
ço de tempo, tais como ar e água. Recursos naturais não renováveis são aqueles que
não são repostos pela natureza em um curto espaço de tempo, tais como petróleo e
minério de ferro. O petróleo é produzido pela natureza, mas são necessários milhões
de anos para isso.

A partir das definições anteriores, poderíamos pensar que deverí-
amos nos preocupar apenas com os recursos naturais não renováveis.
Ledo engano. Devemos nos preocupar com ambos. Há recursos naturais

22 • capítulo 1

não renováveis que dificilmente irão se esgotar, pois são pouco utilizados, como o urânio.
Mas o mesmo não se pode dizer do petróleo.

A água é um recurso renovável, mas, na história recente do Brasil, em vários momentos,
o abastecimento de água e o fornecimento de energia elétrica foram motivo de sérias pre-
ocupações, devido à falta de chuvas. Situação que tende a se agravar com as mudanças cli-
máticas. Temos ainda o problema da qualidade da água. No Brasil, a maior parte do esgoto
residencial não é tratada, antes de ser despejada nos rios, lagos, lagoas ou mar. Por sinal,
poucos sabem que o que pagamos de conta de água é basicamente para cobrir os custos
com transporte e limpeza da água. O custo da água em si, é próximo a zero.

Ford versus General Motors e o início da sociedade de consumo
(ou não se fazem bens de consumo duráveis como antigamente)

Muitos pesquisadores consideram a disputa entre a Ford e a General Motors (GM), nos anos 20
do século passado, como o marco inicial da chamada sociedade de consumo, por ter populariza-
do a prática de obsolescência planejada.
Até o início dos anos 1920, a Ford dominava amplamente o mercado de automóveis nos Estados
Unidos, devido ao sucesso do Ford Modelo T. Esse carro era barato e durável. A ideia da Ford era
que fosse um carro para a vida inteira. Mas tinha um inconveniente, era considerado feio pelos
consumidores, devido ao design e, principalmente, por ser preto. A GM, para concorrer, lançou
um carro que tinha muitas das características do Ford Modelo T, mas com duas importantes
diferenças: havia modelos em diferentes cores e, a cada ano, seria lançado um modelo novo — o
carro do ano —, com mudanças em relação ao modelo do ano anterior. Com essa política, no final
dos anos 1920, a GM já vendia mais carros que a Ford. Não houve jeito, a Ford teve que ceder
e passou a lançar novos modelos de carros.
Com essa prática, em apenas um ano, um carro fica velho, pois já é fabricado um modelo novo.
Isso induz o consumidor a trocar de carro todo ano e, portanto, a comprar vários carros ao longo
de sua vida, e não um só, como queria Ford. Isso impulsionou o mercado de carros usados e
gerou um enorme desperdício de recursos naturais e muito lixo, pois são produzidos muito mais
carros do que o necessário. Um produto com obsolescência planejada é elaborado para ter uma
vida curta, levando o consumidor a comprá-lo várias vezes.
Um produto pode ter uma vida curta por vários motivos: saiu um novo modelo com pequenas mudan-
ças; saiu um novo modelo com grandes mudanças, pois houve um salto tecnológico (por exemplo,
TVs com telas LED e LCD); saiu de moda; ou simplesmente não funciona direito e os consertos são
frequentes. Em outras palavras, os bens de consumo duráveis são cada vez menos duráveis.

ATENÇÃO

Algumas perguntas para reflexão. Qual a geladeira mais durável, a sua ou a da sua avó? Qual o critério
que você usa para definir que um conserto vai sair caro e é hora de comprar um produto novo? Há quanto
tempo você tem seu atual telefone celular e o que te levou a fazer a última compra?

capítulo 1 • 23

COMENTÁRIO Fatores de produção, agentes econômi-
cos e o fluxo circular
Lucros/dividendos
A contrapartida da utilização dos fatores de produção no processo pro-
Quando se compram ações de uma em- dutivo é a sua remuneração. No caso do trabalho, a contrapartida são
presa que está na Bolsa de Valores (em- os salários e, no caso do capital, são os lucros (considerando apenas o
presa de capital aberto), se tem direito a trabalho assalariado e o capital produtivo).
receber dividendos caso essa empresa
tenha lucro. Dividendos é parcela do lu- REFLEXÃO
cro que é distribuída aos acionistas.


Supondo-se uma economia onde existam apenas famílias e empresas (retiramos
propositadamente o governo e relações com o exterior), os proprietários dos fatores
de produção são as famílias, que emprestam esses fatores produtivos às empresas,
para que essas viabilizem a produção de bens. Os agentes econômicos são, portanto,
as famílias e as empresas, que são as entidades que viabilizam o processo produtivo.

As famílias e empresas interagem em dois mercados, o de fatores e
o de produtos. No mercado de fatores, as famílias emprestam capital e
trabalho para as empresas utilizarem a produção em troca de uma re-
muneração, no caso, salários e juros.

O valor da remuneração é negociado entre as partes. Atenção! Trata-
-se apenas de empréstimo, com regras definidas, dos fatores produtivos,
e não venda desses fatores. Se fosse venda, no caso do trabalho, estaría-
mos no regime de escravidão e não de trabalho assalariado. O trabalha-
dor pode pedir demissão na hora que quiser, e o acionista pode vender
suas ações quando desejar.

No mercado de produtos, as empresas vendem seus produtos às famí-
lias que, para comprá-los, utilizam a renda obtida no mercado de fatores.
Portanto, os dois mercados estão interligados, em um fluxo circular.

Essa vinculação dos mercados mostra que pagar baixos salários, se
por um lado diminui o custo de produção das empresas, por outro lado
diminui seu mercado consumidor, pois as famílias ficam com menos
dinheiro para gastar. Essas relações estão sintetizadas no fluxo circular,
que mostra como, para cada fluxo real, há uma contrapartida monetá-
ria. Afinal, a Economia trata de acompanhar transações que ocorrem em
valores, em moeda.

24 • capítulo 1

Fluxo circular

Bens e serviços comprados Mercado de Bens e serviços vendidos
Gastos produtos Receitas

Famílias FLUXO MONETÁRIO FLUXO REAL Empresas
(DINHEIRO) (BENS, SERVIÇOS E FATORES)

Renda Mercado de Salários e lucros
Capital e trabalho
fatores de produção Empréstimo de capital e trabalho

Ford e o salário de 5 dólares

No início de 1914, a Ford, empresa produtora de automóveis, estava enfrentando um sério pro-
blema. Tinha acabado de introduzir uma técnica produtiva revolucionária, a linha de montagem,
mas a produção não crescia como o desejado. O ritmo mais acelerado do processo produtivo
tinha aumentado a insatisfação entre os trabalhadores. Com isso, a dedicação ao trabalho e a
produtividade eram baixas e, portanto, frequentes as demissões e contratações de substitutos
com consequentes gastos em seleção e treinamento.
Para enfrentar esse problema, a empresa tomou uma decisão inteiramente inusitada para a épo-
ca. Resolveu dobrar o salário dos operários para US$5 ao dia e diminuir a jornada de trabalho
para 8 horas por dia, cinco dias por semana. Parecia uma decisão suicida de um empresário ex-
cessivamente paternalista, e foi um choque na opinião pública e no meio empresarial. Mas fazia
todo sentido, do ponto de vista econômico.
Pagando salários acima da média do mercado, a Ford podia cobrar dedicação dos operários, e
conseguiu isso. Todos queriam trabalhar na Ford e quem estava dentro não queria sair. A rotati-
vidade diminuiu drasticamente. Com maior dedicação, aumentou a produtividade (produção por
operário). Com a jornada de 8 horas, a fábrica podia trabalhar 24 horas com três turnos de 8
horas e sempre com operários descansados. Se fossem dois turnos de 12 horas, isso não seria
possível. A produção por fábrica aumentou. Gastou mais com os operários, mas em compen-
sação, o rendimento por operário e por fábrica aumentou muito e mais do que compensou. Em
outras palavras, o custo por operário aumentou, mas o custo de produção caiu, com isso pode-se
reduzir o preço dos carros e vender mais.
Havia também outro motivo para o aumento dos salários. Ford queria que os operários ganhas-
sem o suficiente para comprar seus automóveis, e conseguiu isso. Ford não via os salários só
como custo de produção, via também como demanda para seus produtos. Portanto, percebia que
o mercado de fatores e o de produtos estavam interligados.

capítulo 1 • 25

Economia, sociedade e meio ambiente

Como vimos, a Economia é uma ciência social, portanto, um pré-requisito para sua exis-
tência é uma sociedade minimamente organizada, ou pelos menos com algumas regras
sociais estabelecidas. Talvez a relação econômica mais antiga seja a troca, e ela pressupõe
que os dois lados confiem na qualidade do produto. Mesmo nos primórdios da raça huma-
na, quando se praticava o escambo, valia o princípio da troca de produtos defeituosos, ou
seja, se a carne que recebi estiver estragada, tenho direito de receber a minha lança de volta.

