ㅤ ㅤㅤ

tográfica capaz de proteger os usuários “ Hoje, analisar um celular
de serem bisbilhotados. O WhatsApp de uma pessoa é muito
fez isso, assim como a Apple, com o mais revelador do que
iMessenger ou o aplicativo Signal. É im- entrar no domicílio dela.”
portante que existam serviços seguros,
à prova de interceptação. MUDA TUDO FAZ DEZ ANOS QUE VOCÊ ESCREVEU O PRIMEIRO

UMA DAS FUNÇÕES MAIS IMPORTANTES DO ESTADO “Não tenho dúvidas ARTIGO DEFENDENDO A CRIAÇÃO DE UM MARCO
É JUSTAMENTE A DE ZELAR PELA SEGURANÇA. HOJE, de que o acesso
SE O ESTADO CONSIDERAR VOCÊ SUSPEITO, ELE à informação por REGULATÓRIO CIVIL PARA A INTERNET BRASILEIRA.
PODE ENTRAR NA SUA CASA — QUE ATÉ ENTÃO ERA
UM TERRITÓRIO PRIVADO — E VARRER TUDO ATRÁS meio da tecnologia DESDE ENTÃO, O QUE MUDOU DE LÁ PARA CÁ?
DE PROVAS. COMO FICA O PAPEL DO ESTADO NA PRE- pode mudar a vida No momento, estou envolvido na criação
VENÇÃO DE CRIMES QUANDO ELE PERDE ESSE “ACES- das pessoas. Meu de outro marco, que é o Plano Nacional
SO PRIVILEGIADO” A TODOS OS LUGARES? caso é um exemplo de Internet das Coisas. A ideia é desen-
Acho que o Estado nunca teve ferra- muito claro disso.” volver uma série de políticas públicas ca-
mentas tão poderosas para investigação pazes de fomentar a chamada Internet
como tem atualmente. As revelações do das Coisas — que consiste em conectar
caso Snowden e os documentos vazados objetos à rede, tanto utensílios domésti-
pelo WikiLeaks, que aparentemente são cos, como geladeira ou televisão, quanto
verdadeiros, demonstram que o estado plantas industriais, sistemas de transpor-
de vigilância é imenso. Estamos perden- te urbano e assim por diante. Além dis-
do as poucas esferas privadas que ainda so, no Brasil ainda não temos uma lei
restam. É nesse contexto que os poucos de proteção de dados pessoais. Isso traz
serviços que adotam um sistema de pro- grande incerteza jurídica e deixa despro-
teção criptográfica contra vigilância sur- tegidos os usuários. Eu viajo bastante, e
gem. Vale lembrar que, hoje, analisar um vejo o que está acontecendo em vários
celular de uma pessoa é muito mais re- lugares do mundo. Tenho convicção de
velador do que entrar no domicílio dela. que nosso país pode ser grande em tec-
É preciso equilíbrio. É totalmente justifi- nologia e inovação, melhorando a vida
cável que casos ilícitos possam ser inves- de todos. Entretanto, para isso precisa-
tigados, mas é necessário haver freios e mos pensar grande e ter coragem
contrapesos para evitar abusos.
e disposição para fazer acontecer. 51
FALANDO EM SNOWDEN, LOGO DEPOIS QUE ELE VA-
ZOU OS PRIMEIROS DOCUMENTOS, O GOVERNO BRA-
SILEIRO ANUNCIOU UMA SÉRIE DE MEDIDAS DE SE-
GURANÇA, COMO UM SISTEMA DE E-MAILS PRÓPRIO,
QUE FORAM DEIXADAS DE LADO QUANDO A CRISE
CHEGOU. ESTAMOS SEGUROS COMO ESTAMOS?
Não estamos seguros. Ao contrário,
o Brasil não tem uma política ampla de
cibersegurança para a administração pú-
blica. Recentemente houve o escândalo
em que se divulgou acidentalmente to-
das as senhas de sites diretamente liga-
dos ao governo federal. Não só isso é
patético em si como as senhas divulga-
das eram ridículas do ponto de vista de
segurança. Havia até uma instrução que
dizia “não mudar nunca” sobre uma das
senhas divulgadas. Isso vai contra prin-
cípios elementares de segurança da in-
formação. Precisamos de uma política
geral de segurança para a administração
pública. Estamos totalmente desprepara-
dos e expostos nessa área.

