sumário
janeiro 2018
174 e d i t o r i a l
176 m c d i g i t a l
NA CA PA
38 caPa As revelações da atriz e escritora Fernanda Torres
48 a P o s ta s 2 0 1 8 O que ver, ouvir e comer neste ano
53 e u l e i t o r a “Casei com meu melhor amigo”
88 N u t r i Ç Ã o Reprograme o metabolismo
98 TENDÊNCIAS 08
106 16 FeBre troPical O verde domina a moda praia
17 olHar 43 Os óculos vibrantes da Prada
24
18 escritÓrio 40 gr aus A nova alfaiataria fresh
19 sNe aKermaNia O tênis-desejo da Tommy Hilfiger
20 sereia urBaNa Cabelo molhado é cool!
21 se X teto de luXo As fragrâncias de Carolina Herrera
22 estilo com coNteÚdo Maxichapéus para usar já
23 BatalHa das editor as Beachwear em dois tempos
24 Hi-lo Os melhores looks para encarar voos longos
R E POR TAGE M
08 e s P e c i a l Elas equilibram a vida na cabeça
28 e N t r e v i s t a Maria Valéria Rezende, de freira
feminista a escritora premiada
32 c o m P o r t a m e N t o Por que estamos tão ansiosas?
44 s o c i e d a d e Mulheres na política
@WOR K
56 P e r F i l Daniela Cachich, vice-presidente da PepsiCo
CULTUR A
52 l e o J a i m e Disney não é lugar de criança
MODA
62 F e s t a d i u r N a Luxo na areia
70 d e s e J o s d e v e r à o O mood praiano da vez
BELEZA Capa banca Vestido e
faixa Osklen. Brincos
82 v e r à o As novidades e dicas quentes da estação e anel Cartier Capa
86 B e a u t Y N e W s Lançamentos refrescantes de verão assinante Vestido Dior.
Colar Cartier Fotos
90 B e l e Z i N H a Deixe a pele brilhar Christian Gaul Edição de
91 t e N t a Ç Õ e s O nécessaire com a cor do ano moda Larissa Lucchese
Styling André Puertas
LIFESTYLE Beleza Ricardo dos Anjos
(Capa MGT) com produtos
94 v i a g e m A Paris da influencer Helena Bordon M.A.C e Match O Boticário
98 g a s t r o N o m i a Comece o dia com iogurte Produção-executiva
Vandeca Zimmermann
102 m e u c a N t o A atriz Helena Ranaldi Assistente de beleza
Milla Mendes Assistentes
103 e v e N t o s de fotografia Guilherme
104 H o r Ó s c o P o Ferreira Tratamento de
106 t e N t a Ç Ã o d o m Ê s imagem RG Imagem
Foto: divulgação Chaveiros de
pelúcia e couro
Fendi,
R$ 2.790 (cada)
Diretor-Geral frederiC zoGhaib kaChar
Diretor de Audiência LuCiano touGuinha de Castro
Diretora de Mercado Anunciante virGinia anY
Diretor Editorial fernando Luna
Diretora de Redação Marina Caruso
Editora-Chefe L aura anCona Lopez Diretor de Arte ÍtaLo Massaru
Moda
Editoras CaMiLa LiMa, Larissa LuCChese
Stylist andré puertas
Redação
Editora-Executiva Maria L aura neves Editora Sênior adriana ferreira siLva
Editora de Beleza vÂnia GoY Editora de Capa e Comportamento Lu anGeLo
Editora de Lifestyle e Eu, leitora roberta MaLta Editora de Atualidades Cristiane senna
Produtora-Executiva vandeCa ziMMerMann ([email protected])
Repórteres pauL a MeLLo, thiaGo baLtazar
aRte
Editora de Arte Mariana suzuki
Designers CaMiLa ribeiro, paMeLLa Moreno
Assistente-Executiva aLierCia pires
SeRviçoS editoRiaiS
Pesquisa CedoC/GLobopress
ColaboRaRaM neSta edição
aLe faGundes, arturo QuerzoLi, beth freidenson, CarLos bessa, CarLos rosa, CaroL Gherardi, CaroLine Curti,
Christian G auL , danieL ar atanGY, fernanda GuiMar ães, fred othero, João berthoLini, JuLia rodriGues, k ak á oLiveir a , kieL piMenta ,
LiLL Jenner, Liz haM, LuÍsa aMoroso, Luiza karaM, peter beard, riCardo dos anJos, thibé, vito MarieLLa
MERCADO ANUNCIANTE (SEgMENTOS: TECNOLOgIA, TI, TELECOM, ELETROELETRÔNICOS, COMéRCIO & VAREjO) Diretor de Negócios Multiplataforma Emiliano Morad Hansenn Gerente de Negócios Multiplataforma Ciro Horta Hashimoto
Executivos Multiplataforma Christian Lopes Hamburg, Cristiane de Barros Paggi Succi, Jessica de Carvalho Dias e Roberto Loz Junior (SEgMENTOS: BENS DE CONSUMO, ALIMENTOS E BEBIDAS, MODA E BELEZA, ARQUITETURA E DECORAÇÃO)
Diretora de Negócios Multiplataforma Selma Souto Executivos Multiplataforma Eliana Lima Fagundes, Fátima Regina Ottaviani, Giovanna Sellan Perez, Paula Santos Silva, Selma Teixeira da Costa e Soraya Mazerino Sobral (SEgMENTOS:
MOBILIDADE, SERVIÇOS PÚBLICOS E SOCIAIS, AgRO NEgÓCIOS, INDÚSTRIA, SAÚDE, EDUCAÇÃO, TURISMO, CULTURA, LAZER, ESPORTE) Diretor de Negócios Multiplataforma Renato Augusto Cassis Siniscalco Executivos Multiplataforma Cristiane
Soares Nogueira, Diego Fabiano, João Carlos Meyer e Priscila Ferreira da Silva Diretora de Negócios Multiplataforma Sandra Regina de Melo Pepe Executivos de Negócios Multiplataforma Dominique Pietroni de Freitas e Lilian de Marche