ATENÇÃO

Os economistas não podem fazer o que querem — embora esse seja o desejo de muitos —, pois tem que
se submeter à sociedade. A economia é limitada pela sociedade, pois está contida nela. Não existiria socie-
dade se não existisse vida na terra, e, para isso, certas condições ambientais foram necessárias. Também
não se pode produzir sem recursos naturais. A sociedade é limitada pelo meio ambiente, do qual faz parte.

Como vimos anteriormente, o fluxo circular deve ser entendido como uma representa-
ção simplificada e limitada da economia, mas não da realidade. A figura a seguir é também
utilizada para representar o desenvolvimento sustentável e a economia ecológica.

A relação entre economia, sociedade e meio ambiente

MEIO AMBIENTE

SOCIEDADE

ECONOMIA

Próximos capítulos

Este livro está estruturado para cobrir os principais conceitos introdutórios da Economia.
Neste capítulo, abordamos o objeto de estudo da Economia e as noções básicas de custo de
oportunidade e fluxo circular. Os próximos capítulos tratarão, em larga medida, de apro-
fundar essas noções.

O capítulo 2 é dedicado aos principais teóricos em Economia, ou seja, procurou-se situ-
ar aqueles cujas contribuições permitiram mudanças qualitativas importantes na maneira

26 • capítulo 1

como a análise econômica passou a ser realizada. Nesse sentido, áreas de conhecimento
dentro da Economia, como a Microeconomia e a Macroeconomia, guardam relação com a
evolução do pensamento econômico. No capítulo 2 também tratamos de apresentar breve-
mente os princípios de organização de dois sistemas econômicos — a Economia de Merca-
do e a Economia Planificada.

O capítulo 3 introduz os conceitos de análise em Microeconomia, cujo objetivo é mos-
trar, através do equilíbrio parcial dos mercados, a tendência da Economia de atingir o es-
tado de bem-estar. Nesse capítulo é feita uma introdução sobre o método de análise em
Economia que supõe agentes racionais maximizadores (famílias e firmas) de suas funções
e objetivo. A partir da caracterização dos agentes econômicos são apresentadas as análises
sobre o equilíbrio nos diferentes tipos de mercado. Noções de organização industrial são
apresentadas ao final do capítulo.

O capítulo 4 apresenta outra perspectiva de análise em Economia, que é a macroeconô-
mica. Inicia-se o capítulo com a descrição das medidas utilizadas em análises agregadas
— os agregados macroeconômicos — para, em seguida, mostrar como a análise do com-
portamento destes agregados ajuda a explicar o desenvolvimento da Economia em curto
prazo. Temas como desemprego e inflação concluem o capítulo.

O capítulo 5 apresenta os instrumentos de política econômica à disposição dos gover-
nos para intervir na Economia. Como economias de mercado são propensas a flutuações,
os governos dispõem de mecanismos de intervenção para contrabalançar os movimentos
de subidas e descidas do produto, do emprego e dos preços, que são percebidos reduzindo
o nível de bem-estar social.

O capítulo 6 é dedicado à análise de longo prazo, contrapondo as noção de desenvol-
vimento econômico e de crescimento econômico. Políticas públicas para a promoção do
desenvolvimento econômico são apresentadas, bem como medidas de desenvolvimento
social. Um tópico sobre globalização conclui o capítulo.

Por fim, o livro apresenta um apêndice sobre como elaborar gráficos e tabelas econômi-
cas. Entende-se que o uso de gráficos e tabelas é recurso bastante difundido, sendo útil o
treinamento do aluno na leitura destas ferramentas estatísticas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRESSER-PEREIRA, L. Os dois métodos e o núcleo duro da teoria econômica. Revista de Economia Política, 2009,
vol. 29, nº 2 (114). Disponível em: <http://www.bresserpereira.org.br/papers/2008/08.06.DoisMetodos-REP.pdf>.
Acesso em: 5 abr. 2014.
CANO, W. Introdução à Economia — uma abordagem crítica. 2. ed. São Paulo: UNESP, 2007.
PROCHNIK. V. Cadeias produtivas e Complexos Industriais - seção do capítulo Firma, Indústria e Mercados, In:
Hasenclever, L. e Kupfer, D. Organização Industrial, São Paulo: Campus, 2002. Disponível em: <http://www.ie.ufrj.br/
cadeiasprodutivas/pdfs/cadeias_produtivas_e_complexos_industriais.pdf>. Acesso em: 1 mar. 2014.

Leituras Sugeridas:

MAY, PETER (Org.) Economia do Meio Ambiente – Teoria e Prática. São Paulo: Campus, 2010.


capítulo 1 • 27

28 • capítulo 1

Contextualização

2 da Ciência
Econômica
paulo gonzaga mibielli de
carvalho

Contextualização da Ciência

2 Econômica

AUTOR Uma introdução à História do Pensamen-
to Econômico
Adam Smith
A Economia, como toda ciência, tem uma história e escolas de pensamen-
to. Destacaremos aqui apenas os principais economistas e escolas, com
ênfase no que é mais pertinente para o entendimento do debate atual.

Os Economistas Clássicos

Adam Smith (Escócia, 1723-1790) é A Economia como uma ciência específica nasce com os economistas de-
considerado o fundador da Ciência Eco- nominados clássicos. O primeiro e o mais importante dos economistas
nômica, pois, até então, a Economia era clássicos, e por isso considerado o pai da Economia, foi Adam Smith.
parte da Filosofia ou da Política, e não
uma disciplina autônoma. Começou sua Smith era adepto do pensamento iluminista, que se tornaria a base
carreira acadêmica como filósofo moral intelectual da Revolução Francesa (1789). Portanto, acreditava que para
e seu primeiro livro, de 1759, se intitula- o conhecimento da realidade e transformação da sociedade, era funda-
va Teoria dos sentimentos morais. Seu mental o uso da razão, e não da tradição ou da religião. Duas ideias de
segundo livro é o clássico Riqueza das Riqueza das Nações estão presentes até hoje no debate econômico, a sa-
Nações, de 1776. ber: a mão invisível e divisão de trabalho.

Mão invisível

Segundo Smith, somos todos egoístas e procuramos, no mundo econô-
mico, sempre o que é melhor para nós. Mas fazendo isso, mesmo que de
forma intencional, como que guiados por uma “mão invisível”, estamos
realizando o que é o melhor para a sociedade.

EXEMPLO

Se o padeiro procura produzir o melhor pão pelo melhor preço, o açougueiro, a me-
lhor carne pelo melhor preço, e assim por diante, a sociedade ganha, pois o que
todos nós queremos são produtos bons e baratos. O padeiro e o açougueiro agem
dessa forma devido à pressão da concorrência e porque querem ser bem sucedidos
ter lucro. Esses agentes econômicos estão se relacionando e cooperando entre si
no mercado de produtos e fatores, sem nenhum plano prévio ou orientação externa.

O que vimos no exemplo é o que Smith chamou, metaforicamente,
de mão invisível. Portanto, cada um procurando o melhor para si, che-

30 • capítulo 2

ga-se a uma situação que é a melhor para a sociedade. Segundo Smith, COMENTÁRIO
se todos agissem por motivos altruístas, visando o bem comum, o resul-
tado seria muito pior. Isso só é possível, segundo Smith, quando há livre Produtividade
concorrência, sem interferência do governo.
Como vimos no capítulo anterior, Ford
COMENTÁRIO sabia disso, pois para poder aumentar
sua produção, deu um aumento de salá-
Interferência do governo rio aos trabalhadores. O objetivo, que foi
plenamente conseguido, era aumentar a
Ainda hoje, todos os economistas que defendem pouca intervenção do governo na dedicação dos trabalhadores e, conse-
Economia usam como justificativa a mão invisível de Smith. Costumam dizer: deixe quentemente, sua produtividade.
o mercado em paz, não intervenha governo, pois a mão invisível vai solucionar os
problemas econômicos.
AUTOR
Smith, no entanto, não era a favor de que a atuação do governo na
Economia fosse a menor possível. O governo tinha um papel importan- David Ricardo
te, por exemplo, nas áreas de infraestrutura e educação. Portanto, impli-
citamente, aceitava que a mão invisível não solucionava todos os proble-
mas da sociedade e, para o bem comum, era necessária a intervenção do
Estado em algumas áreas.

