História do Teatro
O TEATRO ÉPICO DE
BERTOLT BRECHT
O1
Quem é Bertolt Brecht..................02
O2
Conceitos.......................................11
O3
Aristóteles X Brecht.......................14
ÍNDICE
O1
QUEM É
BERTOLT
BRECHT
Eugen Bertholt Friedrich Brecht, mais
conhecido como Bertolt Brecht, nasceu
em 10 de fevereiro de 1898 em Augsburg,
na Baviera, no extremo sul da Alemanha.
Em 1914, com o começo da I Guerra
Mundial, Brecht se matriculou em
Medicina na Universidade de Munique,
com a esperança de não ser convocado
para a guerra.
Bertolt Brecht,
em foto de
Jörg Kolbe, em
1954
Logo no começo de seus estudos, é
designado para um hospital militar em
Augsburg, que o leva a escrever A Lenda
do Soldado Morto, onde denuncia o
extremismo dos militares alemães.
Com o fim da guerra, Brecht retorna à
Munique, que, na época, é o centro da
boêmia e da vanguarda alemã.
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Em Munique, Brecht passa a se interessar mais
pelos cafés e cabarés literários do que por
medicina, ainda mais ao começar a conhecer
outros artistas, como o escritor Frank Wedekind,
sendo um dos que influencia Brecht e o leva a
escrever sua primeira peça teatral chamada Baal,
em 1918.
Baal possui as características de um teatro
expressionista, revelando a animalidade da
natureza humana em um personagem que canta
seus poemas em cabarés e tem uma vida repleta
de desregramentos.
Sua segunda peça, Tambores da Noite, possui duas
versões, uma de 1918, que tem em sua essência a
ideia do avanço do proletariado, e outra reescrita
por Brecht em 1953, que fala da derrora do
proletariado. Em ambas as versões, a história se
situa no fracasso da Revolução Espartaquista (uma
organização socialista, marxista, revolucionária, an
ti-imperialista e antimilitarista atuante
na Alemanha durante a Primeira Guerra Mundial),
ao retratar a vida de uma família oportunista de
guerra.
Ainda em 1918, Brecht encena suas duas primeiras
peças em Munique, revelando a todos seus ideais
políticos e revolucionários.
Na mesma época, Brecht se torna crítico teatral do
jornal Der Volkswille, em Augsburg, e ataca o
movimento expressionista e sua concepção
materialista de mundo.
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Em 1921, Brecht se muda para Berlim, onde o
influente crítico Herbert Ihering chamou-lhe a
atenção para a apreciação do público berlinense
pelo teatro moderno. E Brecht é atraído pelos
dadaístas, que formavam a vanguarda mais
politizada da época, criticando a arte burguesa e as
instituições políticas.
Brecht se encanta com o cenário que encontra em
Berlim, mas sua fama de crítico instransigente se
espalha, e ninguém se dispõe a montar suas peças
já escritas, e Brecht passa a lutar por sua própria
sobrevivência, chegando a ser internado por
desnutrição.
Inspirado em suas próprias experiências e pelo
livro A Selva, de Upton Sinclair, Brecht escreve, em
1923, a peça Na Selva das Cidades, retratando a
exclusão social e as relações de poder da vida em
sociedade.
No mesmo ano, Brecht conhece a atriz vienense
Helene Weigel, que se tornará sua companheita
além de ser sua atriz predileta e inspiração de suas
principais protagonistas femininas, sendo também
a mãe de seus dois filhos: Stefan e Barbara.
Em 1924, junto com Feuchtwanger, Brecht adapta
a obra de Marlowe para o teatro, e A Vida de
Eduardo II da Inglaterra passa a ser sua primeira
encenação bem sucedida.
Nos ensaios da peça, Brecht pede que os atores
trabalhem a expressão corporal, e que evitem o
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sentimentalismo e as falsas declamações, o que o
leva a criar a ideia do teatro épico.