As mulheres
lideram a

comunidade
Mumbuca, no
estado do Tocantins,
há nove gerações

MULHERES DE OURO

UMA DAS POUCAS REFERÊNCIAS DE SOCIEDADE MATRIARCAL DO BRASIL,
COMUNIDADE QUILOMBOLA CONHECIDA PELO CULTIVO DE CAPIM

DOURADO TEM AS TERRAS INVADIDAS PELA PRIMEIRA VEZ NA HISTÓRIA

REPORTAGEM E FOTOS FELLIPE ABREU, ISMAEL DOS ANJOS E LUIZ FELIPE SILVA

PR MA
TO PI

MT BA
PALMAS

VOCÊ ESTÁ AQUI
A comunidade
quilombola Mumbuca
fica na região do
Jalapão, no Tocantins

53

1 A Com a valorização do capim, utilizado
para produção de artesanato vendido em
1. CAPIM DOURADO Às 4 horas da manhã do dia 20 de se- todo o mundo, têm ocorrido cada vez
Acessórios feitos com tembro de 2016, todos os moradores da mais saques e ataques aos campos de
a planta são a principal comunidade Mumbuca já estavam acor- colheita, e Mumbuca é a maior preju-
dados e a postos. Era o dia da colheita dicada. Além de suas plantações serem
fonte de renda da do capim dourado, o momento mais im- roubadas, os moradores da região ainda
comunidade portante do ano para os cerca de 220 qui- foram vítimas de um incêndio crimino-
2. EM ALTA lombolas que vivem entre os rios Novo e so na ponte que dá acesso ao núcleo da
Sono, no coração do Jalapão, no estado comunidade — para chegar até lá, tive-
A colheita é feita de do Tocantins. Antes de o sol nascer, um mos de cruzar o rio guiando o carro pela
forma artesanal grupo de aproximadamente 15 jovens par- parte mais rasa. Quando começam as
3. SÓ DÁ ELAS tiu para o reconhecimento do campo de chuvas de verão, o acesso só é possível
colheita, localizado a aproximadamente de balsa. “O capim dourado é um legado
As mulheres lideram o 45 quilômetros do vilarejo. O ritual seria tradicional de nossos antepassados e a
trabalho nos campos o mesmo de sempre: quando encontras- principal fonte de renda de nossa comu-
de colheita; à esquerda, sem um lugar com boa oferta do material, nidade”, afirma Ana Cláudia Matos, que
eles montariam acampamento e volta- em 2012 tornou-se a primeira quilom-
de roupa azul, Ana riam para buscar as pessoas mais velhas. bola de Mumbuca a ingressar em uma
Cláudia Matos Dessa vez, contudo, onde esperavam en- universidade. Ela se formou assistente
contrar um campo repleto de capim, o social e, em sua segunda incursão aca-
54 que eles viram foi só mato queimado. dêmica, está no quinto ano de Direito.
Pela primeira vez na história, os quilom-
bolas ficaram sem o capim dourado. “Temos que saber o que os homens
de fora sabem de igual para igual, pelo
menos para dizer que não queremos fa-
vores, mas que conhecemos e exigimos
nossos direitos”, justifica. Matos é, tal-
vez, a maior representante da nova gera-
ção de uma longa linhagem de lideranças
femininas da comunidade quilombola.
O papel das mulheres em Mumbuca não
está restrito a cerimônias religiosas e cul-
turais: elas são as principais líderes desde
a fundação do povoado, em meados do sé-
culo 19. A comunidade foi criada a partir
do encontro entre negros escravos fugidos
de uma forte seca na Bahia e indígenas da
etnia xerente sediados no Jalapão — onde
ela se mantém até hoje. Os índios foram
todos expulsos, com uma exceção: Jacinta,
com quem um dos negros se casou e come-
çou a linhagem que está na nona geração.

AS FILHAS DE JACINTA

“Jacinta, minha tataravó, era uma mulher
muito forte e guerreira”, conta Doutora, a
atual líder do povoado. Batizada Noêmia
Ribeiro da Silva, ela recebeu o apelido do
pai aos nove anos após encontrar no mato
uma planta chamada alfavaca e usá-la para
curar um problema que ele tinha no olho.
“Ele me disse que eu tinha um sinal de in-
teligência muito grande, e que ia me pôr
para estudar para ser doutora de verdade”,
relembra. Doutora não estudou Medicina,
mas dominou o artesanato do capim como
poucos — é especialista em chapéus — e,
com o tempo, assumiu a posição de lide-

rança tradicional máxima em Mumbuca, 2
que tem esse nome por conta de uma es-
pécie de abelha característica da região.