Divisão do trabalho

A segunda ideia é a divisão do trabalho, tanto dentro da sociedade — David Ricardo (Londres, 1772-1823),
hoje chamada de divisão social do trabalho —, como dentro da fábrica juntamente com Adam Smith e Thomas
— que hoje seria a divisão técnica do trabalho. A divisão do trabalho traz Malthus, é considerado um dos funda-
a especialização, com ela maior produtividade (maior produção por tra- dores da escola clássica inglesa de Eco-
balhador) e, portanto, barateamento do produto, pois se produz mais nomia Política. Sua obra mais consagra-
com o mesmo número de trabalhadores. O crescimento do mercado é o da é Princípios da economia política e
que impulsiona a especialização. tributação (1817).

Outro economista clássico evocado aqui é David Ricardo. A maior
contribuição de Ricardo à Teoria Econômica foi, provavelmente, a teoria capítulo 2 • 31
das vantagens comparativas, apresentada no livro Princípios de Econo-
mia Política e Tributação, que, até hoje, está na ordem do dia.

No que se refere ao comércio internacional, opõe-se à teoria de van-
tagens absolutas, de Adam Smith. Segundo essa última teoria, o im-
portante no comércio internacional é ter menores custos e, portanto,
vender mais barato. Ou seja, países com custos elevados ou muito inefi-
cientes estão fadados ao fracasso nas trocas internacionais.

Para Ricardo, isso não seria verdade, pois no comércio internacio-
nal o importante são as vantagens comparativas, e não as absolutas. Um
país tem vantagem comparativa em um produto, quando o outro, com
quem compete, tem alto custo de oportunidade ao fabricar produto,
mesmo sendo mais eficiente na produção. O país deveria se especializar
no produto que tem maiores vantagens comparativas.

COMENTÁRIO EXEMPLO

Economistas liberais à época Com um exemplo fica mais fácil de entender a ideia de Ricardo. Vamos supor que em
uma cidade do interior de Minas Gerais existam apenas duas confeiteiras, a Eloisa e a
Para eles, o Brasil tinha uma vocação Mariana, que fazem apenas dois bolos, de laranja e de chocolate. Eloisa faz os dois bolos
agrícola, e, portanto, vantagens compa- mais baratos, pois seu pai tem uma fazenda de onde vêm a laranja, os ovos e o leite. Além
rativas nessa área, e não na indústria. disso, foi muito bem treinada no ofício por Ethel, sua mãe. Mariana deve então desistir e
Mesmo porque a agricultura precisa de mudar de ramo? Claro que não, pois a diferença de preços é grande no bolo de laranja,
terra e mão-de-obra não qualificada, e mas pequena no bolo de chocolate. O motivo é que o chocolate não é produzido em
tínhamos ambas em abundância, e a in- fazenda, mas importado do Rio de Janeiro. Eloy, o pai de Eloisa, experiente empresário,
dústria precisa de capital e mão-de-obra percebeu isso. Ele orientou a filha a deixar de lado o bolo de chocolate e ficar só com o
qualificada, que tínhamos pouco (lembre- de laranja. Pois como esse bolo era bom e barato, podia atender à demanda da cidade e
se, falamos da realidade daquela época). também das localidades próximas. Não valia a pena perder tempo produzindo o bolo de
chocolate, que não era tão barato e, portanto, não conseguiria vender muito.

REFLEXÃO

Ou seja, o custo de oportunidade para se produzir o bolo de chocolate era grande,
pois quanto mais bolo de chocolate Eloisa fazia, menos tempo e matérias-primas
tinha disponível para produzir o de laranja. Mariana, portanto, pode continuar a pro-
duzir seus bolos de chocolate, que eram comprados inclusive por Eloisa. Segundo
a teoria de Ricardo, Eloisa tinha vantagens comparativas na produção do bolo de
laranja e, portanto, Mariana no bolo de chocolate.

A discussão sobre vantagens comparativas está na ordem do dia no
Brasil desde o pós-guerra, quando a industrialização do país passou a
ser um projeto de vários governos, como de Getúlio Vargas e Juscelino
Kubitschek. Muitos questionaram (e ainda questionam) a opção do Bra-
sil. Os economistas liberais à época de Vargas, Dutra e Juscelino diziam
mais ou menos o seguinte: para que o Brasil deve perder tempo produ-
zindo automóveis, se nunca vamos conseguir competir com os EUA nes-
sa área? É melhor nos concentrarmos na produção de café, onde somos
muito melhores que os americanos.

Nesse debate, de um lado ficaram os economistas liberais e de outro
os desenvolvimentistas, ligados ao pensamento da Comissão Econômi-
ca para a América Latina e o Caribe das Nações Unidas — Cepal, que
defendiam a industrialização.

ATENÇÃO

Se dependesse da teoria de Ricardo, o Brasil nunca iria se industrializar. Hoje não ven-
demos carros para os EUA, mas vendemos para a Argentina. Para os EUA, vendemos
aviões da Embraer — inclusive para as Forças Armadas —, dentre outros produtos.

32 • capítulo 2

O problema é que a teoria de Ricardo é estática, é uma fotografia de um AUTOR
determinado momento. Mas a realidade é dinâmica, pode mudar. Pen-
sando-se a realidade do Brasil dos anos de 1940 como algo imutável, não Thomas Robert Malthus
faria sentido uma industrialização. Mas considerando a indústria como o
motor de um processo de desenvolvimento, e que, por conta disso, o Bra-
sil seria diferente, décadas à frente, fazia sentido a industrialização. Ou
seja, o pensamento tem de se descolar no presente e se lançar no futuro.

O custo Brasil Malthus (1766-1834), um pastor pro-
testante, foi o primeiro economista a dar
O custo Brasil é uma expressão muito utilizada nas discussões econô- destaque ao tema crescimento popula-
micas do Brasil e que tem como base a teoria das vantagens absolutas. cional. Sua fama vem até os dias de hoje,
Segundo essa tese, nosso país seria pouco competitivo no comércio in- onde vez por outra, no debate econômico,
ternacional porque teríamos um custo de produção elevado. O custo de é usada a expressão ideias malthusianas.
produção é entendido aqui no sentido amplo, abarcando, além do custo do É considerado o pai da demografia.
salário, matérias-primas e juros, também custos legais (exemplo: encargos
trabalhistas), institucionais (exemplos: burocracia em excesso, deficiências
na educação), tributários (impostos elevados), de infraestrutura (estradas
precárias) e corporativos —sindicatos de trabalhadores resistindo à mo-
dernização (SANDRONI, 2005).
Um exemplo do custo Brasil foi um estudo feito pelo Banco Mundial. Essa
pesquisa ordenou os países segundo a facilidade de se fazer negócios.
Nesse ranking o Brasil ficou na posição 116ª, bem abaixo do Chile (34ª),
o melhor da América Latina nesse quesito.
Para os defensores dessa tese no Brasil, como a Confederação Nacional
da Indústria (CNI), o país para se tornar competitivo e entrar numa trajetó-
ria sustentável de crescimento, deveria promover profundas reformas nas
áreas que afetam o custo Brasil.

Continuando nosso passeio histórico, evocamos Thomas Robert
Malthus. A tese que ele apresentou, no Ensaio sobre o Princípio da
População, é que a produção de alimentos cresceria em progressão
aritmética (PA), e a população, em progressão geométrica (PG). Em
decorrência disso, se não fossem tomadas medidas cabíveis, a fome
e, no limite, o colapso da sociedade seriam inevitáveis. Malthus era o
que hoje se chama de catastrofista.

A catástrofe não aconteceu, pois tanto a produção agrícola aumen-
tou — devido à incorporação de mais terras e de novas tecnologias —
como a população passou a crescer menos, em razão de mais educação,
urbanização e novos métodos contraceptivos.

