beba com moderação
CACHAÇA EM REVISTA 3
4 CACHAÇA EM REVISTA
ABRIDEIRA Expediente Ao lado, o brinde
tradicional ao fim
CACHAÇA EM REVISTA: da Degustação às
Cegas do Ranking;
DÉCIMA SAFRA embaixo, capas de
nove edições da
Écom muito orgulho que chegamos à Cachaça em Revista
marca de dez edições da Cachaça em
Revista. Esse orgulho se justifica à me- o setor e a Cachaça em Revista ainda têm muito
dida que revela a consistência do traba- trabalho a realizar.
lho que a Cúpula da Cachaça vem realizando –
não sem dificuldades – em busca da valorização Então, espalhemos conhecimentos e informa-
do destilado nacional brasileiro. ção. Nas páginas seguintes, celebramos a pro-
dução de cachaça de excelência com os rótulos
Chegar a essa marca não é uma vitória da Cú- vencedores do V Ranking Cúpula da Cachaça. E,
pula, é da Cachaça, porque demonstra que os ato- na sequência, abordamos temas fundamentais e
res do setor estão prontos para apoiar iniciativas iniciativas importantes para o futuro da cachaça.
que contribuam para o desenvolvimento e a pro- Boa leitura, beba com moderação e… Saúde! Que
fissionalização do mercado. Todas as dez edições venham os próximos dez anos!
de nossa revista puderam ter distribuição gratuita
porque os custos foram cobertos pelos anuncian- Dirley Fernandes
tes – além, claro, de todos os cúpulos terem doado
seu tempo escrevendo artigos, editando, fazendo Editor e “cúpulo”
o Comercial, a produção gráfica etc…
Produção: Cúpula da Cachaça e Carbonários!
Foi no mesmo ano em que publicamos a pri- Editor: Dirley Fernandes
meira Cachaça em Revista – 2013 – que surgiu Editor de Arte: Sidney Ferreira
a ideia do Ranking Cúpula da Cachaça, pensado Fotos: Mateus Verzola e Maurício Motta
como uma oportunidade de divulgação do nos- Produção gráfica: Maurício Maia
so destilado e um incentivo à produção de qua- Coordenação Comercial: Nelson Duarte
lidade. No ano seguinte, a primeira edição do REVISÃO: Andréia Gerk
Ranking atraiu os votos de mais de 2 mil apre-
ciadores e colocou a cachaça na primeira página @cupuladacachacaoficial
de um grande jornal, graças à parceria com o Pa- https://www.facebook.com/CupuladaCachaca
ladar Estadão. Agora, acabamos de finalizar o V www.cupuladacachaca.com.br
Ranking. Foram 48 mil votos e, mais uma vez, a
presença na home page do Estadão. CACHAÇA EM REVISTA 5
A Cúpula cresceu; a Cachaça evoluiu. Mas
nosso destilado ainda está longe de realizar
seu potencial, no Brasil e no exterior. Se o pre-
conceito parece estar ficando para trás, falta
muito chão para o reconhecimento da cachaça
como bebida de excelência. Portanto, a Cúpula,
EM REVISTA EDIÇÃO NO 10 // SAFRA 2022 // ANO X
Cachaçaria Macaúva, março de 2022: cúpulos e 44 TECNOLOGIA & ARTE
turma de apoio mobilizados em torno do Ranking Inovações na área científica vão ajudar
a moldar a identidade e a autenticidade
6 OS CÚPULOS da cachaça, conta Cauré Portugal
Agora, somos 14 membros efetivos
48 NA ROTA CERTA
8 V RANKING em fortaleza, turismo e cachaça
Saiba tudo o que aconteceu no maior se juntam para criar experiências
concurso de cachaças do país inovadoras
24 CEARÁ DE ALAMBIQUE 52 IMAGENS
O renascimento da produção em pequena Um pouco da trajetória da Cúpula, que
escala no estado nordestino se prepara para celebrar dez anos de história
28 COLECIONISMO 56 ALÍVIO CÔMICO
O colecionador Sidnei Maschio conversa humor vindo da terra onde já
com colegas no ofício da garimpagem se nasce fazendo graça
32 CONHECIMENTO 58 SAIDEIRA
Um alerta sobre a disseminação Ninguém vai embora antes dos Versos
de informações no nosso setor Caipiras do caboclo Sidnei Maschio
36 Produção
O que um barril que já serviu para armazenar
vinho pode deixar de herança para a cachaça
40 CACHAÇA E ESTADO
Uma relação que nunca é simples, mas pode
ser muito produtiva para ambos os lados
6 CACHAÇA EM REVISTA
12 3 11
4
6 89
7 5
10
os cúpulos 1 -SIDNEI MASCHIO. Jornalista especializado em Agronomia, é -presidente para a América do Sul da IBA (International Bartender
apresentador do canal TerraViva (Band), onde produz o quadro Association).
Segredos do Alambique, além de poeta, degustador e colecio- 7 - MANOEL AGOSTINHO LIMA NOVO (presidente). Autor dos
nador de cachaças. livros Viagem ao mundo da cachaça e A Arte do Blend na Cacha-
2 - NELSON DUARTE. Master blender, master distiller, consultor ça, atua como professor, consultor e palestrante e é formado em
e autor do livro ‘Cachaça: uma dose de marketing’ e especialis- Análise Sensorial pelo Centro Studi Assaggiatori (Brescia, Itália).
ta em Bebidas Destiladas pela WSET (Wine & Spirits Education 8 - MAURÍCIO MAIA (secretário executivo) . Consultor, profes-
Trust). Foi gerente de Desenvolvimento de Líquidos da Ypióca. sor e jurado de concursos internacionais, como o Spirits Selec-
3 - MILTON LIMA. É colecionador de cachaças e proprietário da tion, do qual é embaixador no país. Especialista no líquido pre-
Cachaçaria Macaúva. Criador de cartas de cachaças, inclusive cioso há mais de 20 anos, é colunista do Estadão.
a da Macaúva, premiada pela revista Prazeres da Mesa como uma 9 - ANDRÉIA GERK. Auditora Fiscal Federal Agropecuária
das melhores cartas de bebidas do país. do Ministério da Agricultura, engenheira agrônoma, autora
4 - JEAN PONCE. Bartender com longa carreira em casas como o de publicações como ‘A Cachaça no Brasil, Dados de Regis-
DOM e o Brasil a Gosto, ele hoje comanda o paulistano Guarita Bar, tro de Cachaças e Aguardentes’ (Mapa), atuando em prol da
uma das maiores referências da coquetelaria brasileira, entre outras cachaça há 15 anos.
casas. 10 - DIRLEY FERNANDES. Jornalista, editor, escritor e documenta-
5 - CAURÉ PORTUGAL. PhD em enologia com especialização em rista, comanda o site Devotos da Cachaça. Passou por jornais como O
microbiologia (Universidade de La Rioja), é CEO da Smart Yeast, uma DIA , Extra e Jornal do Brasil, foi colunista da Gula e é autor do docu-
das maiores referências em processos fermentativos no país. mentário Devotos da Cachaça (2010).
6 - MESTRE DERIVAN. Decano da coquetelaria nacional e um dos 11 - LEANDRO BATISTA. Um dos mais conhecidos sommeliers
responsáveis pela internacionalização da caipirinha. Passou por de cachaças do país, formou-se como profissional no Mocotó, em
bares como o Número, em São Paulo (SP), e Blue Note e foi vice- São Paulo, e foi um dos responsáveis pelo sucesso da casa. Está à
frente da Boutique de Cachaças Umas e Outras.
os NOVOS cúpulos Altino Farias. Illan Oliveira.
À frente da Embaixada Sócio executivo da
Nina Bastos. da Cachaça, em Solution Comercial,
Comanda o Bar Fortaleza, com de São Paulo,
Jiquitaia, em São centenas de distribuidora com um
Paulo, referência rótulos, ele lidera o elenco de mais de mil
em termos de movimento de difusão marcas de cachaça.
coquetelaria e valorização do nosso
com cachaça destilado no Ceará.
e ingredientes
brasileiros.
8 CACHAÇA EM REVISTA
V RANKING
Concentração: cúpulos
durante degustação
às cegas. Cada bateria
é composta por cinco
F amostras de cachaça
oi o maior Ranking de todos
os tempos. E comprovou, para
nós cúpulos e para todo o setor,
que a iniciativa que projetamos
lá atrás, a partir do primeiro trimestre
de 2013, logo após o primeiro encon-
tro da Cúpula da Cachaça, não é mais
nossa. É da Cachaça, tornou-se um pa-
trimônio da nossa indústria. Nenhuma
categoria – incluindo fermentados e
destilados – consegue promover uma
ação que provoque a mobilização a ní-
vel nacional e consiga a visibilidade do
Ranking Cúpula da Cachaça.
Vamos aos números que susten- O MAIOR
tam a tese aí de cima. Nessa quinta
edição do Ranking – que é bienal –, a
primeira fase, a Votação Popular, atraiu
nada menos que 48 mil votantes va-
lidados. No total, foram 129.123 indi-
cações, já que cada pessoa poderia
escolher até três cachaças, para 886
diferentes rótulos de cachaças de 17
unidades da Federação. O recorde
anterior – 43 mil votos, no terceiro
RDEATNODKOISNOGS SRanking – foi superado com folga.
Quinta edição da iniciativa da Cúpula mobilizou
por cinco meses todo o setor de cachaça,
quebrando recordes e atraindo a atenção
de quem ama e quem ainda vai amar a cachaça,
conta o cúpulo Dirley Fernandes
10 CACHAÇA EM REVISTA
Pardin Porto
Da Quinta Prata
Havana/ Anísio Santiago
Premium/ Extra Premium Branca Armazenadas/Envelhecidas
V RANKING
As postagens sobre empenho dos produtores. Eles não A FINAL
o Ranking no Paladar pouparam esforços para que os espe- Os cúpulos só acompanhávamos,
Estadão foram parar, cialistas recebessem amostras de suas
como sempre, na pri- cachaças, que chegaram às dezenas divulgando, monitorando e adminis-
meira página do portal do na casa de cada uma dessas figuras trando tudo. Porque, até a etapa final,
Estadão – cerca de 350 mil vi- de destaque no mercado. não apitamos nada em relação à com-
sitantes diários. O anúncio do petição em si. Só ficamos torcendo
resultado final permaneceu Há uma característica do Ranking para que os especialistas (a lista com
24 horas na home do portal, que vale um comentário. Assim como o nome de todos está na página 20)
tendo sido uma das matérias na primeira fase é difícil que uma ca- caprichem em suas listas para que a
mais acessadas em todo o site na- chaça se classifique caso não peça vo- gente possa ter uma bela degustação
quele dia (17 de março). Obviamente, tos aos seus admiradores, na segunda às cegas. Eles nunca falham. Mas dessa
muita gente que ainda não foi con- sempre vai levar vantagem a cachaça vez capricharam ainda mais.
quistada pela cachaça travou ali con- que se apresenta para os especialistas.
tato com nosso destilado, por meio Os especialistas mandaram para
de um concurso chancelado por um Ninguém conhece todas as 250 a finalíssima, em Analândia, nos dias
dos mais importantes veículos de co- cachaças classificadas na primeira 11 e 12 de março, cachaças de 13 es-
municação do país. fase. A goiana Capueira, por exem- tados. Ao lado de rótulos que marcam
Com isso, o Ranking segue cum- plo, não tinha um ano de mercado presença desde a primeira edição –
prindo a missão a que ele se propôs ao longo dos dois meses em que como a Magnífica Reserva Soleira ou a
quando foi idealizado: dar visibilidade os especialistas fizeram suas avalia- Coqueiro Prata –, eles indicaram novi-
ao nosso destilado, romper precon- ções. Mas apresentou-se e conse- dades interessantes, como a alagoana
ceitos e revelar a excelência da nossa guiu uma vaga entre as 50 melhores Baobá e a paulista Alzira.
produção para públicos cada vez mais cachaças do ano.
amplos. Aumentar o público da Cacha- Surpreendentemente, a campeã
ça é uma missão que a Cúpula assumiu Portanto, o Ranking tende a pre- da categoria Armazanadas/ Envelhe-
e o Ranking é uma de nossas maiores miar quem se mobiliza para chegar à fi- cidas do IV Ranking, a Leblon Sig-
ferramentas para cumpri-la. nal. E isso explica algumas ausências de nature Merlet, ficou de fora da final,
rótulos de excelência que teriam tudo corroborando o ensinamento do
AS FASES para estar entre as 50 finalistas. É como mestre Neném Prancha.