Noffs (SEgMENTOS: FINANCEIRO, LEgAL, IMOBILIÁRIO Executivos Multiplataforma Ana Silvia Costa, Milton Luiz Abrantes ESCRITÓRIOS REgIONAIS Diretora de Negócios Multiplataforma Luciana Menezes Pereira Gerente Multiplataforma
Larissa Ortiz Executivas de Negócios Multiplataforma Babila Garcia Chagas Arantes RIO DE jANEIRO Gerente de Negócios Multiplataforma RJ Rogerio Pereira Ponce de Leon Executivos Multiplataforma Daniela Nunes Lopes Chahim, Juliane
Ribeiro Silva, Maria Cristina Machado e Pedro Paulo Rios Vieira dos Santos BRASÍLIA Gerente Multiplataforma Barbara Costa Freitas Silva Executivos Multiplataforma Camila Amaral da Silva e Jorge Bicalho Felix Junior OPEC OFF LINE Carlos
Roberto de Sá, Douglas Costa e Bruno Granja OPEC ONLINE Danilo Panzarini, Higor Daniel Chabes, Rodrigo Pecoschi EgCN Consultora de Marcas Olivia Cipolla Bolonha DESENVOLVIMENTO COMERCIAL E DIgITAL Diretor de Desenvolvimento
Comercial e Digital Tiago Joaquim Afonso g.LAB Caio Henrique Caprioli, Lucas Fernandes CUSTOMIZADAS Vera Ligia Rangel Cavalieri EVENTOS Daniela Valente PORTFÓLIO E MERCADO Rodrigo Girodo Andrade PROjETOS ESPECIAIS Luiz Claudio
dos Santos Faria, Guilherme Iegawa AUDIÊNCIA Diretor de Marketing Consumidor Cristiano Augusto Soares Santos Diretor de Planejamento e Desenvolvimento Comercial Ednei Zampese Coordenadores de Marketing Eduardo Roccato
Almeida e Patricia Aparecida Fachetti TECNOLOgIA DA INFORMAÇÃO Diretor de Tecnologia Rodrigo Gosling ESTRATégIA DIgITAL Coordenador Santiago Carrilho Desenvolvedores Alexsandro Macedo, Fabio Marciano, Fernando Raatz, Fred
Campos, Leandro Paixão, Marden Pasinato, Murilo Amendola, Thiago Previero e William Antunes ESTRATégIA DE CONTEÚDO DIgITAL Gerente Silvia Balieiro
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Penteado de Uchoa Rodrigues, 700, Santana de Parnaíba, SP CEP 06543-001. A revista Marie Claire (ISSN 0104-8589) é uma publicação mensal da EDITORA GLOBO S.A. Distribuidor exclusivo para todo o Brasil: Dinap – Distribuidora Nacional de Publicações
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NA INTERNET: http://www.editoraglobo.com.br
6
PR I M EI R A PA L AV R AOprimeiro editorial do ano tem um gostinho especial. Não
só porque grandes são as chances de você estar com ele
FOTOS: DENISE-HOFFMEISTER / CHRISTIAN GAUL / BOB WOLFENSONem mãos à beira-mar, na borda da piscina ou em uma
rede de papo pro ar, mas porque é o editorial da esperança, da
mudança, da possibilidade de realização dos desejos mais íntimos.
Para quem escreve ou para quem lê, há sempre a sensação de
que o ano novo será capaz de limpar tudo o que não funcionou
no anterior e fazer dar certo. Não sei se você é do tipo que pula
ondas, joga flores no mar ou olha para as estrelas vislumbrando o
melhor. Mas, independentemente do ritual, gostaria de pedir que,
em algum momento (antes, durante ou depois da virada) você de-
seje um 2018 melhor para todas as mulheres, até aquelas que não
conhece. Quem sabe, dessa forma, a gente consiga potencializar
os laços construídos em 2017 – vide movimentos como Women’s
March, Mexeu Com Uma Mexeu Com Todas e #MeToo, muito bem
cobertos pela Marie Claire em suas plataformas, by the way – e
acertar na escolha das candidatas às eleições de 2018.
Por que candidatas e não candidatos? Porque um estudo recente
divulgado pela ONU Mulheres mostra que, quando o assunto é
representatividade política, o Brasil está no vergonhoso 154º lugar
de 174 países. Temos somente 55 mulheres entre os 513 deputa-
dos federais e 13 senadoras entre os 81. Ou seja, se continuarmos
elegendo nossas parlamentares
nessa velocidade de tartaruga, só
alcançaremos a equidade de gê-
nero em 2080. Então, em outubro,
antes de escolher seus nomes a
Presidência, Senado, Câmara e
Governo do Estado, pense que
quem perde com a falta de mulhe-
res no poder é a democracia, co-
mo mostra a reportagem de Maria
Laura Neves à página 46. Quando
a primeira mulher assumiu o go-
verno do Chile, o país se tornou
o primeiro do mundo a instituir
uma lei nacional de combate às
desigualdades de gênero dentro
das empresas. Já imaginou o que
pode acontecer aqui no Brasil
se, além de unidas nas hashtags,
estivermos também nos cargos MARINA CARUSO
mais importantes? Feliz 2018! DIRETORA DE REDAÇÃO
espeCial8
Carga pesada
Esta imagem é comum e milenar. Em vários países, mulheres usam a cabeça para
transportar tudo que lhes é essencial, do ganha-pão ao guarda-roupa.