A preocupação de Malthus então não faz mais sentido no mundo de
hoje? Faz muito sentido para a China, o país mais populoso do planeta, e

capítulo 2 • 33

AUTOR também a segunda maior economia do mundo, que adota políticas (agora
um pouco menos rígidas) de controle populacional. Faz sentido para vários
Karl Marx países africanos — exatamente os mais pobres — onde a população cresce
exponencialmente. Talvez faça sentido para o restante do mundo também.
Karl Heinrich
Marx (1818 - REFLEXÃO
1883) foi fun-
dador da doutri- A população do planeta está crescendo menos, mas, segundo alguns analistas, a produ-
na comunista ção de alimentos não está aumentando no ritmo desejado (as mudanças climáticas con-
moderna, e de- tribuem para isso), e há o risco de termos um descompasso no futuro. A FAO, por exem-
nomina-se mar- plo, tem essa preocupação (agência das Nações Unidas para alimentação e agricultura).
xismo o conjun-
to de ideias e teorias dele, as quais você Falaremos agora sobre Karl Marx. O nome de Marx é sempre lembra-
verá de forma mais extensa durante do quando as coisas vão mal, ou melhor, quando vão muito mal, como foi
este capítulo. o caso da crise de 1929 e, em menor medida, da crise financeira de 2008.
Marx, de todos os economistas clássicos, foi quem estudou com mais pro-
fundidade o funcionamento de uma economia capitalista, como atesta
COMENTÁRIO sua principal obra, O Capital. Isso se deve, sobretudo, a dois motivos.

Admiração Primeiramente, Marx escreveu no século XIX, quando o capitalismo
industrial, já consolidado, caminhava para uma nova fase, com maior
No Manifesto do Partido Comunista, che- concentração do capital e maior interligação entre capital produtivo e
ga a afirmar que a burguesia, durante seu financeiro. Smith, que viveu um século antes, ainda no início da revolu-
domínio de classe, apenas secular, criou ção industrial, não tinha como analisar esse capitalismo — que é mais
forças produtivas mais numerosas e mais próximo da nossa realidade atual. Marx pôde se beneficiar do muito que
colossais que todas as gerações passa- foi escrito sobre o funcionamento do capitalismo, inclusive o que os de-
das em conjunto (Marx e Engels, 1848). mais economistas clássicos escreveram.

COMENTÁRIO O segundo motivo é a necessidade de se conhecer o adversário se
você quer vencê-lo, e esse era o objetivo de Marx. Com relação ao capita-
Socialismo lismo, Marx tinha, ao mesmo tempo, admiração e ódio.

Na época de Marx, o socialismo era ne- Para Marx, a burguesia — e, portanto, o capitalismo — era profunda-
cessariamente revolucionário e incom- mente injusta, pois explorava a população, em especial os operários, e
patível com o capitalismo. Posterior- por isso deveria ser derrubada. Nesse sistema os ricos ficariam cada vez
mente o movimento socialista se dividiu mais ricos e os pobres cada vez mais pobres.
entre socialistas revolucionários e não
revolucionários (reformistas), que luta- Derrotado o capitalismo, seria implantada uma economia cujos
vam por um regime capitalista com mais meios de produção seriam propriedade do governo (socialismo). Sendo
justiça social, incorporando algumas bem sucedida a implantação do socialismo, se alcançaria o comunismo,
ideias socialistas. Essa última corrente, que seria uma sociedade igualitária, sem classes e sem governo.
também chamada de Social Democrata,
acabou predominando na Europa. Para Marx, o colapso do capitalismo era inevitável por dois motivos:
pressão dos operários explorados (luta de classes) e as contradições in-
ternas do funcionamento próprio do capitalismo. Essa é a razão pela
qual Marx é sempre lembrado em épocas de grandes crises do capitalis-
mo, como em 1929 e 2008.

34 • capítulo 2

REFLEXÃO COMENTÁRIO

Esses eventos de crise sempre nos recordam de que as economias de mercado (ca- Políticas sociais
pitalismo) não funcionam bem e isso pode acarretar consequências sociais sérias, tal
como índices elevados de desemprego. As políticas sociais são as voltadas
para a melhoria das condições de vida
Se as economias de mercado não funcionam adequadamente, os da população. Otto Bismarck, primeiro-
marxistas diriam: não seria o caso de mudar de sistema e implantar o so- ministro do império alemão no final do
cialismo? As economias de mercado têm sobrevivido às suas crises com século XIX, um político conservador e
base em reformas e intervenção do governo. Por outro lado, as econo- visionário, adotou uma gama de pro-
mias ditas comunistas e seguidoras das ideias de Marx, fracassaram em gramas sociais — pensões, aposenta-
maior ou menor grau. A China é um sucesso econômico, mas pode-se di- dorias, auxílio-desemprego, seguro de
zer que a China é um país comunista? Com certeza não. Apesar de vários acidentes de trabalho, dentre outros
países terem se intitulado comunistas — como a antiga União Soviética — por conta do crescimento dos parti-
—, nunca se alcançou o comunismo conforme concebido por Marx. dos de esquerda, notadamente o Social
Democrata.
O maior legado de Marx é pouco associado ao seu nome. Suas pre-
visões fracassaram, mas seus ideais contribuíram para mudar o capita-
lismo ao fortalecer os sindicatos e ao levar à criação de partidos de es- COMENTÁRIO
querda. Como consequência, estas instituições levaram os governos de
diferentes matizes políticas a adotarem políticas sociais. Friedrich List

O chamado Estado de Bem-Estar, no qual as políticas sociais tor- Friedrich List (1789-1846) defendia a
nam-se mais abrangentes e articuladas, surge na Inglaterra depois da tese de que as empresas nacionais não
Segunda Guerra Mundial, por iniciativa do Partido Trabalhista, um conseguiriam se desenvolver se o mer-
partido de esquerda moderado. Esse modelo é atualmente adotado, cado já estivesse ocupado por empresas
em maior ou menor grau, por muitas economias, no Brasil inclusive. de países estrangeiros economicamente
mais avançados. Nessas circunstâncias,
Uma prova de que o capitalismo mudou é o apoio à existência de po- para ele, justificava-se um protecionismo
líticas sociais, que é hoje um consenso no espectro político. Pode-se dis- educador, com a finalidade de proteger,
cutir que tipo de política e qual sua extensão, mas não sua necessidade e por um período de tempo, o mercado
importância em distintas áreas. nacional para assegurar a consolida-
ção das indústrias nacionais, ou seja,
REFLEXÃO para que tivessem condições análogas
para disputar mercados num ambiente
Por exemplo, hoje é consenso que a Educação Básica deve ser gratuita, e que o de livre concorrência. List morou mui-
trabalho de crianças em fábricas deve ser proibido. Essas são duas das propostas de to tempo nos EUA, e até se naturalizou
Marx e Engels no Manifesto Comunista. O tempo mostrou que políticas educacionais americano, onde políticas protecionistas
e de proteção às crianças eram necessárias, e que não é preciso um governo revolu- eram defendidas desde o século XVII por
cionário que queira implantar o comunismo para colocá-las em prática. Alexander Hamilton (Secretário do Te-
souro de George Washington, o primeiro
A reação alemã presidente dos EUA), e começaram a ser
adotadas em 1789.
Friedrich List, jornalista e político, foi um dos críticos das ideias de
Adam Smith na Alemanha. Muitas vezes quando se aborda a história
do pensamento econômico, seu nome não é lembrado. No entanto, List capítulo 2 • 35

COMENTÁRIO tem especial importância para nós, que vivemos na América Latina, pois
sua principal obra — O Sistema Nacional de Economia Política, de 1841
Grande potência — teve grande influência no pensamento da Cepal — Comissão Econô-
mica para a América Latina e o Caribe. As ideias de List serviram de base
Segundo Ha-Joon Chang (2013), a para concepção das Zollvereins — uniões aduaneiras que criaram zonas
grande maioria dos países hoje desen- de livre comércio entre os vários reinos independentes da Alemanha.
volvidos adotaram políticas protecionis-
tas; e políticas de livre mercado raramen- ATENÇÃO
te fazem os países pobres ficarem ricos.
Adam Smith seria inteiramente contra medidas protecionistas, pois representavam
uma intervenção indevida do governo no livre mercado, onde não devia haver favo-
COMENTÁRIO recimento. Que na disputa entre empresas, valha a livre concorrência, e que vença
o melhor, sem privilégios para ninguém, diria Smith (e muitos pensam assim hoje).
Câmbio favorável
A questão é que se não houver algum tipo de proteção, a disputa será
A política cambial, que trata do valor sempre David e Golias, ou seja, muito desequilibrada. Isso significa que
das moedas estrangeiras, será tratada a Inglaterra, que foi o primeiro país a passar por uma revolução indus-
mais adiante neste livro. Neste momen- trial, tinha uma enorme vantagem sobre seus concorrentes. Os países
to basta o entendimento de que câmbio deveriam abrir mão de se industrializar e aceitar que produtos manufa-
— no nosso caso, dólar — desfavorável turados deveriam ser comprados da Inglaterra?
à importação significa dólar caro. Inver-
samente, o dólar caro é favorável para Os EUA responderam negativamente a essa pergunta e adotaram po-
quem exporta, pois a receita do exporta- líticas protecionistas, sendo esse um dos motivos pelos quais esse país
dor é em dólar. se tornou uma grande potência. Por sinal, se David Ricardo fosse anali-
sar a economia dos EUA no início do século XIX, diria que o país deveria
COMENTÁRIO se especializar na produção de algodão e outros produtos agrícolas, e
importar manufaturados da Inglaterra.
Zollverein
RESUMO
O Zollverein era claramente protecio-
nista e inspirado nas ideias de List, e Políticas protecionistas visam proteger um setor econômico, normalmente a indús-
seu sucesso levou à criação de outras tria, no caso da América Latina, e, para esse fim, fazem uso de medidas que deses-
uniões aduaneiras. O Mercado Comum timulam ou impedem a importação de produtos concorrentes. Isso pode ser feito,
Europeu, que depois se transformou em por exemplo, por meio da criação de cotas de importação, impostos elevados sobre
União Europeia, teve como ponto de importados, câmbio desfavorável para a importação.
partida a união aduaneira. O Mercosul
tem o objetivo de se tornar uma união Caso a política do governo vise não só proteger, mas também desen-
aduaneira entre seus países membros. volver um setor, serão adotadas medidas de política industrial. Essas
medidas objetivam estimular a produção local, por meio, por exemplo,
de: crédito em condições favoráveis; isenção de impostos; câmbio favo-
36 • capítulo 2 rável para importação de insumos e máquinas necessárias para o de-
senvolvimento do setor.