Desde a índia Jacinta, é para as mulheres
que os quilombolas olham em busca de li-
derança, organização e dos elos com a his-
tória e tradição. Guardina, Laurina (a des-
cobridora do capim dourado), Laurentina
e Guilhermina, mãe de Doutora e conhe-
cida como Dona Miúda, são as mulheres
que já comandaram o povoado. Além de-
las, houve um único homem, que foi o go-
vernante entre os períodos de Laurina e
Laurentina. “É uma comunidade matriar-
cal desde o início. A decisão final parte das
mulheres, como Doutora e Santinha [mãe
do presidente da associação de artesãos e
outra importante liderança]. Quem cuida
da economia são as mulheres, assim como
da criação dos filhos”, explica Ana Cláudia
Matos. Depois dela, outros 11 jovens de
Mumbuca, na maioria mulheres, chega-
ram ao ensino superior. São estudantes
de Pedagogia, Engenharia Ambiental e
Educação do Campo: “Todos os cursos
têm significado para nós. Aqui, ninguém

3

1

1. BRILHA MUITO estuda Agronegócio porque é algo que pim dourado, eles agora terão de comprar
não faz sentido, pode nos destruir. Tudo o produto. “Cada quilo de capim custa uns
Mulher mostra como é feita é pensado para o bem coletivo.” R$ 30, mas agora que sabem que estamos
a costura do capim sem, o preço pode até dobrar”, preocupa-se
Irmã de Matos, Núbia Ribeiro, 16 anos, Matos. As queimadas e os saques não fo-
2. PANORAMA pensa em estudar Medicina para poder ram as primeiras ameaças aos quilombolas.
A comunidade tem atender os conterrâneos que sofrem com Os moradores de Mumbuca nunca abando-
apenas ruas de terra, a falta de hospital e até mesmo de pos- naram o lugar em que cresceram, mas por
uma associação de to de saúde. O atendimento médico mais muito pouco a comunidade não perdeu o
moradores e uma escola próximo fica em Mateiros, a mais de uma direito a seu território tradicional. A criação
hora de distância. “A gente cresce com o do Parque Estadual do Jalapão, em 2001,
3. VENDE-SE exemplo dessas mulheres guerreiras que colocou sob estatuto de proteção ambiental
Na loja da associação lutaram pelo nosso povo”, conta. O espírito uma enorme área do estado de Tocantins
de pertencimento à comunidade e ao terri- que compreende a terra dos quilombolas.
há produtos como tório permeia toda a história de Mumbuca.
colares, bolsas e cestos “Eu ensino tudo que posso ensinar aqui, A medida pegou de surpresa os mum-
como aprendi com minha mãe, que apren- buquenses, que até aquele momento nem
56 deu com minha avó. As mulheres ensina- sequer tinham acesso à energia elétrica —
ram tudo e são agarradas a este povoado, a luz chegou somente em 2001. “O parque
nunca largaram isto aqui”, afirma Doutora. veio sem considerar a comunidade. Foi

EXPULSÃO DO PARQUE

O primeiro impacto da perda da colhei-
ta é econômico. O artesanato gera quase
todo o rendimento dos quilombolas e, para
continuar vendendo utensílios, acessórios,
bijuterias e outros produtos à base de ca-

uma traição da lei. Jogaram por cima da 2 57
gente e chegaram dizendo que aqui era
parque e que ninguém poderia ficar na co- 3
munidade. Oh horror!”, relembra Doutora.
aos latifundiários, que podem impedir
Foi depois disso que o povoado passou nossas atividades tradicionais, como co-
a buscar o reconhecimento como quilom- lher o capim, ou até mesmo nos fazer de
bola. “Um professor veio aqui e viu nossas serviçais deles”, diz Matos, que já traçou
feições. Quando contamos nossa história, sua estratégia para os próximos meses.
nos alertou que éramos quilombolas e que o “Desde o fim do século 18, o poder pú-
Estado tinha uma dívida histórica conosco”, blico não faz nada aqui. O que temos
explica Matos. O reconhecimento garantiu aqui é construído com nossa força, pela
a permanência de Mumbuca, mas a demar- associação de moradores. Neste ano, te-
cação legal do território ainda não ocorreu. mos que nos manter de pé, ir todo dia
monitorar os campos de capim e cobrar
Antes do boom do capim dourado e do poder público os seus deveres.”
da chegada da energia elétrica, a popula-
ção se sustentava por meio de produção
de subsistência e escambo do artesanato.
As plantações em roça, o cultivo de gado
e o desmatamento para uso da madeira
em construções de casas e barcos foram
proibidos pela lei de proteção ambiental.
“Chegamos a receber multas de mais de
R$ 10 mil por causa de um alqueire de
roça. O povo precisa disso para sobrevi-
ver. Se eu não posso plantar onde meu
avô plantou, onde vou plantar?”, pergun-
ta Matos. “Não usamos trator, é tudo no
machado e enxada. É sustentável, não é
como essas empresas que devastam tudo.”

