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sociologia para jovens do sec. xxi - PNLD 2018

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Published by Agent 005, 2020-05-19 12:47:24

sociologia para jovens do sec. xxi - PNLD 2018

sociologia para jovens do sec. xxi - PNLD 2018

Você concorda com cada uma destas maneira discordante do gênero em que foram
análises? Discorda de alguma? Por quê? Discuta enquadradas e reelaboram suas identidades
com os seus colegas e com os professores. de gênero rompendo com a visão binária
que reconhece somente gêneros masculino e
Aproveite também para pesquisar a feminino e com a heteronormatividade. Entre
respeito da existência de “escravas sexuais” suas demandas específicas podemos citar o
em determinadas partes do planeta (como é o reconhecimento do uso de um nome social
caso das mulheres de etnia yazidi, no Iraque); (em substituição àquele que consta em seus
sobre a situação de abandono vivido pelas documentos de identificação), a retificação do
mulheres que cumprem penas em penitenciárias registro civil, as cirurgias de transgenitalização,
brasileiras; sobre o porquê de que somente em o uso do banheiro em acordo com a identidade
2015 as mulheres puderam votar em eleições autorreconhecida, a implementação de ações
na Arábia Saudita; sobre o assédio sexual e as que combatam a discriminação no mercado
represálias que meninas estudantes brasileiras de trabalho (dada a imensa dificuldade que
de Ensino Fundamental e Médio sofrem nas mulheres trans têm de se obter empregos com
escolas em razão das roupas que vestem. Você carteira assinada, por exemplo) e a denúncia
pode levantar muitas questões sobre violência da violência que sofrem diariamente, com
de gênero nas sociedades atuais, infelizmente. a luta pela criminalização da transfobia.
A luta de transgêneros e transexuais por
O transfeminismo e as “vadias” reconhecimento e direitos colocou sob crítica
a heteronormatividade e reforçou a oposição
Quando falamos de feminismo nos dias entre o cisgênero e o transgênero. A palavra
de hoje, além de todas as questões levantadas, cisgênero aponta para a identidade de gênero
há a necessidade ainda de se destacar também construída com base no sexo biológico de
uma corrente que ficou conhecida como nascimento de um determinado indivíduo,
transfeminismo. Como o próprio nome já aponta, identidade considerada socialmente aceita para
trata-se do movimento organizado e em defesa o sexo biológico em questão. Diz respeito,
das demandas e reivindicações das mulheres portanto, aos indivíduos não trans. O avanço
transgêneras. Definem-se dessa forma aquelas dos debates sobre os transgêneros impactou
mulheres que, em tempo integral, parcial ou em os movimentos feministas de forma crítica,
momentos específicos da sua vida, demonstram revelando novas camadas de opressão.
algum grau de desconforto ou se comportam de

WikimediaCommons/Anton Bielousov

Primeira Marcha das Vadias,
Toronto, Canadá, 2011.

349Capítulo 22 - “Lugar de mulher é onde ela quiser?”Relações de gênero e dominação masculina no mundo de hoje

Elza Fiuza/ABr Neste início de século XXI, também
assistimos os surgimento de um novo movimento
Marcha das Vadias, em Brasília, 2011. de mulheres, intitulado por alguns como o
início de uma quarta onda do feminismo (ver,
Como demonstram os exemplos relacio- por exemplo, OLIVEIRA e KORTE, 2014).
nados neste capítulo, percebe-se que as Esse novo movimento apresenta algumas
mulheres são vítimas de distintas formas de características bem demarcadas e organiza,
opressão. Essas não ocorrem de forma isolada: entre outras ações, as polêmicas manifestações
na prática, existem interseções nas diversas autointituladas como “Marchas das Vadias”
demandas das lutas das mulheres, com um (“SlutWalk”, em inglês). Elas tiveram início
cruzamento envolvendo questões de gênero, em Toronto, Canadá, em 3 de abril de 2011.
de raça, de classe social e/ou de sexualidade. Essa primeira marcha foi convocada como
Como descrito por Djamila Ribeiro (2014), a protesto contra os diversos casos de abuso
ideia de uma mulher “genérica”, “universal” sexual que ocorrera em janeiro daquele ano na
esconde essas mulheres concretas, com Universidade de Toronto, como resposta a um
reivindicações e desejos específicos, cuja luta policial que recomendara, equivocadamente,
reflete o grau das relações de poder presentes que “as mulheres evitassem se vestir como
na sociedade. Existem outros saberes, outras vadias (sluts), para não serem vítimas”.
culturas, outras experiências à margem dos Esse primeiro protesto contra a tentativa de
poderes e da ideologia que predomina. Dessa culpabilização das vítimas – prática comum em
forma, mulheres afrodescendentes, indígenas, casos assim, em todo o mundo ocidental – levou
quilombolas, lésbicas, bissexuais, transexuais, 3 mil pessoas às ruas de Toronto, sendo logo
travestis, isto é, essas que não pertencem ao seguido por manifestações em outras cidades,
mundo oficial e escolarizado, através das lutas como Chicago, Los Angeles, Amsterdã, Buenos
sociais fazem-se presentes neste momento, Aires, entre outras, se espalhando também
batalhando pelo seu espaço e colocando-se pelo Brasil, alcançando praticamente todas as
como partes fundamentais da construção de capitais, a começar por São Paulo, em junho
propostas de políticas públicas que envolvem de 2011, e se reproduzindo depois por dezenas
seus direitos em relação à saúde, à educação e de cidades localizadas no interior do país. A
ao emprego. Marcha das Vadias, portanto, saiu às ruas contra
a ideia machista de que as mulheres que são
Pense um pouco: você convive com colegas vítimas de estupro seriam as “responsáveis” por
cuja identidade de gênero escapa ao padrão essa violência, que a teriam provocado através
normativo e binário de homem e mulher? Como do seu comportamento. Como alvos desta
tais colegas estão inseridos e suas identidades crítica atual dos movimentos feministas estão
reconhecidas no espaço escolar? afirmações que em si constituem violência
simbólica, a exemplo de que algumas mulheres
350 Unidade 3 - Relações Sociais Contemporâneas mereceriam ser estupradas ou de que o assédio
é normal na relação entre homem e mulher.
Assim, as mulheres marcham denunciando
os casos de estupros, mas utilizando roupas
transparentes, lingerie, saias curtas, ou somente
sutiãs – ou nem estes. Daí toda a polêmica
criada em torno desses atos, acrescida pela
denúncia da hipocrisia reinante na sociedade,
das performances teatrais provocativas e do
fato do movimento não poupar as autoridades

e as instituições religiosas, consideradas como Violência de gênero e
responsáveis pelos seus discursos moralizantes legislação brasileira
que culpabilizam e que subalternizam as
mulheres diante da dominação masculina. A violência contra a mulher “é qualquer
ato ou conduta baseada no gênero, que cause
Como você já sabe, as críticas à condição morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou
de opressão vividas pelas mulheres não podem psicológico à mulher, tanto na esfera pública
ser generalizadas para todos os seres humanos, como na esfera privada” (OEA, 1994). Essa
entretanto, algumas delas podem servir como violência pode ser visível e explícita, como a
base de análise sobre a nossa sociedade. Uma agressão física, a morte, o estupro e a ameaça,
coisa, porém, é certa: o feminismo, a entrada ou invisível e sutil, como na publicidade e no
massiva das mulheres no mercado de trabalho humor machista, assim como em ameaças,
e o aumento considerável do seu nível de constrangimentos, humilhação, vigilância,
educação formal no século XX provocaram perseguição, chantagem, calúnia, difamação
muitas mudanças na relação entre homens e e injúria. Infelizmente ainda não é possível
mulheres e, principalmente nas identidades de comemorar a diminuição e muito menos a
gênero, como foi exposto no início do capítulo. erradicação dessas formas de violência no
Os movimentos feministas, de certa forma, Brasil.
mobilizaram e despertaram muitos grupos de
mulheres e de homens a questionar as ideias No plano legislativo, podemos afirmar que
antigas de que existe uma predisposição natural uma grande conquista das mulheres no Brasil
– biológica – para o papel de homem e o de foi a chamada Lei Maria da Penha (Lei 11.340,
mulher e de que as identidades de gênero se sancionada em 7 de agosto de 2006), elaborada
reduzem a duas, estáticas e pré-fixadas, homem e aprovada pelo Congresso Nacional com o
e mulher. Assim, cumprem o papel de dar voz às objetivo de coibir a violência doméstica e familiar
mulheres invisibilizadas e aos demais gêneros contra as mulheres. A Lei, em diversos itens,
que não se enquadram na norma socialmente garante às mulheres atendimento específico
reconhecida. nas delegacias em caso de violência doméstica
e familiar, além de providenciar investigações
Wordpress
sobre os agressores. A Lei acabou com
as penas pagas em cestas básicas ou
multas e tornou o Estado o responsável
pelo enfrentamento da violência contra
a mulher. Possibilita que agressores
de mulheres no espaço doméstico ou
familiar sejam presos em flagrante
ou tenham sua prisão preventiva
decretada. Foi chamada de Maria da
Penha em homenagem à farmacêutica
Maria da Penha Maia Fernandes (1945)
que, em 1983, por duas vezes, sofreu
tentativa de assassinato por parte do
marido, ficando paraplégica. Ela se
tornou uma grande ativista-símbolo
da luta das mulheres no combate à
violência doméstica.

Marcha das Vadias. São José
dos Campos/SP, 2012.

351Capítulo 22 - “Lugar de mulher é onde ela quiser?”Relações de gênero e dominação masculina no mundo de hoje

As diversas lutas desencadeadas pelo mo-Waldezviolência física (51,68%). Os demais casos
vimento feminista fizeram com que ocorressem registrados foram de violência psicológica
no Brasil algumas mudanças no cotidiano das (16.846 ocorrências – ou 31,81%), violência
trabalhadoras brasileiras. No Rio de Janeiro, moral (5.126 = 9,68%), violência patrimonial
por exemplo, em 2006, foi aprovada uma lei que (1.028, correspondendo a 1,94%), violência
obriga trens e metrôs do estado a reservarem sexual (1.517, ou 2,86%), 931 denúncias de
um vagão apenas para as mulheres, nos dias cárcere privado (1,76%) e 140 casos de violência
úteis, das 6h às 9h e das 17h às 20h. O objetivo envolvendo o tráfico de drogas (0,26%).
dessa lei era reduzir os casos de assédio sexual
nesses meios de transporte e que as mulheres Há também a caracterização do que hoje é
se sentissem seguras no vagão reservado a intitulado como feminicídio, que é a perseguição
elas. Portanto, uma reivindicação histórica dos e o assassinato de pessoas do sexo feminino em
movimentos feministas, que era a luta contra o função de questões de gênero, ou seja, a mulher
assédio violento dos homens, se transforma em é morta pelo fato de ser mulher. Segundo a
lei, numa tentativa de mudar o cotidiano urbano campanha “Compromisso e Atitude”, entre
de muitas pessoas. 1980 e 2010 ocorreram 92 mil assassinatos de
mulheres no Brasil, sendo que quase a metade
Encerrando este capítulo, vale atualizar (43,7 mil) somente na última década. De acordo
dados gerais bastante significativos e denun- com o Mapa da Violência 2012, o número de
ciadores a respeito da violência praticada contra mortes no período citado apresentou aumento
as mulheres brasileiras. De acordo com alguns de 230%. Fazendo outro recorte desses dados, o
compilados pela Campanha “Compromisso Mapa da Violência 2015 revelou um aumento de
e Atitude”, que divulga, defende e organiza 190,9% de assassinatos de mulheres e meninas
ações em prol do cumprimento da Lei Maria da negras no período 2003-2013.
Penha (http://goo.gl/gBH4aN), das mulheres
submetidas a situações de violência em todo O feminicídio foi classificado como um
o país – segundo a Central de Atendimento à crime hediondo no Brasil somente em março de
Mulher, da Presidência da República, em 2014 2015. Um crime é considerado hediondo quan-
–, enquanto 35% são agredidas semanalmente, do o delito em questão é caracterizado como
43% sofrem agressões diárias. Dentre os casos repugnante, bárbaro ou asqueroso. A Lei do
de violência doméstica, 23,51% se dão desde o Feminicídio n. 13.104/2015 aumentou a pena
início da relação. para essas agressões de 12 para até 30 anos.

Ainda em 2014, do total de 52.957 de- O que você acha dessas medidas legislati-
núncias de violência, 27.369 representaram vas? Pesquise a respeito dessas leis e avalie se
elas contribuíram, de alguma forma, para mo-
352 Unidade 3 - Relações Sociais Contemporâneas dificar as relações entre homens e mulheres em
nosso país. Aproveite para pesquisar discus-
sões no Congresso Nacional e na Assembleia
Legislativa de seu estado que possam afetar as
garantias legais existentes atualmente. Discuta
com seus colegas e professores.

Por que é importante estudar e
pesquisar sobre as mulheres?