No início do século XIX, o que hoje chamamos de Alemanha não
existia e, em seu lugar, havia um conjunto de pequenos países (reinos).
Foi criada, em 1833, uma união aduaneira (Zollverein) entre esses paí-
ses, que consistia na abolição das tarifas aduaneiras no comércio entre

eles e criação de tarifas únicas para o comércio com os demais países. AUTOR
O sucesso dessa medida contribuiu de forma decisiva para a unificação
política da Alemanha em 1871. Alfred Marshall

A Economia Neoclássica

Como o objetivo deste capítulo é apresentar apenas os principais eco-
nomistas, optamos por nos restringir a um economista da corrente
neoclássica, também chamada de marginalista — que abarca, a gros-
so modo, o período 1870-1910 —, e escolhemos Alfred Marshall, um
professor de Cambridge (Inglaterra), que costuma ser chamado o pai
da Microeconomia.

ATENÇÃO

A Microeconomia é o ramo da Economia que estuda a interação, no mercado, entre Alfred Marshall (Londres, 1842-1924)
empresas e consumidores. Vários economistas pesquisaram nessa área (como Je- exerceu forte influência na Economia,
vons, Menger, Walras), mas Marshall não só incorporou muito do que seus anteces- em especial pelo livro Princípios de Eco-
sores e contemporâneos escreveram, como deu importantes contribuições próprias. nomia (1890), uma compilação em dois
No século XX o âmbito da Microeconomia se expandiu passando a abarcar também, volumes de todo o pensamento econô-
por exemplo, a relação entre empresas que concorrem em um mesmo mercado e do mico à época.
governo com empresas e consumidores. Para maiores informações, veja o capítulo
3, que tratará da Microeconomia.
COMENTÁRIO
A partir de Marshall, a ciência econômica, até então conhecida
como Economia Política, se tornou Economia, que é a denominação Princípios de Economia
usada até hoje. Seu livro — Princípios de Economia — teve (e ainda
tem, mas de forma indireta) enorme influência e é considerado o pri- Vários conceitos que são fundamen-
meiro livro-texto de Economia. tais na Microeconomia têm como refe-
rência o livro Princípios de Economia,
RESUMO bem como sua formulação matemática
e apresentação gráfica — por exemplo,
A principal diferença entre os economistas clássicos e os neoclássicos é que os utilidade marginal (originalmente for-
primeiros utilizavam a teoria do valor trabalho e, os segundos, a do valor utilidade. mulado por Jevons), oferta, demanda,
Para os clássicos, o preço de um produto tinha como base a quantidade de horas elasticidade, custos fixos e variáveis. As
de trabalho necessária para sua fabricação, e para os neoclássicos, a base do preço duas curvas mais conhecidas da ciência
é a sua utilidade. Para os neoclássicos não importa quanto trabalho se despendeu econômica — as de oferta e demanda
para a fabricação de um produto, se não conseguir vendê-lo — portanto não sendo — foram formuladas por Marshall. Não
útil para ninguém — seu preço é zero. O preço da mercadoria, portanto, não é deter- vamos aqui nos deter em explicar esses
minado quando a mesma é produzida (valor trabalho), e sim no mercado, quando é conceitos, pois os mesmos serão abor-
vendida/consumida (valor utilidade). dados no capítulo seguinte deste livro.


capítulo 2 • 37

AUTOR A Escola Austríaca

Joseph Schumpeter A maioria dos economistas da chamada Escola Austríaca, como Menger
e Böhm-Bawerk, poderia ser classificado como neoclássicos, mas um
Schumpeter (Morávia, atual República deles fugiu à regra e, para muitos, é um estudioso de difícil enquadra-
Tcheca, 1883 -1950) notabilizou-se pelo mento em qualquer categoria, chegou até a dar origem a uma escola de
estudo dos ciclos econômicos e, princi- pensamento. Esse economista foi Joseph Schumpeter. Seus principais
palmente, do progresso técnico. Foi o livros foram A Teoria do Desenvolvimento Econômico e Ciclos Econômicos.
primeiro economista a dar destaque ao
tema tecnologia e, ainda hoje, é uma re- Schumpeter criou uma expressão muito presente nas discussões
ferência na área. Vários economistas se econômicas dessa área, que é a destruição criativa, tendo como ponto
consideram seus seguidores, dando ori- de partida os estudos de Marx. Para Schumpeter (e para Marx), o capi-
gem à escola Neo-schumpeteriana. talismo é extremamente dinâmico e, para abrir espaço para o novo, é
necessário destruir o velho. Ao se lançar um novo produto (ou meio de
CONCEITO produção, de transporte etc.) está se substituindo (destruindo) produtos
antigos. Para Schumpeter, os ciclos econômicos são inerentes ao funcio-
Ciclos econômicos namento de uma economia capitalista.

São flutuações da atividade econômica em Os ciclos de longa duração, chamados ciclos Kondratieff (em home-
que a uma fase de expansão da produção nagem ao economista russo Nikolai Kondratieff, que foi o primeiro a
se segue uma de contração, ou uma fase estudar o tema dos ciclos longos), estariam sempre associados a uma
de grande expansão é seguida por uma de onda de progresso técnico. Segundo os economistas neo-schumpeteria-
baixo crescimento. Os ciclos poderiam ser nos, Freeman e Soete (1997), teriam ocorrido cinco ciclos de Kondratie-
de curta, média ou longa duração. ff. Estamos atualmente no ciclo da microeletrônica.

Ondas sucessivas de progresso técnico
COMENTÁRIO Adaptado de Freeman e Soete (1997) p.19

Desemprego estrutural Período Ondas de Krondratieff
Quem trabalhava na indústria de
máquinas de escrever perdeu seu 1780-1840 Revolução industrial
emprego para sempre, pois esse 1840-1890 Era da máquina a vapor e das ferrovias
produto não é mais fabricado. Foi 1890-1940
substituído pelo computador. Em 1940-1990 Era da eletricidade e do aço
longo prazo, os empregos perdi- Era da produção em massa
dos são mais do que compensados 1990 - ?
pelos empregos criados. Mas, no Era da microeletrônica
curto e médio prazo, será difícil en-
contrar ocupações para as pessoas Schumpeter dá muito destaque ao papel dos empresários no proces-
desempregadas, e políticas públi- so de inovação tecnológica. Por conta disso, criou mais tarde a expressão
cas são importantes para minimi- “empresário schumpeteriano”, para designar os que são especialmente
zar esse inevitável custo social. inovadores. Hoje é consenso entre os economistas que o progresso téc-
nico é o principal motor do crescimento econômico no longo prazo.

Em contrapartida, o progresso técnico, ao destruir setores econô-
micos e processos produtivos, também destrói seus respectivos pos-
tos de trabalho, gerando o que depois foi chamado de desemprego
estrutural, ou seja, a perda de emprego porque a ocupação corres-
pondente não existe mais.