Durante a festa da colheita do capim dou-
rado — realizada dias antes da descober-
ta do saque —, o procurador da República
Álvaro Manzano levou à Mumbuca um
termo de compromisso entre a comuni-
dade e o Parque Estadual. Uma tentativa
de regulamentar a relação. “O documento
busca compatibilizar, porque existe um di-
reito constitucional do povo quilombola a
seu território e a presença da unidade de
conservação. Esperamos estabelecer um
equilíbrio entre essas normas em conflito”,
diz o representante do Ministério Público.

O direito à demarcação territorial e à
tradição é a principal luta dos quilombo-
las. E os próximos desafios já estão pos-
tos: enfrentar a chegada do agronegócio ao
Jalapão (capitaneado pelo projeto de expan-
são agrícola com investimento estrangeiro
na região do Matopiba, acrônimo das ini-
ciais dos estados do Maranhão, Tocantins,
Piauí e Bahia) e a falta do capim dourado
(sem território demarcado, a comunida-
de não tem direito oficial sobre nenhum
campo de colheita, podendo, assim, ficar à
mercê de saques aos campos que tradicio-
nalmente cultivavam ou de verem essas ter-
ras exploradas por grandes latifundiários).
“O desafio é impedir que abram as terras

58





foram selecionados sob o critério de ob- da”, diz Altman, que tem uma fortuna “Uma renda básica projetada pelos
capitalistas do Vale do Silício só pode-
ter um panorama heterogêneo em con- estimada em mais de US$ 1 bilhão. rá amplificar o poder deles, em vez de
fortalecer o dos mais pobres”, também
dições de trabalho, etnia, idade. Não há Um de seus alegados receios é de que escreve o jornalista e pesquisador nor-
te-americano Nathan Schneider. “Se
envolvimento da prefeitura, que, con- a tecnologia possa canibalizar a eco- queremos achar uma solução para o
apocalipse robótico, é melhor não re-
tudo, diz ver a ideia com bons olhos. nomia, substituindo pessoas por ro- corrermos aos que o causam.”

“Cerca de 57% dos nossos residentes bôs e ressecando o consumo. mão em m

são o que chamamos de ‘pobres de ati- Segundo uma análise de 2 mil pro- N

vos’ — o que significa que eles não têm fissões feita pela empresa de pesqui- Na segunda-feira, Mara Simião vai
acordar na zona rural de Mogi das
pelo menos três meses de poupança em sa McKinsey, 45% dos empregos nos Cruzes, região metropolitana de São
Paulo, e preparar o café para ela, os fi-
caso de acontecimentos drásticos em EUA, de faxineiro a CEO, podem ser lhos e o marido. Suas contas a preocu-
pam. O marido ganha um salário míni-
suas vidas”, revela Jose Corona, diretor substituídas pela tecnologia já exis- mo como caseiro e, mesmo que ela não
exerça atividade remunerada, eles não
de equidade e parcerias estratégicas da tente. Que dirá pela que vem por aí. são elegíveis para o Bolsa Família. Há
alguns anos, contudo, uma ajuda men-
Prefeitura de Oakland. Anteriormente, estudo da Universidade ão ∏ Desal de R$ 30 permitiu que comprasseão ∏ De
óculos para os filhos — ao que atribui
“As pessoas poderão fazer volun- de Oxford havia concluído número pró- o melhor desempenho escolar da me-
nina de 14 anos e do menino de 12.
tariado, trabalhar, não trabalhar, mu- ximo: 47%. Análise posterior do Centro mão em m
O dinheiro veio do projeto
dar para outro país — o que queiram. Europeu para Pesquisa Econômica, por ReCivitas, realizado desde 2008 na co-
munidade Quatinga Velho com o finan-
Esperamos que a renda básica pro- outro lado, indicou que só 9% dos em- ciamento de doadores do mundo todo.
Foi a primeira iniciativa de renda bá-
mova liberdade, e queremos obser- pregos atuais estão em risco — cenário sica global a promover transferências
de indivíduo para indivíduo, segun-
var como tal liberdade é experiencia- mesmo assim preocupante. do os pesquisadores Bruna Augusto
e Marcus Brancaglione. No ápice, dis-
No setor tecnológi- tribuía o benefício a 127 moradores,
de porta em porta, em espécie. Hoje,
co, outros peixes gran- 14 famílias recebem R$ 40 mensais.
A ideia é expandir o valor até que ele
des sugeriram apoio cubra de fato todos os gastos essen-
ciais. “Mesmo com uma quantia ex-
Programas similares à ideia da renda bá- tremamente baixa, fazia diferença.
Projetos em andamento sica universal: Elon Renda básica não abre os mares, mas
Projetos previstos Musk, da Tesla; Chris alguns problemas, os mais absurdos,
Já tiveram projetos Hughes, cofundador de crianças passando fome, podem
do Facebook; e o me- ser mitigados”, diz Brancaglione.