Durante a votação popular, a gente no velho ensinamento futebolístico de
Neném Prancha: “Quem pede recebe; HORA DAS BRANCAS
assistiu, mais do que nunca, a um festi- quem desloca tem preferência”. Às 10h15 de 11 de março, sob as
val de postagens nas redes sociais, com
os produtores pedindo votos para os Mas, voltando à segunda fase. vistas do prefeito de Analândia (SP), o
seguidores de suas marcas. Uma cele- Nessa edição, a mobilização foi fan- professor Paulo Franceschini, a velha
bração bonita, que incentiva o engaja- tástica. Especialistas como Enaldo Lo- mesona da Cachaçaria Macaúva que
mento dos defensores das marcas. Ao pes, da Cachaçaria Trilha Real, de Belo testemunhou nossa primeira reunião,
final, 250 rótulos passaram de fase. Horizonte (MG), Deise Novakoski, do em janeiro de 2013, recebeu a primeira
Rio de Janeiro (RJ), e Altino Faria, da amostra das 50 cachaças finalistas do V
A segunda etapa – a Seleção dos Embaixada da Cachaça, de Fortaleza Ranking Cúpula da Cachaça.
Especialistas –, na qual 28 especia- (CE), hoje eleito cúpulo, chegaram
listas avaliaram as chamadas “250 a comandar degustações em suas Em volta da mesa, éramos dez cú-
Cachaças Mais Queridas do Brasil”, respectivas cidades com as cachaças pulos, com a estreia de Cauré Portugal
teve um brilho especial por conta do “candidatas”, movimentando os devo- e a ausência de Leandro Batista, que
tos do nosso destilado e incentivando estava de“licença médica”.
a troca de conhecimento cachaceiro.
Como em todas as edições do
Ranking, sem exceção, começamos a
12 CACHAÇA EM REVISTA
O destaque do ano foram as branquinhas. Pela primeira vez na história do Ranking, as cachaças
em inox receberam notas mais altas do que as da categoria Premium/ Extra Premium
degustação pelas cachaças brancas. quando publicado no Paladar Estadão uma cachaça repleta de história foi a
Mas, dessa vez, havia algo diferente. –, não chegamos a ficar surpresos. vencedora. A Havana/ Anísio Santia-
Tão logo terminada a primeira bateria go, de Salinas (MG), que, lá em 1943,
de cinco amostras, degustadas em O fato é que desde a Seleção dos estabeleceu um novo patamar para
silêncio, e anunciado o intervalo, o Especialistas, essa edição do Ranking já a qualidade do nosso destilado, foi a
comentário entre os cúpulos era a im- se anunciava favorável às branquinhas. melhor avaliada (84), praticamente em
pressionante qualidade das cachaças Se a categoria teve apenas oito rótulos um empate com a Cachaça Da Quinta.
que havíamos degustado. entre as finalistas de 2020, em 2022
esse número subiu para 13. E uma estreante foi a melhor na
Há entre os cúpulos, como em categoria Premium/ Extra Premium.
todo grupo que se reúne em torno do Por outro lado, fomos mais rigoro- A Pardin Porto, cachaça com tira-
nosso destilado, aqueles com tendên- sos em 2022. No IV Ranking, 20 cacha- gem limitadíssima, criação de um
cia a apreciar mais o frescor das cacha- ças obtiveram notas superiores a 80. alquimista cuja profissão é surpreen-
ças brancas, os fãs da variação infinita Dessa vez, apenas nove. E a explicação der, foi a melhor avaliada, com 80,6
de aromas e sabores das madeiras é simples: a qualidade das amostras pontos. A Pardin Porto é produzida
brasileiras e os admiradores empeder- das brancas estabeleceu um bench- em Natividade da Serra (SP) e enve-
nidos das delícias clássicas dos carva- mark alto logo de saída. Assim, entre lhecida em barris ex-Porto pelo mas-
lhos. Mas, na hora de avaliar, contam essas nove que se destacaram como ter blender Marcelo Pardin.
as virtudes e problemas que identifica- melhores entre as melhores, cinco
mos em cada amostra, independente eram cachaças armazenadas em inox: O próximo Ranking começa em
do tipo de cachaça em que a amostra Século XVIII, Bem Me Quer, Tiê, Pindo- setembro do ano que vem. Anun-
se enquadre. Em suma: brancas são rama e Cachaça da Quinta. ciam-se mudanças nas categorias.
avaliadas de acordo com o que uma Mas a mecânica campeã estabele-
cachaça branca deve apresentar e as- AS CAMPEÃS cida desde a primeira edição vai se
sim por diante. A Cachaça da Quinta Prata, glorio- manter: uma primeira fase com voto
popular, uma segunda com o filtro
As virtudes explícitas das brancas, sa branquinha produzida com requintes de especialistas de renome e a final
dessa vez, fizeram toda a diferença. E o de artesania em Carmo (RJ) e que nos com a degustação às cegas feita
V Ranking foi o primeiro em que essas representa até no Japão, graças à maior pelos cúpulos, que agora são 14. É
cachaças tiveram pontuação superior pontuação obtida no Ranking (84,4), re- como diz outra máxima futebolística,
à alcançada pelas cachaças premium. cebeu o título de Cachaça do Ano. que nem sempre está correta, mas
aqui se aplica à perfeição: “Em time
Quando os cúpulos soubemos o Na categoria Armazenadas/ En- que está ganhando não se mexe!”.
resultado – a maioria de nós, apenas velhecidas, a mais numerosa da etapa
final do Ranking – 26 concorrentes –,
CACHAÇA EM REVISTA 13
BRANCAS (INOX)
No ano em que as cachaças brancas foram as mais bem avaliadas do
Ranking, esses produtos que não passam por nenhuma madeira apresen-
taram uma ampla variedade de estilos E procedênciaS, revelando que
se pode imprimir muito da personalidade do produtor nas artes da fer-
mentação e alambicagem, ASSIM COMO NO POSICIONAMENTO DO PRODUTO.
02 04BEPQMRUAMTEARE
PINDORAMA Pitangui (MG)
Engenheiro Paulo de Frontin (RJ) 39%
40%
Estreante no Ranking, essa branquinha O Alambique Santíssima só
fluminense cheia de personalidade apresenta produtos de alta
reúne as melhores virtudes de uma qualidade. Suave, aveludada, fácil de
cachaça branca, unindo dulçor e frescor beber, a Bem Me Quer Prata é um
em doses precisas. É bebida expressiva, carinho para a alma do apreciador
feita para quem ama cachaça. de cachaça. Degustá-la é como
balançar lentamente na rede em
03PRATTIAÊ
uma fresca tarde mineira.
Aiuruoca (MG)
42% 05SXÉVCIIUILO
Uma das cachaças Cel. Xavier Chaves (MG)
mais queridas dos 47%
apreciadores de uma Cachaça produzida em
terras onde se alambica
branquinha, com desde os tempos coloniais,
gosto de fazenda a Século XVIII honra a sua
e de tradição, essa história. Uma cachaça forte
filha da Mantiqueira e cheia de aromas e sabores
novamente figura de cana fresca, produzida
entre as primeiras do com requintes de ourives.
Ranking, após o título
de campeã em 2020.
Merece sempre!
NOBRE CRISTAL Cruz do Espírito COLOMBINA CRISTAL Alvinópolis (MG) Pirassununga (SP)
Santo (PB) PAVÃO
43% 42%
06 42% 07
Mineira de Cachaça estreante
A Nobre, com Alvinópolis (MG), no Ranking, a
seu delicioso exemplarmente Pavão é uma
toque de dulçor aveludada, a Cristal branca ao estilo
e bom corpo, é é herdeira da longa clássico, com
cachaça que beira tradição de uma riqueza de aromas
à perfeição e marca que acaba e o gosto de
representa muito de completar cem cana-de-açúcar
bem no Ranking anos. que agrada aos fãs
a produção das bebidas que
paraibana, repleta 08 não passam por
de branquinhas de madeira.
excelência.
CAIALUA 6 ANNAS
TREAIPSI ENXUTÃRDEOMSA
TWREARDNIECICOKNAL
SANHAÇU ORIGEM
11 12 13
09 10
Chã Grande (PE)
Formosa (GO) Aracruz (ES) Silva Jardim (RJ) Rio das Flores (RJ)
47%
40% 40% 48% 42%
A pernambucana
A goiana é A marca capixaba A marca fluminense só Clássica cachaça vai estar sempre
representante da leveza estreia no Ranking tem apresentado ao produzida com nas listas de todas
entre as branquinhas do com uma cachaça mercado produtos de requintes de as premiações,
Ranking. Fácil de beber, que também tem alto nível. A Extrema artesania no Vale porque é produto
equilibrada entre o a marca da leveza é a versão mais forte do Paraíba, com de extraordinária
herbáceo e o adocicado, e um dulçor muito da casa. É cachaça muita untuosidade pureza, que
é daquelas que deixam característico e com aromas e sabores e um estilo fácil expressa
sempre a vontade de convidativo. caracteristicamente de beber em como poucos a
descer mais uma dose. intensos e complexos, sua suavidade personalidade da
com notas de caldo de acariciadora. cana-de-açúcar.
cana e capim limão.
ARMAZENADAS/ ENVELHECIDAS
Na categoria que reúne o maior quantitativo de cachaças na fase fi-
nal do Ranking, a variedade, como sempre, é grande. Os blends cada vez
ocupam mais espaço no cenário, criando novos e, por vezes, inusitados
aromas e sabores. Cachaças clássicas e estreantes tÊm seu lugar nes-
sa linda e democrática seleção de pérolas da produção brasileira.
02 04
EMSOTÂRENTCTIAI TJeiqêuitibá
Jandaia do Sul (PR) Aiuruoca (MG)
40% 42%
Um blend de sabor original,
equilibrado com perfeição, garantiu Um dulçor cálido e a picância na conta certa
a essa cachaça paranaense a deixam essa cachaça que traz a marca das
segunda melhor pontuação da melhores artes da alambicagem próxima da
categoria mais disputada do perfeição. A branca campeã do Ranking 2020
Ranking. Castanheira, carvalhos foi posta a descansar 18 meses no jequitibá. E
americano e francês e amburana nasceu mais um produto da marca de Aiuruoca
entram na composição. (MG) a figurar nas melhores posições do
Ranking.
03 05
Baobá IPJasraqibuneecliersaa
Ouro
Linhares (ES)
São Sebastião (AL)
40% 40%
A alagoana que acaba Com uma linha de
de chegar ao mercado cachaças campeã,
e é produzida no a marca capixaba
Alambique Gogó emplacou dois rótulos
da Ema exalta a entre os melhores do
herança africana Brasil. A Jaqueira é uma
na cultura brasileira cachaça que atinge um
e é composta por ponto de suavidade
partes de cachaças delicioso sem abrir mão
em jequitibá-rosa, da complexidade que a
umburana e bálsamo torna única.
em um blend que
pegou na veia.