Brecht começa a explorar novas formas
dramáticas, e em 1926 escreve sua primeira
comédia, Um Homem é Um Homem, onde utiliza de
canções e falas dirigidas diretamente ao público,
quebrando o distanciamento ilusionista da quarta
parede que até então separava os atores do palco
do público na plateia.
Em 1927 Brecht passa se interessar pelas ideias
marxistas e pelas novas formas dramáticas,
aproximando-se do encenador Erwin Piscator,
conhecido por suas montagens cheias de
projeções de filmes, cartazes, etc.
Piscator é quem apresenta Brecht ao teatro agit-
prop, com peças apresentadas em bairros
populares, com atores-operários, e o ideal de
transmitir as ideias libertárias para um público
iletrado.
Porém, Brecht via que esse teatro não resolvia o
problema em seu cerne, vendo-o como
revolucionário somente no plano teatral, mas não
no conteúdo.
Com isso em mente, em 1928, Brecht escreve A
Ópera dos Três Vinténs, com música do
compositor Kurt Weill. A peça é uma adaptação da
ópera musical Ópera dos Mendigos, de John Gay, de
1728.
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A peça foi encenada já nos moldes do teatro épico
de Brecht, e foi um sucesso, sendo representada
mais de 1000 vezes, e ainda contou com uma turnê
internacional.
O sucesso da peça levou Brecht a delimitar melhor
o conceito do teatro épico, escrevendo a peça
Mahagonny, em 1927, completamente dentro dos
moldes épicos, colocando o público frente a
situações em que precisa tomar decisões a favor
ou contra ao que é apresentado na peça, fazendo-o
não só interpreta o que vê, mas perceber o que vê
como realidade, e se sentir impulsionado a
transformar o que vê, ou seja, deve adotar uma
postura crítica.
Com esse intuito, Brecht cria o que ele chamou de
Teatro Didático, que tem como objetivo provocar
uma consciência coletiva em quem participa, seja
como ator ou espectador, e de fácil entendimento
para o público leigo, principalmente crianças e
proletários.
Sua primeira peça nesses moldes, O Vôo Sobre o
Oceano, foi escrita em 1929, e apresentada como
peça radiofônica para crianças.
Entre 1929 e 1930, Brecht se dedica à escrita de
peças didáticas, entre elas: Baden-Baden; Aquele
que Diz Sim, Aquele que Diz Não; A Exceção e a
Regra; e A Decisão.
Em 1932, Brecht realiza seu primeiro e único filme,
Kuhle Wampe, que conta a história de uma família
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de operários num acampamento na periferia de
Berlim. O filme foi censurado inúmeras vezes pelo
governo alemão, por ser considerado um filme de
teor comunista por criticar o capitalismo e o a
dominação de classes.
A repressão do governo contra os proletários,
aproxima ainda mais Brecht dessa temática em
suas obras.
Nesse mesmo período, Brecht começou a assimilar
elementos gestuais do teatro nô japonês, e os
adaptou em suas encenações, denominando-os de
Gestus.
Em 1930, Brecht adapta o romance de Górki,
chamado A Mãe, para o teatro. As apresentações
passam a ser vigiadas pela polícia, levando a prisão
de sua companheira, Helene Weigel, que
interpretava a mãe.
A situação política na Alemanha se agrava, o que
faz com os teatros temam em apresentar as peças
de Brecht.
Com o avanço do nazismo, e o aumento da
perseguição que o acometia, Brecht precisou
recorrer ao exílio, fugindo da Alemanha em 1933.
Brecht esperava voltar logo para seu país, mas seu
exílio se estendeu por cerca de 15 anos, fazendo-o
morar em diversos lugares, como Dinamarca,
Áustria, Suíça, França, Inglaterra, Rússia.
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É na Rússia que Brecht desenvolve sua ideia de
efeito de distanciamento, que procura conservar
uma distância crítica entre espectadores e a
interpretação dos atores.