gainvestidor Marc A outra iniciativa que testa renda bá-
sica no Brasil tem valor ainda menor:
Andreessen, entre ou- a Prefeitura de Maricá (RJ) dá R$ 10
a algumas famílias pobres. O projeto
tros. Uma das ONGs começou no fim de 2015, na ges-

preferidas para doa- tão de Washington Quaquá (PT). 61

ções é a GiveDirectly,

que quer implantar no

Quênia o maior e mais

longo projeto do tipo já

feito. Pelos planos, mi-

lhares de famílias rurais

receberão US$ 1 mil por

ano. Faltam US$ 6,3 mi-
ÍNDIA lhões para o início da

Madhya operação, que já obteve
Pradesh US$ 23,7 milhões.

Já críticos como o

pesquisador bielorrus-

so Evgeny Morozov di-

UGANDA zem que a propensão

FORT PORTAL dos gigantes do Vale
Em experimento de do Silício pelo conceito
ONG, 50 moradores não é remorso, mas sim
adultos da região uma blindagem. Assim,
recebem US$ 18,25 escreveu, “a precarieda-
e crianças, US$ 9,13.

de dos subempregos na

‘gig economy’ [econo-

mia compartilhada] não

soaria tão terrível, e os

executivos seriam vistos

como benfeitores”.

Participação Continuada], salário-fa-

mília.” Já para Lena Lavinas, professo-

ra da UFRJ e pesquisadora no Instituto

de Berlim pelo Estudo Avançado

(Alemanha), a chance da implementação

e? ∏ Que país é esse? ∏ Que tende a zero. “O desenho da lei permite a
condicionalidade da renda básica, o que
J é o oposto da ideia. Somos o único país

país é ess que tem isso na lei, mas nunca tentamos

fazê-la sair do papel.” Além disso, diz,

a conjuntura engessa a possibilidade.

Já imaginou um país que tenha uma lei “O governo, sem compromisso algum

para determinar que todo cidadão rece- com o bem-estar da população, passou

ba dinheiro suficiente para cobrir des- uma lei no Congresso que restringe

pesas mensais com alimentação, edu- o gasto público por 20 anos.”

cação e saúde? Ele existe, e é o Brasil. Atualmente vereador em São Paulo,

A lei nº 10.835/2004, que entrou em vi- o autor do projeto que originou a lei,

gor durante o governo Lula e resultou Eduardo Suplicy (PT), diz ter a con-

na implementação do Bolsa Família, vicção de que a renda básica universal,

prevê exatamente essas determinações. “mais cedo ou mais tarde, vai acontecer”.

Mas uma das ressalvas é que, para isso Persistência não lhe falta: após três anos

dar certo, devem ser consideradas “as de cancelamentos das reuniões, conse-

possibilidades orçamentárias.” guiu finalmente 50 minutos para expor

Qual é, então, a chance de a renda seus planos à presidente Dilma em ju-

básica vingar? “Sempre é possível, só nho passado. A saga, narrada pelo polí-

depende do tamanho da transferência”, tico nas redes sociais, virou até meme.