Intrigada pelo hábito, a fotógrafa francesa Floriane de Lassée viajou o mundo
para descobrir, afinal, qual fardo elas têm de carregar P o r l u í z a k a r a m
Hyatt, Etiópia
as almofadas com capa
de seda que a etíope
empilha orgulhosa na
cabeça são seus objetos
mais valiosos. Quando
não estão com Hyatt,
ficam espalhadas pela
sala de sua casa e
funcionam como bom
pretexto para reunir
seus amigos e família
anga, Indonésia
personagem predileta de Floriane, a garotinha
tenta equilibrar as bacias em que ela
e sua mãe lavam as roupas e as louças do dia
a dia. Um retrato propositalmente exagerado,
para dar o efeito da carga excessiva que
ela, uma criança, é obrigada a assumir
Sary e Nifah,
Indonésia
Moradoras da ilha paradisíaca de
Celebes, a dupla vive de coletar
cocos pela praia e vendê-los aos
turistas. apesar de o uso do véu
não ser obrigatório nesse país
de maioria muçulmana, Nifah
acostumou-se a carregar na
cabeça também sua tradição de fé
11 espeCial
aru, Etiópia
Fotografada que
inaugurou o projeto, toda
semana a pequena aru
caminha por três horas
acompanhada de suas
cabritas até o mercado
local com a cabeça cheia
de estacas de madeira
red Basanti, índia
encontrar e transportar quilos de
palha todo dia faz parte da rotina
de red e sua família. É com esse
material que ela cozinha, ilumina
a casa e, eventualmente, repara ou
reconstrói os cômodos
13
espeCial
imagine levar acima da cabeça, ao longo O formato que o corpo dessas mulheres toma
de várias horas por dia, itens com peso ao carregar o fardo tocou particularmente a fotó-
equivalente ao seu? e mais: passar a vida grafa. “assim como formiguinhas, elas sustentam
inteira fazendo isso diariamente? O ato, inco- montanhas de madeira, mantimentos, colheitas do
mum para a maioria das mulheres que vivem campo”, conta. “Às vezes, curvam demais as cos-
em grandes centros urbanos, é relativamente tas para dar conta, mas o que mais me chamou a
constante para as que moram no campo, em atenção foi o pescoço sempre ereto e o olhar fixo
países como indonésia, etiópia e até Brasil – de quem tem consciência do que leva consigo.”
quem não se lembra da célebre marchinha de
Carnaval “lata d’Água na Cabeça”, do compo- Floriane se emocionou com histórias como a
sitor paraense Candeias Junior? da adolescente aru, do interior de adis abeba,
capital da etiópia, a primeira das retratadas.
Foi a partir da curiosidade sobre o dia a dia Toda semana, a garota caminha por três horas,
dessas carregadoras que a fotógrafa parisiense acompanhada de suas cabritas, até o mercado
Floriane de lassée, 40 anos, produziu as imagens local com a cabeça cheia de estacas de madeira –
que ilustram esta reportagem. antes de engravi- é da criação das cabras e do comércio de lenha
dar do primeiro filho – e carregar, ela própria, que provém a renda da família. Na foto, seu
um peso extra por meses –, Floriane embarcou olhar parece refletir o peso da responsabilidade
numa investigação sobre o desafio de levar con- que carrega, assim como a satisfação de se
sigo um volume constante. durante dois anos, a saber tão útil. Já a garotinha anga, a predileta
artista entrevistou e retratou mulheres em países de Floriane, foi clicada na indonésia, ao tentar
em que ainda se mantém o hábito milenar e es- equilibrar as bacias em que ela e sua mãe lavam
sencialmente feminino de equilibrar na cabeça as roupas e as louças do dia a dia. “para dar o
o que é elementar, desde objetos e frutas para efeito da carga excessiva que ela, uma criança, é
vender até roupas e móveis da casa; às vezes, obrigada a assumir, criei um cenário exagerado,
volumes equivalentes a 70% do próprio peso. usando cordas para sustentar aquele amontoado
sobre a menina”, explica a fotógrafa.
Floriane conta que um dos pontos mais
marcantes desse encontro foi notar que elas, ao viajar de um extremo a outro do mundo,
apesar de todo o trabalho, não pareciam ela conta que sentiu o mesmo turbilhão de
infelizes. “É exaustivo e corajoso”, afirma. “e sensações. e, no meio da produção da série,
vai além do peso físico. Faz refletir sobre os engravidou. durante as últimas fotos, aos
fardos que o sexo feminino carrega consigo, quase nove meses de gestação, caiu a ficha:
sejam questões ligadas à família, às tradições ninguém é capaz de aguentar cargas tão
culturais, aos problemas sociais... Meu trabalho pesadas (em tantos sentidos) como a mulher.