Sales Oliveira (SP) Regui Brasil Ouro Braço do Trombudo Ivoti (RS)
40% (SC)
MARGÔ OURO 7WeMbaedreiHraauss 38%
Cachaça impecável, 42%
é um blend O blend inovador
de cachaças De sabor intenso e que continua a fazer
armazenada em textura aveludada, a sucesso é composto
carvalho e prata Regui Brasil, produzida por partes de
e apresenta os em Santa Catarina cachaça em carvalho
aromas abaunilhados sob responsabilidade americano, carvalho
típicos do carvalho, de um paranaense francês, bálsamo,
porém conservando amante da cachaça, canela sassafrás,
o frescor típico descansa por 36 amburana, grápia e
das brancas, se meses em carvalho cabriúva. A mescla em
configurando em americano de porções exatas resulta
06 bebida muito 07 primeiro uso e é uma 08 em uma cachaça com
peculiar. das cachaças mais dulçor agradabilíssimo
fáceis de se beber do e notas de especiarias.
mercado.
UDambQuurinatnaa Mineiriana Carvalho PArmibnucresaanIasabel
Barra Grande Retrô
09 10 11 12
Carmo (RJ) Itabira (MG) Linhares (ES) Itirapuã (SP)
40% 40% 45% 43%
Uma das joias da Blend de cachaças em Perfumada, contida no Um blend que acertou na
produção brasileira, carvalho americano dulçor e encorpada, a mosca, a Barra Grande
a Umburana do e francês, essa Princesa Isabel é um dos tem predominância
alambique de Carmo mineirinha bordada melhores exemplares do de jequitibá, com um
(RJ) é bebida apreciada à mão está pela seu gênero. É finalizada toque de carvalho
no Brasil e no exterior segunda vez no top 10 em barris de carvalho francês e doses quaase
por seu equilíbrio do Ranking graças à americano, o que lhe homeopáticas de
perfeito que contempla sua riqueza sensorial, confere um lindo toque a umburana. O resultado é
o dulçor típico dessa onde toques frutados, mais de elegância. uma cachaça com jeito de
madeira brasileira picância e abaunilhados branquinha que agrega
e o frescor de uma convivem em poética um dulçor confortável e
cachaça branca. harmonia. alguma picância.
ARMAZENADAS/ ENVELHECIDAS
Pinga Ni Mim
Reserva do Serjão
Indiazinha
Carvalho
Bem Me Quer
Ouro
Coqueiro
Prata
13 14 15 16
Salinas (MG) Abaetetuba (PA) Pitangui (MG) Paraty (RJ)
42% 40% 39% 44%
Carvalho americano, Carvalho Paraense elegante, essa Um blend muito especial, Cachaça produzida por uma família
Francês, Amburana, Bálsamo, cachaça é armazenada preciso e elegante, com com dois séculos de história
Eucalipto, Castanheira e Canela por 12 meses em barris cachaças em carvalho e ligada à cachaça, representando
Sassafrás unem forças nessa de carvalho europeu bálsamo, produz uma bebida a tradição cachaceira de Paraty, a
cachaça produzida em um antes utilizados na com riquíssima paleta de Coqueiro, armazenada por seis
território sagrado para o nosso indústria de whisky. aromas e sabores e com a meses em amendoim, é untuosa
destilado. suavidade característica dos e expressiva, com acidez e doçura
produtos da premiada marca em perfeita escala.
Bem Me Quer.
Santa Terezinha
Sassafrás
Série Gourmet
Matriarca
Jaqueira
Sebastiana
Castanheira
Alzira
17 18 19 20
Marechal Floriano (ES) Medeiros Neto (BA) Américo Brasiliense (SP) Torrinha (SP)
38% 42% 39% 41%
Com sua cor rubra e seus Os baianos foram pioneiros O sabor abaunilhado e O blend de jequitibá e
sabores de especiarias, a no uso da jaqueira. É cachaça o dulçor característico umburana ainda estagia no
Sassafrás é uma cachaça agreste, combinando um dulçor da castanheira, uma jequitibá-rosa antes de ir
“fora da caixinha”, fruto da de caramelo com alguma das melhores madeiras para a garrafa, o que resulta
criatividade de um produtor picância e o adstringente para armazenamento em uma cachaça com muito
que se esmera na busca característico da madeira, em da cachaça, conferem a equilíbrio e suavidade,
de sabores diferenciados e uma combinação das mais essa bebida elegância e com acentos frutados e
coleciona bons resultados. interessantes e originais. equilíbrio ímpares. adocicados.
Matriarca 4 Madeiras
Brasileiras
Engenho São Luiz
Amendoim
Gogó da Ema
Reserva
21 22 23
Medeiros Neto (BA) Lençóis Paulistas (SP) São Sebastião (AL)
42% 42% 42%
O blend heterodoxo une amburana, Porta-voz da linda herança do Armazenada por seis anos em
jaqueira, bálsamo e louro canela – um amendoim no armazenamento da jequitibá-rosa e bálsamo, essa
produto originalíssimo e genuinamente cachaça, a São Luiz é macia, untuosa bela cachaça alagoana coleciona
brasileiro. É cachaça potente, com e muito fácil de beber, com sua doçura prêmios por seu equilíbrio entre
sabores de especiarias e baunilha e característica e ausência de acidez. a expressividade do bálsamo e a
picância acentuada. Some muito rápido da estante. maciez conferida pelo jequitibá.
Mato Dentro
Prata
Gogó da Ema
Alquimia
Capueira Blend
3 Madeiras
25 26
24
São Sebastião (AL) Paraúna (GO)
São Luiz do Paraitinga (SP)
40% 38%
42%
Essa cachaça com atraente cor Noviça no mercado, a Capueira
Uma das mais tradicionais e dourada passa cinco anos em surpreendeu ao chegar entre as
gostosas cachaças do mercado, jequitibá-rosa, outros cinco em finalistas. O toque do pau-brasil no
a Mato Dentro conquista com bálsamo e, finalmente, dois em blend com o freijó e o carvalho fazem
seu paladar adocicado e aromas carvalho francês. O resultado é uma a diferença na cor – um tom algo
florais extremamente agradáveis. cachaça com um sabor docemente alaranjado – e no sabor, que tem um
Os 12 meses de descanso temperado. tom seco e alguma picância.
no amendoim conferem
untuosidade.
PREMIUM/EXTRA PREMIUM
Na categoria das cachaças top de linha, as mudanças foram poucas
em relação ao IV Ranking. Mesmo porque, aqui falamos de cachaças
de longo período de maturação. Blends interessantes e cachaças com
envelhecimento em mais de uma madeira marcam presença nessa prate-
leira onde o carvalho reina absoluto, do Rio Grande do Sul a Alagoas.
03
ProRpersieerMtviáadrddioaosss
Dracena (SP)
39%
Mais uma bela
colocação para
essa marca paulista
que, dessa vez, traz
um blend muito
original: cachaças
envelhecidas por seis
anos em barris de
carvalho americano,
bálsamo, eucalipto,
sassafrás, jaqueira e
amburana, além de
um toque de acácia.
02 04
Vecchio Albano RMeasteorvDaednotro
Extra Premium Fundador
Torrinha (SP) São Luiz do Paraitinga (SP)
40%
Envelhecida três anos em carvalho, é cachaça com sabor 40%
clássico, recendendo a baunilha e com textura aveludada.
A Reserva homenageia o fundador da
tradicional Mato Dentro, Dr. Rômulo,
em um blend de madeiras brasileiras:
amburana, bálsamo, castanheira
e amendoim. Cachaça suave,
equilibrada e muito saborosa.
Dom Bré Weber Haus
Extra Extra Premium
6 Anos
Premium
06
05
Ivoti (RS)
Guarani (MG)
38%
40%
Essa cachaça de sabores
Representante de uma destilaria mentolados, que passa cinco
com padrão de qualidade anos em carvalho francês e
mais um em bálsamo, revela
exemplar, a Extra Premium está em seu equilíbrio a qualidade
no top ten desde 2020. A Extra da produção da casa Weber, é
presença constante e merecida
Premium é cachaça clássica, entre as melhores do país.
cristal sem jaça. E sua elegância
acolhedora a faz companhia
perfeita para uma noite de inverno.
Engenho Magnífica Companheira
São Luiz Reserva Extra
Extra Soleira
Premium Premium
08
07 09
Vassouras (RJ)
Lençóis Paulistas (SP) Jandaia do Sul (PR)
43%
42% 40%
Uma das cachaças com
Calorosa e de estilo maior presença no Ranking, A campeã do Ranking 2020
clássico, essa cachaça novamente se posicionou entre
passa três anos em barris onde aparece desde a
de carvalho, resultando primeira edição, a Reserva as melhores do ano. Cachaça
em bebida expressiva, Soleira é única em seu sabor untuosa, com envelhecimento de
com sabores de mel e oito anos em barril, ela agrada em
castanhas, com um final frutado elegantíssimo,
picante muito agradável. coloração profunda e um cheio aos fãs do carvalho.
frescor surpreendente.
Sebastiana Guaraciaba
Duas Premium
Barricas 11
10 Guaraciaba (MG)
Américo Brasiliense (SP) 42%
40% A Guaraciaba se destaca
por ser uma cachaça que
As duas barricas do nome tem as virtudes dos três
dessa cachaça se referem anos em carvalho – com
ao carvalho e à castanheira. forte recendência de mel
A cachaça passa dois anos e avelãs –, mas manter
em cada uma para chegar um estilo mais afiado. É
ao brilhante e elegantíssimo encorpada e potente, na
melhor tradição mineira.
resultado final.
RANKING 2022
André Ricardo alex mesquita aline bortoletto Altino Farias Ana Laura Armando Del Arthur Paron
Alcarde Guimarães Bianco Cintra
Bartender Pesquisadora e Embaixada
Pesquisador CEO da InovBev da Cachaça Criadora do Master blender Master Distiller
da Esalq (Fortaleza-CE) app Cachaciê
bruno videira carlos lima Cecilia helena cesar adames claudia fernandes Deise Novakoski denise marcolino
Movimento Diretor-executivo Especialista em Professor e Confraria Bartender e Jornalista e
Viva Cachaça do Ibrac embalagens especialista Copo Furado sommelière especialista
e criadora em destilados em cachaça
de conteúdo
OS ESPECIALISTAS
A segunda fase do Ranking Cúpula da Cachaça contou com o apoio de
um grupo espetacular de especialistas no destilado nacional brasileiro.
São grandes parceiros da Cúpula na tarefa de valorizar a cachaça e
profissionalizar cada vez mais o setor. Dois deles, inclusive, se tornaram
cúpulos após a participação no concurso. Veja quem são.
Enaldo Lopes felipe jannuzzi Gilberto Freyre Neto Illan Oliveira Isadora Bello jairo martins Leszec Wedzicha
Fornari
Cachaçaria Criador do Secretário de Diretor da Escritor e Especialista em
Trilha Real (MG) ‘Mapa da Cachaça’ Cultura de PE Distribuidora Sommelière especialista destilados de cana
em cachaça
Solution
Luís Cláudio Luisa Saliba Marcel Rates Laércio Zulu Osvaldo Bernadino Rosane Ferreira zeca meirelles
Fernandes Junior
Chef e sócia da Diretor da loja Bartender Presidente da ProDrinks Escola
Especialista Rota do Acarajé ‘Eu Amo Cachaça’ Distribuidora Confraria Copo de Coquetelaria
em bebidas Savana
Furados (RJ)
22 CACHAÇA EM REVISTA
SAFRA 2022
A Cachaçaria Macaúva, mais uma vez, recebeu
os cúpulos para a degustação às cegas, fase
final do Ranking. O prefeito de Analândia, Paulo
Franceschini (de camisa clara, na foto acima)
esteve presente na abertura do encontro, com
parte de sua equipe.