diz Pedro Olinto, economista do Banco “Quem sabe possamos começar em

Mundial que estuda o impacto de po- janeiro de 2018, com um presidente

líticas públicas sobre a pobreza. Num democraticamente eleito”, diz Suplicy

exemplo em que todos os brasileiros re- à GALILEU. “Poderíamos começar

cebessem R$ 200 por mês, diz, “isso com um valor um pouco melhor do

representaria cerca de 10% do PIB, o que o garantido pelo Bolsa Família,

que poderia ser mais ou menos alcança- talvez R$ 100 por pessoa, que um dia

do com a substituição do Bolsa Família, serão R$ 200, depois R$ 500, depois

62 seguro-desemprego, BPC [Benefício de R$ 1.000.” Uma das maiores diferenças

da renda básica é a incondicionalidadeixo ∏ De ciixo ∏ De ci“O que me preo-
e a universalidade. Por isso, diz Suplicy,ma para bacupa não é a econo-
a burocracia seria reduzida. “Os mais ri- mia do ‘Uber-now’,
cos já recebem dinheiro passivamente, mas a do ‘Uber- na Suíça propôs a implementação de
e não têm de provar que o salário é bai- later’”, afirma Stern, um pagamento de 2.500 francos suíços
xo ou que levam os filhos à escola [con- referindo-se à possi- (R$ 7.900) por mês a todos os adul-
dições do Bolsa Família]”, afirma, refe- bilidade de que mes- tos. Vale notar que, em consequência
rindo-se a rendimentos de negócios, mo ocupações pouco do custo de vida no país, o montante
propriedades e capital financeiro. estáveis sejam extin- equivaleria a R$ 2.900 no Brasil, se-
tas — a companhia já gundo o índice de paridade de poder
ma para ba testa carros autôno- aquisitivo do Banco Mundial.
mos, sem motoris-
R ta. “A renda básica é A proposta recebeu 77% de votos
gestão de risco para contra e 23% a favor. “Nossa ideia era
Rendimentos financeiros, aliás, são pessoas abastadas. apresentar o conceito, e não nos enga-
vistos por alguns como a única fonte Como manter esta- jar numa batalha retórica para ganhar
de financiamento para uma iniciativa bilidade econômica a maioria a todo custo”, diz o diretor da
de renda universal. De acordo com es- quando não houver campanha, Enno Schmidt. “Por isso, foi
tudo do economista francês Thomas mais empregos?” missão cumprida.” Sua estratégia é, em
Piketty, ganhos de capital (juros, di- aproximadamente oito anos (“depen-
videndos, ações, aluguéis e outros) Para liberais eco- dendo do clima político”), finalmente
representam por volta de 30% dos nômicos, a beleza implementar o plano — que substituiria
rendimentos da economia norte--ame- da renda básica es- todo o sistema de segurança social.
ricana. Desses, um terço foi destinado taria justamente na redução da má-
só à faixa socioeconômica do topo, o quina pública por meio da eliminação Um dos argumentos contrários à
famigerado 1% da população. A ideia, de programas sociais. Ou seja, mesmo campanha é a possibilidade do aumen-
então, seria taxar esse rendimento e que os governos tivessem de pagar, to da inflação. Evidências do estado
distribuir entre o restante. seria menos do que desembolsam hoje do Alasca (EUA), que paga anualmen-
e, teoricamente, de uma forma mais te royalties do petróleo à população,
Piketty, por sua vez, expressa prefe- eficiente. Mas quais seriam os efeitos sugerem que esse problema inexiste.
rência por salários maiores a uma even- no mercado de trabalho? Não se sabe “Da maneira que é hoje, não temos sen-
tual renda básica — esta, carro-chefe ao certo, mas as evidências de estu- so de humanidade, de sociedade. Não
da campanha de Benoît Hamon, can- dos e programas semelhantes realiza- há direito à vida. Tudo depende de seu
didato do Partido Socialista na corrida dos no Canadá, nos Estados Unidos, desempenho, produtividade. Antes de
presidencial francesa. Hamon promete na Índia e em outros lugares sugerem sermos uma sociedade de trabalhado-
750 euros (aproximadamente R$ 2.500) que a resposta seja “quase todos”. res, seres econômicos, somos uma so-
mensais para todo cidadão acima de ciedade humana e civil”, diz Schmidt.
18 anos. Uma das maneiras de pagar “Como economista do trabalho, me “É um tópico mundial e que se torna
por isso seria taxar mais pesadamente interessa saber se o benefício estimu- cada vez mais importante. No próximo
as empresas que substituem trabalha- la o emprego”, conta Ioana Marinescu, referendo, vamos lutar e ganhar.”
dores por robôs ou softwares. professora da Universidade de
Chicago. “E a evidência empírica
“Não posso falar pelo Brasil, mas mostra que há praticamente nenhum
nos Estados Unidos é plenamente fi- efeito.” A análise da mudança de vida
nanciável”, diz Andy Stern, economis- de pessoas que ganharam na loteria,
ta que dirigiu uma das maiores uniões diz ela, pode servir como parâmetro
sindicalistas dos EUA e do Canadá para prever a disposição ao trabalho
por 14 anos e autor de um livro sobre diante de uma renda incondicional.
o tema, Raising the Floor (Elevando o “Há efeito negativo [pessoas largan-
Piso, sem edição no Brasil). “Se der- do o emprego], mas, surpreendente-
mos US$ 10 mil [por ano] a todos, exis- mente, é muito pequeno.”
tem muitas maneiras de pegar esses
US$ 10 mil de volta dos enormemente Para encontrar uma resposta, a
ricos por meio do sistema tributário.” Finlândia deu início, em janeiro, a um
Além de impostos novos, ele propõe estudo com 2 mil pessoas entre 25 e 58
enxugar gastos no sistema de saúde. anos sem atividade remunerada, que re-
ceberão 560 euros (R$ 1.900) por mês
durante dois anos, independentemen-
te de sua condição. Também recente-
mente, no ano passado, um referendo