é uma ode àquelas cuja vida é pesada e, mesmo
assim, conseguem cultivar a leveza na rotina.” “Quis refletir sobre os
fardos que o sexo feminino
Batizado de Quanto Você Consegue carrega consigo. É uma ode
Carregar?, o projeto deu seus primeiros passos àquelas cuja vida é pesada”
com uma road trip da fotógrafa pelo leste da
África. Clicando uma a uma as mulheres de – Floriane de Lassée, fotógrafa
diferentes países, Floriane seguiu depois para
a Ásia e, finalmente, a américa do sul, sempre
documentando a rotina de suas personagens.
C JORNADA PELO
ONHECIMENTO
A MENTORA DOS
GEÓLOGOS DO FUTURO
Sylvia Anjos tem uma vida dedicada aos estudos e se
destaca também como mentora de jovens profissionais
Desde criança, a geóloga Sylvia Anjos tem Sylvia um outro reconhecimento, o de mentora.
sede por aprender. Em casa, embora seus “Ela é impressionante. Sempre fomenta as pessoas
pais não tivessem o ensino básico comple-
to, e talvez justamente por isto, o incenti- a se capacitarem, fazerem pós-graduação, pensa no
vo aos estudos era constante. Ainda pe- trabalho e na equipe em todos os aspectos, sugere
quena, percebeu que esse era um meio de alçar voos desafios. Fiquei moldado ao estilo dela de trabalhar e
maiores, mesmo sem saber ainda quais seriam eles. aprendi muito”, conta o geólogo Nilo Matsuda, que
Durante a escola, uma professora de geografia abriu concluiu seu mestrado pela Universidade Federal de
seus olhos. “Teve uma aula em que ela começou a Ouro Preto (Ufop) sob orientação de Sylvia e, mais
falar que os Andes subiram e isolaram o mar que an- tarde, integrou sua equipe por onze anos.
tes havia onde hoje é a Amazônia. Isso ficou na minha
mente. Percebi que a geologia era fascinante. É a úni- Outro orientando de Sylvia, o geólogo Carlos Ma-
ca ciência que te dá uma noção em 4D. Você entende noel de Assis, lembra que a mestre era uma lenda
o que aconteceu para entender o hoje”, explica ela. dentro da companhia. “É uma das pessoas mais inte-
ligentes que eu já conheci. É determinada, objetiva,
Com essa aula inesquecível e a percepção de que consegue tudo o que quer. Ela foi minha gerente, a
a geologia daria a ela uma visão ampla de tudo, deci- melhor que eu já tive”, lembra ele.
diu prestar vestibular para o curso, na Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Os estudos, como Os dois concordam: a capacidade de formação de
Sylvia esperava, a levaram para patamares bem altos. profissionais e pessoas é inerente à Sylvia. Ela, no
Depois de estagiar em várias companhias, formou-se entanto, atribui seu trabalho a um dever: “Adquirimos
e prestou concurso para a Petrobras, onde há 38 anos muito conhecimento e valiosas experiências aqui na
atua na área da geociência, tornando-se pioneira na Petrobras. Se eu não puder compartilhar com mais
área petrolífera no país. gente, é uma pena”, diz.
GEÓLOGOS DO AMANHÃ
Gerente de Geologia e gerente geral de AppliedTe- E não é só dentro da companhia que Sylvia ajuda a
chnologies de Libra, no pré-sal, este ano recebeu da formar novos geólogos. À frente da presidência da
American Association of Petroleum Geologists Associação Brasileira de Geólogos de Petróleo
(AAPG) o prêmio AAPG Distinguished Service Awa- (ABGP), ela participa do projeto Geólogos do Ama-
ard for 2017, um dos mais importantes da área no nhã, em parceria com a UFRJ, que, há cinco anos,
mundo. Tanto estudo e também dedicação à frente promove workshops para professores da rede pública
de equipes, orientadora de pesquisas de mestrado e de ensino. O objetivo é que os docentes levem mais
doutorado ou na coordenação de projetos renderam a conhecimento sobre geologia para a sala de aula.
APRESENTADO POR
Outro projeto do qual participa é a
Casa de Pedra, da UFRJ, coordenado
pelo professor Ismar de Souza Carva-
lho. O projeto conta com o incentivo
e apoio da ABGP e oferece alojamen-
to para estudantes e professores rea-
lizarem estudos de campo de fósseis
na Bacia do Araripe, na divisa de
Pernambuco e Ceará. “Faço esse tra-
balho na ABGP porque sinto uma
necessidade de devolver alguma coisa.
Me sinto na obrigação de tentar im-
plantar aqui no Brasil algo do que vi
ao redor do mundo. As associações
têm esse papel de divulgar, de fazer
com que ideias sejam compartilha-
das”, afirma ela, que fez mestrado e
doutorado na Universidade de Illinois,
nos Estados Unidos, nos anos 1980.
As iniciativas arrojadas sempre es-
tiveram presentes na vida de Sylvia.
Ela foi a primeira mulher a trabalhar
embarcada. A conquista do espaço
num meio majoritariamente mascu-
lino aconteceu à base de muita insis-
tência, uma vez que as funcionárias
atuavam somente em terra devido à
Sylvia tem sede falta de estrutura das plataformas.
de conhecimento, “Insisti muito para que eu e minha
desde criança colega fôssemos para a plataforma,
então deixaram a gente ir para passar
o dia só. Depois disso, passou a ser
uma prática na companhia “, destaca.