Para mostrar a sua invisibilidade como
sujeito, inclusive como sujeito da ciência, das
letras, das artes e do conhecimento. Para tornar
visíveis aquelas que foram ocultadas ao longo
da História. Para alcançarmos igualdade de

gênero, igualdade salarial, erradicar a violência Reprodução/GeorgetownUniversity em movimentos sociais e coletivos de mulheres,
de gênero, ampliar os seus direitos de cidadania pode-se transformar e mudar a realidade de
e para que a mesma saia da condição de objeto discriminação e violência que descrevemos
em que foi colocada. aqui? Concorda que o conhecimento científico,
como desenvolvido pela Sociologia, por
A violência contra as mulheres não pode exemplo, pode nos libertar de modos enviesados
ser algo aceito e tolerado como inerente ao ser de ver as relações sociais de gênero? Afinal, para
humano. Os papéis sociais impostos a mulheres você, a educação está diretamente relacionada à
e homens, reforçados por culturas patriarcais, possibilidade de mudanças na sociedade?
estabelecem relações de dominação e violência
entre os gêneros. Em virtude do componente Para você refletir, segue uma reflexão
cultural é que se faz fundamental a ação apresentada pela escritora nigeriana
educativa, a fim de construir uma sociedade livre Chimamanda Ngozi Adichie: “O gênero
de estereótipos que conduzem a uma relação dita o modo como experimentamos o
de desigualdade. A escola deve promover uma mundo. Mas podemos mudar isso (...) a
educação pela igualdade entre os gêneros e cultura está em constante mudança (...)
interferir na construção e desenvolvimento não é a cultura que molda as pessoas,
de pessoas livres desses padrões, nos quais a são as pessoas que fazem a cultura”.
dignidade e o respeito mútuo sejam as diretrizes
principais. (ADICHIE, 2015).

Qual é sua avaliação sobre todas Chimamanda Ngozi Adichie é escritora nigeriana. Uma das
as informações, análises e reflexões que personalidades africanas atuais que mais contribui para a divulgação
apresentamos neste capítulo? Agora que você da luta das mulheres e da literatura africana contemporânea.
conheceu de um ponto de vista científico
um pouco mais a respeito de como se dão as
relações de gênero em nossa sociedade, qual é
a sua posição, sobre o feminismo e as suas lutas
históricas?

Precisamos refletir sobre a importância
dos grupos dominados se tornarem canais de
resistência e luta, sem se prender a identidades
fixas e imutáveis, a padrões pré-estabelecidos e
tidos por “naturais”. Você concorda que, através
dos estudos feministas e do maior engajamento

353Capítulo 22 - “Lugar de mulher é onde ela quiser?”Relações de gênero e dominação masculina no mundo de hoje

Interdisciplinaridade

Conversando com a Biologia

“Ser um homem feminino não fere o meu lado masculino!”

Lana Fonseca

A frase acima foi retirada da música Masculino foi usada para “comprovar” uma suposta superioridade
e feminino, do guitarrista brasileiro Pepeu Gomes1, e dos homens sobre as mulheres e servir de base para
traz para nós uma reflexão muito importante: o que inúmeras atrocidades contra estas.
determina nossa masculinidade ou nossa feminilidade?
Mas o que há de realidade nessas afirmações?
Do ponto de vista biológico, ser homem ou ser Homens e mulheres são diferentes sim, mas essas
mulher se refere aos nossos cromossomos sexuais, o diferenças não podem definir valores, hierarquias ou
par de genes que determina nosso sexo. No caso de discriminação. Somos todos Homo sapiens sapiens,
termos um par XX seremos mulheres, caso tenhamos com direitos iguais.
um par XY seremos homens.
Nesse sentido, temos que ter muito cuidado
Mas o que é ser homem ou ser mulher? para que a Biologia não seja usada, mais uma vez,
Biologicamente falando, é ter caracteres sexuais em nome do preconceito, da discriminação e da
primários (sistema reprodutor) e secundários (seios, barbárie. O fato de possuirmos um único par de genes
pelos, voz, dentre outros) de homem ou de mulher. Mas, que nos diferencianão pode ser usado como motivo
e do ponto de vista social? Podemos determinar o que é para subjugação de um indivíduo sobre o outro. Da
ser homem ou mulher? mesma forma, a orientação sexual, seja determinada
geneticamente ou não, não nos torna piores ou melhores
Entendemos que a determinação do gênero ou da do que ninguém, pois já sabemos que a atividade
orientação sexual é um conjunto de fatores complexos sexual nos animais não serve apenas à perpetuação da
que não pode ser determinado apenas biologicamente. espécie, como foi historicamente divulgado. Inúmeras
Entretanto, há uma imensa disputa na sociedade sobre espécies animais buscam o sexo para outras funções
esse tema: seria a sexualidade determinada apenas (prazer, relação social, pertencimento ao grupo) além
pela nossa carga genética? Os cientistas hoje estão da reprodução.
divididos sobre essa questão; muitos afirmam que a
homossexualidade, por exemplo, seria um distúrbio, Podemos concluir que a Biologia é um poderoso
uma doença e que, portanto, teria cura! instrumento para desmistificarmos preconceitos sociais,
desde que usada com justiça e equidade.
Contudo, a comunidade científica ainda não
chegou a uma teorização sobre essa questão e não Lana Claudia de Souza Fonseca é professora da
podemos afirmar que a orientação sexual possa ser UFRRJ. Graduada em Biologia pela UFRRJ e Doutora
determinada apenas pela carga genética de cada em Educação pela Universidade Federal Fluminense.
indivíduo.
1 Masculino e Feminino. Artista e compositor: Pepeu Gomes, gravadora:
Outra questão polêmica que vem sendo enfrentada Sony/CBS – 1983.
pela sociedade, no decorrer de sua História, é o “mito da
superioridade masculina”. Por muitas vezes, a ciência

354 Unidade 3 - Relações Sociais Contemporâneas

Interatividade

Revendo o capítulo Dialogando com a turma

1 – O que significa feminismo? Explique e 1 – Faça um levantamento de frases difundidas
caracterize as chamadas “quatro ondas” do pelo movimento feminista, em seus diversos
movimento feminista, apresentando também as contextos históricos e culturais, e debata com
críticas que o identificam com uma perspectiva a sua turma os significados, as concepções e as
eurocêntrica. polêmicas envolvidas em cada uma delas, assim
como os mecanismos que regem as ideologias
2 – O capítulo se encerra apresentando diversos machistas.
dados sobre a condição das mulheres em nosso Alguns exemplos:
país. A partir dessas informações, (a) pesquise – “Não se nasce mulher, torna-se” (Simone de
e atualize os números a respeito da violência Beauvoir);
contra as mulheres brasileiras, incluindo os – “Meu corpo, minhas regras”;
dados sobre os casos de feminicídio; e (b) – “Eu não vim da sua costela; você é que veio
pesquise e apresente para a turma dados sobre do meu útero!”;
a condição das mulheres em outras partes do – “Mulher bonita é aquela que luta!”.
planeta, comparando com a realidade que
vivemos aqui. 2 – Pesquise, leia e debata com a turma o conteúdo
do Manifesto da “Marcha das Vadias”.
3 – Caracterize o que pode ser entendido como
assédio sexual, comentando as informações Verificando o seu conhecimento
contidas no seguinte cartaz:
1 – (ENEM 2015)
Cartaz de autoria de Carol Rosseti
Ninguém nasce mulher: torna-se mulher. Nenhum
destino biológico, psíquico, econômico define
a forma que a fêmea humana assume no seio da
sociedade; é o conjunto da civilização que elabora
esse produto intermediário entre o macho e o
castrado que qualificam o feminino.

BEAUVOIR, S. O segundo sexo. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 1980.

Na década de 1960, a proposição de Simone de
Beauvoir contribuiu para estruturar um movimento
social que teve como marca o (a)

(A) ação do Poder Judiciário para criminalizar a
violência sexual.

(B) pressão do Poder Legislativo para impedir a
dupla jornada de trabalho.

(C) organização de protestos públicos para garantir
a igualdade de gênero.

(D) oposição de grupos religiosos para impedir os
casamentos homoafetivos.

(E) estabelecimento de políticas governamentais
para promover ações afirmativas.

355Capítulo 22 - “Lugar de mulher é ondCeapeíltaulqou1i9se-r?“C”Rhelgaoçuõeoscdaevegiêrãnoe!r”oEeadgoomrain?aVçiãoolêmncaiasceuldineasingouamlduanddeosdseochioajies

2 – (ENEM 2015) TEXTO IV
O IMPACTO EM NÚMEROS – Com base na
PROPOSTA DE REDAÇÃO Lei Maria da Penha, mais de 330 mil processos
foram instaurados apenas nos juizados e varas
A partir da leitura dos textos motivadores seguintes especializados.
e com base nos conhecimentos construídos ao
longo de sua formação, redija texto dissertativo- 332.216 processos que envolvem a Lei Maria
-argumentativo em modalidade escrita formal da
língua portuguesa sobre o tema “A persistência da Penha chegaram, entre setembro de 2006 e março
da violência contra a mulher na sociedade de 2011, aos 52 juizados e varas especializados em
brasileira”, apresentando proposta de intervenção Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher
que respeite os direitos humanos. Selecione, existentes no País. O que resultou em:
organize e relacione, de forma coerente e coesa,
argumentos e fatos para defesa de seu ponto de vista. 58 mulheres e 2.777 homens

TEXTO I – Nos 30 anos decorridos entre 1980 e enquadrados na Lei Maria da
2010 foram assassinadas no país acima de 92 mil Penha estavam presos no País em
mulheres, 43,7 mil só na última década. O número dezembro de 2010. Ceará, Rio de
de mortes nesse período passou de 1.353 para Janeiro e Rio Grande do Sul não
4.465, que representa um aumento de 230%, mais constam desse levantamento feito
que triplicando o quantitativo de mulheres vítimas pelo Departamento Penitenciário
de assassinato no país. Nacional.

WALSELFISZ, J. J. Mapa da Violência 2012. Atualização:
Homicídio de mulheres no Brasil. Disponível em: www.
mapadaviolencia.org.br. Acesso em: 8 jun. 2015.

TEXTO II – TIPO DE VIOLÊNCIA RELATADA

BRASIL. Secretaria de Políticas para as Mulheres. Balanço 237 mil relatos de violência
2014. Central de Atendimento à Mulher: Disque 180. Brasília,
2015. Disponível em: www.spm.gov.br. Acesso em: 24 jun. foram feitos ao Ligue 180, serviço
2015 (adaptado).
telefônico da Secretária de Políticas
TEXTO III
para as Mulheres.

Disponível em: Sete de cada dez vítimas que telefonaram para
www.compromissoeatitude.org.br.
Acesso em: 24 jun. 2015 o Ligue 180 afirmaram ter sido agredidas pelos
(adaptado). companheiros.

356 Unidade 3 - Relações Sociais Contemporâneas Fontes: Conselho Nacional de Justiça, Departamento Penitenciá-
rio Nacional e Secretaria de Políticas para as Mulheres.
Disponível em: www.istoe.com.br. Acesso em: 24 jun. 2015
(adaptado)

Pesquisando e refletindo sem fins lucrativos, que promove e facilita a
interconexão entre grupos de mulheres em todo
LIVROS o Brasil, constituindo uma rede de serviços em
educação popular feminista. Acesso: janeiro/2016.
ADICHIE, Chimamanda Ngozi. Sejamos todos
feministas. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. SURVIVOR, com Clarice Falcão:
https://goo.gl/rwNG8x
A autora nigeriana parte de sua experiência pessoal Versão da atriz para o sucesso do grupo Destiny’s
de mulher para pensar o que ainda precisa ser feito Child. No vídeo, Clarice e várias mulheres
para que meninas e meninos não se enquadrem nos interpretam a letra da música passando batom
estereótipos existentes que definem determinados vermelho pelo corpo. No fim da exibição aparece
comportamentos como “feminino” e como a seguinte mensagem: “É preciso ter coragem para
“masculino”. O livro é uma adaptação de um ser mulher nesse mundo. Para viver como uma. Para
discurso feito pela autora, que teve mais de 1 milhão escrever sobre elas.” Acesso: janeiro/2016.
de visualizações nas redes sociais e foi musicado
por Beyoncé. O vídeo está disponível em: https:// MÚSICAS
goo.gl/C9apyp Acesso: janeiro/2016.
DESCONSTRUINDO AMÉLIA – Autora e
MOREIRA ALVES, Branca; PITANGUY, intérprete: Pitty
Jacqueline. O que é feminismo. São Paulo: A letra deste rock faz uma referência direta ao samba
Brasiliense, 1985. “Ai que saudades da Amélia”, escrito na década de
1940 por Ataulfo Alves e Mário Lago. Pitty retrata
Este livro apresenta um histórico do movimento uma nova Amélia, que não entende por que ganha
feminista até grande parte do século XX, suas menos que o namorado, apesar de ter o mestrado,
principais ideias e as lutas das mulheres contra a mas que não se sujeita e resolve virar a mesa.
ideologia machista.