NOVA TEORIA DA GRAVIDADE O

elimina o conceito de matéria escura Q
e desbanca as ideias de Einstein e U
E
Newton. Ela já passou em um teste
importante — resta saber se tem futuro F
A
Z

T
U
D
O

C
A
I













TUBO DE ENSAIOS

POR DR. DANIEL BARROS*

OS POMBOS DE essa espécie de superstição porque
SKINNER VÃO A tendiam a continuar fazendo o que
SPRINGFIELD quer que estivessem fazendo — por
mero acaso — na primeira vez que
Talvez você não se lembre, mas uma das personagens surgia a ração. O aparecimento da
mais notórias da cultura pop é uma viciada em comida reforçava aquele comporta-
jogos de azar. Ela pode passar horas, dias, semanas mento, que era repetido. E cada vez
esperando um prêmio diante de um caça-níqueis que o alimento vinha, mais forte se
tornava a associação enganosa que
TODO MUNDO ADORA FOFOCAR ganha nada logo em seguida, e por Se o prêmio as aves faziam com seus rituais.
sobre a vida das celebridades. Falar isso tenta novamente. E de novo, de às vezes vem,
sobre os casamentos, viagens e salá- novo, passando horas, dias, semanas outras não, Não satisfeito, Skinner aumentou
rios dos famosos sempre rende boa diante da máquina. a tendência o intervalo entre as rações para um
audiência. Expor os problemas, en- é persistir minuto em algumas das caixas. Com
tão, faz ainda mais sucesso — brigas, No fim das contas, Homer a incita mais tempo isso os comportamentos supersticio-
divórcios e internações em clínicas a admitir que tem um problema com sos se tornaram ainda mais intensos.
são fonte inesgotável de assunto. jogo. “Está certo, talvez eu devesse no jogo, E quando a ração foi suspensa, eles
Há um seriado, por exemplo, que procurar ajuda profissional”, diz ela. esperando demoraram muito mais para cessar
expõe o drama de sua protagonista “Não, é muito caro”, reage Homer. que, em algum — um dos pombos pulou por mais de
sem o menor pudor. Ela é viciada em “Apenas não faça mais isso”, conclui momento, ele 10 mil vezes antes de desistir.
jogo. Trata-se de uma das séries mais com sua inteligência de sempre. Essa renda frutos
longevas da história. O nome da jo- sequência resume um dos aspectos Faz sentido. Se algo traz sempre
gadora patológica? Marge Simpson. mais viciantes do jogo — elevado em uma recompensa, quando esta acaba
todo seu poder nos caça-níqueis —, não se demora a notar que a festa
Com o brilhantismo que lhe é pecu- o reforço intermitente. terminou. Mas quando o prêmio às
liar, Os Simpsons abordaram o tema vezes vem, outras não, a tendência
da dependência de jogo no início dos Em 1948, o psicólogo norte-ameri- é persistir mais tempo no compor-
anos 1990, no décimo episódio da cano B. F. Skinner, um dos psicólogos tamento, esperando que, em algum
quinta temporada da série. E a forma mais influentes da história, publicou momento, ele ainda renda frutos. Dá
como o fizeram mostra um pouco por um artigo chamado Superstição nos para notar o paralelo perfeito com
que o jogo pode se tornar um vício Pombos, no qual mostrava a força os caça-níqueis, não?
tão grave como o de qualquer droga. desse tipo de reforço parcial. No
experimento, ele colocava pombos A pobre Marge Simpson, sentada
Tudo começou depois que um cas- em caixas programadas para dis- diante da máquina, nada mais é do
sino foi construído em Springfield pensar uma pelota de ração a cada que a versão com pele amarela e ca-
com a justificativa de movimentar 15 segundos, independentemente belo azul de um pombo de Skinner.
sua combalida economia. Marge vai do que os bichos fizessem. Durante Cada vez que põe uma moeda e puxa
até lá para buscar Homer, que arran- vários dias seguidos, oito pombos fo- a alavanca, acredita que está fazen-
ja um emprego de crupiê, e encontra ram colocados nessa caixa, um por do algo que lhe renderá uns troca-
uma moeda no chão. Por brincadeira, vez, durante alguns minutos. dos. Eventualmente ela acerta. O que
resolve colocá-la num caça-níqueis só lhe dá mais convicção de conti-
e tem a sorte — ou o azar — de ser Depois de muitos dias, cada pom- nuar tentando até a próxima — sem
premiada com uns trocados. É o que bo tinha desenvolvido uma mania perceber que esse intervalo lhe custa
basta para despertar nela a vontade diferente: uns se balançavam, outro mais do que ela jamais ganhará.
de jogar novamente. É claro que não dava três voltas a cada 15 segundos,
um dava saltinhos. Eles adquiriam *DANIEL BARROS é psiquiatra do Instituto de