38 • capítulo 2

Produtos que morrem e renascem AUTOR

É interessante notar que alguns produtos dados como mortos acabam por Friedrich Hayek
renascer algum tempo depois. Schumpeter nunca deve ter pensado nisso.
Um caso conhecido são os discos de vinil, que sofreram um golpe mortal Friedrich Hayek (Viena, Áustria, 1899-
com o aparecimento dos CDs e teriam sido definitivamente enterrados 1992) foi reverenciado, com medalhas,
com o surgimento do MP3, downloads e, por fim, da música alugada por pelos dois mais importantes políticos
streaming. Mas o vinil está de volta, não como produto de massa e, sim, neoliberais, o Presidente Reagan, dos
para um nicho de mercado composto pelos DJs e aficionados. Virou um EUA, e a Primeira-Ministra Margaret
produto cult. Muitos fãs de rock consideram a qualidade de som do vinil Thatcher, da Inglaterra. Por conta disso,
insuperável — mas há controvérsias se isso é mesmo verdade. Com a volta sua principal obra — O caminho da ser-
do vinil, voltou também o toca-disco. vidão —, considerada um libelo contra
Um produto que pode voltar é a máquina fotográfica Polaroid, cujas fotos o socialismo, tem tido sucessivas edi-
são reveladas, em papel, na mesma hora. Alguns empresários já percebe- ções. Hayek ganhou o prêmio Nobel de
ram que há demanda por fotos em papel e não apenas digitais. Economia, em 1974, em conjunto com
E você, o que acha? Na sua opinião, este livro vai ser substituído pelo tablet Gunnar Myrdal. O curioso é que ambos
ou pelo e-reader? têm posições diametralmente opostas.
Hayek é um crítico da intervenção do
Outro economista da escola austríaca que se notabilizou foi Friedri- governo na Economia e Myrdal um de-
ch Hayek, que é considerado o pai do que hoje é chamado neoliberalis- fensor. Alguns interpretaram essa pre-
mo. Para Hayek, o sistema de livre mercado é uma ordem espontânea, miação como uma demonstração da fal-
tão importante para a humanidade quanto o desenvolvimento da lin- ta de critérios na premiação. No entanto,
guagem. Defende que a sociedade seja organizada em torno do mercado a maioria dos analistas entendeu que a
e que a atuação do governo seja a menor possível. A regulamentação da premiação expressava o reconhecimen-
vida econômica, consequentemente, deveria ser mínima. to da diversidade de pensamento dentro
da Economia.
Hayek também se opunha a políticas que tivessem como objetivo a
justiça social, por ser uma interferência indevida nas liberdades indi-
viduais. Mas aceitava algumas exceções à regra de não intervenção do AUTOR
Estado, pois era favorável a que o governo ajudasse a quem fosse extre-
mamente pobre, por meio da garantia de uma renda mínima, apoiava Keynes
a instituição de seguro social para atender a indivíduos doentes ou aci-
dentados, bem como regulamentações na área ambiental.

A economia keynesiana

Se Marshall é o pai da Microeconomia, não há dúvidas de que Keynes é John Maynard Keynes (Inglaterra, 1883-
o criador da Macroeconomia, que é o estudo do comportamento, prin- 1946) opôs-se ao pensamento econô-
cipalmente no curto prazo, do desempenho da Economia de um país mico neoclássico. Especialmente após a
no que se refere à produção, renda, emprego, preços etc. Curiosamente,
Keynes se considerava um seguidor de Marshall, de quem foi discípulo. capítulo 2 • 39

Segunda Guerra, suas ideias foram ado- Sua principal obra — Teoria geral do emprego, juro e moeda — é uma
tadas por praticamente todos os países crítica radical ao pensamento econômico dominante da época, sinteti-
ocidentais de maior poder econômico. zado na chamada Lei de Say.
Sua influência sofreu declínio a partir de
1970; entretanto, por conta da crise fi- Keynes pensava de forma diametralmente oposta. Para Keynes, o
nanceira de 2007, renovou-se o interes- capitalismo é inerentemente instável e, portanto, o pleno emprego é a
se pelas ideias de Keynes e as críticas exceção e não a regra. Para alcançá-lo só com intervenção do governo, a
aos defensores do livre mercado. mão invisível não dará conta dessa tarefa. A queda de salários nunca irá
levar ao pleno emprego, pois o nível de emprego não é determinado no
mercado de trabalho, e sim pela demanda.
CONCEITO
REFLEXÃO
Lei de Say
Os empresários não contratam mais operários que não precisam simplesmente porque
Formulada pelo economista francês Jean- agora os salários estão mais baixos. Eles vão contratar os operários que necessitam
-Baptiste Say, segunda a qual toda oferta, para atender a sua expectativa de demanda (de venda) para seus produtos. Além dis-
ao produzir renda, gera sua demanda. Por- so, seria difícil rebaixar valor dos salários, pois os sindicatos não aceitariam isso.
tanto, desequilíbrios na economia seriam
apenas momentâneos e solucionados Se excluirmos importação e exportação, a demanda da economia é
pelo sistema de preços, e o pleno empre- composta pelo consumo das famílias, o investimento e os gastos do go-
go da mão de obra não seria uma situa- verno. O consumo varia com a renda. O investimento depende da taxa de
ção de exceção e, sim, a regra. O pleno juros — quanto menor, maior o estímulo para investir em máquinas, equi-
emprego seria alcançado, pois se a oferta pamentos e novas fábricas — e da expectativa de lucro dos empresários.
de trabalhadores for superior à demanda, Esse segundo componente, por ser subjetivo, é muito instável. Em épocas
haverá queda de salários e se chegará a de recessão (de queda da produção da economia), a renda cai e, com ela,
uma situação de equilíbrio, com todos em- o consumo. Os empresários não investem, pois a economia vai mal. Cabe,
pregados, porém com salários menores. portanto, ao governo, gerar a demanda através de gastos públicos.

Para Keynes, a concorrência e o funcionamento dos mercados são fun-
damentais em uma economia capitalista, mas na mão invisível não fariam
sentido. Ao contrário, entendia que, em muitos casos, quando as pessoas
buscam o melhor para si mesmos, esse comportamento leva a uma situ-
ação que é a pior para todos. Isso é chamado de falácia da composição.

EXEMPLO

Por exemplo, se há um boato de que um banco está em má situação financeira e vai
quebrar — algo que ninguém deseja —, todos os correntistas irão rapidamente ao
banco para sacar seu dinheiro. Se todos fizerem isso, o banco quebra. Se todos, du-
rante uma crise econômica, resolverem poupar dinheiro para fazer frente a um futuro
incerto, isso vai diminuir ainda mais o consumo e agravar a crise.

Essa terapia para enfrentar a recessão, uma grande novidade na época,
já vinha sendo posta em prática, nos anos 1930, por alguns governos — na
Suécia e nos EUA, com o New Deal do presidente Roosevelt —, para enfren-
tar a depressão causada pela crise de 1929, mas sem uma fundamentação
na teoria econômica. O livro de Keynes, portanto, surgiu na hora certa.

40 • capítulo 2

ATENÇÃO AUTOR

As ideias de Keynes provocaram o que ficou conhecido como revolução keynesiana, Milton Friedman
pois mudaram a forma de se pensar o funcionamento da Economia e seu pensamen-
to foi hegemônico entre os economistas até os anos 1970. Nessa época, a inespe-
rada combinação de baixo crescimento da economia com a inflação — chamada de
estagflação (estagnação da economia com inflação) — colocou em xeque o pen-
samento keynesiano. Até então se achava que a inflação estaria necessariamente
associada a mais emprego e produção.

Monetarismo

Keynes foi o economista mais influente da primeira metade do século Milton Friedman (Nova Iorque, 1912-
XX, e Milton Friedman fica com esse posto na metade seguinte. Ele re- 2006) foi ganhador do prêmio Nobel em
presentou a reação do pensamento neoclássico à revolução keynesiana. 1976, e seu nome é associado à corren-
te de pensamento chamada monetarista.
Friedman advoga que o papel da moeda na Economia é neutro, ou As principais obras de Friedman foram
seja, não pode afetar o lado real. Isso quer dizer que governantes podem, Capitalismo e Liberdade e Uma história
por motivos eleitoreiros, tentar manipular a taxa de desemprego na Eco- Monetária dos Estados Unidos.
nomia emitindo mais moeda e induzindo a população a gastar mais.
Mesmo que a taxa de desemprego possa diminuir no curto prazo, para CONCEITO
os monetaristas o efeito em longo prazo será o de gerar mais inflação
(ver capítulos 4 e 5, referência à curva de Phillips).