Me sinto na A trajetória de Sylvia, pautada pela busca incessan-
obrigação de te por aprender, se confunde com a história da Petro-
tentar implantar aqui bras. Com os olhos marejados, ela lembra que a jor-
no Brasil algo do que nada insaciável pelo conhecimento é a própria
vi ao redor do mundo.” história da empresa. “Primeiro, encontramos o maior
campo terrestre de petróleo do Brasil, em Carmópo-
SYLVIA ANJOS lis. Depois fomos para o mar e encontramos o campo
de Guaricema. Foi isso que nos deu base para encon-
© ENY MIRANDA GERENTE GERAL trar o pré-sal. Somos respeitados pelo conhecimento,
descobrimos tudo através disso”, conclui.
DA PETROBRAS
PRODUZIDO POR
Foto: divulgação O cOntêiner dOs
naviOs inspira
a nOva it bag
chanel, destaque
na passarela dO
Métiers d’art paris-
HaMburgO, desfiladO
nO Mês passadO
tendência
pOr @camilalimaq
TENDÊNCIA18
Pareô
Amaro,
R$ 380
Óculos maiôs Saia de sarja
de assimétricos Triton,
em ensaio de R$ 268
madeira
Papel marIe claIre Bolsa de palha
Craft, Sneak Peak para
R$ 390 Gallerist, R$ 780
FEBRE DOS Top, R $ 178, e hot pants,
tRÓPICOS R$ 208, Cia Marítima
A praia pede verde Túnica
e folhagens de todas as de seda
proporções. Acessórios Adriana
de palha, ráfia e madeira Degreas
arrematam o visual para
Farfetch,
R $ 1.280
água de coco paraDICa Vestido de
c&a / verão 2018DE StylIng algodão
Fotos: gui paganini / imaxtree / divulgação
misture estampas, Salinas para
eLeGeNDO peças O Q V e s t i r,
cOm fuNDO De R$ 420
tOm simiLar
Mule de palha tressê
A.Brand, R$ 498
Sousplat de
cerâmica
Cecilia Dale,
R $ 129
19
desejo
Foto: carlos bessa / produção-executiva: vandeca zimmermann OLHAR 43 Óculos com armação
Com armações amplas, de veludo,
aveludadas e em cores
saturadas, os novos modelos R$ 2.040 (cada)
Prada fazem o mix ideal
de elegância e irreverência
20
TENDÊNCIA
Óculos
Chloé,
R $ 1.530
Camisa Saia a alfaiataria
alongada de tricô com risca
de giz em
Canal Lilly ensaio de
Concept, Sarti, marie claire
R$ 679 R$ 698
Mule de camurça escritório
Arezzo, R$ 220 40 graus
Bracelete de ouro A alfaiataria de amplas
18 quilates proporções é a pedida
H.Stern, R $ 19.800 certa para um verão
elegante na cidade
jacquemus / verão 2018
Calça de Short de Colete de Fotos: Fabio bartelt ( Monster Photo) / divulgação
sarja linho Lojas alfaiataria
Lança Pompeia, Amaro,
Perfume, R$ 70 R $ 210
R$ 433
dica
de styling
mescle texturas.
peças de linho
ficam lindas ao
lado das de
seda
Poltrona Wing, Empório Cinto de
das Cadeiras, R$ 5.200 corda Maria
Valentina,
R$ 200
21
Sneakermania desejo
os tênis ultrapassaram as academias
de ginástica. Na nova coleção de
Tommy Hilfiger, eles aparecem
em versão mule e tom cintilante
Foto: carlos bessa / produção-executiva: vandeca zimmermann Tênis de couro
metálico com
apliques, R $ 1.190
22 tendência
Óleo
Fortalecedor
Ekos Patauá,
Natura,
R$ 54
Extra
Dimension
Skinfinish,
M.A.C,
R $ 149
Gel Forté, altuz arra bijus
Sebastian,
R $ 196 combine
acabamento
sereia molhado com
urbana
maxiaces-
Na praia ou na cidade, aposte sórios
em um visual relaxado,
isabel marant nina ricci
com fios naturalmente ondulados
e make natural e luminoso kenzo Fotos: imaxtree / divulgação / thinkstock
Quem não se lembra do cabelo ondulado
à la Daryl Hannah no filme Splash: uma Se-
reia em Minha Vida? Pois aqueles cachos e on-
das com cara de terem sido feitos sem esforço
estão super em alta neste verão. Uma manei-
ra simples de reproduzir o estilo é fazer uma
trança com os fios ainda úmidos e soltá-los
depois de secos. Dá um efeito elaborado, sem
sacrifício. “Outra opção é criar ou intensifi-
car a ondulação com o aspecto molhado. É fá-
cil: aplique um mix com duas partes de gel de
forte fixação para uma parte de óleo finaliza-
dor. Assim, os fios ficam mais maleáveis e bri-
lhantes”, ensina Evandro Angelo, cabeleireiro
do salão C.Kamura, em São Paulo. Complete o
look com um toque de bronzer nas maçãs.
23
desejo
Foto: carlos bessa / produção-executiva: vandeca zimmermann Perfumes sexteto
Confidential de classe
(entre R$ 780
e R $ 1.290 ) os seis perfumes da linha
Confidential, de Carolina
Herrera, vão do floral fresco
ao oriental opulento. Puro
charme em frascos de cristal!