Entre 1938 e 1939, Brecht escreve a peça Terror e
Miséria no Terceiro Reich, onde descreve a
Alemanha da época, baseado em testemunhos e
notícias, o que afasta ainda mais seu retorno à
terra mãe.
Com o início da II Guerra Mundial, em setembro de
1939, Brecht não vê mais nenhum lugar seguro na
Europa, e embarca com a esposa e os filho, para os
Estados Unidos, instalando-se em Santa Mônica,
na Califórnia.
Mesmo estando do outro lado do Atlântico, Brecht
continua a escrever peças sobre os
acontecimentos na Europa, entre eles As Visões de
Simone Marchand e O Bravo Soldade Schweyk.
Porém, o público californiano não demonstra
interesse nas peças de Brecht, o que o leva a
trabalhar no cinema, com Fritz Lang, onde
contribuiu com o roteiro de Os Carrascos Também
Morrem.
Entre 1943 e 1947, Brecht viaja diversas vezes à
New York, tanto para avaliar seu retorno à
Alemanha como para tentar lançar, sem sucesso,
suas peças na Broadway.
Brecht só conseguirá retornar para seu país em
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1948, e fica consternado ao ver os sobreviventes da
guerra famintos, vagando por entre ruínas e os
buracos das bombas, além de ver uma Alemanha
dividida.
Frente a isso, Brecht retoma aquela que será uma
de suas obras mais icônicas: Mãe Coragem e Seus
Filhos, a qual desenvolveu entre 1938 e 1941.
Porém, na época, a peça é vista como pacifista
demais para uma Alemanha em plena Guerra Fria.
A atriz Gisela May e o diretor Manfred Wekwerth
durante o ensaio de Mãe Coragem e Seus Filhos, de
Bertolt Brecht, em 1978
Em janeiro de 1949, Brecht e sua esposa, Helene
Weigel, formam sua própria companhia teatral, o
Berliner Ensemble, formada por uma geração
jovem de atores e dramaturgos.
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Em 1955, Brecht recebe o prêmio Stalin da Paz, em
Moscou, e falece em 14 de agosto de 1956, aos 58
anos, em Berlim Oriental.
Brecht é considerado um dos dramaturgos
fundamentais deste século. Além de ter
revolucionado a teoria e a prática da dramaturgia e
da encenação, mudou completamente a função e o
sentido social do teatro, usando-o como arma de
consciencialização, educação e politização.
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O2
CONCEITOS
BRECHTIANOS
Para compreender melhor as peças de Brecht, é
necessário que se conheça alguns dos conceitos
básicos que diferenciam seu modo de fazer teatral:
Didática (peça – ): Paralelamente a seus estudos
marxistas, Brecht escreve exercícios didáticos que
dispensam a instituição do teatro, assim como seu
público. Previstos para grupos amadores da
Juventude Comunista, seu objetivo é experimentar
comportamentos coletivos a fim de juntar a ação
política à reflexão moral. O ator-espectador
aprende ensinando para deixar de ser consumidor
e tornar-se produtivo.
Distanciamento (Verfremdrung): Termo de
inspiração hegeliana que Brecht usa
abundantemente a partir de 1936 para designar
certos procedimentos épicos. Estes devem
suprimir o que há de geralmente conhecido e de
patente nos caracteres e processos em cena.
Tornados assim insólitos e notáveis, eles não mais
permitem que o espectador se identifique com
eles instintivamente e confunda teatro e realidade.
À medida que o espectador reconhece uma
situação como histórica, o mundo lhe parece
transformável: "Doravante o teatro lhe apresenta o
mundo para que ele se apodere dele". Podem servir
de efeitos de distanciamento: intervalos e canções
que interrompem a ação, cartazes que antecipem a
narrativa, prólogos e epílogos ou apóstrofes ao
público, gestos e metáforas, a música, o cenário,
etc. Já se encontram muitos desses efeitos no
teatro asiático ou nas farsas medievais.