FILMES 22 – Autora e intérprete: Lily Allen Universal Pictures/Sarah Gavron
Será que ainda existem mulheres que sonham em
ACORDA, RAIMUNDO... ACORDA (Brasil, encontrar um “príncipe encantado” que as venha
1990). Direção: Alfredo Alves. Elenco: Paulo Betti, resgatar de uma vida que parece sem sentido?
Eliane Giardini, José Mayer. Duração: 16 min. Talvez isto fosse verdade aos 22 anos, mas parece
Sátira sobre as relações de opressão entre homens improvável depois...
e mulheres. Você também pode encontrar este
curta no site: http://vimeo.com/5859490. Acesso: FILME DESTAQUE
janeiro/2016.
AS SUFRAGISTAS (Suffragette)
25 DE JULHO – O FEMINISMO NEGRO
CONTADO EM PRIMEIRA PESSOA (Brasil, FICHA TÉCNICA:
2013). Direção: Avelino Regicida. Duração: 62 min. Direção: Sarah Gavron
O documentário aborda sobre o desconhecimento da Elenco: Carey Mulligan,
data e sobre o Feminismo Negro. Discute racismo e Helena Bonham Carter
machismo, e aborda a invisibilidade do dia 25 de Meryl Streep
julho, em que se comemora o Dia da Mulher Afro- Duração: 106 min.
-Latino-Americana e Caribenha, que foi criado em (Reino Unido, 2015).
1992, após o I Encontro de Mulheres Afro-Latino-
Americanas e Afro-Caribenhas. O filme se passa no início
do século XX e trata da luta
INTERNET das mulheres britânicas pelo
direito ao voto. Depois de
REDE MULHER: http://www.redemulher.org.br décadas de manifestações
Segundo as organizadoras, a Rede Mulher de pacíficas, um grupo de mili-
Educação é uma organização não governamental tantes decide organizar atos de insurgência, para chamar
a atenção da população e dos parlamentares. Uma de suas
novas líderes surge ao se engajar e adquirir formação po-
lítica no próprio movimento pela igualdade de direitos.

357Capítulo 22 - “Lugar de mulher é ondCeapeíltaulqou1i9se-r?“C”Rhelgaoçuõeoscdaevegiêrãnoe!r”oEeadgoomrain?aVçiãoolêmncaiasceuldineasingouamlduanddeosdseochioajies

Aprendendo com jogos

O resgate da princesa escrito ou filmado (até por um
celular! Isso normalmente é
SALVE A PRINCESA... DO MACHISMO! conhecido como o gameplay
do jogo). Após todas e todos
Divulgação do grupo jogarem, discutam
nos grupos os diferentes pa-
Divulgação péis dos personagens do jogo e
como a imagem da mulher frá-
Jogos em que você assume o papel de um príncipe Divulgação gil que precisa ser salva é apre-
e o seu objetivo é salvar a princesa da bruxa ou do sentada. Respondam questões
dragão são muito comuns. Mas você não irá encontrar como: quais os pressupostos
com facilidade na história dos contos de fadas uma sobre as identidades sociais de
princesa que não queira ser resgatada – simplesmente gênero nos quais esses jogos se
porque a vontade dela parece não importar! Aqui o baseiam? Quais outros estere-
nosso objetivo será precisamente este: desconstruir ótipos encontramos nos games
noções preconceituosas relacionadas a gênero nos indicados? Como as histórias
jogos tipo “resgate a princesa”. Divulgação narradas nesses jogos pode-
Como jogar: riam ser diferentes, no que diz
1. Organize-se em quatro grupos com os seus respeito às identidades de gênero?
colegas de sala. Cada grupo jogará um dos games
online gratuitos apresentados acima. Todos os 3. Reconte o conto! Narre o jogo por meio de
participantes dos grupos devem ter a experiência do um conto, de quadrinhos, de uma peça teatral
jogo. Você acessa os jogos nos endereços: dramatizando a narrativa do game ou, também,
a) http://goo.gl/98qtGB através de uma exposição crítica de diversas
b) http://goo.gl/aNqKW5 fontes como jornais, revistas ou internet (blogs,
c) http://goo.gl/U6LeJo redes sociais, sites de jornais etc.) que apresentem
d) http://goo.gl/RkKHNv a mesma visão sobre gênero que o jogo pretende
2. Cada grupo produzirá um relato das experiências questionar.
dos jogadores em relação ao jogo, que pode ser por
4. Reconstrua a narrativa do jogo, de modo que se
358 Unidade 3 - Relações Sociais Contemporâneas incluam elementos críticos à visão sobre gênero
disseminada no jogo (por exemplo, um final
surpreendente onde se descobre que a princesa não
precisa nem deseja ser salva ou eventos no jogo
que ensinem ao jogador sobre os estereótipos do
personagem principal, o herói ou, ainda, a inversão
dos papéis e até a inclusão de outras identidades de
gênero na dinâmica do game).

5. As apresentações dos grupos terão de 5 a 15
minutos para exposição de suas ideias e ao final
da atividade o (a) professor (a) poderá colocar a
turma em círculo e discutir com os alunos o que
aprendemos com os jogos sugeridos.

Capítulo 23

“Cada um sabe a dor e a delícia de
ser o que é.” Debatendo a diversidade
sexual e de gênero

PRIMEIRO CASAL HOMOSSEXUAL A ADOTAR CRIANÇA NO PAÍS FALA SOBRE DIA DOS PAIS
Marcos Lavezo - G1 Rio Preto e Araçatuba/SP 12/08/2012

Todo o Dia dos Pais é uma data que se comemora em dobro para a pequena Theodora Carvalho
da Gama, de 11 anos, que mora em Catanduva (SP). Primeira criança adotada legalmente por um casal
homossexual masculino no Brasil, a criança tem neste segundo domingo de agosto uma data especial,
em que se comemora o fato de ser uma das poucas meninas criadas por dois pais no Brasil.

Mais do que Theodora, quem comemora muito este dia é o casal Dorival Pereira de Carvalho
Júnior e Vasco Pedro da Gama Filho. Eles, que estão juntos há mais de 20 anos, brigaram até o fim na
Justiça para conseguir a guarda legal da menina. “Esperamos bastante para conseguir a adoção, para
que tudo desse certo. Então o Dia dos Pais é uma data muito bonita e importante para nós, representa
a realização de um sonho”, afirma Vasco.

A adoção de Theodora foi no final de 2005. Na época a menina tinha 4 anos. Ela não tem o
sobrenome da mãe na certidão, mas de dois pais. (...) “Ficamos quase seis anos na luta para adotar. O juiz
não autorizou na primeira vez. Depois entramos com o pedido novamente e embasado na área psicossocial
o juiz foi favorável. Agora aproveitamos o Dia dos Pais para nos divertir e curtir a nossa família”, diz Vasco.

Para não ter ciúmes no Dia dos Pais, na escola, Theodora sempre faz dois presentes, um para
cada pai. No Dia das Mães quem ganha atenção e carinho são as tias do casal. “Até na escola ela já
aprende que no Dia dos Pais ela tem de fazer duas lembranças. Se ela der presente para um pai só,
sai briga”, brinca Vasco.

Passada toda a “guerra” para conseguir a adoção, o casal afirma que o resto foi fácil. Mesmo
sendo pais de primeira viagem, eles afirmam que não tiveram dificuldade para cuidar da menina. “Não
tivemos problemas, mas sempre tinha aquele medo de saber se estamos fazendo a coisa certa na hora
de educar ou cuidar dela. Mas nós dois tivemos uma boa educação e nossas famílias também ajudam
na hora de cuidar”, explica Vasco, que é cabeleireiro.

Theodora surgiu na vida deles em uma visita a uma instituição de crianças carentes do município.
“Eu me apaixonei por ela ali. Eu bati uma foto dela escondido e cheguei em casa falando para o Júnior
que tinha uma menina que era a nossa cara”, conta.

Na escola, o preconceito passa longe de Theodora. Na verdade, os amigos até ficam com inveja
dela por ter dois pais. “Eu tenho orgulho deles. Acho bacana ter uma família diferente. Gosto muito de
beijar, abraçar e andar de bicicleta com eles. Eu e o Vasco fazemos a maior festa. Os meus amigos
falam que também queriam ter dois pais”, diz a menina.

Em Catanduva, o casal também não sofreu com o preconceito por tentar adotar uma criança.
Na verdade, eles tiveram apoio da maioria dos moradores. “A cidade abraçou a causa. Todas as
idades, de todos os sexos, adolescentes, senhoras. Todos nos cumprimentaram pela ação”, diz.

Depois de brigar na justiça por tanto tempo e enfrentar o preconceito por parte da sociedade,
o maior presente do Dia dos Pais, para Vasco e Dorival, é a pequena Theodora.

(Publicado pelo canal de notícias G 1. Disponível em: http://goo.gl/FEUxZi Acesso: janeiro/2016.)

359Capítulo 23 - “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é.”Debatendo a diversidade sexual e de gênero

Há alguns anos, seria impossível ler um Ellyo Teixeira/G1 Essas transformações têm sido acompa-
nhadas também por muita reação conservadora,
relato como esse. No que diz respeito a gênero Reprodução: www.baciadasalmas.com de pessoas, grupos e instituições que trabalham
e sexualidade, nossa sociedade tem mudado para que as coisas continuem sendo (ou
bastante nas últimas décadas. A experiência de melhor, voltem a ser) como eram antes. Foi
ser mulher hoje é muito diferente do que foi assim também quando o Brasil aprovou o voto
ser mulher no tempo das nossas mães e das feminino (1932) e a Lei do Divórcio (1977).
nossas avós. Ser homem também não é mais
a mesma coisa que era no início do século Manifestante exibe cartazes contra o casamento entre pessoas do
XX. Essas mudanças nas relações de gênero mesmo sexo. Brasil, 2015.
transformaram a forma como as pessoas vivem
o afeto, o sexo, o casamento, a experiência de Hoje parece absurdo que alguém seja
ter e criar filhos e filhas, as relações familiares. contra um casamento entre duas pessoas
Muitos jeitos de amar, de se relacionar, de fazer simplesmente porque elas têm cores de pele
sexo e de formar uma família, que já existiam diferentes. Como você acha que serão vistas
antes, mas eram discriminados, proibidos ou daqui a 50 anos as pessoas que hoje protestam
simplesmente não se falava deles, ganharam contra o reconhecimento do casamento entre
visibilidade nos últimos anos. pessoas do mesmo sexo?

Visibilidade significa que alguma Hoje conservadores defendem que existe
coisa sobre a qual não se falava, que um modelo (se não único, bastante restrito)
nós mesmos nem percebíamos, ou que de ser homem e de ser mulher – e que isso
propositalmente fingíamos que não exis- é um destino biológico – que casamento,
tia, passa a ser enxergada, vista e dis- adoção e reconhecimento como família são
cutida por todas as pessoas. As Paradas direitos apenas para heterossexuais e que é a
do Orgulho, por exemplo, foram uma heterossexualidade a única orientação sexual
estratégia que gays, lésbicas, bissexuais que deve ser visibilizada e valorizada. De outro
e pessoas trans criaram para dar visibi- lado, há quem defenda que qualquer pessoa
lidade a formas de ser, amar e se rela- tenha liberdade para amar e se relacionar
cionar que já existiam, mas que estavam segundo o seu desejo – e não sob uma imposição
condenadas ao silêncio: não se podia social. Que há muitos jeitos de ser e de viver
falar de homossexualidade no almoço e que nenhuma pessoa deve ser obrigada a se
de família, não existiam casais do mes- comportar ou se identificar segundo modelos
mo sexo na televisão e ninguém sabia o pré-estabelecidos.
que era transexualidade. Hoje esses são
assuntos que a gente discute na hora da E você? O que você pensa sobre isso? Você
novela, no facebook e na sala de aula. já teve oportunidade de discutir sobre identidade

“Parem a mistura de raças”, dizem os cartazes de manifestantes
americanos que protestavam contra o casamento entre brancos e

negros nos Estados Unidos, nos anos 1950.