24 CACHAÇA EM REVISTA
TERRITÓRIOS DA CACHAÇA
Depois de período de pouca visibilidade,
marcas produzidas nos engenhos do
Ceará querem mostrar sua qualidade.
Berço da produção no estado, Viçosa
vai em busca de reconhecimento da IG,
conta o cúpulo Nelson Duarte
D epois de muitos anos CEARENSERENASCIMENTO
no ostracismo, ressurge
com força a cachaça de
alambique no Ceará. Das
lendárias cachaças Alencarina e
Canaã, de Mombaça, sertão cen-
tral do estado, pouco restou além ção de cachaças de alta qualidade ao duzidas em alambique que desde
das lembranças, alguns poucos to- turismo rural, no caminho de belas meados do século XIX destila em
néis de madeira e instalações hoje praias do litoral cearense. pequenos engenhos: Viçosa do Ce-
destinadas a outras ocupações, A cachaça Reserva do Sertão ará, berço do ilustre jurista Clóvis
dentre elas a apicultura. promete chegar ao mercado no se- Beviláqua e que reivindica também
O município de Acarape também gundo semestre, com forte apelo de o posto de berço da cachaça cea-
já foi um grande produtor de cachaça valorização regional, de sabores, sa- rense. Não se tem notícias de que
em alambiques, porém, com o passar beres e cultura nativa do Ceará. o nobre causídico apreciava uma
dos anos, perdeu força. Mas, hoje, tem Além de Acarape e Pindoreta- boa branquinha, mas o ambiente
como representante de sua tradição ma, ressurge com força um polo da cidade convida à degustação de
uma cachaça intensa e de personali- produtor de boas cachaças pro- uma cachaça bem destilada.
dade marcante.
A cachaça Taberna do Poço traz
consigo todo o regionalismo que
marcou as boas épocas das cachaças
do Ceará, depois ofuscadas pela pro-
dução industrial que por pouco não
sufocou os pequenos engenhos.
Produzida num pequeno enge-
nho à beira de uma rodovia vicinal, a
Taberna do Poço é cuidadosamente
elaborada pelo Sr. Chagas, que acom-
panha cada passo da produção e aos
poucos vem conquistando o coração
e o paladar dos cearenses.
Também na região de Pindoreta-
ma, tradicional produtora de rapa-
dura, está em desenvolvimento um
projeto audacioso de aliar a produ-
26 CACHAÇA EM REVISTA
Em Viçosa, Além das paisagens pitorescas, a dos no London Spirits Competition,
produtores se uniram cidade abriga engenhos que busca- renomado concurso internacional
ram junto ao Sebrae local consulto- que conferiu medalha de ouro para a
Conhecida como Suíça Brasilei- ria para a legalização e registro de Cachaça Aviador Prata e medalha de
ra, Viçosa do Ceará é uma pequena seus produtos junto ao Mapa (Mi- prata para a saborosíssima Cachaça
cidade encravada na Serra do Ibia- nistério da Agricultura, Pecuária e Aviador Ipê Premium, além de uma
paba, região montanhosa e, por in- Abastecimento). medalha de ouro no Concurso de Vi-
crível que possa parecer, fria para os nhos e Destilados do Brasil, em 2021.
padrões nordestinos. O movimento cresceu e, recente-
mente, foi criada a Associação Ami- Mas não é preciso pesquisar
Para quem gosta de aliar uma gos Produtores de Cachaça Superior demais para perceber a importân-
degustação de excelentes cachaças do Ceará – APCVIC, que reúne cinco cia histórica de Viçosa do Ceará no
ao turismo, essa simpática cidade é produtores da região. panorama da cachaça. Segundo
o lugar certo. o Anuário do Mapa, divulgado em
Segundo Caio Carvalho, produ- meados de 2021, o município cea-
tor da Cachaça Aviador e presidente rense tem dez produtores de aguar-
da associação, a história da sua ca- dentes registrados, fora os que es-
chaça é comum à maioria das mar- tão em processo de regularização.
cas da região. Todas eram vendidas Assim, é reconhecido como o mu-
nos próprios engenhos, ou nos nicípio que tem mais produtores de
empórios locais, sem preocupação aguardente registrados.
com a identidade e o fortalecimen-
to das marcas. Apesar de números ainda alar-
mantes de produção informal, cada
O engenho da família de Caio pro- vez mais a procura pela legalização
duz cachaça há três gerações, mas só vem marcando a atuação desses pe-
em 2020 buscou a regularização junto quenos engenhos.
ao Mapa. Depois disso, a Cachaça Avia-
dor teve dois de seus rótulos premia- Além da Cachaça Aviador, ou-
tros produtores enxergaram que o
Produzida no sítio associativismo é a saída para o for-
Vambira, a cachaça talecimento da cachaça na região.
Mapirunga traz Buscamos contato com outros dois
consigo a tradição produtores da região que tiveram
de um nome familiar suas cachaças votadas entre as 250
aliada a modernas mais Queridas do Brasil no V Ranking
técnicas de manejo da Cúpula da Cachaça.
ambiental. O cuidado
com a preservação do Na página do Facebook da Ca-
meio ambiente é tal que chaça Nogueira a gente encontra
ocupa espaço nobre no uma descrição que define, exata-
site da marca. mente, o que é o engenho.
“Um lugarzinho lá no pé da
serra, lá no Vale do Lambedouro...”
onde a simpatia dos descendentes
do fundador do engenho esconde
segredos centenários da produção
cuidadosa, fermentação lenta que
CACHAÇA EM REVISTA 27
TERRITÓRIOS DA CACHAÇA
acontecer em junho com a apoio
da Prefeitura Municipal de Viçosa
do Ceará e do Sebrae.
guarda os mistérios e características Ao lado, Cachaça Aviador, de Viçosa, Em busca da IG
da cultura da região. com sua bela embalagem. Acima, O patrimônio cultural e imaterial
a Taberna do Poço, de Acarape:
O Engenho Nogueira é aberto ganhando espaço em casa que representa a cultura da cachaça
à visitação e, com agendamento em Viçosa do Ceará é uma joia rara,
prévio, é possível almoçar, harmo- pa espaço nobre no site da marca. que precisa ser lapidada com cuida-
nizando as delícias da roça e as Os tonéis de ipê onde as cachaças do para que não se perca nenhum
cachaças da casa. Recomendo a detalhe dessa riqueza.
cachaça armazenada nos tonéis de maturam, aguardando o momento
pau d’arco. Vale a pena! certo de ir para a garrafa, guardam O principal objetivo dos produ-
os segredos dos melhores spirits. tores agora é o reconhecimento da
Seguindo adiante nossa trajetó- Saborosa e de forte personalidade, Identificação Geográfica (IG) para a
ria etílica, vamos a mais um enge- a Mapirunga é cachaça que agrada cachaça de Viçosa do Ceará. É um
nho que tem uma linda história para aos mais exigentes degustadores. processo rigoroso, no qual se faz
contar e, igualmente, recebe com necessário comprovar a ligação
maestria seus visitantes. Aproveitamos uma rápida parada histórica da região com a cachaça e
para conhecer a Cachaça Malandri- o reconhecimento de característi-
Produzida no sítio Vambira, a nha, um antigo engenho de rapa- cas regionais específicas de produ-
cachaça Mapirunga traz consigo a dura que em 1992 passou a produzir ção. A certificação como IG é con-
tradição de um nome familiar aliada também cachaça. cedida pelo INPI (Instituto Nacional
a modernas técnicas de manejo am- de Propriedade Industrial) ao final
biental. O cuidado com a preserva- Guardada por mais de ano em desse processo.
ção do meio ambiente é tal que ocu- tonéis de umburana, pau d’arco e
aroeira, a cachaça adquire coloração, Atualmente, apenas três regiões
aroma e sabores característicos des- alcançaram a certificação de Identi-
sas madeiras. ficação Geográfica no segmento da
cachaça: Paraty (RJ), Salinas (MG) e
Seu produtor é um dos grandes Abaíra (BA).
ativistas pela evolução da cachaça
em Viçosa do Ceará. Na Paraíba, Areia está com o pro-
cesso de reconhecimento de sua IG
Mais duas marcas de cachaça bem avançado, muito graças à atua-
estão também engajadas na cons- ção conjunta dos produtores unidos
trução e fortalecimento da asso- na associação local, a APCA/PB (Asso-
ciação. As cachaças Vale do Lam- ciação dos Produtores de Cachaça de
bedouro e Sambaitiba integram Areia – Paraíba), presidida pelo produ-
o movimento e estarão presentes tor Thiago Baracho, da cachaça Triunfo.
no ressurgimento do Festival Mel,
Chorinho e Cachaça, que volta a Nos mesmos moldes de Areia, de-
clarada por decreto estadual “Capital
Paraibana da Cachaça”, também cami-
nha Viçosa do Ceará em busca de sua
IG e do seu reconhecimento como a
Capital Cearense da Cachaça.
Fica a dica para nossos nobres
deputados cearenses.
28 CACHAÇA EM REVISTA
GENTE
O cúpulo Sidnei Maschio, colecionador de cachaças
com acervo de 2 MIL rótulos conta a história de
dois companheiros de ‘ofício’ para revelar o que
Ninguém sabe exatamente move essa paixão pela garimpagem de relíquias
quando é que o homem
começou a colecionar coi-gHiastórrriaanafa
sas, mas ainda bem que dada cuidadosamente em preciosas viva na sociedade. E a sua contribui-
prateleiras. ção nessa seara é invejável: o Pedro é
dono de uma coleção que, quando
Pro Pedro de Alcântara, empresá- este texto estava sendo escrito, tinha
rio do setor de ferrovias e metrôs, o
isso aconteceu há muito tempo, por- colecionador é, no sentido mais am- 3.100 peças, entre garrafas, minia-
que foi desse jeito, juntando, resga- plo do entendimento, quase como turas e embalagens de outros for-
tando e estudando os mais variados um poeta ou um cronista, um con- matos. Como ele não para de correr
tipos de objetos guardados das mais tador da história que repassa a me- atrás de velhas novidades, hoje com
diferentes formas que a gente ficou mória de uma determinada cultura, certeza já tem mais.
sabendo de pedaços importantes da não só pra que ela seja preservada O primeiro ato desta arrebatadora
história da humanidade. mas também pra que ela continue paixão aconteceu em 1998, quando
Ao longo dos anos, as coleções,
além de merecerem a atenção de his-
toriadores e especialistas de pratica-
mente todas as áreas do conhecimen-
to, passaram também a fazer parte do
dia a dia de gente de todos os andares
do edifício social. Caixas de fósforos,
moedas, selos, relógios, obras de arte,
carros antigos ou de luxo, quase tudo é
colecionável. Colecionar ajuda a contar
a história. Mas é também um exercício
de paixão, e o coração do ser humano é
muito fértil neste terreiro.