Psiquiatria do HC–FMUSP, doutor em Ciências

e bacharel em Filosofia. Atua com divulgação

científica em vários meios. É consultor 71
do programa Bem Estar (TV Globo).

PANORÂMICA

Tensão asiática: mísseis de longa distância são disparados pelas Forças Armadas da Coreia do Norte, em local e data não divulgados. Após a chegada de Donald Trump à

72

presidência dos Estados Unidos, o governo norte-coreano afirmou que continuará com a realização de testes nucleares e ameaçou atacar alvos militares norte-americanos.

Imagem: STR/AFP/Getty Images. Pesquisa: Franklin Barcelos 73

UMLATTIO- PARA FAZER A DIFERENÇA

AS FRAGILIDADES DA AGORA QUE VOCÊ LEU A REVISTA, SAIA DO SOFÁ
SAÚDE O INSPIRARAM
TEM VONTADE DE FICOU CURIOSO PARA GOSTARIA DE QUER ENTENDER
A APOIAR MÉDICOS CONTRIBUIR PARA UM CONHECER MAIS A PARTICIPAR DE UM MELHOR COMO A
VOLUNTÁRIOS? PROJETO BRASILEIRO TECNOLOGIA MUDARÁ
FUNDO A DEPENDÊNCIA PROTESTO PELA A DEMOCRACIA?
DE RENDA BÁSICA? POR JOGOS DE AZAR? CIÊNCIA NO BRASIL?

Saúde pública no
Brasil deve perder
R$ 430 bilhões nas
próximas décadas.

INSTITUTO RECIVITAS PRO-AMJO HORAS DA VIDA ITS RIO MARCHA PELA CIÊNCIA

A ONG promove iniciativa que O Programa Ambulatorial do O projeto reúne profissionais Além de estudar o impacto e o Ocorre na mesma data em
distribui renda a moradores Jogo foi criado pelo Departa- da saúde que atendem de futuro da tecnologia no Brasil e que acontece o protesto nos
do distrito de Quatinga Velho, mento de Psiquiatria da USP. EUA. Anote na agenda: dia
Presta atividades assistenciais graça pacientes nos consultó- no mundo, o Instituto de 22 de abril, às 14 horas, no
em Mogi das Cruzes (SP). a jogadores patológicos, além rios, preenchendo lacunas do Tecnologia e Sociedade Largo da Batata, em São Paulo.
São aceitas doações de atuar em ensino e pesquisa. sistema público. Aceita doações promove uma série de
eventos abertos ao público. facebook.com/
em reais e em bitcoins. ipqhc.org.br a partir de R$ 1 por dia. marchapelacienciasp/
recivitas.org horasdavida.org.br itsrio.org

S1 ÓMI+N. PARECE QUE O JOGO Quem NÃO FOMOS NOBREZA NA FAVELA QUE FÍSICO!
ESTÁ VIRANDO faz sexo CONVIDADOS Arqueólogos acharam A estreia da série Genius,
Aconteceu em março, Apesar dos impropérios é mais Para os pobres mortais partes de uma estátua que contará a vida de
mas não coube na revista que ainda ouvem em produtivo que não sabiam até do faraó Ramsés II, o Albert Einstein desde
2017, as brasileiras são durante o então, foi revelado Grande, submersa ao jovem, está marcada
destaque em... produção trabalho, que o aplicativo de lodo em uma favela para 23 de abril, às
científica: 49% dos concluiu paquera Tinder tem uma nos arredores do Cairo. 22 horas, pelo canal
artigos publicados são de pesquisa versão secreta, chamada A peça gigantesca foi National Geographic.
mulheres. O índice daqui feita nos Select, só para pessoas encontrada onde ficava a O gênio adulto é interpre-
é melhor que o dos EUA Estados excepcionalmente antiga cidade de Heliópo- tado por Geoffrey Rush,
e o da União Europeia. Unidos. bonitas e celebridades. lis, morada do Deus Sol. de O Discurso do Rei.



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