360 Unidade 3 - Relações Sociais Contemporâneas

de gênero e orientação sexual em casa, na enxoval, que é mais rosa ou mais azul; já tem
escola ou no grupo de amigos? Muito do que expectativas de vida da família sobre ela, que
a gente sabe ou escuta sobre sexualidade tem a tem a ver com como essa família entende que
ver com religião ou Biologia. Que tal conhecer um homem ou uma mulher deva viver dentro
um pouco sobre o que as Ciências Sociais dessa determinada sociedade. Não há nada na
falam sobre esse tema? Neste capítulo vamos genética do cabelo da mulher que diga que ele
aprender alguns conceitos, conhecer histórias é mais propenso a ficar comprido do que o do
e compartilhar experiências que nos ajudem a homem. Não há nada no formato do quadril de
ter uma compreensão mais consistente sobre o um homem que o impeça de usar uma saia. Se
assunto. essas convenções existem, elas foram social,
cultural e historicamente construídas.
Sexo e gênero
Portanto, ainda que, como seres humanos,
Vamos rever o que você estudou no compartilhemos determinadas características
capítulo anterior: qual a diferença entre físicas, as concepções de masculino e feminino
sexo e gênero? Sexo é tudo aquilo que está mudam de cultura para cultura, de grupo para
relacionado às características físicas de um ser grupo e se transformam ao longo do tempo
humano. O órgão sexual, o genoma, o formato dentro do mesmo espaço social. O significado
do corpo, enfim, tudo aquilo que é característica de ser homem ou mulher numa grande cidade
relacionada diretamente à materialidade do Brasil no início do século XXI é diferente
corpórea. Assim, teríamos pessoas do sexo do que significa ser homem ou mulher numa
masculino, do sexo feminino e pessoas grande cidade do Irã ou numa vila pequena
intersexuais, que possuem características físicas no interior da China, nessa mesma época. E
de ambos. Para sermos ainda mais precisos: também bastante diferente do que significava
de um ponto de vista estritamente biológico ser homem ou mulher aqui no início do século
teríamos de falar em macho e fêmea, porque os passado ou antes de 1500.
termos masculino e feminino já nos remetem
às representações socialmente elaboradas, E você? O que significa ser mulher
agregando a esses termos características de para você? E ser homem? E o que justifica
comportamento e papéis sociais que nada essas diferenças? A Biologia? O instinto?
têm a ver com os caracteres anatômicos e Ou a cultura?
fisiológicos. E gênero? O conceito de gênero,
por outro lado, tem a ver com a cultura e com Identidade de gênero
como os sujeitos reinterpretam expectativas
socialmente elaboradas, correspondendo Mesmo no nosso tempo e na nossa cultura
mesmo a um espaço de negociação de sentidos hoje, as pessoas têm concepções diferentes de
em articulação sempre tensa entre interesses como são (ou deveriam ser) homens e mulheres.
conflitantes. Ao invés de explicar as diferenças Dependendo da origem familiar, da religião, da
entre homens e mulheres pela anatomia, pelos idade, da filosofia de vida, do contexto cultural,
hormônios ou pela genética, esse conceito fala das experiências que já viveram, as pessoas vão
sobre como essas diferenças são produzidas nas construindo formas diferentes de viver o gênero
relações sociais. E por serem as identidades de e de construir sua identidade de gênero.
gênero elaborações de relações sociais, estão
inseridas em hierarquias e classificações ou, Identidade de gênero é como você se
numa expressão, em relações de poder. relaciona com o masculino e o feminino no seu
contexto cultural. Para as Ciências Sociais, não
Entre um bebê humano do sexo masculino há, necessariamente, uma linha direta entre o sexo
e um homem, na forma dominante como a biológico e o comportamento de gênero porque
nossa sociedade concebe um homem – no seu as práticas afetivas e sexuais não decorrem por
jeito de ser, de falar, de andar, de vestir, de obrigação do sexo biológico. O jeito de agir
agir – há uma grande distância. Antes mesmo e de se relacionar de homens e mulheres (e a
de uma criança nascer ela já tem um nome, própria divisão binária dos gêneros) não é algo
que é masculino ou feminino; já tem um natural, que já vem programado na genética,

361Capítulo 23 - “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é.”Debatendo a diversidade sexual e de gênero

mas é fruto de uma norma social que estabelece ensinado a todo momento, em praticamente
modelos de masculinidade e de feminilidade a todos os espaços sociais. E todas as práticas
serem seguidos. Essa norma não está escrita em sexuais e formas de relacionamento que fogem
nenhuma lei – no Brasil não há nenhuma lei que do modelo heterossexual vão sofrer algum tipo
diga como homens ou mulheres devem sentar, de discriminação.
vestir, falar, trabalhar (embora nossa legislação
seja marcada por questões de gênero). Mas essa A combinação dessas duas normas, uma
norma é ensinada e aprendida a todo momento, que divide as pessoas em homens e mulheres
nos programas de TV, nas postagens nas redes com modelos de comportamento pré-definidos
sociais, no cinema, no espaço de trabalho, no e outra que toma a heterossexualidade
culto religioso, na escola. compulsória a todas as pessoas, é que chamamos
de heteronormatividade.
Portanto, embora não exista uma norma
legal, existe uma forte norma social que impinge Heteronormatividade é a norma so-
às pessoas um determinado comportamento de cial que hoje ainda regula a maior parte
gênero. Ás pessoas que seguem em boa parte das relações de gênero e sexualidade na
essa norma, nós chamamos de cisgênero. nossa sociedade. Essa norma funciona a
Às pessoas que transgridem essa norma, nós partir de alguns pressupostos: 1. os se-
chamamos de transgênero. res humanos são divididos em sexo mas-
culino e sexo feminino, 2. a cada sexo
Pessoas trans são pessoas que não corresponderia um comportamento de
se identificam com o modelo de compor- gênero e uma prática social diferenciada,
tamento de gênero que boa parte da so- oposta e complementar, 3. A heterosse-
ciedade espera delas. Pessoas que cons- xualidade é a única orientação possível,
troem uma identidade de gênero radical- natural e compulsória para todas as pes-
mente diferente da que lhes impingiram soas, 4. Pela heterossexualidade compul-
no nascimento. São homens e mulheres sória o esquema binário masculino/femi-
trans, travestis, transexuais e pessoas que nino se completa e o modelo se reproduz,
transitam pelos gêneros ou não querem confundindo-se gênero e sexualidade.
se definir como masculino ou feminino.
Nossa tradição cultural sexista e machista
Orientação sexual faz com que muitas pessoas confundam o desejo
por alguém do mesmo sexo com a vontade de
Outro conceito fundamental do conheci- pertencer a outro gênero. Se um homem tem
mento sociológico que estamos apresentando modos de se comportar que identificamos como
aqui é a orientação sexual e afetiva. Esse con- feminino, boa parte das pessoas imagina que
ceito tem a ver com por quem você se apaixona, ele seja gay. Ao contrário, homens que mantém
por quem você sente atração sexual, com quem relações sexuais com outros homens como
você quer transar e se relacionar. Embora geral- ativos e se mantém no estereótipo masculino,
mente se classifique as orientações sexuais em muitas vezes não vão se reconhecer como
homo, hetero e bissexual, o desejo e o afeto são homossexuais. Nessa discussão, é importante
mais complexos e envolvem outras dimensões não confundir identidade de gênero com
para além de sexo e gênero, de forma que há orientação sexual. A primeira diz respeito
muitas (certamente mais que três) formas de vi- a como eu me entendo, me identifico como
ver a sua sexualidade. sujeito nesse mundo dividido em masculino e
feminino. A outra tem a ver com a direção do
Não há no Brasil nenhuma lei que estabeleça meu desejo por outras pessoas. Portanto, do
a heterossexualidade como orientação sexual a mesmo modo que entre as pessoas cisgênero
ser seguida, praticada ou ensinada. Mas, como (não trans) há hetero, bi e homossexuais, as
nos modelos de gênero, existe uma forte pressão pessoas trans também podem ter variadas
social para que as pessoas sejam heterossexuais. orientações sexuais, sem deixar de ser trans por
Esse é o modelo de relacionamento exibido e causa disso.

362 Unidade 3 - Relações Sociais Contemporâneas

Transfobia e homofobia que acontece em relação ao racismo contra
negros, pois é comum atribuir os preconceitos
Se nos últimos anos pessoas trans, homo aos outros, sem reconhecer o próprio.
e bissexuais ganharam visibilidade, também fi-
cou mais evidente a violência dirigida a pessoas Para Gustavo Venturi (2009), professor
que vivem relacionamentos e práticas sexuais de Sociologia da USP, a pesquisa indica o
não heterossexuais e/ou que transgridam deter- que os sociólogos já suspeitavam: por trás da
minadas normas de comportamento de gênero. imagem de liberalidade que o senso comum
Quando o foco da discriminação é a orienta- atribui ao povo brasileiro, particularmente em
ção sexual – real ou presumida – chamamos de questões comportamentais e de sexualidade, há
homofobia. Quando o foco é a identidade de graus de intolerância com a diversidade sexual
gênero e o alvo são pessoas trans, o nome que bastante elevados – coerentes, na verdade,
damos é transfobia. com o grande número de crimes homofóbicos
existentes no Brasil.
Homofobia é a discriminação ou
violência contra pessoas por conta de A homofobia e a transfobia se materializam
sua orientação sexual homossexual, real de muitas maneiras. A invisibilidade, quando
ou presumida. Não permitir que um casal se age como se estas pessoas não existissem
de mulheres adote uma criança pelo fato ou não devessem ser vistas – a ausência de
de serem lésbicas é homofobia. Fazer personagens homossexuais e de demonstrações
piadas e comentários ofensivos a pessoas de seu afeto na televisão ou a falta de políticas
homossexuais, também. públicas de saúde para homens trans são alguns
exemplos. A estigmatização, que alimenta
Transfobia é a discriminação dirigida preconceitos contra essas pessoas (como
a pessoas em razão de sua identidade de doentes, perversas, imorais ou perigosas). A
gênero. Não reconhecer a identidade de discriminação no acesso a direitos civis (como a
gênero de uma pessoa trans ou dispensá- liberdade de expressão, o reconhecimento legal
-la de um processo de seleção para o do casamento, a adoção ou o reconhecimento
emprego por conta de sua identidade são da sua identidade de gênero) e sociais (como
formas de transfobia. se matricular e ser respeitado na escola e não
ser excluído de oportunidades de trabalho). A
A pesquisa “Diversidade Sexual e violência física e psicológica, que pode levar,
Homofobia no Brasil, Intolerância e Respeito em alguns casos, até mesmo à morte.
às Diferenças Sexuais”, realizada em 2008 pela
Fundação Perseu Abramo, em parceria com a Carlos Ruas
fundação alemã Rosa Luxemburg Stiftung,
(VENTURI, 2009) investigou as percepções
sobre as práticas sociais diante da orientação
sexual e da identidade de gênero das pessoas.
Perguntados sobre a existência ou não de
preconceito contra as pessoas gays, lésbicas,
bissexuais e trans no Brasil, quase a totalidade
entrevistada respondeu acreditar que existe
preconceito contra travestis (93%), contra
transexuais (91%), contra gays (92%), contra
lésbicas (92%) e 90% acham que há preconceito
contra bissexuais. Porém, perguntados se
são preconceituosos, apenas 29% admitiram
ter preconceito contra travestis, 28% contra
transexuais, 27% contra lésbicas e bissexuais
e 26% contra gays. Isso lembra um fenômeno

363Capítulo 23 - “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é.”Debatendo a diversidade sexual e de gênero

A seguir você encontra um mapa sobre e a violência homo e transfóbica acontecem
violência transfóbica que mostra casos em vários espaços: na família, na comunidade,
conhecidos de assassinatos de pessoas trans, no trabalho e também na escola. E você? Já
em razão da sua identidade de gênero, no ano presenciou ou sofreu alguma discriminação
de 2014. No mapa o Brasil aparece em primeiro ou violência homo/transfóbica? Você mesmo
lugar com o número mais alto de homicídios já discriminou ou agrediu alguém por sua
de pessoas trans. Apesar de não contar identidade de gênero ou orientação sexual?
com dados oficiais e mesmo considerando a
subnotificação ou a simples ausência de dados Essa violência é alimentada por uma
de países que criminalizam práticas que fujam série de preconceitos que estigmatizam
da heteronormatividade, o levantamento dá homossexuais, bissexuais e pessoas trans. Um
uma ideia de como o Brasil é um país perigoso desses estigmas é de que a homossexualidade
para pessoas trans, especialmente se comparado e a transexualidade são doenças. Esta ideia
a outros países semelhantes, como México, remonta à ascensão da Ciência, em especial da
Argentina ou Índia. Medicina no século XIX. É a Psiquiatria quem
vai começar a patologizar, ou seja, caracterizar
Segundo o Relatório sobre Violência como doença comportamentos que antes eram
Homofóbica no Brasil, produzido pelo governo tratados como desvios no campo da moral e da
brasileiro em 2011, foram citadas ao poder religião. O que era pecado ou imoral passa a
público federal 6.809 denúncias de violações ser visto como transtorno mental, e quem antes
de direitos humanos de caráter homofóbico, era considerado pecador passa a ser tratado
o que significa uma taxa de 3,46 denúncias como um doente que precisa de tratamento.
efetuadas a cada 100 mil habitantes. Há várias É nessa época, inclusive, que surge a palavra
pesquisas que mostram como a discriminação
homossexualismo.

Reprodução: tgeu.org

Monitoramento de homicídios de trans realizado pela Transgender Europe (atualização 2014): 1.509 casos reportados de assassinatos de pessoas
trans entre janeiro de 2008 e março de 2014. Na legenda: número de assassinatos de pessoas trans comunicados.