Pois então: se o caso é de história
e paixão, poucos objetos juntam tão
bem estas duas coisas como uma
garrafa de cachaça. E não é de hoje
nem de anteontem que o brasileiro
coleciona a legítima aguardente bra-
sileira, servida, cantada e bebida em
versos e copos, mas também guar-
30 CACHAÇA EM REVISTA
o Pedro saiu da sua casa em Jundiaí, casa, o coração do colecionador laria, em Vitória de Santo Antão (PE), e
a 60 quilômetros da capital paulista, bate mais forte pelo seu acervo de um exemplar da Aguardente Jacaré,
pra participar de um encontro de garrafas de Havana e Anísio Santia- fabricada em Salvador (BA), a partir da
motociclistas em Tiradentes (MG). Foi go, que é o maior do Brasil. São 259 década de 1940, com o rótulo pintado
lá que, pela primeira vez, seus olhos peças da marca que se tornou um diretamente na garrafa.
se encantaram por garrafa antiga, ícone da cachaça brasileira, o que
e daí pra frente ele não parou mais. faz dele um dos maiores conhece- Pro Pedro, saber quanto vale uma
“Colecionar é uma forma de mostrar dores dessas raridades. Tanto que, cachaça rara é uma questão não tão
e eternizar o seu mundo, as passa- depois desses anos todos correndo simples assim, mas existem hoje mui-
gens e objetos que contam a sua his- atrás, pesquisando e estudando a to mitos . “Preço é uma coisa; valor é
tória. E colecionar cachaças, pra mim, Havana, o Pedro conta que hoje ele outra. Pra ser valorizada, primeiro a
é uma coisa assim telúrica, que tem a precisa só de um minuto pra identi- cachaça precisa ser carregada de his-
ver com a nossa ligação com a terra, ficar uma falsificação – o que não é tória, de fatos significativos em torno
com a nossa cultura e com a histó- raro de acontecer. da sua marca, e depois ela tem de ser
ria do Brasil, que teve justamente o rara, com poucos exemplares disponí-
açúcar e a nossa aguardente de cana Outra garrafa mitológica que ele tem veis, o que a faz ser disputada”, afirma.
como os seus primeiros produtos in- bem guardada é a raríssima Cachaça “Mas isso tudo tem um limite, e mes-
dustriais”, diz. Pelé, objeto de desejo de dez entre dez mo uma raridade como a Pelé, por
colecionadores. O caso já é bem conhe- exemplo, não pode custar R$ 15 ou R$
Entre as grandes preciosidades cido e começou quando o maior joga- 16 mil, como se diz por aí. A minha eu
guardadas nas prateleiras que se dor da história, ainda menino, com 18 paguei bem menos”, completa o cole-
espalham por vários cômodos da anos de idade, ganhou a Copa do Mun- cionador.
do de 1958. Um empresário de Piracica-
Edilson Diniz percebeu que as garrafas ba (SP) viu na imagem do garoto ótima Em cada garrafa,
“contam histórias”. Seu acervo está na oportunidade de negócio e lançou, com uma história
Adega do Tercino, em Areia (PB) a concordância do pai de Pelé, seu Don-
dinho, uma marca de cachaça com o Colecionar garrafas e boas his-
nome e a figura do futuro rei do futebol. tórias também é o que alimenta a
paixão do engenheiro agrônomo
O que se conta é que outro craque, o aposentado Edilson Diniz, que não
Zito, companheiro de Pelé nos Santos e por coincidência mora em Areia (PB),
na Seleção, teria chamado a sua atenção um dos eldorados da cachaça. Como
pro fato de que, sendo jovem e atleta, muitos outros colecionadores, ele co-
não ficaria bem pra sua imagem ligar meçou assim meio sem querer, quan-
seu nome a uma cachaça. Pelé então te- do ganhou, num encontro com os
ria se arrependido e mandado recolher, antigos companheiros da Universida-
pra destruir, toda a produção, que no en- de Federal da Paraíba, uma cachaça
tanto já estava sendo distribuída no co- vinda de Junqueiro (AL).
mércio. Segundo o Pedro, “reza a lenda
que teriam sobrado só 20 peças. Mas é “Gostei muito do presente, mas
lenda, porque além da minha eu conhe- não me passou pela cabeça a ideia de
ço e sei onde estão outras 23 garrafas”. começar uma coleção”, conta ele. “Foi
só algum tempo depois, durante uma
Outro dos destaques da coleção é visita a um engenho de Triunfo (PE),
uma Parati Suquinho produzida no Rio que eu vi que aquelas garrafas conta-
de Janeiro em 1936. A galeria tem ain- vam uma história, que aquilo era bo-
da duas Pitu também de 1936, com os nito e tinha importância, e a partir daí
rótulos do primeiro endereço da desti- não parei mais”.
CACHAÇA EM REVISTA 31
Pedro de
Alcântara,
com a esposa
Katy: o maior
colecionador
de Havana do
mundo
GENTE
“Preço é uma coisa; valor é outra. Pra ser Diferentemente do vinho, as
valorizada, primeiro a cachaça precisa ser garrafas de cachaça devem ficar
carregada de história” - Pedro de Alcântara em pé, especialmente no caso das
que são fechadas com tampinhas
No começo, a intenção do Edil- concorrido, sendo ponto obrigatório de metal, que não devem ficar em
son era só de deixar o seu o seu ar- pro povo da cidade e principalmente contato com a bebida. Embora não
mário de bebidas mais interessante pra quem vem de fora. seja um padrão para todos os cole-
pra receber os amigos, mas, confor- cionadores, Edilson protege as em-
me a quantidade de peças foi cres- O acervo do Edilson é formado balagens em sacos plásticos. E, no
cendo, o plano mudou radicalmente por mais de 1.800 rótulos, entre mi- que ele diz ser a pior parte da arte
e ele abriu a Adega do Tercino – o niaturas, latas e garrafas dos mais va- de colecionar, uma vez por ano ele
nome é uma homenagem ao seu riados formatos e tamanhos. Rigoro- limpa todas as peças com um pano
pai. O estabelecimento, como diz so e detalhista, ele cataloga todas as seco, pra tirar a poeira. (Haja tem-
o Edilson, funciona na sua própria peças por cidade, produtor, volume, po, cuidado e paciência!)
casa, exclusivamente às sextas-feiras madeira e graduação, tendo hoje na
e aos sábados, pra receber amigos coleção cachaças de vinte estados Tempo e paciência também
e turistas interessados em conhe- e 285 municípios. Um cuidado im- fazem parte da receita pra conti-
cer a coleção, apreciar boa música portante é em relação ao ambiente nuar ampliando a coleção, e nessa
e degustar cachaças de qualidade, onde as garrafas ficam guardadas, empreitada a “garimpagem” é fun-
harmonizadas com petiscos os mais que deve ser livre de umidade e sem damental. Além do empenho, o
especiais. Pois hoje o lugar é muito incidência direta de sol, para preser- sucesso depende da sorte: “Uma ca-
var, principalmente, os rótulos. chaça colecionável precisa ter histó-
ria. A nossa região aqui de Areia, por
exemplo, chegou a ter mais de cem
engenhos produtores de cachaça e
rapadura, e correr o chão do sertão
procurando essas garrafas é insti-
gante e prazeroso. E encontrar uma
dessas raridades é um momento de
plena realização, a perfeita expressão
da felicidade”, enfatiza.
“Ser colecionador não é apenas
juntar garrafas, é conhecer a nossa
geografia, a história e as histórias nes-
te nosso imenso Brasil, é fazer amiza-
des e ser feliz”, celebra ele.
32 CACHAÇA EM REVISTA
CACHAÇA EM REVISTA 33
EDUCAÇÃO
Como anda a
DA CACHAÇA
Nunca é tarde para aprender algo novo e nunca
é demais aprender. Se tem alguma coisa que muita coisa mudou. Qualquer pessoa com um pouco de
engrandece, que enriquece, que ilumina é o co- conhecimento se acha apta a transferir a outros o que
nhecimento! E ele vem da base, da escola, da sabe (ou acha que sabe). Há que se ter cuidado.
Em tempos cibernéticos, de redes sociais e pílulas de
universidade, dos cursos de extensão, da especialização. conhecimento que cabem numa tela de celular, busca-se
Em tempos de pandemia, os cursos presenciais mi- o aprendizado instantâneo, raso, por vezes desprovido
graram para o formato virtual. Foi um aprendizado co- de fundamento, mas que pode se tornar poderoso se
letivo, tanto para o professor como para os alunos, mas proferido pelos influencers. E é aí que mora o perigo.
teve ganho sim! Da telinha Quanto mais seguido-
do computador de cada A cúpula Andréia Gerk, res você tem, ou quanto
um de nós um mundo de auditora fiscal federal maior o alcance das suas
conhecimento aflorou. Mas publicações, sejam posta-
é preciso ter cuidado na agropecuária do Mapa, faz gens, artigos, livros, aulas,
escolha dos professores ou, palestras, tanto maior a sua
no palavreado atual, dos co- um alerta sobre como os responsabilidade. Há que
aches que vão te guiar por se ter um conhecimento
conteúdos sobre cachaça
caminhos não trilhados. vêm sendo disseminados sólido para poder discernir
Não faz muito tempo, o certo do errado, a verda-
de da falácia, o conforme,
quando queríamos recorrer
a cursos, nos prendíamos a e a responsabilidade do não conforme (quando
instituições de ensino for- se trata de legislação), para
mais, aos bancos de sala de na distribuição de não cair no engodo.
aula, às bibliotecas, à lite- informações
ratura especializada. Hoje, E onde se aprende sobre
Cachaça?
34 CACHAÇA EM REVISTA
‘É importante se informar sobre a instituição ou o
profissional que vai ministrar o curso’, lembra Andréia
Em alguns cursos, como Engenharia Agronômica, Engenharia de
Alimentos e Química, entre outros, aborda-se, em algumas discipli-
nas, a produção de cachaça. No entanto, há cursos de tecnólogo em
produção de cachaça, cursos de especialização, mestrado, doutorado
e pós-doutorado. Mas, também há cursos práticos, de curta duração,
presenciais, virtuais ou híbridos onde se aprende sobre a nossa bebi-
da nacional.
Aliás, cabe mencionar que, em 2022, a Classificação Brasileira de
Ocupações (CBO), que retrata as profissões do mercado de trabalho
brasileiro, passou a considerar o sommelier de cachaça (no femini-
no sommelière) como uma profissão, abrindo mais este espaço para
aqueles que trabalham no setor de serviços e que querem se espe-
cializar no destilado nacional.
É importante se informar sobre a instituição ou o profissional que
vai ministrar o curso, porque isto vai influenciar fortemente na soli-
dez da sua formação. Infelizmente, há muitas pessoas despreparadas
oferecendo cursos e formando profissionais com distorções graves,
conceitos errôneos, por vezes contrários à legislação vigente. E esses
profissionais saem por aí disseminando informações imprecisas e in-
corretas a outras tantas pessoas.
Possuímos uma literatura ainda tímida sobre cachaça, uma pro-
dução científica que fica restrita aos meios acadêmicos, com mono-
grafias, teses de mestrado e doutorado que pouco circulam. Seria
importante construirmos um content hub para a cachaça, para esta-
belecer conexões, gerar negócios, disseminar conhecimento. Imagi-
no uma plataforma onde pudéssemos ter livrarias virtuais, bibliotecas,
legislação, instituições de ensino, produtores, consultores, sommeliè-
res, associações, confrarias, fornecedores de insumos, toda a cadeia
conectada, com trocas instantâneas, ligando todo o país e com
CACHAÇA EM REVISTA 35
EDUCAÇÃO
Universidade
Federal de Lavras
(ao lado), referência
em cachaça. Turma
de estudantes em
visita técnica a
um alambique em
Campos, Estado do
Rio (abaixo)
materiais até mesmo em outras línguas para expandir as ONDE PROCURAR
fronteiras. Em tempos de inovação e criatividade, tudo é
possível e factível. Algumas instituições que oferecem
cursos voltados para a formação
A nossa Cachaça em Revista chega à sua décima profissional em Cachaça:
edição! Única revista voltada exclusivamente para a ca-
chaça, traz artigos escritos pelos cúpulos, cada qual ex- Esalq/USP
plorando temas relacionados ao seu cotidiano, seja le- Universidade Federal de Lavras (UFLA)
gislação, literatura, história, mixologia, temas científicos, Instituto Federal do Norte de Minas Gerais (IFNM)
jornalísticos, serviços, sommelieria, tecnologia... Procura- Inovbev
mos, a cada edição, trazer conhecimento ao nosso leitor, Cana Brasil
pois há que se ter responsabilidade ao ensinar, pois com Cachaçarias Nobres
conhecimento não se brinca.