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Épico: Em Brecht não significa um gênero literário
(ele fala em drama e romance épicos), mas a
atitude crítica do narrador diante da fábula. Este
conta e comenta a ação sem confundir-se com
ela. Ele permite assim que o leitor ou o espectador
observe adotando uma distância crítica,
estabelecendo uma opinião. Ao falar em teatro
épico, a partir de 1926, Brecht opõe-no sobretudo
às correntes naturalistas e expressionistas. Irá
chamá-lo de teatro da era científica, que transmite
conhecimentos práticos e ensina um pensamento
materialista capaz de exercer influência sobre a
realidade. O distanciamento é sua peça-chave.
Gestus Social: O conjunto de gestos e
comportamentos, as expressões fisionômicas, a
linguagem e a entonação de um indivíduo em
relação aos outros, que fazem transparecer ao
mesmo tempo sua personalidade e sua situação
social. "Palavras, gestos podem ser substituídos
por outras palavras, outros gestos, sem que o
gestus seja modificado por isso"
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O3
ARISTÓTELES
versus
BRECHT
Brecht rompeu com a forma dramática de teatro,
que seguia as normas estabelecidas na obra A
Poética de Aristóteles, escrita entre os anos 335
a.C. e 323 a.C., e que norteou toda a escrita
dramática pós a sua redescoberta pelo intelectuais
do renascimento europeu.
As diferenciações são várias, conforme podemos
visualizar na tabela comparativa abaixo:
ARISTÓTELES BRECHT
Música monótica (monos=um Música servia como
/ ode=som) - a uma só voz teatralização do texto (tema)
Quatro principais gêneros: Superação dos elementos:
ditirambo, drama satírico, visibilidade, luz, títulos,
movimento espacial
tragédia e comédia
Forma Dramática Forma Épica
Mimese Gestus Social
Dramaturgia Encenação
Espectador inserido na ação Espectador observador da
(afundado em algo) ação (situado diante de algo)
Imitação direta (ação) Narração
Esgota a atividade Desperta a atividade
intelectual
intelectual
Sentimentos (experiência Decisões/Razões (visão de
afetiva)
mundo)
Sugestão Argumentação
Sentimentos se manifestam Sentimentos convertidos
em conhecimento
como são
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Pensa que conhece o Homem como objeto de
homem: estático investigação: mutável (assim
Relação causal como a sociedade) se
Evolução contínua transforma, está em
O pensamento determina constante processo
Relação episódica
o ser
Interesse apaixonado Evolução em saltos
O ser social determina
pelo desenlace
Dramaturgia fechada o pensamento
Interesse apaixonado
pelo desenvolvimento
Dramaturgia aberta
A dramaturgia fechada, ou aristotélica, prende-se
aos antigos preceitos: obediência básica às três
unidades, mas com certa tolerância, atenção à
velha exigência da causalidade no
desenvolvimento da ação, ao conflito e ao
desenlace dessa mesma ação.
A dramaturgia aberta, ou não-aristotélica, faz mais
ou menos o oposto: a ação se move com relativa
liberdade no espaço e no tempo, não dá atenção à
causalidade, as cenas se sucedem com
independência e contiguidade, e mais algumas
particularidades, seguindo as propostas de cada
dramaturgo.
Relativização, ruptura, distância, decisões,
continuação: recursos que Brecht emprega para
conseguir realizar o efeito de distanciamento na
sua dramaturgia.
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Aristóteles sistematizou o teatro feito em sua
época. Brecht busca contextualizar o teatro,
opondo-se a forma de apropriação de Aristóteles.
A teoria de Brecht está relatada na publicação de
sua autoria, O pequeno Organon, e foi colocada em
prática em inúmeras montagens do Teatro Berliner
Ensemble, sob a direção do próprio Brecht. Essas
montagens memoráveis influenciaram muitos
dramaturgos e encenadores no mundo inteiro.
Bertolt Brecht não visava a total destruição da
ilusão teatral, mas o fim do artificialismo da cena
da época. Não nega a emoção e sim convida o
espectador a raciocinar.
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