24 estilo com conteúdo
por Ucha Meirelles
1
2
MÁxI é 3
deMAIs
Com abas largas e elegância de sobra,
os chapéus gigantes são o acessório da vez
Não é nenhuma novidade para nós, brasileiras, usar colares
statement, brincos alongados, óculos king size e bolsas x-large,
estas últimas, inclusive, uma das manias das passarelas do ve-
Ucha usa rão 2018. A maximização de acessórios é um truque de styling 4
chemisier feito recorrente e tem tudo a ver com nosso clima tropical. 5
por ela, chapéu
Vix, pulseiras Neste verão, no entanto, a peça máxi da vez é o chapéu. Nada
pode ser mais glamouroso do que usá-lo para caminhar na praia
Salvatore ou à beira da piscina. Além da proteção contra os raios UVA e
Ferragamo, UVB, o item deixa qualquer produção instantaneamente chique.
bolsa Serpui
A ideia apareceu nas passarelas de Missoni, Vix, Giorgio Arma-
Marie e
sandálias Fendi
ni e da superbadalada francesa Jacquemus. Nos desfiles, os mode- Fotos: joão bertholini / getty images / imaxtree / divulgação / reprodução /
beleza: ale Fagundes (Capa mgt) / produção-exeCutiva: vandeCa zimmermann
los exuberantes e com abas imensas deixaram o visual mais fresco
e sofisticado e nos dão ótimas ideias para as produções de férias.
Na hora de usar, lembre-se de que a peça deve ser utilizada somente
na praia, piscina ou no máximo em encontros informais – no trabalho
ou em festas, nunca! Para acompanhá-lo, aposte em saídas leves de algo-
8 dão ou com transparências. Para quem gosta de contrastes, os chapéus
de cores fortes também são excelentes opções, dependendo, é claro, do
restante do look. Os de tom preto também são superindicados. Ideais para a
cidade, são parceiros perfeitos para um almoço de domingo com as amigas.
Quanto ao restante da produção, basta investir num look bási-
co: camiseta ou camisa branca, jeans ou shorts sem estampas. Vesti-
dos longos e lisos também são adequados, assim como peças clássi-
cas que não briguem com a extravagância do chapéu escolhido.
ucha meirelles é personal stylist e nossa consultora de estilo (colunas.revistamarieclaire.
globo.com /upost) . escre va par a ucha @ upost.com.br. instagr am : @ uchameirelles
76
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de setembro de marie Claire
2. e 8. o acessório no show
da vix 3. o modelo gucci 4. na
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5. pelas ruas 6. jennifer lopez
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Agradecimento Air France (airfrance.com.br)
30
ENTREVISTAFreira, escritora
e feminista
FOTO: KAREN RITCHIECOR
Ela já fumou maconha, lutou contra a
ditadura e foi amiga de Fidel Castro. Como
missionária, deu a volta ao mundo quatro vezes,
alfabetizando adultos e crianças. Morou na
China, na Argélia, no México e no Timor Leste.
Nos últimos anos, lançou quatro romances,
uma coletânea de contos, e tornou-se uma das
mulheres mais relevantes da literatura do país.
Em entrevista a Marie Claire, Maria Valéria
Rezende defende o aborto legal e mostra por
que o estereótipo de religiosa inocente não cola
nesta militante que briga por mais espaço para
as escritoras femininas P O R M A R I A L A U R A N E V E S
Ésério. Já morri muitas vezes”, diz, com a serenidade meninas e que não precisam usar hábito. “Quando éramos
de quem comenta o tempo, a santista Maria Valéria meninas, nos perguntavam se já tínhamos optado por ser
Rezende, 75 anos, em um restaurante na praia de Cabo freira ou por casar. Escolhi fazer os votos, que era muito
Branco, em João Pessoa (PB), onde mora. “A última foi em mais divertido”, conta a irmã, entre uma baforada e outra
Paraty, na Flip de 2006, quando passei quatro dias infartando. de cigarro, hábito que mantém há 60 anos “e que não tem
Enquanto ouvia o médico falar sobre o meu quadro, tive nada a ver com religião porque o papa também fuma”. Co-
certeza de que estava morta. Foi muito engraçado”, diz, mo missionária, morou na Argélia, no Timor, na China e
para depois emendar outras quatro histórias de (quase) no México, onde ensinou camponeses a ler e a escrever –
morte, relatadas na entrevista a seguir. Marie Claire foi ao trabalho que também desenvolveu no interior do Brasil.
encontro de Val, como é conhecida nas rodas literárias,
após seu romance Outros Cantos (Alfaguara, 152 págs., R$ Hoje, mora em João Pessoa em uma casa com outras
29,90) vencer o Prêmio São Paulo de Literatura (o terceiro quatro freiras. Em nenhum momento deixou de escrever
troféu que ganhou em 2017). Ao longo de dois dias, contou porque “era o que tinha para fazer nos lugares desertos”.
as memórias e brincou: “Anote direitinho porque estou cega, Publicou Vasto Mundo (Alfaguara, 168 págs., R$ 37,90),
mouca e fraca do juízo. Qualquer hora bato as botas”, brinca. o primeiro romance, em 2001. Em 2016, ganhou o Jabuti
com Quarenta Dias (Alfaguara, 248 págs., R$ 32,90), em
Sobrinha-neta do poeta parnasiano Vicente de Carvalho, que narra a história de uma mulher que vaga pelas ruas
diz que uma de suas primeiras lembranças é a de escrito- de Porto Alegre. Para compor o texto, ela mesma dormiu
res reunidos na casa de sua avó, em Santos, onde nasceu nas ruas da capital, por onde também perambulou a es-
e foi criada. Aprendeu a ler sozinha, em francês. Estudou mo por 15 dias. Autodeclarada feminista, luta agora para
em um colégio de freiras e nunca pensou em se tornar es- resgatar e promover escritoras brasileiras. Para isso, aju-
critora porque se encantou com as missões feitas pelas re- dou a fundar o Mulherio das Letras, um grupo que reúne
ligiosas que eram suas professoras. Na faculdade, uniu-se mais de 5 mil romancistas, contistas e poetisas aqui e no
a movimentos da juventude católica, conheceu a Teologia exterior. “São as mulheres que estão escrevendo o que há
da Libertação e, em 1965, virou noviça. Faz parte da Con- de melhor. Os homens estão se dedicando à ‘literatura da
gregação de Santo Agostinho, de religiosas educadoras de brochada’, o mimimi deles”, afirma, aos risos, esta rebelde.