Cachaça não é só uma bebida, é cultura, é história, é
Não posso deixar de falar de legislação, pois, profissão, é ganha-pão, é o homem no campo, é agricul-
enquanto escreve este texto, o decreto que dispõe tura, é turismo, é literatura, é música, é arte, é amizade,
sobre a padronização, a classificação, o registro, a é vida. Beba cachaça de qualidade, beba menos, beba
inspeção, a produção e a fiscalização de bebidas, De- com responsabilidade e beba cachaça com registro no
creto nº 6.871, de 4 de junho de 2009, está em pro- Mapa. Privilegie o produto local!
cesso de consulta pública pela Portaria SDA nº 562,
de 12 de abril de 2022 (até 11 de julho de 2022). Esta
é a hora que o cidadão tem de participar individual
ou coletivamente, por meio das suas associações, da
construção ativa da legislação que afeta produtores,
comerciantes e consumidores de bebidas, incluída
aqui a nossa cachaça. Cabe lembrar que, algumas
das alterações propostas na revisão da Instrução
Normativa nº 13, de 29 de junho de 2005, que “apro-
va o Regulamento Técnico para Fixação dos Padrões
de Identidade e Qualidade para Aguardente de Cana
e para Cachaça” (normativa ainda em processo de re-
visão) não puderam ser incorporadas pois eram con-
trárias ao Decreto nº 6.871, de 2009. Então, interessa
sim, principalmente aos produtores de cachaça, par-
ticipar do processo de revisão deste Decreto.
36 CACHAÇA EM REVISTA
CACHAÇA EM REVISTA 37
PRODUÇÃO
VINHOPresentes do
PARA A CACHAÇA
O cúpulo Manoel Agostinho Lima Novo fala sobre o uso de barris
de vinho que não passam por nova tosta para o armazenamento
e envelhecimento da cachaça, prática que tem resultado em
cachaças premiadas de segundo uso, oriundos da produção de vinho.
Não é uma prática nova nos destilados, mas é de di-
Omundo dos destilados está sempre em evo-
lução, buscando inovações para novos pro- fusão recente no mundo da nossa preciosa branquinha.
dutos, adequação a um público diferenciado Tudo começou em 1920, quando surgiu a Lei Seca
ou mesmo a otimização dos produtos já exis-
tentes. São novas descobertas, resultados de incessantes nos Estados Unidos da América, r passou a ser proibido
pesquisas, tudo aliado à tecnologia e ao conhecimento produzir os whiskies. Nessa época, os produtores, para
inerente à evolução mercadológica. fazer dinheiro, venderam seus barris para os escoceses.
No mundo da cachaça, graças à diversidade da nos-
sa flora, pesquisas de madeiras para armazenagem da Passada a Lei Seca, alguns pequenos produtores ame-
bebida surgem a cada momento, com novas espécies ricanos, sem recursos, trouxeram de volta alguns barris
que podem agregar novos aromas e sabores à já tão que vieram impregnados de uísques escoceses, agregan-
respeitada bebida. do novos aromas e sabores aos uísques americanos.
Ainda falando de inovação, vivemos a febre dos blends.
Não que a prática tenha surgido recentemente, já que é Temendo uma avalanche de retorno de barris e falta de
usada há décadas, mas passou recentemente a ser ado- trabalho para lenhadores e tanoeiros, o Estado americano
tada por um número maior de produtores – ou seja, ela estabeleceu uma lei obrigando o uso de barris novos para
existia, mas não lhe era dado o real valor. Esse tema é ex- armazenagem e envelhecimento do american whiskey.
plorado no meu livro A Arte do Blend na Cachaça, lançado
recentemente. Esse movimento todo despertou nos escoceses a
Nessa linha sucessiva de inovações, surgiu há cer- curiosidade sobre o uso de barris impregnados de vinho,
ca de alguns anos a prática de usar barris sem tosta, bebida mais delicada que o destilado escocês.
Quem começou esse uso foram os produtores
dos whiskies Balvenie e Glenmorangie. Todavia, a
iniciativa ficou restrita à Escócia, já que estes produ-
38 CACHAÇA EM REVISTA
tores não tinham, à época, uma linha de exporta- Pelo Brasil afora, outros produtores adotaram a moda
ção muito desenvolvida. dos barris de vinho, usando outras origens, já que os oriun-
dos de Jerez são cada vez mais raros.
Depois, o produtor do Macallan, marca mais famo-
sa e de boa estrutura mercadológica, começou a usar Adwalter Menegatti, produtor da Cachaça Santa Tere-
barris oriundos dos vinhos de Jerez, importados da zinha, no Espírito Santo, tem um produto que vai ao mer-
Espanha e, depois, barris oriundos do vinho do Porto, cado em breve com o título de Santa Terezinha Exporto. A
Madeira e Sauternes, entre outros. cachaça passa por barris de carvalho americano para ama-
ciar e depois ganha aromas e sabores nos barris de vinho
De Jerez para o Brasil do Porto, com aquele adocicado que lhe é característico.
Ao que se tem notícias, o uso de barris oriundos da
A cachaça Pardim Porto, do Estado de São Paulo, ven-
armazenagem de vinhos no Brasil começou em 2015, cedora do V Ranking Cúpula da Cachaça (2022), tem o
quando o Grupo Osborne, holding espanhola que ad- processo semelhante, mas com um pouco de mais de
quiriu a marca Santo Grau, trouxe para o Brasil barris complexidade. Ela é amaciada antes em seis madeiras di-
de carvalho americano que serviram para armazenar ferentes, mas o seu aroma e sabor finais ocorrem quando
vinhos de Jerez. passa pelo barril de Porto. Como isto acontece?
No Brasil, mais precisamente em Itirapuã (SP), a Madeira e álcool
Fazenda Barra Grande começou a produção da San- Os barris de madeira são usados para armazenar bebi-
to Grau PX e da Santo Grau 5 Botas, ambas cachaças
que antes de entrar nos barris de carvalho impregnado das alcoólicas desde o início da Idade Média. Inicialmente,
de vinho passam por tonéis de jequitibá para ganhar era apenas para estocar, já que havia abundância de ma-
sutileza, um amaciamento do produto, para quando deira e trabalhar essa matéria-prima era mais fácil do que
chegar aos barris de carvalho apenas agregar o senso- o metal. Depois, descobriu-se que o envelhecimento agre-
rial das borras de vinho existentes nos recipientes. Esta gava aroma e sabor, tornando as bebidas mais apreciáveis.
prática, por não explorar a lignina da madeira, confe-
re aos barris uma longevidade considerável, além de, Isto se conseguia, o que na época era desconhecido,
evidentemente, promover um diferencial apreciável ao porque os compostos químicos chamados de fenólicos, ex-
sensorial da bebida, como comenta Maurílio Cristófani, traídos da parede interna das madeiras dos barris em que a
produtor dessas preciosidades. bebida é armazenada, são responsáveis por mudar substan-
cialmente a composição da bebida, seja ela qual for.
PRODUÇÃO
Maurílio Cristófani (ao lado)
trouxe barricas de jerez da
Espanha. A Pardin Porto
(embaixo) é maturada em
barris já usados para o
vinho do Porto
Com esta reação química pro- a moldagem mecânica, antes mesmo de serem desti-
vocada pelos fenólicos, o sabor nados ao vinho. Logo, as propriedades decorrentes da
agressivo do álcool, o amargo e o queima inicial ainda estão vivas na madeira.
rude é substituído por algo mais
adocicado, sutil e com caracterís- Esse procedimento, além de necessário para dar for-
ticas organolépticas mais específi- ma aos barris, assim como para modificar a estrutura
cas e particulares. molecular da madeira, possibilitam melhor extração de
compostos pelos vinhos durante a armazenagem.
Esse processo pode levar
anos e depende de inúmeros fatores. Um desses é Esse processo causa a degradação de polímeros,
o que chamamos tecnicamente de tosta, que signi- como polissacarídeos e polifenóis, proporcionando o
fica a queima leve, média ou acentuada no interior surgimento de moléculas de aroma, que conferem sa-
do barril para que ele ofereça uma área maior de bor especial à bebida.
contato do líquido com a madeira, favorecendo a
troca química de ácidos e álcoois em ésteres, o que No caso da cachaça que se destina aos barris com
confere à bebida um sabor característico, peculiar borras de vinho, independente do vinho original, o
e extremamente agradável. Outra finalidade da tos- processo de oxidação e esterificação ocorre sem uma
ta é retirar o resíduo da bebida anterior. troca agressiva, até porque, como já explicado acima,
as cachaças ali chegam já “amaciadas”, pois passaram
Quando se fala em usar um barril que vem de se- por outra madeira, para perder acidez e ganhar ésteres.
gundo uso proveniente de uma armazenagem de outra Logo, a função das borras oriundas dos vinhos originais
bebida, quer seja destilada ou não, se entende que ele é apenas conferir uma aromatização extra e uma sabo-
passa por uma tosta para que seja “limpo”. rificação à bebida, tornando-a obviamente mais sutil,
agradável, encorpada, delicada e com brilho especial
No caso ora descrito, objeto desse artigo, estamos pelo escurecimento do líquido vindo da “tinta do vinho”.
falando de barris vindos de vinhos em que a tosta é
dispensada propositalmente, pois o que se quer é o No caso das cachaças Santo Grau, tanto a PX
quanto a 5 Botas, o processo é de soleira com extra-
resíduo do vinho, ção a cada 120 dias. Mas esse é um processo especí-
anteriormente fico daquele produtor. Via de regra, é possível fazer o
armazenado, di- sequenciamento horizontal sem perda da qualidade
luído na nossa do produto, como já o fazem outros produtores.
cachaça trazen-
do um diferencial Como bem explica o professor César Adames, “a
extremamente cachaça quando sai dos barris ou tonéis tradicionais
específico senso- é como um bolo de chocolate; passá-la pelos barris
rialmente. oriundos do vinho é como colocar a cereja no bolo”.
Se era bom, fica melhor. Isso eu posso garantir.