364 Unidade 3 - Relações Sociais Contemporâneas

“(...) O sufixo ISMO é de origem grega ções de masculinidade e feminilidade disponí-
e carrega dois sentidos principais: a ideia veis na cultura. Um direito que, reivindicam,
de uma doutrina, seita ou conjunto de não deve estar subjulgado a um diagnóstico
ideias (Cristianismo, Judaísmo, Marxismo) psiquiátrico.
ou a ideia de doença (tabagismo,
alcoolismo, botulismo). Já o sufixo DADE Mas essa realidade já está mudando.
traz um sentido de expressão, manifestação Em 2010, a França foi o primeiro país a
humana (identidade, felicidade, espon- deixar de considerar a transexualidade como
taneidade, sexualidade). Assim, o termo transtorno mental. Em 2012, a Associação
homossexualismo carrega uma ideia Americana de Psiquiatria revisou a forma
conservadora que enxerga os homossexuais como a transexualidade aparece no seu Manual
como doentes ou desviantes. Já a palavra Diagnóstico e Estatístico de Transtornos
homossexualidade nos remete à ideia Mentais. E já há indicativos de que a própria
de que ela é apenas mais uma expressão OMS - Organização Mundial de Saúde reveja
da sexualidade ou da identidade humana. essa classificação na próxima revisão de sua
O termo homossexualismo foi criado no Classificação Internacional de Doenças (CID).
final do século XIX por médicos, como a
classificação de uma doença. Nas últimas Identidade de gênero e
décadas do século XX, os códigos de orientação sexual através dos
doenças retiraram a homossexualidade tempos e das culturas
de suas classificações e, em 1990, a
Organização Mundial de Saúde aboliu a A humanidade, ao longo da história e em
homossexualidade como doença de todas diferentes culturas, criou modos diferentes de
as suas listas. Além disso, em 2001 o lidar com o gênero e a sexualidade. Dependendo
Conselho Federal de Psicologia do Brasil do momento histórico e da sociedade que se
proibiu profissionais da área de realizarem olha, encontramos culturas que lidavam de
qualquer tratamento que vise uma possível maneira mais restritiva ou mais flexível com
“cura” da homossexualidade. O que não é relação à orientação sexual e à possibilidade
doença não precisa ser curada.” de transitar entre os gêneros. Apesar destes
temas parecerem novos, há registros de práticas
(BORTOLINI, 2012, p. 3. Grifos dos autores) homossexuais ou de experiências trans (usando
palavras de hoje para falar do passado) desde a
A transexualidade, no entanto, ainda é Antiguidade. São bastante conhecidos os relatos
bastante patologizada. Para que uma pessoa de relacionamentos e práticas homossexuais na
possa fazer uma cirurgia de transgenitalização GréciaAntiga e no Império Romano. NaAmérica
no Brasil, por exemplo, é preciso a aprovação do Sul, há registro de práticas homossexuais
de um grupo de profissionais de saúde. E ainda socialmente aceitas entre os tupinambás. Os
constam no Código Internacional de Doenças tibira e as çacoaimbeguira (palavras de origem
transtornos ligados à uma incompatibilidade Tupi) eram homens e mulheres que mantinham
entre o sexo biológico e a identidade de gêne- relações com pessoas do mesmo sexo, sem,
ro. Para muitos pesquisadores e pesquisadoras, necessariamente, assumirem o lugar social do
principalmente das Ciências Humanas, a expe- outro gênero (MOTT, 1992).
riência de viver um gênero diferente daquele
designado no nascimento não tem relação com Já entre povos indígenas norte-americanos
qualquer transtorno mental, mas é uma expe- encontramos modos próprios de lidar com o
riência de identidade. Uma das lutas hoje dos que hoje chamaríamos de experiências trans.
movimentos sociais que reúnem pessoas trans Os yuman acreditavam em uma “mudança de
é para que a experiência trans deixe de ser tra- espírito” que podia acontecer na puberdade.
tada como uma questão médica e passe a ser Depois de sonharem serem mulheres, jovens
encarada como direito. O conceito de identida- homens passavam a adotar um comportamento
de de gênero permite que se possa reconhecer feminino e eram então chamados de elxa. As
o direito de cada pessoa à livre construção da mulheres que passavam pelo mesmo processo
sua personalidade na relação com as concep- recebiam o nome de kwe’rhame. Ambos passam

365Capítulo 23 - “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é.”Debatendo a diversidade sexual e de gênero

a assumir na comunidade o lugar do seu novo www.cristanwilliams.comlésbicas e gays enfrentaram os policiais que
gênero e não mais do que lhes foi atribuído no sistematicamente os extorquiam, agrediam e
nascimento (GREEN, 1998). www.cristanwilliams.comrealizavam prisões arbitrárias nos bares que
frequentavam, como o Stonewall Inn – onde a
Os séculos que se seguiram à chegada de www.cristanwilliams.comrevolta começou e que acabou dando nome ao
europeus na América foram de severa repressão episódio.
a práticas que eram consideradas imorais ou
pecaminosas para os colonizadores cristãos. A (...) Uma explosão de raiva e frustração
dominação colonial trouxe consigo a imposição prolongou-se por dois dias e duas noites,
de uma moral judaico-cristã, que estabelecia numa dimensão nunca antes vista. Daí
uma hierarquia de gênero com lugares e em diante, o “orgulho de ser gay e
comportamentos muito definidos para homens lésbica” tornou-se, além de uma palavra
e mulheres, enxergava o sexo e o prazer como de ordem, o ponto de partida na luta
pecado e condenava qualquer prática sexual que contra a discriminação, o preconceito e a
não fosse voltada exclusivamente à reprodução. intolerância social contra os homossexuais.
Essa moral judaico-cristã vai ser levada também
a outros lugares do mundo colonizados pela (MELLO, 2005, p. 199)
Europa, na África, na Ásia e na Oceania.
Imagens históricas da revolta de Stonewall, em Nova York, EUA, 1969.
A expansão do Islamismo, que também
traz discursos de condenação de práticas ho-
mossexuais, vai colaborar também para a dis-
seminação de uma cultura de repressão sexual
e de gênero, especialmente no Oriente Médio e
na África.

A isso se soma o discurso médico que, no
século XIX, vai categorizar como doença prá-
ticas fora do que a moral da época considerava
normais.

Todo esse histórico faz com que cheguemos
ao início do século XX com a homossexualidade
sendo criminalizada e/ou perseguida em
quase todo o mundo. Mas, apesar de toda esta
repressão, pessoas continuaram fazendo sexo e
se relacionando com outras do mesmo gênero e
transitando entre o masculino e o feminino (ou
rompendo com essas polaridades do masculino
e do feminino). E, a partir da segunda metade
do século passado, esses sujeitos vão começar a
ganhar mais visibilidade, construir identidades
coletivas e se organizar para reivindicar direitos.

Nos anos de 1950 e 1960, gays, lésbicas
e trans começaram a formar comunidades
em grandes cidades como Nova York, São
Francisco, Paris, Londres e também na América
Latina (MOTT, 2000). Viviam ali um misto
de tolerância e perseguição: podiam desfrutar
de certa liberdade, mas eram alvo rotineiro
de repressão policial e da ação de grupos
conservadores. Um marco internacional do
movimento por direitos de trans e homossexuais
foram os conflitos ocorridos em Nova York
no final da década de 1960, em que trans,

366 Unidade 3 - Relações Sociais Contemporâneas

A data da Revolta de Stonewall, 28 de Aids marcou violentamente a comunidade
junho de 1969, passou a ser considerada como homossexual, tanto pelo estigma cultural quanto
o “Dia Internacional do Orgulho Gay/Lésbico” pelas mortes concretas de muitas pessoas,
e é comemorada em Paradas do Orgulho em inclusive ativistas e lideranças, por outro ela
muitas cidades do mundo. trouxe uma visibilidade antes nunca alcançada.
Fala-se, na televisão, nos jornais, nas revistas
Movimento social e nos documentos oficiais, sobre como e onde
vivem e circulam os homossexuais, como eles
A despeito de grupos de convivência e fazem sexo, como eles se relacionam – e como
espaços de socialização bem mais antigos, sobrevivem (TREVISAN, 2004).
podemos dizer que um movimento homossexual,
com uma intencionalidade política assim Reprodução
definida, surgiu no Brasil no final da década de
1970 (FACCHINI, 2005, p.88). Essa aparição
tardia – se comparada com países com perfil
semelhante, como México e Argentina, que
viveram esse momento já nos finais dos anos
60 – pode ser justificada talvez pela repressão –
política e moral – imposta pela ditadura militar
brasileira, especialmente a partir de 1968.

Quando o regime militar resolveu evi-
tar uma explosão social ao implementar
um processo de liberalização política lento Exemplares do jornal Lampião da Esquina.
e gradual em meados dos anos 70, alguns
grupos imediatamente se reuniram para
questionar as noções hegemônicas da
homossexualidade, que a consideravam
um comportamento pervertido e doentio.
Embora os grupos que se formaram dos
fins dos anos 70 em diante não evoluíssem
para movimentos de massa, eles conse-
guiram provocar debates nacionais sobre
temas como parceria civil, discriminação e
violência social contra homossexuais.”
(GREEN, 2000, p.454)

Em 1978 foi fundado o “Somos”, em São Já na década de 1990 o movimento volta
Paulo, primeiro grupo que reconhecidamente
tinha os direitos dos homossexuais como a se ampliar. Aumenta o número de grupos,
bandeira. Em 1980 aconteceu o I Encontro
Brasileiro de Homossexuais (Ebho), reunindo a periodicidade dos encontros, muitos deles
mais de seis grupos e seiscentas pessoas. Nessa
época foi fundado, no Rio de Janeiro, um jornal agora acontecendo paralelamente a eventos
voltado para a comunidade homossexual, o
Lampião da Esquina, que funcionou entre 1978 de combate à epidemia de Aids. Para além dos
e 1981 (SALGADO; PIMENTA JR., s/d).
gays, lésbicas, travestis e transexuais começam
Muito pouco tempo depois desse florescer,
o movimento homossexual brasileiro, ainda a ganhar mais visibilidade. Em 1995 acontece
incipiente, vai ser fortemente atingido pela também a primeira marcha reunindo lésbicas,
epidemia da Aids. Mas, se por um lado a gays, bissexuais, travestis e transexuais
(LGBT), no Rio de Janeiro, como finalização
das atividades de um encontro internacional
organizado na cidade. Desde o início, o objetivo
desta e de tantas outras marchas e paradas
realizadas no Brasil foi, em especial, visibilizar

367Capítulo 23 - “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é.”Debatendo a diversidade sexual e de gênero

os sujeitos, denunciar a violência homofóbica e Avener Prado/Folhapress inclusão, segundo alguns especialistas, restrita
defender bandeiras de luta do movimento, como a homossexuais e trans que tenham dinheiro
o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, Fábio Seixo/G1-Extra para pagar.
o reconhecimento da identidade de gênero de
pessoas trans e a criminalização da homofobia. Desde meados da década de noventa,
é possível também encontrar uma presença
Nos anos seguintes, as Paradas vão am- mais marcante e permanente – e talvez numa
pliando seu público e se consolidando como o abordagem menos estereotipada – nos meios
espaço principal de manifestação e visibilidade. de comunicação, especialmente na televisão
(TREVISAN, 2004, p. 375). Personagens
Mas é nos primeiros anos do século XXI homossexuais, bissexuais e trans nas novelas
que elas ganham uma expressão que ultrapassa, e programas de TV, aparecendo não como
no caso de Rio e especialmente de São Paulo, a motivo de piada, pena ou condenação, tiveram
cifra de um milhão de pessoas. Hoje as paradas importante impacto no debate público sobre
não se restringem mais ao centros das grandes orientação sexual e identidade de gênero.
cidades e acontecem em pequenas cidades no
interior e nas periferias dos centros urbanos. Hoje a internet está repleta de conteúdos
que discutem abertamente essas questões e
Parada LGBT de São Paulo, que já reuniu até 3 milhões de pessoas, esses são temas de debate acalorado nas redes
em 2013. sociais.

Parada LGBT do Orgulho na Favela da Maré, no Rio de Janeiro, em Essas mudanças parecem ter produzido
2013. resultados nas políticas públicas e muitos
governos têm investido em ações (ainda que
Essa visibilidade vai se expressar também tímidas) para o combate à discriminação e o
na expansão de um mercado de consumo reconhecimento e valorização das diferenças.
específico – agências de turismo, hotéis,
revistas, bares, boates, lojas e marcas. Uma Já no que se refere ao Poder Legislativo,
apesar de já terem sido eleitos dois deputados
368 Unidade 3 - Relações Sociais Contemporâneas federais abertamente homossexuais, até hoje
não se conseguiu aprovar nenhuma legislação
que trate especificamente da questão da
orientação sexual ou da identidade de gênero.
Em compensação, vários estados e municípios
criaram leis que protegem contra a discriminação
homofóbica e transfóbica.

Mas é no Judiciário que residem os maiores
avanços. No dia 05 de maio de 2011, o Supremo
Tribunal Federal (STF), ao julgar ações
ajuizadas pela Procuradoria-Geral da República,
acolheu uma das reivindicações históricas do
movimento: o reconhecimento legal da união
estável de casais do mesmo sexo. Algum
tempo depois, o Supremo Tribunal de Justiça
abriu caminho para que casais homossexuais
pudessem finalmente ter direito ao casamento
civil. Com essa medida, o Brasil se equiparou
a outros países que já haviam regulamentado
as uniões homoafetivas, como grande parte da
Europa, a Argentina e o Uruguai (ver BIMBI,
2013). Nos EUA, o reconhecimento legal do
casamento civil entre pessoas do mesmo sexo
foi aprovado pelo Judiciário americano em 26
de junho de 2015, com grande impacto nas
redes sociais e nos meios de comunicação.

Tatiana Fortes/O Povo

Casamento
coletivo realizado
em Fortaleza, em
junho de 2014.

É também na Justiça que pessoas trans têm Reprodução do Facebook
conseguido a mudança do nome e do sexo no
registro civil. Não há hoje nenhuma lei federal Reprodução/Casanuvem.com Amanda Palha, travesti, classificada em primeiro lugar para Serviço
que regule o reconhecimento da identidade Social na Universidade Federal de Pernambuco, em 2016.
de gênero de pessoas trans e que lhes permita
a alteração do pré-nome de registro de forma NOME SOCIAL
simples e ágil. Sendo assim, buscam-se No processo de construção de sua
estratégias para que o nome e o gênero pelos identidade de gênero, pessoas trans
quais elas se identificam sejam reconhecidos, em geral assumem um nome social,
inclusive nas escolas. No Exame Nacional que vem substituir, nas suas relações, o
do Ensino Médio (ENEM), por exemplo, já nome de registro civil. A assunção deste
é possível para pessoas trans se inscreverem nome social não é mero detalhe, mas,
e serem tratadas pelo seu nome social. O pelo contrário, está intimamente ligada
Ministério da Educação já recomenda que à afirmação de sua identidade. Quando
todas as escolas e universidades reconheçam a uma instituição, uma empresa ou alguém
identidade de gênero de pessoas trans. não se dirige a essas pessoas utilizando
o nome social que reflete sua identidade
PREPARANEM, grupo de militantes formaram um curso de gênero, nega--lhes o reconhecimento
preparatório para o ENEM voltado a pessoas trans. de sua própria identidade, contribuindo
inclusive para torná-las mais vulneráveis
a situações de violência e discriminação.

