Doia Minha Vida

dávamos os mantimentos. Era um tempo bem mais tran-
quilo. Quase não tinha ladrões, nem assaltantes. Portas e
janelas das casas ficavam abertas até a hora de dormir.
A mãe tinha seus trabalhos nos intervalos. Fiava e
fazia colchas de algodão, redes e outras coisas. Em algumas
outras folgas, ela costurava roupas para a família. Quando
ela saía da roda de fiar, eu corria e sentava, tentando apren-
der. Quando ela chegava ficava brava, dizia que não estava
igual. Fui tentando até que finalmente aprendi.
Aprendi também com ela, minha mãe, a ser durona,
a não entregar facilmente os pontos. Por isso, quando estou
baqueando, meus filhos se preocupam. Ela sempre dizia que
as pessoas precisam ser fortes, lutar até o seu limite.
Deixo aqui um conselho: quem tiver pai e mãe que os
aproveitem. Sejam obedientes, carinhosos e amorosos, por-
que quando morrerem jamais os esquecerão. E as saudades
são amargas. Sinto muita saudade de todos os meus entes
queridos: pais, avós, tios e irmãos que já se foram.
Meu pai avô, aos 65 anos, ficou doente. Como não ti-
nha médico no local, só havia tratamento com farmacêutico,
a cada dia que passava não tinha melhora. Uma tarde ele
estava com muita falta de ar, com dificuldade para falar, en-
tão eu sentei na cama ao lado dele. Ele ficou olhando para os
lados no quarto, olhando os baús, apontou com dedo num
canto e me disse: “Aquele ali é seu, quando eu morrer, ou-
viu?!”
Fiquei com o baú do meu pai e ainda o tenho. Nele
guardo até hoje minhas colchas de algodão. Ele faleceu dia
20 de setembro de 1949.
A outra mãe, vendo meu interesse em fiar, comprou
uma roda (de fiar) e me deu. Eu a tenho até hoje também.
Naquela época, era um costume fazer mutirões. As
mulheres juntavam-se nas casas das amigas para fiar. Fiá-
vamos e cantávamos o dia inteiro. Era muito divertido. Hoje
não fio mais, mas tenho a roda até hoje.
Não pensem que fico à toa o tempo todo. Não. Tenho
86 anos de idade e ainda consigo fazer a lida caseira; cozi-

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nho, lavo e passo roupas, cuido de todas as obrigações da
casa.
Após os afazeres, pego um livro e vou ler, pois gosto
muito de ler; quando não estou lendo, estou bordando ou
fazendo tapetes, gosto muito também. Gosto de cantar e dan-
çar também. Agora não danço mais, as pernas não me dão
mais prazer.
Bom, no início já disse sobre meu ex-marido. Após 56
anos vivendo separado da família, com seus 90 anos, ficou
adoentado. Os filhos preocupados convidaram-no para mo-
rar com um deles, mas ele não aceitou. Agora com 93 anos,
não consegue andar, nem ficar em pé e não reconhece mais
as pessoas.
Ele não pode mais ficar sozinho; os filhos o levaram
para o asilo. Pagam mensalidades e ele é bem cuidado. Está
com Mal de Alzheimer. Sua filha Maria Lúcia o visita todos os
dias; o Valdir e o Valdivino trocam os finais de semana. Um
fica com ele um fim de semana e o outro no final de semana
seguinte.
Maria Lúcia é aposentada e tem mais oportunidade;
os dois trabalham a semana inteira e não podem abandonar
seus consultórios. Só têm folga aos sábados.
Um pai que nunca deu atenção e carinho aos filhos.
Mas os filhos estão fazendo diferente, como ensina a lei de
Deus. Fazer o bem sem olhar a quem. Meus filhos são amo-
rosos, bom coração. São trabalhadores, honestos, responsá-
veis e cuidadosos. Agradeço muito a Deus por tudo, princi-
palmente, pela graça dos meus filhos serem o que são.

Obrigada meu Deus.
Teodora Jacinta de Souza

Este livro foi confeccionado em papel couché,
80 gramas e em Bookman Old Style, em 2018.

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“Tenho 86 anos de idade e ainda
consigo fazer a lida caseira; cozinho,
”lavo e passo roupas, cuido de todas
as obrigações da casa .
(Teodora Jacinta de Souza)