Esses barris so-
freram uma quei-
ma na fabricação
dentro da tanoaria
para que se possa
também facilitar
40 CACHAÇA EM REVISTA
ARTICULAÇÃO
O cúpulo Milton Lima
defende que governos
nos três níveis têm se
aproximado do setor,
o que pode trazer
benefícios para
TODAS AS PARTES A Cachaça
Não é de hoje que o Estado a legalização da cachaça, que convi- Muitas voltas a moenda do tem-
e a cachaça se esbarram. via com uma série de restrições à sua po completou até chegarmos a 2005,
Aliás, essa relação institu- produção e comercialização. quando foi criada a IN13 (Instrução
cional nasce praticamente Normativa nº 13, de 29 de junho de
junto com a cachaça. Em 1789, os intelectuais, padres 2005).. Para quem não conhece, foi
Em 1660, indignados com os al- e militares envolvidos na Inconfidên- um conjunto de normas, criado para
tos impostos cobrados pela Coroa cia Mineira tomavam cachaça como regulamentar a cachaça no Brasil. Uma
Portuguesa, os alambiqueiros toma- forma de protestar contra Portugal das muitas conquistas foi a de estabe-
ram o poder no Rio de Janeiro. Fo- e afirmar um sentimento nascente lecer diferenciação entre os produtos
ram derrotados, mas começaram a de nacionalidade. O próprio Tiraden- aguardente de cana, destilado alcoóli-
ganhar o respeito de Portugal. tes, personagem mais emblemático co simples e cachaça, permitindo que
Comandando o movimento co- do movimento, teria dito “Molhem a essa última assumisse uma identidade.
nhecido como Revolta da Cachaça, minha goela com cachaça da terra”
mesmo depois de ver sua subleva- antes de ser enforcado. O padre Do- No ano seguinte, em 2006, foi
ção abafada, não foram sancionados mingos Xavier, inconfidente e irmão criado o Programa Brasileiro de De-
pela Coroa e abriram caminho para de Tiradentes, fabricava cachaça em senvolvimento da Cachaça (PBDAC)
seu alambique (que aliás até hoje fun- com o objetivo de valorizar a cacha-
ciona, nas mãos de Nando Chaves, e ça, que redundou na criação do Ins-
produzindo a Cachaça Século XVIII). tituto Brasileiro de Cachaça, o Ibrac.
42
Rio de Janeiro,
século XVII: palco
da Revolta da
Cachaça, que
opôs produtores
de aguardente à
Coroa Portuguesa
e o Estado dição de alambicagem, como Socorro,
Amparo e Monte Alegre do Sul. Outras
Esse, além de manter os objetivos in- Secretaria de Agricultura e Abaste- áreas do estado, como Pirassununga e
ternos, assumiu a tarefa de buscar o cimento do Estado, inclusive tenho Piracicaba, também têm potencial para
reconhecimento da cachaça no mer- participado de um projeto que é o se candidatar ao reconhecimento.
cado internacional como um destila- Cachaça.SP. O projeto começou com
do genuinamente brasileiro. a ideia de criar um livro de arte que Um Arranjo Produtivo Local
contasse as histórias de pequenos (APL) se caracteriza pela junção de
Voltando à IN13, atualmente bus- produtores legalizados e de suas ci- atores de um mesmo setor em uma
ca-se uma renovação da legislação que dades. Essa ideia rapidamente criou estrutura de governança própria,
rege o setor, a fim de atualizar as regras corpo incitando a realização do I Fó- que permite atuação conjunta em
de um mercado dinâmico, que muda rum da Cachaça.SP, em março desse situações específicas e de interlocu-
com uma velocidade galopante. ano, no Engenho Central, em Piraci- ção com outros agentes sociais.
caba. Esse processo poderá dar início
Em âmbito regional, falando dos a uma evolução ainda maior, com a No âmbito municipal, tenho vis-
governos estaduais, tenho observa- criação de APLs (arranjos produtivos to muitas prefeituras entendendo a
do que alguns deles têm se aproxi- locais) dedicados à Cachaça. importância da cachaça para os seus
mando do setor. municípios – a força de gerar empre-
A região que sai na frente é a que gos não só na produção, mas tam-
AVANÇOS EM SP abrange o Circuito das Águas Paulista, bém através do turismo da cachaça,
Em São Paulo tive a oportuni- onde estão municípios com longa tra- que é um passeio sem volta.
dade de ver de perto o trabalho da A prefeitura de Analândia, cida-
de que recebe a reunião anual da
Cúpula da Cachaça, tem se mobili-
zado para ter um salão ou uma festa
anual da cachaça. “Uma cidade que
CACHAÇA EM REVISTA 43
ARTICULAÇÃO Engenho D’Ouro Prata
recebe a Cúpula da Cachaça tem Alambique
que ter a sua festa dedicada ao nos- Campanari, em
so destilado” disse o prefeito Paulo Monte Alegre do
Franceschini. Sul, possível sede
de um APL em
Em outro canto do país, o pre- torno da cachaça
feito Lauro de Souza Silva Júnior, de
Jandaia do Sul (PR), se convenceu da
importância da cachaça para o turis-
mo da região e não mediu esforços
para produzir o primeiro festival da
Cachaça de Jandaia do Sul – onde,
além de atrações artísticas, o público
conheceu cachaças de todo o Brasil.
Sem o apoio da prefeitura com o pa-
trocínio de toda a infraestrutura, esse
evento não sairia do “tonel”.
Prefeito Pereira, secretário de Turismo, quer uma boa divulgação, observou-se
Franceschini, de incrementar o turismo na cidade, uma grande repercussão positiva
Analândia (SP): não ficando apenas naquele estáti- para a cachaça do Ceará, que ainda é
cachaça como co de visitas a monumentos, mas, carente de incentivos, conforme me
fonte de atração propor um turismo de experiências, conta Altino.
de turistas e com degustações de cachaça, o que
riqueza o Altino faz como ninguém. Desse Vejo claramente uma aproxima-
processo, está nascendo o projeto ção entre os governos e a cachaça,
Além disso, Lauro ainda vai mais Rota da Cachaça de Fortaleza, para o que traz muitos avanços. Girando
longe. Ele quer que Jandaia do Sul transformar as quartas-feiras da ca- mais um pouco a moenda para o
seja a capital paranaense da cacha- pital cearense no “dia da cachaça”. passado, em um dos artigos publi-
ça. Nada mais justo, por ser Jandaia cados nesta revista em sua segunda
do Sul a cidade do Estado do Paraná Com essa iniciativa, à base de edição (2014), um dos artigos, escrito
com mais registros de cachaças. por Manoel Agostinho (atual presi-
dente da Cúpula), abordava a impor-
Saindo do Sul e indo para o ou- tância do Simples Nacional para a
tro lado do país, eu soube através cachaça e a luta junto à Câmara Se-
de uma conversa com o amigo (e torial da Cachaça, na qual a Cúpula
agora o mais novo cúpulo da famí- ocupa uma cadeira, para que o setor
lia) Altino Farias que a prefeitura de voltasse a ser elegível para o regime
Fortaleza, na figura de Alexandre tributário especial. Pudemos contri-
buir para essa conquista do setor.
A cachaça sempre estará ligada ao
Estado. Essa relação deve ser destilada
cada vez com um olhar mais focado
no produtor e na capacidade que a
cachaça tem de mostrar e se conectar
a culturas, pessoas e histórias.
44 CACHAÇA EM REVISTA
PUBLI
LEGCISÊLNACÇIAÃONO ALAMBIQUE
Tecnologia e arte
a serviço da identidade
Fato que ninguém questiona é que a cachaça
materializa em si ARTE e HISTÓRIA. Traz arrai-
gados em seu processo de institucionalização
os muitos signos de transformação cultural,
social e política da sociedade brasileira. Somado a
isso, a cachaça também se difunde sobre uma carga
de valores, crenças e emoções, sendo utilizada como
medicamento ou até figurando como emblema de
comemorações ou revoltas.
Nesse contexto, torna-se também imprescindível
rememorar o papel marcante da cachaça enquanto
símbolo de resistência e sua embebição em processos
de lutas e conquistas sociais, políticas, econômicas e
culturais do Brasil.
Mas, para além da iconografia nacional, o grande
desafio para toda a cadeia produtiva da cachaça hoje
é buscar elementos de RESSIGNIFICAÇÃO da interação
entre os indivíduos e a natureza para fins produtivos. O cúpulo CauréPortugal
O importante desse movimento recente e ainda explora as possibilidades
pouco explorado é a formulação não apenas de práti-
cas formais de agregação, mas a busca por uma forma da inovação científica
de pavimentar vias de DIFERENCIAÇÃO através de ele- como ferramenta para o
mentos intangíveis:
a. competitividade, incorporando valor desenvolvimento de cachaças
agregado ao produto; com procedência
b. coletividade, com maior retorno para as e marcas com selo de
economias rurais; autenticidade
c. conectividade, estreitando e fortalecendo como INDICAÇÕES GEOGRÁFICAS que, além de legitima-
os laços entre produtores e consumidores; e rem e protegerem os processos tradicionais de produção,
também edificam conhecimentos, reestabelecendo as ati-
d. informação, comunicando a procedência, vidades produtivas e motivando o surgimento de inova-
valores humanos e os métodos utilizados. ções. A Indicação Geográfica se divide em INDICAÇÃO DE
PROCEDÊNCIA e DENOMINAÇÃO DE ORIGEM. Enquanto a
Esses elementos constituem o amálgama de iden- primeira vai indicar apenas as localidades que produzem,
tidade e tipicidade do que entendemos formalmente com excelência, determinado produto, a Denominação de
46 CACHAÇA EM REVISTA
Origem indica que o produto oriundo de tal localidade mas o destilado mais brasileiro por excelência tem se profis-
é diferenciado, ante a existência de condições naturais e sionalizado nos últimos anos. Os gráficos extraídos da platafor-
humanas que o individualizam. Atualmente existem três ma Web of Science nos dão uma ideia da evolução da quan-
indicações geográficas registradas como Indicação de tidade de pautas científicas que empregam a ‘cachaça’ como
Procedência para cachaça, sendo elas: elemento de pesquisa nos mais diferentes campos, incluindo
Ciência e Tecnologia de Alimentos, Química analítica, Agricul-
a. MICRORREGIÃO DE ABAÍRA (2014), tura, Microbiologia, Biotecnologia Aplicada, etc.
localizada na região da Chapada Diaman-
tina, abrangendo parte dos municípios de Sem dúvidas, os estudos em Ciência, Tecnologia e
Abaíra, Jussiape, Mucugê e Piatã; Química Analítica trouxeram grandes avanços no enten-
dimento da origem e evolução de compostos que contri-
B. PARATY (2007), no município de Paraty buem para as impressões de aroma e sabor e daqueles que
(RJ), com uma área total de 700 km2; figuram como contaminantes, bem como sua interrelação
com a aplicação e o aperfeiçoamento das boas práticas de
C. REGIÃO DE SALINAS (2012), abrangendo fabricação – as quais vêm sendo mais compreendidas e
os municípios de Taiobeiras, Rubelita, Santa aperfeiçoadas.
Cruz de Salinas e Fruta de Leite (MG), em
uma área de 2.541 km2. Por outro lado, a Ciência avançou consideravelmente
no entendimento das complexas interrelações dos mui-
tos microrganismos que atuam nos processos de fermen-
Exemplos como esses, quando bem articulados por
todos os atores da cadeia produtiva, trazem a possibi-
lidade de demarcar sinais distintivos que permitam a
identidade diferenciada de produtos locais no mercado
e seu uso como ferramenta de MARKETING eficaz e de
grande valor econômico. Adicionalmente, viabilizam
formas mais sólidas de transmitir a IDENTIDADE CULTU-
RAL de uma região e agregar valor às riquezas naturais
do local e às habilidades de sua população.
CULTURA E RELEVÂNCIA Gráficos da plataforma Web of Science mostram a evolução das
Outro ponto de suma importância é que as indica- pautas científicas que empregam a ‘cachaça’ como elemento de
pesquisa em campos como Ciência e Tecnologia de Alimentos,
ções geográficas podem ser uma ferramenta valiosa Química analítica, Agricultura, Microbiologia e Biotecnologia Aplicada
na preservação da biodiversidade, aliada ao desenvol-
vimento e promoção regional. Sim, quanto a isso não CACHAÇA EM REVISTA 47
restam dúvidas: GEOGRAFIA É SABOR!