32
ENTREVISTA
MARIE CLAIRE Como surgiu o Mulherio das Letras? MC E como foi a clausura?
MARIA VALÉRIA REZENDE Nos últimos anos, com os novos prê- MVR Podia ler à vontade, desenhar, fazer esculturas. Teve
mios literários e editoras alternativas, os nomes das escrito- uma história engraçada. Depois de três meses no conven-
ras começaram a aparecer. A gente começou a se encontrar to, uma amiga que fumava foi me visitar. A madre passou
e todas reclamavam do pouco espaço nas grandes editoras. e viu o cinzeiro cheio de bitucas. Não falou nada, só olhou.
Na Flip de 2016, conversando pelas esquinas, decidimos nos Quando a amiga foi embora, me perguntei: “O que estou
unir. Criamos um grupo no Facebook. Agora são mais de 5 fazendo aqui que não posso nem fumar um cigarrinho?”.
mil pessoas. Fizemos um encontro em João Pessoa e esta- Fui para o escritório da madre, falei que não queria mais
mos discutindo a tradução de brasileiras para outras línguas. seguir. Ela abriu uma gaveta, pegou um maço de cigarro e
disse: “Você quer ir embora ou é disso que você tem von-
MC Vocês se considera feminista? tade?”. Ela me deixou fumar um cigarro depois de cada
refeição, no meio do mato, para não influenciar as outras
MVR Claro! Mas não sou histérica. O Mulherio é uma respos- meninas. Depois de um tempo, encontrei outra noviça fa-
ta ao machismo no mundo dos livros. Já me aconteceu de zendo a mesma coisa [risos]. Ela tinha uma sabedoria, né?
estar em um evento literário e nenhum dos escritores me
cumprimentar mesmo sabendo quem sou. São os mesmos MC Você também ajudou militantes a combater a ditadura?
que fazem o que chamo de “literatura da brochada”. Os ve-
lhos, de mais de 60, criam personagens que ficam lembrando MVR Ainda na faculdade, passei a fazer parte da juventu-
do atletismo sexual em todo o romance. É o mimimi deles. de católica que era de esquerda. Quando saí da clausura,
em 1967, me formei e fui dar aula no Colégio Madre Alix,
MC Como se iniciou na literatura? em São Paulo. A coisa começou a ficar feia e passamos a
empregar companheiros na escola com outros nomes. As
MVR A casa da minha avó, em Santos, era um ponto de en- madres sabiam de tudo. Em 1968, quando deram o golpe,
contro de escritores. Discutia-se de tudo. Além disso, a lite- estava no Uruguai e não consegui voltar para casa. Passei
ratura está na família. Lia as poesias de meu tio-avô Vicente três meses fazendo articulação pela América Latina, de pa-
de Carvalho, isso formou meu imaginário. Muito criança co- róquia em paróquia. Depois, fui morar e trabalhar no Jar-
mecei a escrever cartas para a minha avó, em forma de nar- dim Nordeste, na Zona Leste de São Paulo. Ali que come-
rativas. Não parei mais. Na faculdade de pedagogia [no Sedes çaram o que mais tarde vieram a se chamar comunidades
Sapientiae, em São Paulo], entrei para a juventude católica. eclesiais de base [projetos de educação que se espalharam
pela América Latina durante os anos 70 e 80].
MC Por que decidiu ser freira?
MC E como era esse trabalho?
MVR Quando eu era mocinha, era normal ser freira. Eu ad-
mirava as irmãs do meu colégio que percorriam os povoa- MVR Viajei por toda a América Latina, pela África, pela China.
dos de pescadores, índios guaranis e quilombos na Serra Falo inglês, francês, italiano, espanhol e aprendo o que for
do Mar e ensinavam puericultura, primeiros socorros, hor- preciso. Comecei a ficar conhecida por não ter medo de nada.
ticultura, alfabetizavam as moças. Meu pai, que era médico, Onde havia uma missão, me chamavam. Dei a volta ao mun-
também participava de missões e me levava para ler histó- do quatro vezes. Também fui morar no interior da Paraíba,
rias para as crianças. Minha vida missionária começou ce- onde trabalhava na defesa dos direitos dos pequenos agricul-
do. Pensei: “Vou ser freira, que é muito mais interessante tores na luta contra os latifundiários. Fotografava e filmava o
do que ficar em casa cuidando de marido e filho”. Tinha trabalho e foi por causa disso que morri pela primeira vez.
que aturar dois anos de noviciado fechado, mas paciência.
“Não sinto falta de sexo.