RESUMO

Friedman defendia ideias próximas às de Hayek, de não intervenção do governo na Eco- Taxa natural de desemprego
nomia e de defesa do livre mercado. Os gastos públicos deveriam se ater ao mínimo.
A taxa natural de desemprego é um con-
Para Friedman, existe um limite inferior para o nível da taxa de de- ceito normativo, ou seja, serve como uma
semprego, chamado de taxa natural de desemprego. Se o desemprego referência para a discussão de política
ficar abaixo desse nível, irá provocar inflação via elevação dos salários. A econômica, pois não há como saber, de
hipótese da taxa natural de desemprego seria equivalente à taxa de ple- fato, qual é a taxa natural para uma Eco-
no emprego da Economia, que, como Keynes já havia observado, uma nomia em um determinado momento.
vez atingida, provocaria inflação. Economistas monetaristas trabalham com
a hipótese de que existe uma taxa natural.
ATENÇÃO

A divergência entre Keynes e Friedman estaria no fato de que, para o primeiro, a ten-
dência da economia de mercado era funcionar abaixo do pleno emprego, com ociosi-
dade de fatores de produção (ver capítulo 4); e, para o segundo, economias de merca-
do funcionariam próximas ao pleno emprego, ou seja, à taxa natural de desemprego.

capítulo 2 • 41

AUTOR A persistência do desemprego involuntário, ou seja, a existência de
trabalhadores dispostos a trabalhar por qualquer salário e mesmo as-
Celso Furtado sim não encontrando emprego, diagnosticado por Keynes como uma
possibilidade real em economias descentralizadas (não planificadas,
Celso Furtado (1920-2004) escreveu ver próximo tópico), desaparece na literatura monetarista.
obras fundamentais, como Formação
Econômica do Brasil (1959) e De- REFLEXÃO
senvolvimento e Subdesenvolvimento
(1961), e seu nome integra a lista dos Economistas da corrente monetarista sofrem muitas críticas, assim como keynesia-
grandes economistas mundiais que, nos nos, nos anos 1970, por não terem previsto a estagflação, ou seja, o movimento de
anos 1940 e 1950, criaram a nova te- alta de preços e queda do produto, verificado após o primeiro choque do petróleo, em
oria do desenvolvimento. Esta teoria é 1973, em praticamente todas as economias.
conhecida como a teoria estruturalista
do desenvolvimento, e tem os trabalhos A partir daí surge uma nova escola de pensamento, a Novo Clás-
e relatórios desenvolvidos pela CEPAL sica, que tem Robert Lucas, ganhador do prêmio Nobel em 1995,
— Comissão Econômica para América um de seus maiores nomes. A partir da revolução Novo Clássica, o
Latina e Caribe — a sua principal refe- grau de sofisticação técnica em Economia aumenta bastante, com
rência. Ver também capítulo 6. a incorporação cada vez mais intensa de técnicas econométricas na
construção de modelos.

REFLEXÃO

A escola Novo Clássica atualmente encontra-se com menos prestígio, porém o lega-
do técnico foi incorporado pela corrente mais atual, a chamada escola Novo Keyne-
siana, que busca uma nova síntese do pensamento macroeconômico, como a que
prevaleceu após a revolução keynesiana.

Estruturalismo

A contribuição mais expressiva da América Latina (portanto também
do Brasil) à história do pensamento econômico deu-se por meio da cor-
rente estruturalista da Cepal, da qual Celso Furtado foi uma das figuras
mais proeminentes.

Essa escola de pensamento surgiu na Cepal inspirada pelos traba-
lhos de Raul Prebisch, seu primeiro presidente. Segundo essa escola, o
desenvolvimento econômico da América Latina dependia da industria-
lização. O modelo de crescimento, até então vigente na região — base-
ado na exportação de produtos primários (café, cobre, carne etc.) e cha-
mado de primário-exportador — estava fadado ao fracasso devido aos
preços desfavoráveis desses produtos no mercado internacional, em
relação aos preços dos produtos importados. Em pouco tempo nossas
exportações não teriam como gerar as divisas (dólares) necessárias para
cobrir nossas importações, e a Economia entraria em colapso.

42 • capítulo 2

REFLEXÃO COMENTÁRIO

A saída seria a industrialização e para isso seria necessária a adoção de políticas Contabilidade
protecionistas e industriais, o que ficou conhecido como modelo de substituição de
importações. O objetivo seria o de mudar a estrutura da Economia, alterando o eixo Sem preços seria impossível calcular o
dinâmico, da agricultura para a indústria. valor da produção, pois esse pressupõe
a existência de preço e quantidade para
Esse modelo predominou na América Latina até os anos 1980, quan- cada produto.
do a crise econômica e o pensamento neoliberal levaram à mudança
para um modelo de economia aberta tanto para importações quanto
para exportações. COMENTÁRIO

Economia Capitalista (de mercado) ver- Acesso aos produtos
sus Economia Planificada
No primeiro momento, no início da im-
Uma Economia capitalista se estrutura a partir do mercado, que é o res- plantação do socialismo, o critério da
ponsável pela alocação dos recursos e distribuição da renda, via merca- distribuição de produtos seria para cada
do de produtos e fatores. Em uma Economia planificada (comunista), um, segundo sua contribuição à produ-
esse papel cabe ao governo, que é quem detém os meios de produção. ção da sociedade. No segundo momen-
Ele é quem define o que, quanto, como e para quem vai ser produzido. to, com o socialismo já implantado, o cri-
tério seria para cada um, segundo suas
EXEMPLO necessidades.


Em uma Economia capitalista, por exemplo, se há muita procura por determinado
tipo de telefone celular, seu preço vai aumentar e, com isso, vai sinalizar ao produtor
que a produção precisa aumentar. Na Economia planificada, por meio de um estudo,
o governo define quais e quantas pessoas devem ter telefone celular e produz o
necessário para atender a essa meta fixada. Em uma Economia capitalista, o con-
sumidor vai a uma loja para comprar um produto. Em uma Economia planificada, vai
para receber o produto a que tem direito, mostrando sua caderneta. Esta relaciona
que produtos tem direito a receber, e o que já foi retirado da loja.

Em uma Economia planificada continuam existindo preços e pagamen-
to de salários. Mas os preços têm valores arbitrários e servem, basicamente,
para viabilizar a contabilidade. Os salários são muito baixos, pois os produtos
não são comprados e sim distribuídos pelo governo. Os salários servem para
gastar no restrito mercado livre, muitas vezes ilegal, onde tudo é muito caro.

Do ponto de vista social, supondo que o planejamento seja feito corre-
tamente, o sistema de planejamento centralizado é o mais justo, pois todos
vão ter acesso aos produtos que necessitam — segundo a avaliação do go-
verno. Em uma Economia de mercado (capitalista), só tem acesso a merca-
dorias, do feijão ao celular, quem pode pagar por elas. Portanto, quem tem
renda baixa, pode consumir muito pouco e passar necessidades.

capítulo 2 • 43

CONCEITO O grande problema da economia planificada é que ela fracassou
nos diferentes países que a adotaram. Milhões de pessoas morreram
Planejamento indicativo de fome na União Soviética e China, por exemplo, em razão de políticas
equivocadas que adotaram o planejamento centralizado.
Por meio de uma série de instrumentos
fiscais, creditícios, compras públicas Vários são os motivos para esse fracasso, destacamos alguns:
etc., bem como negociações com o em- 1) Sempre foi posto em prática por regimes autoritários, portanto eram ar-
presariado, o governo procura que suas bitrárias, em maior ou menor grau, as escolhas sobre o que, quanto, como
metas de produção sejam cumpridas e para quem produzir;
pelo setor privado. 2) É muito difícil para o governo ter todas as detalhadas informações necessá-
rias para viabilizar adequadamente o planejamento. O processo dessas informa-
ções é extremamente trabalhoso e complexo;
3) Não há concorrência entre empresas, portanto não há estímulo para se
aperfeiçoar ou baratear os produtos, bem como gerar novos produtos e
processos. O progresso técnico — principal motor do crescimento a longo
prazo — fica, portanto, comprometido;
4) A maioria da população não aceita receber apenas o que o governo
considera que é o justo e quer ter acesso a mais produtos, alguns tidos
como supérfluos.

Por conta disso, quando os países do leste europeu se democratiza-
ram, na mesma hora, abandonaram o regime vigente para abraçar o ca-
pitalismo. A Rússia, que tinha um parque industrial muito diversificado
na época da antiga União Soviética, agora se concentra na produção e
exportação de petróleo e gás. Boa parte de sua indústria não suportou a
concorrência com as mercadorias importadas. As economias de merca-
do podem ser socialmente injustas, mas isso pode ser minimizado por
meio de políticas sociais.