(BRASIL, 2015)

369Capítulo 23 - “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é.”Debatendo a diversidade sexual e de gênero

Mesmo com todos essas transformações, a violências e humilhações cotidianas. (...) A
discriminação e a violência contra pessoas trans violência contra a população homossexual se
e homossexuais segue se repetindo no Brasil e ancora no entendimento de que existem formas
no mundo. Em 2015, o número de países que corretas de amar e se relacionar com outras
criminalizam a homofobia chegava a 78. A pessoas, enquanto outras seriam desvios que
pena de morte para os homossexuais, por sua marcam os indivíduos negativamente, fazendo
vez, ainda está presente em países como Arábia com que integrem o grupo dos que poderiam
Saudita, Irã, Mauritânia e Iêmen, e em regiões ser violentados e torturados sem que isso gere
da Nigéria e da Somália (cf. MELLO, 2005, p. sobressaltos ou fira a democracia” (BIROLI,
202; MELO, 2015). 2015).

“Trata-se de questões bem concretas, e De outro lado, os direitos civis de
não de um embate entre ideias. Os movimentos homossexuais e trans têm cada vez mais sido
sociais que têm o gênero como parte da sua garantidos em países de todos os continentes.
agenda denunciaram e continuam a denunciar
o fato de que alguns indivíduos, pelas suas Depois de tudo o que você leu, aprendeu e
características, têm menos chances do que discutiu neste capítulo sobre diversidade sexual
outros de ser respeitados e são alvos de e de gênero, qual a sua percepção sobre os
temas que trabalhamos aqui?

DIREITOS DE LéSBICAS E GAYS NO MUNDO Reprodução: ilga.org
ILGA, AsSsSoOcCIAçãOo INnTtEeRrNnACcIOoNnAL dDeE LéSsBbICcASs, GAyYsS, bBIsSsSeExuUAIsS, tTrRAnNsSGénNeErRoOsS eE InNtTeErRsSeExuUAIsS

Groenlândia

Alasca Islândia Maio 2013

Reino Noruega Suécia Finlândia Federação Russa www.ilga.org
Unido 3 entidades Dinamarca Estônia
Canadá
Lituânia Letônia
BélgHicoalaSnudLíaçuxa.ARelpe. mÁTcuhsaetrcniaahHauPngEorsialloôvánqiuaia
Washington Maine Irlanda Bielorrússia Cazaquistão Mongólia
Vermont Nova Hampshire China
Illinois Nova Iorque CoRnhnMoedacestiscIasulctahnudssets Europa: Ucrânia
41 países e Moldávia
Nova Jersey Eslovênia Croácia Romênia
Wisconsin 10 entidades França Bósnia e Herz. Sérvia
Oregon Iowa Bulgária Geórgia
Nevada Portugal Andorra Itália Mont. Kos. Armênia Uzbequistão Quirguistão Coreia
Albania Arim Azerb. do Norte
Espanha Coreia
Washington, D.C. Delaware Turquia Turcomenistão Tajiquistão do Sul
Colorado Maryland Grécia Japão
Califórnia Estados Unidos Gibraltar Malta Chipre Síria
Tunísia Líbano Afeganistão
da América Israel
32 estados Marrocos Gaza Iraque I r ã

19 estados Ilhas Canárias Jordânia Kuwait Paquistão Nepal
Butão
Coahuila Bahamas Argélia Líbia

México Rep. Dominicana Egito Barein Bangladesh Taiwan
10 estados Cuba Ilhas Virgens Catar
Havaí Miamar Laos
A r á b i a E.A.U.
Distrito Federal Jamaica Haiti Porto Rico Mauritânia Saudita Índia Vietnã

Mali Niger Omã
Cabo Verde Sudão
Guatemala Belize São Crist. e Névis Antígua e Barbuda Burkina Chade Eritrea Iêmen Tailândia Filipinas
Honduras São Vincente e Dominica Senegal Fasso Camboja 6 cidades
Granadinas Santa Lúcia Gâmbia Djibuti
Grenada Barbados Guiné-Bissau Benin
El Salvador
Nicarágua Guiné
Trinidad e Tobago

Costa Rica Venezuela Guiana Serra Leoa Gana Nigéria Sudão Etiópia Sri Lanka Palau
Panamá Suriname Costa do Sul Aceh
Colômbia Guiana Francesa
do Marfim Togo Rep. Maldivas Brunei
Libéria Centro-Africana
Camarões Malásia
Somália
Singapura
Guiné Equatorial Uganda
Congo
São Tomé e Príncipe Ruanda Quênia Indonésia
Gabão
Equador República Dem.Burundi

do Congo Seicheles
Tanzania
Peru Sumatra do Sul Nauru

Brasil Timor Leste Papua Nova Ilhas Quiribáti
14 entidades Guiné Salomão
penalização Samoa
Tuvalu Ocidental
pena de moRte Comores
Angola Malauí

5 países e partes da Nigéria e Somália Zâmbia Moçambique Ilhas Cook

apRiSionamento / caStigoS coRpoRaiS Bolívia Vanuatu
71 países e 5 entidades* Paraguai
Zimbábue Maurício Nova Caledônia

Prisão até Namíbia Madagascar Fiji
14 anos
Pena de morte Botsuana Austrália Ilha Norfolk Tonga
Austrália
Prisão entre 14 anos Prisão, sem Suazilândia Ocidental
até prisão perpétua indicação
de duração / Chile Lesoto 8 estados
Impreciso: Legislação banimento
não especificamente Rosario África do Sul Nova Gales do Sul
homofóbica, mas que Iraque:
pode ser utilizada perseguição Argentina Uruguai Reconhecimento Território da
como tal por agentes Buenos Aires Capital da Austrália
não ligados
“Lei da Propaganda”, ao Estado / Reconhecimento de uniõeS entRe peSSoaS do meSmo Sexo Proteção Victoria Nova
que restringe Índia: legislação 31 países e 35 entidades* Zelândia
a liberdade de aguardando Leis anti-discriminação
expressão e decisão do adoção conjunta 65 países e 85 entidades* Tasmânia
associação tribunal 14 países e 38 entidades*
União que substitui o casamento Países com leis que proíbem * Estas leis são dirigidas à lésbicas, homens gays, bissexuais e à atos sexuais e
Casamento igual (ou quase igual ao casamento) a discriminação com base relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo. Por vezes, também se aplicam às pessoas
na orientação sexual trans e intersexo. Esta edição do mapa mundial (Maio de 2013) foi coordenada por Stephen
Adoção conjunta União que substitui o casamento Barris (ILGA). Design: Eduardo Enoki. Os dados representados neste mapa baseiam-se em
com um estatuto claramente Sem legiSlação "Homofobia do Estado, uma pesquisa jurídica sobre criminalização, proteção e reconhecimento
inferior ao casamento do amor do mesmo sexo - 2013", um relatório da ILGA elaborado por Jingshu Zhu & Lucas Paoli
Itaborahy (disponível em www.ilga.org em várias línguas). A ILGA agradece aos grupos que
contribuíram para a atualização anual.

370 Unidade 3 - Relações Sociais Contemporâneas

Interdisciplinaridade

Conversando com a Biologia

Reprodução humana: ampliando perspectivas

Roney Polato

Quando limitamos a abordagem da sexualidade gênero possam vivenciar a experiência de ter filhos/as.
somente à prática sexual e vinculamos a prática sexual ao É preciso discutir, além dos processos biológicos,
objetivo reprodutivo, ignoramos uma série de dimensões
e experiências que vão para além desse modelo restrito. as questões éticas, sociais e culturais envolvidas.
A prática sexual heterossexual monogâmica com objetivo Discutir como casais com diversas orientações sexuais
reprodutivo é apenas uma das possibilidades de vivência e identidades de gênero podem ter filhos/as é uma boa
e prática sexual (nem de longe majoritária). oportunidade de debate.

Em primeiro lugar, é importante pensar que nós não O caso Thomas Beatie
nos reproduzimos simplesmente. Nós temos filhos/as. Thomas Beatie é um homem transexual. Apontado
Esse é um processo que envolve fatores anatômicos e
fisiológicos, mas também culturais, sociais e econômicos. como menina no nascimento, Thomas construiu uma
Um processo em que se colocam em questão muitas identidade masculina. Fez também uma série de
coisas, como saúde, responsabilidades, autonomia, transformações corporais, mas não se submeteu à
vulnerabilidades, ciência e informação. Essa perspectiva cirurgia de transgenitalização. Depois de algum tempo
é fundamental para pensarmos de modo mais crítico e casado, Thomas e sua mulher (cis) decidiram ter um/a
amplo sobre temas como a maternidade e a paternidade, filho/a. A mulher de Thomas, no entanto, havia feito,
a interrupção da gravidez, quando discutimos taxas de quando mais nova, uma histerectomia. Ela não poderia
natalidade e fecundidade, ou a gravidez na adolescência engravidar. Thomas então parou de fazer o tratamento
– só para citar alguns exemplos. hormonal que vinha fazendo, voltou a ovular, foi feita uma
inseminação artificial e ele engravidou. Beatie, que já vivia
Se, por um lado, a reprodução não é o objetivo há cinco anos ao lado de sua esposa Nancy, no Arizona
óbvio nem natural de toda relação sexual, ela também (EUA), ganhou os holofotes da mídia após dar à luz uma
não é apenas uma sequência linear de acontecimentos menina em 2008. As imagens de Thomas, com todo o
(da fecundação ao parto), mas um processo amplo, estereótipo cultural masculino (barba, bigode, cabelos
imerso num complexo de relações humanas, construções curtos, roupas masculinas) exibindo uma enorme barriga
sociais e experiências de vida. de grávido sem dúvida desperta muitas inquietações em
muitas pessoas.
Reproduções
Uma primeira ideia que deve ser problematizada é Pesquise um pouco mais sobre esse caso, leia
matérias na mídia e tente se informar mais sobre os
a de que a maternidade e paternidade só são possíveis procedimentos, tanto do processo transexualizador
para as pessoas heterossexuais. Esse equívoco advém (processo ao qual as pessoas transexuais devem
da ideia de que casais homossexuais não podem – ou se submeter caso desejem realizar a cirurgia de
não querem – ter filhos/as ou constituir famílias porque, transgenitalização), quanto das técnicas de reprodução
em princípio, não poderiam realizar a função biológica assistida e de inseminação artificial. Algumas questões
da reprodução. Mas, ter filhos/as depende da fertilidade que podem ser abordadas são: a) a própria inseminação
das pessoas (fator biológico) e da sua vontade, e não artificial, seus procedimentos e possibilidades; b) o
da orientação sexual (ser heterossexual, bissexual, quanto a ciência e a tecnologia influenciam nossas
homossexual, etc.). Além disso, existem diferentes relações sociais e nossa cultura – inclusive pondo em
maneiras de se ter um/a filho/a (inclusive biologicamente). questão algumas concepções morais; c) o que a história
de Thomas nos ensina sobre sexualidade e reprodução?
Pesquisas médicas e biológicas vêm desenvolvendo,
cada vez mais, diferentes formas de reprodução assistida, Roney Polato de Castro é Licenciado em Ciências
que permitem que pessoas com problemas na produção
de gametas, ou com diferentes formações anatômicas Biológicas (UFJF), mestre e doutor em Educação
e fisiológicas, orientações sexuais ou identidades de
pela UFJF, onde leciona atualmente. Foi professor no

Ensino Fundamental.

371Capítulo 23 - “Cada um sabeCaadpoítrueloa19de- l“íCcihaedgeouseor coaqvueeirãéo.”!”DEebaagtoernad?oVaiodlêivnecrsiaideadessiegxuuaaldlaeddees gsêonciearios

Interatividade

Revendo o capítulo público, pretende-se:

1 – Qual a diferença entre sexo e gênero? E o que (A) contribuir para a invisibilidade do preconceito
significam os conceitos de orientação sexual e ao grupo LGBT.
identidade de gênero?
(B) copiar os modelos educacionais dos EUA e da
2 – De que maneira a homofobia e transfobia se Europa.
materializam?
(C) permitir o acesso desse segmento ao ensino
3 – Faça uma reflexão sobre as transformações que técnico.
aconteceram a partir da metade do século XX e
que garantiram o avanço dos direitos de pessoas (D) criar uma estratégia de proteção e isolamento
trans e homossexuais. do grupo.