Mas moldar produtos com cultura e relevância não
significa ignorar novas paletas de cores de TECNOLOGIA
e INOVAÇÃO. São processos que devem coexistir, estar
em sinergia. E nessa seara, a cachaça tem atuado de ma-
neira transformadora nos últimos anos, mesmo quando
comparada a outros destilados de renome e já consoli-
dados na história.
O fato é que ainda há muito o que se descobrir em
relação a todos os aspectos multidisciplinares da cachaça,
CIÊNCIA NO ALAMBIQUE
tação e na compreensão da forma como a atividade
biológica desses consórcios impacta na qualidade do
produto destilado.
Com inovações nas áreas da Microbiologia e da Biotec-
nologia, muitos produtores ou associações, debruçados
na busca por identidade e tipicidade, podem atualmente
ter acesso a leveduras nativas, isoladas e testadas. Desta
forma, agregam-se melhores índices de RENDIMENTO e
PRODUTIVIDADE ao processo. Para além disso, imprime-se
diferenciação, agregando ainda maior controle e padroni-
zação da cachaça. Tudo isso valorizando a BIODIVERSIDA-
DE local e incorporando um forte apelo de BRANDING a
produtos de relevância e com procedência.
MOSTO DE ALTA DENSIDADE Moldar produtos com cultura
Alguns estudos mais recentes – incluindo os do nosso e relevância não significa
ignorar novas paletas de cores
laboratório, Smart Yeast - desenvolveram programas de se- de TECNOLOGIA e INOVAÇÃO. São
leção focados em encontrar leveduras de grande potencial processos que devem coexistir,
aromático, mas também com maior perfil de resistência estar em sinergia. E nessa
para trabalhar com mostos de alta e muito-alta densidade seara, a cachaça tem atuado de
(high-gravity e very-high-gravity). Trata-se de uma inovação maneira transformadora.
com selo de SUSTENTABILIDADE, pois permite maior econo-
mia de recursos humanos, energéticos e de água, além de
minimizar o impacto em volume de resíduos. Alguns outros
casos têm inclusive fugido da curva e encontramos levedu-
ras no processo de fermentação de cachaça com potencial
para a produção de CERVEJAS diferenciadas, HIDROMEL ou
fermentação de FRUTAS.
Para além do universo das bebidas, leveduras isola-
das em processos tradicionais de produção de cachaça já
foram aplicadas para a fermentação de cacau, café e até
mesmo jaca... trazendo à tona produtos com selo de ino-
vação, territorialidade e originalidade.
O que sedimenta nessa breve trajetória de aprendi-
zado que a cachaça nos proporciona é que, lançando
mão de tecnologia de ponta e inovação nos processos
produtivos, ainda é possível manter os laços de tradi-
ção, cultura e tipicidade deste destilado tão icônico e
democrático. Ainda assim, a arte de incorporar matizes
de sustentabilidade, respeito à biodiversidade e aos
componentes humanos, assim como a busca por elos
de origem, sempre surgirá como elemento agregador
e estruturador de marcas com selo de autenticidade.
48 CACHAÇA EM REVISTA
CACHAÇA EM REVISTA 49
TURISMO DE EXPERIÊNCIA
O cúpulo Altino Farias conta como, junto
com a Prefeitura de Fortaleza, criou a
Rota da Cachaça, um projeto com base em
atitudes e mínimo investimento
NAROTADO SUCESSO
Nos anos 1960, 70 e até meados dos 1980, o Ce- do Ceará produtos de baixo custo. Com isso, assistimos ao
ará tinha uma grande diversidade de rótulos de desmonte de toda a nossa indústria de cachaça de alambi-
boas cachaças, produzidas em várias regiões. que. Mas alguns teimosos resistiram. Ainda bem!
Adolescente e já iniciado nas atividades etílicas,
tive o prazer e a satisfação de beber de boa parte delas. De uns tempos para cá, os horizontes da cachaça se ex-
Nesse tempo, porém, o consumo de cachaça era restrito pandiram. A bebida passou a contar com uma legislação es-
a pequenos bares e mercearias de bairros, periferia da ci- pecífica e produtores se organizaram em associações para
dade e interior, além do consumo doméstico. Em bares e procurar a evolução da qualidade e uma melhor colocação
restaurantes ditos chiques, sua presença era vetada. no mercado. Ao ser apresentada de forma mais atual e com
Nos anos 1980, um produtor de Acarape, então distri- uma boa comunicação visual, onde“qualidade”é a chave, a
to de Redenção, a cerca de 80 quilômetros de Fortaleza, cachaça vem ganhando um novo e exigente público, com
resolveu ousar, “sair da caixa”, e lançou campanhas publi- as portas de bares e restaurantes elegantes abertas a ela.
citárias de excelente qualidade, associando sua cachaça,
a Chave de Ouro, à elegância e sofisticação. Aviões execu- Essa movimentação despertou nosso pessoal aqui
tivos, carros luxuosos, lindas paisagens e modelos igual- do estado, e muita coisa boa vem acontecendo, com
mente bonitos compunham as peças publicitárias ao lado produtores informais procurando regularização, busca de
da cachaça. Não satisfeito – e o empreendedor nunca está conhecimento, prospecção de novos mercados e premia-
–, lançou uma marca top de linha, a Tonel 21, com aromas, ções internacionais.
sabores e embalagem exclusivos. Ainda não satisfeito,
abriu uma loja própria em local nobre, onde servia suas VIVÊNCIAS EM FORTALEZA
cachaças acompanhadas de frutas, caldinhos e outros mi- Enquanto isso, o secretário de Turismo de Fortaleza,
mos que faziam a festa dos admiradores de uma boa pin- Alexandre Pereira, e sua equipe, vinham trabalhando com
ga. O local era muito bem decorado. Copos, louças, talhe- a ideia de sair um pouco daquele turismo estático de visi-
res, guardanapos, tudo de muito bom gosto. Essa ousadia tar monumentos e pontos históricos, procurando meios de
nunca saiu da minha cabeça. Infelizmente, essa destilaria proporcionar ao turista vivências diferentes em nossa cida-
teve suas operações suspensas no auge do sucesso, senão de. Atento a essa movimentação em torno da cachaça, essa
seria umas das maiores atualmente. bebida nacional por excelência e com fortes raízes na cultu-
Naquele tempo, a cachaça não tinha valor agregado. ra do nosso estado entrou na mira do secretário de Turismo.
Os produtores e seus descendentes foram se desinteres- Por esse motivo, fui procurado há três anos pelo
sando pela produção. As grandes destilarias cuidaram de, secretário e sua equipe para, juntos, desenharmos um
rapidamente, preencher o espaço, colocando no mercado projeto turístico envolvendo experiências com cachaça
– projeto esse que teve seu desenvolvimento interrom-
pido com a pandemia.
50 CACHAÇA EM REVISTA
Embaixada da Cachaça (acima) pronta para receber
os visitantes. Raimundo do Queijo (embaixo) é
tradição no Centro de Fortaleza
Passado o período de restrições, retomamos o traba-
lho com várias rodadas de reuniões. Chegamos a um es-
boço do projeto, já batizado de “Rota da Cachaça”: casas
devidamente capacitadas seriam indicadas aos turistas,
ou interessados em ter experiências com cachaças, em
roteiro livre. Esses estabelecimentos deveriam oferecer
combos de cachaças harmonizadas com petiscos em
condições especiais e disponibilizar profissionais prepara-
dos para um atendimento personalizado, tirando dúvidas
e fornecendo informações e curiosidades sobre a bebida.
Trabalhar a cultura da cachaça seria requisito básico.
O passo seguinte foi a seleção das casas participan-
tes. Nessa fase convidamos quatro casas a participarem,
além da Embaixada da Cachaça: Cantinho do Frango, Giz
Boemia, Raimundo do Queijo e Arupemba/Pirata. Todas
toparam de imediato! Essa seleção foi feliz porque procu-
ramos contemplar casas em bairros diferentes, com con-
cepções diversas, propiciando abordagens diferenciadas
da cachaça e, consequentemente, experiências únicas.
A EMBAIXADA DA CACHAÇA, que fica no bairro
Joaquim Távora, funciona como loja e bar. O foco exclu-
sivo da loja é a cachaça, com cerca de 400 rótulos de
vários estados brasileiros. No serviço de bar, a cachaça
também é destaque, com dez tipos de combos para
experimentações, além dos rótulos ofertados em doses,
que são servidas geladinhas. Gorette, sócia e gerente da
CACHAÇA EM REVISTA 51
TURISMO DE EXPERIÊNCIA Arupemba:
cachaça e forró
loja, está sempre à disposição para um bom papo sobre
cachaça e a indicação do rótulo certo para a ocasião e na Praia da
gostos certos. Eu sempre estou na área e atendemos Iracema
pessoalmente a todos os interessados.
consumir um ou mais combos ganha um copinho shot per-
Localizado no bairro Aldeota, a cachaça sempre foi sonalizado da ROTA DA CACHAÇA com a logo do estabe-
tradição no CANTINHO DO FRANGO, um complexo lecimento. Quem fizer o circuito completo, terá uma linda
que reúne bar, restaurante, loja de discos, barbearia e coleção de cinco copinhos... E muita história para contar.
espaço para shows que privilegia artistas da terra. A car-
ta da casa conta com mais de 400 opções e tem uma Quinta-feira em Fortaleza é a “Quinta do Caranguejo”,
atenção toda especial do Caio Napoleão, proprietário na qual muitos bares e restaurantes oferecem essa igua-
do estabelecimento. ria ao público. Justamente por ser um dia mais tranquilo
em termos de movimento, elegemos a quarta-feira para
No Centro, coração da cidade, próximo ao Mercado o atendimento específico da Rota da Cachaça. Daí para
Central, está o RAIMUNDO DO QUEIJO, uma mercearia se criar o mote “Quarta da Cachaça” foi um pulo. Claro
especializada em queijos e produtos da terra como casta- que todos poderão ter esse atendimento todos os dias
nhas de caju, doces, paçoca, etc. Com um ar meio interio- da semana, mas a quarta é o dia mais especial.
rano, a vida ali parece passar mais devagar. É ideal para ex-
perimentar uma boa cachaça, sem pressa e com uma boa Nossa cachaça é tão boa, tem receptividade e a em-
prosa com o Seu Raimundo ou com o Adriano, seu filho. patia tão intensa, que com certeza esse projeto será um
sucesso e irá chacoalhar as noites de quarta em Fortale-
O GIZ é um barzinho transado, bem atual, muito bem za. Interessante notar que o Rota da Cachaça é baseado
decorado, com cozinha e serviços excelentes. Localizado praticamente em atitudes. O investimento foi mínimo.
no Meireles, bairro nobre, o Giz já nasceu com uma exce- “Pensar diferente, querer fazer, fazer acontecer”, essa lição
lente carta de cachaças, pela qual, aliás, eu sou responsá- é a “chave de ouro” que ficou para mim nessa maravilho-
vel. Música boa e gente bonita completam a casa. sa, emocionante e transbordante aventura que é fazer o
Rota da Cachaça. Saúde a todos e... Boas doses!
De frente para o mar, na encantadora Praia de Iracema
está o PIRATA BAR/RESTAURANTE ARUPEMBA. A casa, que
recebe uma multidão de turistas, é famosa pela melhor
segunda-feira do planeta, com uma programação musical
com forte pegada no forró. A cozinha nordestina e a cacha-
ça, obviamente, não podiam faltar no seu mix cultural.
QUARTAS DA CACHAÇA
Tudo alinhado com as casas participantes, treinamento
de pessoal realizado, hora dos detalhes finais. Há um cardá-
pio da Rota comum às cinco casas, com imagens de seus
combos, mapa de localização, e outras informações. Quem
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