EXEMPLO

Hoje o planejamento central puro é adotado apenas pela Coréia do Norte. Cuba, Laos
e a China, em especial, combinam planejamento central com economia de mercado.

Os governos das economias capitalistas podem ter planos de desen-
volvimento e fazer planejamento. Mas é o planejamento indicativo. No
Brasil, por exemplo, tivemos o II Plano Nacional de Desenvolvimento
Econômico (II PND), durante o Governo Geisel. A Europa teve um ambi-
cioso plano de reconstrução depois da Segunda Guerra Mundial (Plano
Marshall). O governo dos EUA praticou planejamento durante a Segun-
da Guerra Mundial, pois era necessário administrar bem os recursos do
país para dar conta das necessidades advindas de um conflito mundial,
e, ao mesmo tempo, atender ao mercado interno.

44 • capítulo 2

Capitalismo x Comunismo – a corrida espacial

Durante o período da Guerra Fria (1947-1989), quando em vários momentos pareceu iminente
uma guerra nuclear entre EUA e União Soviética (URSS), houve uma disputa que foi apenas
tecnológica — a corrida espacial (1955-1972). Era disputa (não declarada oficialmente) de
quem levaria o primeiro homem à Lua. A URSS saiu na frente com o primeiro satélite a orbitar
a Terra (Sputnik), seguido do primeiro astronauta (Yuri Gagarin) e da primeira nave espacial,
não tripulada, a pousar na Lua (Lunik 9). Mas os EUA recuperaram o atraso ao colocarem o
primeiro homem na Lua com a missão Apollo 11, e, com isso, venceram a corrida. Em 1972, os
dois países resolveram não mais concorrer e iniciaram a cooperação na área espacial. A corrida
espacial mostrou de forma inconteste a superioridade tecnológica dos EUA em relação à URSS.
Esse evento deixou um legado que vem até hoje, como o desenvolvimento da tecnologia da
comunicação por satélites, da robótica e da energia solar. O país que mais se beneficiou desse
progresso tecnológico foi os EUA.

Economia: divisões e relação com as diferentes profissões

Em linhas gerais, a Economia se divide em Microeconomia, Macroeconomia, História Eco-
nômica e Econometria — que trata do teste de modelos econômicos por meio do instru-
mental estatístico. Como vimos anteriormente, a Microeconomia trata do funcionamento
dos mercados e a Macroeconomia, da Economia como um todo. Tanto a Macroeconomia
quanto a Microeconomia podem se subdividir em várias subáreas.

RESUMO

Principais subáreas da Economia

- Economia internacional, que trata das relações econômicas com o exterior;
- Economia do setor público, que estuda o papel do Estado na Economia, a evolução e composição das
receitas e despesas do governo, bem como as principais políticas públicas;
- Economia monetária e financeira, que estuda a oferta de moeda na Economia e o funcionamento do
setor financeiro;
- Economia do trabalho, que trata do mercado de trabalho e suas instituições;
- Economia regional e urbana, que investiga como as atividades produtivas se distribuem e se relacionam
no espaço;
- Desenvolvimento econômico, que estuda os modelos de crescimento e como as economias se desenvolvem;
- Economia do meio ambiente, que estuda as relações entre Economia e o meio ambiente e o desenvolvi-
mento sustentável;
- Economia do bem-estar, que trata das políticas públicas voltadas para o bem-estar da população, tais
como política de saúde, educacional, previdenciária.

capítulo 2 • 45

CONCEITO Economia e sua relação com
Administração e Contabilidade
Esportes
Administração e Contabilidade são profissões muito próximas da Eco-
Muitas vezes um clube de futebol tem nomia, pois há muitas cadeiras em comum entre os cursos, em espe-
um mau desempenho no campeonato, cial com o de Administração. Não se pode analisar um balanço de uma
porque teve que vender seus melhores empresa sem levar em conta a situação econômica do mercado em que
jogadores para pagar dívidas. atua, bem como do país (e do mundo). O mesmo vale para a gestão de
uma empresa, nas suas diferentes áreas. Mais ainda, a análise financei-
ra das empresas apresenta muitas interfaces com a Economia.

REFLEXÃO

Deve-se mencionar ainda que uma das áreas que mais tem ganhado espaço nas últi-
mas décadas, com o avanço da globalização econômica e financeira, é a de finanças,
que reúne economistas e administradores especializados em mercado financeiro.

Economia e sua relação com Comunicação

O jornalista necessita de conhecimentos de Economia, não só o jornalista
econômico. Pode-se entender a política, sem entender de Economia? Com
certeza não. Muitos analistas consideram que o desempenho da Economia é
uma variável decisiva nas eleições majoritárias (para presidente, governador
e senador). A Economia é importante, inclusive, para entender os esportes.

A relação com Economia é também muito estreita nas áreas de pu-
blicidade, propaganda e marketing, e produção cultural, de modo ge-
ral, pois envolvem estudos de mercado, preferências dos consumidores,
captação de recursos etc.

EXEM PLO

Na elaboração de um estudo de comunicação para um empreendimento imobiliário,
por exemplo, é inevitável fazer uso de variáveis econômicas, tais como referenciais
para financiamento (como índice da inflação, taxa de juros, taxa de câmbio), analisar
o valor do salário mínimo frente ao público-alvo, entre outros.

Economia e sua relação com Direito

O conhecimento de Economia é útil para os advogados porque a ativida-
de econômica é regida por contratos monetários com amparo em leis.

46 • capítulo 2

Muitas leis têm implicações econômicas, como a defesa do consumidor e da concorrência,
direito de propriedade, dentre outras.

EXEMPLO

A relação entre Direito e Economia é estreita em várias áreas tais como o Direito do Trabalho (indenizações
trabalhistas, por exemplo), Direito Tributário (valor e cobrança de impostos), Direito Comercial (fusões e
aquisições de empresas).

Economia e sua relação com Geografia

Há uma relação direta com a Geografia Econômica e com vários ramos da Economia: Plane-
jamento Urbano e Regional, Economia dos Transportes, Economia do Meio Ambiente etc.

EXEMPLO

A Geografia foi muito importante, por exemplo, para o desenvolvimento das cidades de Salvador e Rio
de Janeiro. Se esses locais não oferecessem boas condições naturais favoráveis para a instalação de
um porto, nunca teriam sido capitais do Brasil. Brasília foi escolhida para a nova capital em razão da sua
localização, no centro do país.

Vale mencionar aqui o nome de Paul Krugman, ganhador do prêmio Nobel em 2008, por
sua contribuição em estudos sobre padrões de comércio e a localização da atividade econômica.

Economia e sua relação com História

A História Econômica é uma das bases do curso de Economia. Não se pode entender a His-
tória sem entender a Economia, da mesma forma que não se pode entender a Economia
sem entender a História, pois a História é o laboratório da Economia.

Não é possível entender momentos decisivos da humanidade, como a Revolução Fran-
cesa, Revolução Russa e a Segunda Guerra Mundial, sem levar em conta as condições eco-
nômicas vigentes na época.

EXEMPLO

O Plano Real, de 1994, não teria sido bem-sucedido se seus formuladores não tivessem estudado tanto
as experiências fracassadas dos planos de controle da inflação adotados no Brasil nos anos 1980, quanto
as experiências exitosas de combate à hiperinflação, como a da Alemanha nos anos 1920. O economista
Gustavo Franco, um dos formuladores do Plano Real, havia estudado profundamente a hiperinflação alemã
dos anos 1920, por exemplo.

capítulo 2 • 47

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CHANG, H. 23 coisas que não nos contam sobre o capitalismo. São Paulo: Cultrix, 2013.
DANA. S. Entenda o que compõe o chamado custo Brasil. Folha de S. Paulo, São Paulo, 4 nov. 2013.
FREEMAN, C. e SOETE, L. The economics of industrial innovation. Londres: Third Edition Pinter, 1997.
SANDRONI, P. Dicionário de economia do século XXI. São Paulo: Record, 2005.

Leituras Sugeridas:

HEILBRONER, R. A História do pensamento econômico. São Paulo: Nova Cultural, 1996.
HUNT, E. e SHERMAN, H. História do pensamento econômico. Petrópolis: Vozes, 1977.
HUBERMAN, L. História da riqueza do homem. São Paulo: LTC, 2011.


48 • capítulo 2

3 A Abordagem
Microeconômica
jorge nogueira de paiva britto


Click to View FlipBook Version