Dialogando com a turma (E) promover o respeito à diversidade sexual no
sistema de ensino.
1– Você se considera preconceituoso com relação
a homossexuais e pessoas trans? Que ideias você 2 – (ENEM, 2010)
tem sobre o assunto? De onde você acha que vêm
suas concepções sobre gênero e orientação sexual? “Pecado nefando” era expressão correntemente
Você já viveu algum tipo de discriminação? Quais utilizada pelos inquisidores para a sodomia.
as semelhanças e as diferenças entre o preconceito Nefandus: o que não pode ser dito. A Assembleia de
que você já sofreu e o que atinge homossexuais e clérigos reunida em Salvador, em 1707, considerou
pessoas trans? a sodomia “tão péssimo e horrendo crime”, tão
contrário à lei da natureza, que “era indigno de ser
2– Pesquise em equipe e apresente para a turma nomeado” e, por isso mesmo, nefando.
informações a respeito das batalhas políticas travadas
no país durante o ano de 2015 em relação à chamada O número de homossexuais assassinados no Brasil
“ideologia de gênero” nas escolas, apresentando os bateu o recorde histórico em 2009. De acordo com
argumentos das partes em confronto. Esse embate o Relatório Anual de Assassinato de Homossexuais
ocorreu no município em que você reside? Aproveite (LGBT – Lésbicas, Gays, Bissexuais e Travestis),
para diferenciar o termo “ideologia de gênero” dos nesse ano foram registrados 195 mortos por
conceitos que você aprendeu neste capítulo. motivação homofóbica no país.

Verificando o seu conhecimento A homofobia é a rejeição e menosprezo à orientação
sexual do outro e, muitas vezes, expressa-se sob a
1 – (ENEM, 2010) forma de comportamentos violentos. Os textos
indicam que as condenações públicas, perseguições
A primeira instituição de ensino brasileira que inclui e assassinatos de homossexuais no país estão
disciplinas voltadas ao público LGBT (lésbicas, associadas:
gays, bissexuais e transexuais) abriu inscrições
na semana passada. A grade curricular é inspirada (A) à baixa representatividade política de grupos
em similares dos Estados Unidos da América e da organizados que defendem os direitos de
Europa. Ela atenderá jovens com aulas de expressão cidadania dos homossexuais.
artística, dança e criação de fanzines. É aberta a todo
o público estudantil e tem como principal objetivo (B) à falência da democracia no país, que torna
impedir a evasão escolar de grupos socialmente impeditiva a divulgação de estatísticas relacio-
discriminados. nadas à violência contra homossexuais.

O texto trata de uma política pública de ação (C) à Constituição de 1988, que exclui do tecido
afirmativa voltada ao público LGBT. Com a criação social os homossexuais, além de impedi-los de
de uma instituição de ensino para atender esse exercer seus direitos políticos.

372 Unidade 3 - Relações Sociais Contemporâneas (D) a um passado histórico marcado pela demo-
nização do corpo e por formas recorrentes de
tabus e intolerância.

(E) a uma política eugênica desenvolvida pelo
Estado, justificada a partir dos posicionamentos
de correntes filosófico-científicas.

Pesquisando e refletindo sobre “Diversidade Sexual e Homofobia no Brasil:
Intolerância e respeito às diferenças sexuais”.
LIVROS Expressa em gráficos e tabelas, a pesquisa mostra as
tensas relações de gênero e entre heterossexuais e
MACRAE, Edward. O que é homossexualidade. outras orientações sexuais existentes no Brasil. Um
São Paulo: Brasiliense, 1983. ótimo instrumento para analisar sociologicamente
Neste livro os autores formulam argumentações estas relações. Acesso: janeiro/2016.
científicas para questionar a rígida separação
entre comportamento convencional feminino e GADVS – GRUPO DE ADVOGADOS PELA
masculino, problematizando a moral sexual vigente DIVERSIDADE SEXUAL E DE GÊNERO:
e suas relações de poder. Eles discutem como os http://www.gadvs.com.br/
papéis sexuais e as relações de gênero produzem- Página organizada por advogados que assumem
-se histórica e socialmente, não sendo dados de uma causas em defesa dos direitos da população LGBTI.
natureza biológica universal. Além da legislação, o site apresenta artigos e
livros, notícias diversas e manifestações do grupo.
LEVITHAN, David. Dois garotos se beijando. Rio Informa também onde denunciar a discriminação
de Janeiro: Galera Record, 2015. homofóbica. Acesso: janeiro/2016.
O livro enfoca a diversidade sexual através de
várias histórias e personagens, tendo como prota- MÚSICAS
gonistas jovens que sofrem preconceitos e que são
marginalizados em função da sua orientação sexual. MENINOS E MENINAS – Autores: Renato Russo,
Dado Villa-Lobos, Marcelo Bonfá. Intérpretes:
FILMES Legião Urbana.

BILLY ELLIOT (Reino Unido, 2000). A solidão de quem é desrespeitado apenas por
Direção: Stephen Daldry. Elenco: Jamie Bell, Julie querer viver neste mundo tão complicado, que não
Walters, Gary Lewis. Duração: 111 min. aceita a diferença.
Billy Elliot é um garoto de 11 anos que vive numa
pequena cidade do interior da Inglaterra. O pai o PAULA E BEBETO – Autores: Milton Nascimento
obriga a treinar boxe, mas Billy fica fascinado com e Caetano Veloso. Intérpretes: Gal Costa; Milton
o balé, ao qual tem contato através de aulas de dança Nascimento.
clássica realizadas na mesma academia. Incentivado A música ficou marcada pela frase “Qualquer
pela professora de balé, ele troca o boxe pela dança, maneira de amor vale a pena”, que passou a ser
mesmo tendo que enfrentar seu pai e seu irmão. frequentemente utilizada em manifestações a favor
dos direitos LGBT.

MILK – A VOZ DA IGUALDADE (Milk, EUA, FILME DESTAQUE Reprodução
2008). Direção: Gus Van Sant. Elenco: Sean Penn,
Emile Hirsch, Josh Brolin, Diego Luna, James TOMBOY (França, 2011).
Franco. Duração: 128 min.
FICHA TÉCNICA:
Harvey Milk é um nova-iorquino que, para mudar de Direção: Céline Sciamma.
vida, decidiu morar e trabalhar com seu namorado Elenco: Zoé Héran, Malonn
Scott em São Francisco, no início dos anos 1970. Lévana, Jeanne Disson.
Enfrentando a violência e o preconceito da época, Duração: 82 min.
com a colaboração de amigos e voluntários (não
necessariamente homossexuais), Milk entra numa Laure é uma garota de
intensa batalha política e consegue ser eleito o 10 anos, que vive com os
primeiro gay assumido a alcançar um cargo público pais. A família se mudou
de importância nos Estados Unidos. há pouco tempo e, com
isso, não conhece os vizi-
INTERNET nhos. Um dia resolve ir na
rua e conhece Lisa, que a
DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS – confunde com um meni-
FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO: no. O filme aborda a experiência da transexualidade
http://bit.ly/12caOse vivida por uma criança – e todos os estigmas e en-
frentamentos a partir daí.
Nesta página você encontra uma grande pesquisa

373Capítulo 23 - “Cada um sabeCaadpoítrueloa19de- l“íCcihaedgeouseor coaqvueeirãéo.”!”DEebaagtoernad?oVaiodlêivnecrsiaideadessiegxuuaaldlaeddees gsêonciearios

Aprendendo com jogos

Criando possibilidades

RESPEITAR DIFERENÇAS É QUESTÃO DE JUSTIÇA.

Divulgação: Cimac Noticias

Você deve pegar uma bexiga e colocar 5. Crie painéis com recortes de jornais, revistas etc.
mensagens em seu interior. O conteúdo das para retratar essas violências.
mensagens será elaborado por suas próprias ideias
e percepções acerca da diversidade sexual. Após 6. Crie frases curtas e criativas que estimulem a
encher as bexigas e ao sinal do(a) professor(a), reflexão sobre as razões desses eventos. A exposição
jogue-as para o alto com o intuito de misturá-las. dos painéis pode ser feita na escola em locais de
Cada um deve apanhar então um novo balão, mas grande circulação.
não pegue o seu de volta. Estoure a bexiga. Leia
as mensagens contidas em seu interior em voz alta 7. Jogue novamente a adaptação do jogo de tabuleiro
para todos e discuta com os seus colegas sobre essas Detetive por um dia.
mensagens. Este jogo foi adaptado de
http://goo.gl/07zF8F 8. Imagine um jogo similar ao Lutas simbólicas
para pôr em discussão especificamente a violência
Como jogar: de gênero. Crie um esboço, algumas cartas e uma
descrição geral de como funcionaria o seu game.
1. Leia o capítulo 23, “Cada um sabe a dor e a delícia
de ser o que é”. Debatendo a diversidade sexual e de 9. Pesquise a publicidade em revistas semanais e
gênero. identifique ao menos três matérias publicitárias
em que papéis, qualidades ou características são
2. Após todos os participantes jogarem e depois de associadas a gênero, principalmente, as publicidades
todos terem lido os papéis com as impressões de que dizem o que é ser homem e o que é ser mulher.
cada um com relação ao tema “diversidade sexual”, Analise tanto o texto publicitário quanto as imagens
aguarde o(a) professor(a) fazer um círculo com utilizadas e o que elas sugerem. Recorte os três
todos da classe. exemplos encontrados e escreva um breve texto com
suas análises para compartilhar com seus colegas de
3. Relate suas impressões individuais acerca do jogo. turma.

4. Encontre em revistas, livros, jornais, matérias 10. Socialize com os seus colegas em sala de aula
da internet etc., distribuídos pelo(a) professor(a), o que a experiência significou para você e o que
episódios de violência sexual ou de gênero conside- aprendeu com a mesma.
rando a reflexão anterior sobre a diversidade sexual.

374 Unidade 3 - Relações Sociais Contemporâneas

Capítulo 24

“Tudo se chama nuvem, Tudo se chama rio”:
nossos ancestrais, primeiros habitantes do Brasil

Kelly Russo

Brasileiros que moram
em nossas terras há
milhares de anos: os
povos indígenas.
Na foto, uma cerimônia
indígena xinguana sendo
filmada por um indígena
da etnia Yawalapiti, em
julho de 2004. Esse povo
vive ao sul do território
Indígena do Xingu, em
Mato Grosso.

Talvez o que vamos dizer agora nesta Grandes Navegações era encontrar uma nova rota
de comércio com o Oriente. Assim, quando esses
primeira frase deste capítulo seja muito, mas europeus chegaram ao continente americano
muito estranho!!! Antes dos portugueses che- achavam que estavam “nas Índias” (atualmente,
garem às terras brasileiras, não existiam índios. apenas “Índia”, país pertencente ao continente
asiático). Assim, na chegada em nossa terra, os
Agora você talvez pense: “impossível, pois europeus adotaram o termo “índios” como nome
quando Pedro Álvares Cabral chegou ao Brasil, para TODOS os povos que aqui viviam. Portanto,
em 22 de abril de 1500, encontrou muitos antes da chegada dos europeus, os povos que
índios nas praias brasileiras”. Mesmo assim, habitavam o território que depois veio a ser o
continuamos a afirmar: não existiam índios Brasil e o continente americano não tinham um
no Brasil antes de 1500. Não, não estamos nome comum que os definissem. Pelo contrário,
tentando lhe confundir! Pedimos a você que cada povo tinha sua própria denominação, que o
leia com calma e depois debata com os seus diferenciava dos demais. Existiam, por exemplo,
colegas os nossos argumentos. os Pataxó, os Tupinambá, os Temiminó, os
Potiguara, e muitos outros.
O nome“índio”surgiucomoscolonizadores
portugueses e espanhóis. Como você aprendeu
no Ensino Fundamental, um dos objetivos das

375Capítulo 24 - “Tudo se chama nuvem, Tudo se chama rio”: nossos ancestrais, primeiros habitantes do Brasil

Acervo Museu Paulista, SP. Isto significa dizer que essas comunidades
já existiam antes da chegada dos europeus –
Quando os europeus chegaram às Américas, o primeiro ato foi antes de Cristóvão Colombo – e se identificam
classificar todos os povos indígenas como índios – termo genérico simbólica e culturalmente de forma diferente da
sociedade brasileira.
que perdura até hoje. Tela de Oscar Pereira da Silva.
Desembarque de Cabral em Porto Seguro (1922). Essa definição é muito semelhante àquela
adotada no Estatuto do Índio (Lei 6.001/73) que
Desde o início da colonização portuguesa define, em seu artigo 3º, indígena como:
houve muita especulação sobre a origem dos
povos indígenas e até mesmo se eles eram seres “...todo indivíduo de origem e ascen-
humanos. A hipótese mais difundida pelos dência pré-colombiana que se identifica
estudos mais tradicionais da Arqueologia é de e é identificado como pertencente a um
que esses povos que habitavam as Américas grupo étnico cujas características culturais
eram provenientes do continente asiático. Nesse o distinguem da sociedade nacional.”
sentido, a teoria que se tornou mais comum é que
eles teriam atravessado o estreito de Behring (BRASIL, 1973)
(entre a Sibéria e o Alasca) e se espalhado
pelo continente há cerca de 14 a 12 mil anos Assim, o que percebemos é que esse
atrás. Por outro lado, pesquisas mais recentes conceito tenta diferenciar os indígenas da
questionam essas interpretações (cf. FUNARI; sociedade branca e essas marcas diferentes se
NOELLI, 2005). Um exemplo é o trabalho da caracterizam predominantemente em relação às
arqueóloga brasileira Niéde Guidon (1992), suas culturas, línguas e raízes históricas. Vamos
que identificou ao sul do continente datas mais ver algumas dessas características mais adiante.
antigas do que a apontada acima, contrariando
essa hipótese mais difundida. Para tornar essas Com o passar dos séculos esses povos
interpretações ainda mais inconclusivas, estudos decidiram adotar o termo genérico “índio”
linguísticos, como os desenvolvidos por Nichols como forma de fortalecimento de identidade
(1990; 1992) avaliaram o início do povoamento comum e de unidade na luta contra a opressão
da América entre 30 e 35 mil anos atrás (cf. branca e por direitos à terra.
CARNEIRO DA CUNHA, 2012, p. 10).
No Brasil, foi ao longo da década de
Mas como poderíamos definir o conceito 1970 que começou a se formar um movimento
de índio? O que significa ser um indígena? indígena de configuração nacional – algo
inédito e muito difícil de acontecer, haja vista
Segundo o antropólogo Eduardo Viveiros a grande diversidade de povos aqui existentes
de Castro (2006), “índio é qualquer membro e pelas distâncias de nosso país – na busca
de uma comunidade indígena, reconhecido por por reconhecimento cultural e pelo direito
ela como tal. ‘Comunidade indígena’ é toda à terra. Aliás, a luta por territórios ainda é a
comunidade fundada em relações de parentesco principal luta dos povos indígenas no Brasil,
ou vizinhança entre seus membros, que mantém ou seja, a reivindicação junto ao Estado pelo
laços histórico-culturais com as organizações reconhecimento de suas terras originárias que
sociais indígenas pré-colombianas” (p.1). foram tomadas e ainda são disputadas por não
indígenas desde 1500 até hoje.
376 Unidade 3 - Relações Sociais Contemporâneas
Outra questão importante que precisamos
refletir é que, em muitos livros de História, os
estudantes e os atuais professores aprendem
ou aprenderam algumas coisas sobre os
povos indígenas somente em relação ao seu
passado, ou seja, nas histórias contadas e
escritas, os povos indígenas apareciam quase
sempre a partir da chegada dos portugueses

e espanhóis em nossas terras do oeste do www.brasiliana.usp.br
Oceano Atlântico e depois sumiam. Sempre
se contou uma história do passado, dando Um dos desenhos de J. B. Debret (Cabeças de Índios), que em 1834
a impressão de que os “índios” são pessoas tentou retratar os diferentes povos existentes no Brasil desde a
pertencentes a uma cultura congelada no chegada dos portugueses. (Fonte: DEBRET, 1978)
tempo, como se eles não existissem mais,
ou até existem, mas estão isolados nas Estes povos falavam uma diversidade
florestas e no “meio do mato”. Outras ideias de línguas e, através delas, davam nomes e
e imagens que se aprendem desses povos é a entendiam o mundo à sua volta. Opa! Se até hoje
propaganda da grande mídia, principalmente existem povos indígenas, essa terra que hoje
na TV e no cinema, que retrata o “índio” de conhecemos como Brasil tem na verdade muitos
forma folclórica e exótica, de pena na cabeça, nomes e muitas línguas. Como assim? No Brasil
portando arco e flecha, e com roupas que se não se fala só o português? Bom, vamos tentar
assemelham aos “índios” norte-americanos. entender o que é esta pluralidade de povos que
habitam este lugar a partir da diversidade de
Entretanto, o que vamos conversar aqui línguas existentes até hoje no país.
com vocês é outra ideia que leva em conta
não só o passado, mas também o presente dos Existem muitos estudos de antropólogos
povos indígenas. E a leitura que fazemos do e historiadores que afirmam que, à época da
passado não é a mesma que nossos pais e avós chegada dos europeus, existiam milhões de
aprenderam, mas sim um passado que não foi indígenas. Uns falam em 20 milhões, outros em
contado pela sociedade branca, por ignorância 10 milhões, outros, ainda, em 4 ou 5 milhões.
ou de forma proposital. Sobre o presente, vamos Não há um consenso entre os especialistas,
descrever e estudar – tomando como base os entretanto, o etnólogo Curt Nimuendaju (1981)
estudos desenvolvidos pela Etnologia Indígena, catalogou um montante de 1.400 povos que
uma área da Antropologia que estuda os grupos eram divididos em grandes famílias linguísticas
indígenas – o que fazem esses povos, quais denominadas troncos linguísticos.
são suas lutas e conhecimentos. Além disso,
ao contrário do que sempre vemos na mídia, Os grupos que foram contatados primeiro
esses povos não estão somente em aldeias foram os povos de línguas provenientes do
distantes nas florestas; há grupos indígenas
também entre nós, nas cidades, trabalhando,
estudando, utilizando-se das novas tecnologias
e, uma das coisas mais significativas, nossa
cultura brasileira é repleta de símbolos e modos
de viver de origem indígena. Talvez você
descubra, depois de estudar neste capítulo, que
muitas coisas que você faz no seu cotidiano,
provêm das culturas milenares indígenas.
Vamos começar?

“Nos deram espelhos, e vimos
um mundo doente”

Quando os portugueses chegaram nesta
terra, os povos indígenas estavam organizados
e divididos entre os diferentes grupos étnicos
que aqui viviam (retorne ao Capítulo 6 para ver
o significado de grupos étnicos).

377Capítulo 24 - “Tudo se chama nuvem, Tudo se chama rio”: nossos ancestrais, primeiros habitantes do Brasil

Tupi, localizados no litoral, que chamavam Acervo Museu Nacional de Belas Artes/Rio de Janeiro
este território de PINDORAMA (Pindó Rama
ou Pindó Retama), cujo significado é “Terra Latuff Famoso quadro de Victor Meirelles retratando a primeira Missa em
das Palmeiras”. Mas as informações acima território brasileiro, 1861.
demonstram a grande diversidade étnica e
linguística e também nos oferece algumas Este relato e muitos outros são importantes
pistas sobre a riqueza cultural, social e política para nos lembrar que não foram somente os
que existia nesse território antes da chegada dos africanos escravizados que foram vítimas
portugueses. da empresa colonial europeia. A escravidão
indígena foi anterior e inclusive concomitante
Quando os europeus chegaram por à africana.
aqui, encontraram milhares de povos. Se,
num primeiro momento, houve admiração e No início da colonização o contato com
encantamento, anos depois, com a ocupação os europeus foi tratado como uma relação de
do território, vieram as doenças e a escravidão. troca e negociação de mercadorias – a mesma
As doenças eram a varíola, o sarampo, a que se realizava no continente americano entre
tuberculose, a gripe etc., que foram uma das os diversos povos que aqui viviam. A partir
principais causas da diminuição progressiva do momento que os europeus começaram a
das populações indígenas até o século XX. O empreitada da colonização, parte dos povos
primeiro registro de varíola ocorreu em 1562, indígenas tentou fugir para o interior do país,
na Bahia, quando foram dizimadas aldeias passando a resistir de várias formas. Nem todos
inteiras dos Tupinambá. os povos fugiram; muitos foram dizimados,
tendo suas línguas completamente extintas;
A escravidão também foi outro fator de outros tantos foram escravizados. Muitos
extermínio de povos inteiros. Com o início da também foram catequizados, passando a
exploração colonial, os indígenas foram muito viver parcialmente “protegidos” nas missões
utilizados na extração do pau-brasil e em muitos comandadas pelos jesuítas.
outros trabalhos exigidos pelos portugueses.
Claudio Figueiredo (2009) relata que: Pouco se conta nos livros escolares sobre a história de extermínio e
das lutas de resistência dos povos indígenas nas Américas.
“O missionário francês Claude
D’Abeville reproduziu a seu modo, em
um relato publicado em 1614, as pala-
vras de um velho chefe Tupinambá do
Maranhão, mostrando como, aos olhos
dos indígenas, a escravidão foi sendo im-
posta na sua relação tanto com os portu-
gueses (os “peró”) como com os france-
ses: ‘Vi a chegada dos peró. Começaram
eles como vocês, franceses, fazem agora.
De início queriam apenas comerciar, sem
morar aqui. (...) depois mandaram vir os
padres, e estes levantaram cruzes. Mais
tarde afirmaram que nem eles, nem os
padres podiam viver sem escravos para
os servirem e por eles trabalharem. (...)
Não satisfeitos com os escravos captu-
rados em guerra, quiseram também os
filhos dos nossos e acabaram escravi-
zando toda a nação; e com tal tirania e
crueldade que os que ficaram livres fo-
ram forçados a deixar a região’”.

378 Unidade 3 - Relações Sociais Contemporâneas

Atualmente, existem 305 povos indíge- antigo, visto que muitas dessas comunidades
nas espalhados pelo Brasil, segundo o Censo ocultavam suas línguas e suas práticas culturais
2010 (IBGE). Não constam desse levantamento ancestrais para se protegerem da violência das
os povos isolados – ou “resistentes” (cf. BA- políticas de colonização branca e de tomada de
NIWA, 2006, p. 51-55) – que vivem na Região suas terras. Você sabia, por exemplo, que até a
Amazônica e que ainda resistem aos contatos Constituição de 1988, era proibido falar línguas
com a nossa sociedade. Portanto, temos poucas indígenas no país? Pois é, a partir do momento
informações sobre quantos são esses povos, as- que o Estado brasileiro reconheceu os direitos
sim como suas línguas e organizações sociais. desses povos, muitas comunidades puderam,
De qualquer forma, os últimos censos do IBGE então, reconstruir suas histórias para inicia-
apontam um crescimento da população indíge- rem um processo de reconhecimento étnico
na no país. Em 1991 eram 294.131, em 2000, (MORELLO, 2012).
734.127 e em 2010 foram identificados 817.963
indivíduos indígenas. Esses dados mostram E onde estão e como vivem as populações
como os povos indígenas não serão extintos ou indígenas no país? Vejamos alguns dados e
irão desaparecer, como se pensava há décadas mapas que ilustram como se encontram os
atrás: eles estão crescendo e cada vez mais se atuais povos indígenas no Brasil, segundo o
organizando para que o Estado brasileiro possa Censo demográfico de 2010 (BRASIL, 2011):
reconhecê-los a partir de sua grande diversida-
de cultural, linguística e Gráfico 1
social.
Tabela 1
Segundo especialis-
tas no tema (COLLET;
PALADINO; RUSSO,
2014), os principais fa-
tores que explicam este
crescimento populacional
entre as populações indí-
genas foram o aumento da
taxa de natalidade, a dimi-
nuição da mortalidade in-
fantil, e, principalmente, o
maior número de pessoas
e comunidades que estão
reivindicando suas origens
e o reconhecimento de suas
culturas e terras. Após a
promulgação da Constitui-
ção de 1988, muitas comu-
nidades reivindicaram seu
reconhecimento enquanto
povos indígenas.

Como assim? Uma
comunidade pode virar in-
dígena de uma hora para
outra? Não, esse é um
processo muito longo e

379Capítulo 24 - “Tudo se chama nuvem, Tudo se chama rio”: nossos ancestrais, primeiros habitantes do Brasil

Mapa 1
Distribuição da população indígena no Brasil

População indígena

Reprodução/www.old.ilga.org 5° -70° ô"ô"RÍO -65° -60° QUIB O CORANTIJN -55° R. -50° -45° -40° -35° 5°
ESS R.
Y# R. META Uiramutã E MARO Y#
BOGOTÁ Normandia W IJNE CAYENNE

GUYANE
Oiapoque


"ô ô""ô ô"C O L O M B I A
ô"ô""ôô"Guainía
VENEZUELA

Pacaraima SURINAME

ORIN Amajari Bonfim R. Oiapoque

O Alto Alegre Rio Ta cutu RIVER População total
CO 2010
Rio BUOraAricoVeIrSa TACY#antá
RIO Ca
Rio ô""ôRORAIMA GUYANA
Rio Ituí
Río bamba R. Negro trimani Rio AMAPÁ "ô
R. Ene Itaquaí "ô
Río AmapariR.
Vaupés R. Içana Jari
ô""ô"ôR. Papuri RIO ô"
BRANCO
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ô"0°
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EQUADOR Uaupés Santa Isabel do Rio Negro R. Jufari JARI MACAPÁ
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Alalaú 0°
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-70° -65° -60° -55° "ô -50° -45° -40° -35° -30°

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2010

Podemos perceber, principalmente no delas, com o acréscimo da pergunta: “Você se

Mapa 1, que os povos indígenas estão presen- considera indígena?” Veja na Tabela 2 alguns

tes em todo o Brasil e em todas as capitais dos dados comparativos de 1991, 2000 e 2010.

estados. Esses atuais números Tabela 2
são bem diferentes daqueles

identificados nos dois Censos 1991 2000 2010
anteriores. Aliás, o mapeamento 190.755.799
das populações indígenas pelo Total(1) 146.815.790 169.872.856 189.931.228
IBGE só se iniciou em 1991.
No Censo demográfico de 2010, Não indígena 145.986.780 167.932.053 817.963
ocorreu um aprimoramento da 160.925.792
pesquisa sobre populações in- Indígena 294.131 734.127 160.605.299
dígenas, identificando os povos,
suas línguas, além da população Urbana(1) 110.996.829 137.925.238 315.180
residente em suas terras e fora 29.830.007
Não indígena 110.494.732 136.620.255 29.325.929

Indígena 71.026 383.298 502.783

Rural(1) 35.818.961 31.947.618

Não indígena 35.492.049 31.311.798

Indígena 223.105 350.829

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1991/2010

380 Unidade 3 - Relações Sociais Contemporâneas




































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