MC Não pensou que sentiria falta de sexo e da vida conjugal? Duvido quando as
pessoas dizem que não
MVR Não, coloquei essa energia em outros projetos. E duvi- conseguem ficar sem.
do um pouco quando ouço que a pessoa não consegue fi- Coloquei essa energia
car sem transar. Cada ano que passa, digo: “Obrigada, meu em outros projetos”
Deus, como fui inteligente”. Os homens mentem muito e
o que querem é um buraco. Quando morava em Guarabi-
ra (PB), tinha um barranco perto de casa. Os menininhos
ficavam ali, encostados, enfileirados. Fui lá ver, tinha um
monte de buraquinhos. Cada um tinha o seu! A relação dos
homens com o sexo não passa pelas mulheres, mas pela
atração pelo próprio penduricalho. Uma esquisitice, já pen-
sou? Parece – pelas informações que tenho, porque nunca
pude nem me interessei em verificar – que tem uns tortos.
MC Como assim? MC Em algum momento você chegou a questionar sua fé?
MVR Morri psicologicamente. Naquela época, os fazendei- MVR Aos 12 anos. Nessa época, entendi que a fé é no
ros jogavam os bois sobre as plantações dos agricultores mistério. É uma aposta. Não tem como comprovar coi-
para obrigá-los a deixar a terra. Uma noite, fui com minha sa nenhuma, nem refutar nenhum dos argumentos. Fa-
máquina fotográfica registrar aquilo. Surgiram sete homens ço a aposta porque para mim é melhor viver com ela.
com as espingardas apontadas para mim. Os trabalhado- Sou melhor para os outros e para mim mesma se tenho
res que estavam comigo gritaram: “Vai embora, irmã! Vão fé. Não fico me remoendo.
matar!”. Subi no morro para falar com os homens, que tre-
miam mais do que eu. Quando cheguei lá, me pediram MV Já sofreu algum tipo de preconceito por ser freira?
a máquina. Dei o filme. Mas morri outras vezes também.
MVR Existe uma exploração do esquisito: “Freira ganha...
MC Como? [referindo-se às manchetes sobre os prêmios que recebeu].
Ou muita gente da imprensa põe: “Ex-freira...”. O pessoal
MVR Teve um senhor de engenho que me apontou a arma. tem o estereótipo da freira como uma pessoa burrinha,
Sabe como me safei? Na ditadura havia um ministro que se que não arranjou marido e foi para o convento.
chamava Eliseu Resende. Disse que era meu parente. Usei
esse mesmo argumento para soltar companheiros da pri- MC Sofreu algum tipo de violência no campo ou na rua? Para
são. Uma vez quase me afoguei no mar de Itapuã. Noutra, escrever Quarenta Dias você passou 15 dias vagando pe-
estouraram as rodas do avião, que ficou girando em falso, las ruas de Porto Alegre.
até parar com o bico em cima do mar no aeroporto do Ga-
leão. A última foi o folclórico infarto em uma Flip. Fui pa- MVR Toda cidade esconde aquilo que não quer que os
rar no hospital da usina nuclear e retirada de lá de avião. outros vejam. Para escrever a respeito, precisava ir para
Na maca, ouvia o médico dizer: “Não, por terra não pos- uma cidade que não conheço. Peguei umas milhas, fui
so liberar que ela não aguenta. Não, helicóptero não, o cli- para Porto Alegre e me hospedei na casa das minhas ir-
ma tá péssimo”. Pensei: “Morri, agora vou assistir a tudo”. mãs de lá. Perguntei quais lugares eram perigosos. Foi
o meu roteiro. Abordava as pessoas com o argumento
MC Você tem medo da morte? que bolei para a personagem [que estava em busca de
um rapaz desaparecido]. Dormi no saguão do pronto-
MVR Não tenho medo, mas não me sinto livre para mor- socorro, passei noite na porta de igreja fingindo dormir.
rer porque sou responsável pelas pessoas ao meu redor.
MC Estamos vivendo um momento de intolerância religiosa.
MC Foi amiga de Fidel Castro? Como vê os ataques que sofrem os terreiros de candomblé?
MVR Conversamos muitíssimo e nos encontramos algumas MVR É inacreditável. Alguém está ganhando dinheiro tentan-
vezes. Ele queria que a gente ensinasse a Teologia da Li- do eliminar as outras alternativas de fé popular... No fundo,
bertação, pois continuaram a ser um povo católico. E as- a religião é um esteio para ajudar as pessoas a viver. Convi-
sim fiquei indo e vindo de Cuba por dez anos, nas décadas vo com muita gente do candomblé e é uma gente benigna
de 80 e 90. Viajei o mundo todo em missões. No México, e evangélica no sentido do adjetivo, daquele que vive de
por exemplo, tomei uma bebedeira de mezcal, em uma fes- acordo com o Evangelho. É uma comunidade.
ta nos anos 70, que me ensinou que não posso com nada
fermentado. Era o primeiro ano de ocupação de uma fin- MC Qual é a sua opinião sobre a legalização do aborto?
ca por trabalhadores rurais e eu era a convidada de hon-
ra. A comemoração era beber e seria uma desfeita recusar. MVR Eu me pergunto como é que uma pessoa engravida
sem querer nos dias de hoje. É preciso educar as mulheres
MC Já usou algum tipo de droga? e os homens para não engravidarem sem querer. Agora
existe um problema maior, e mais grave, que é o estupro.
MVR Em 1969, estava trabalhando com um padre bene- Existem tipos de estupro – inclusive o cometido pelo mari-
ditino, Augustinho, em uma detenção provisória de me- do. E também não tem cabimento pôr a vida de uma mãe
nores do Tatuapé (SP). Os meninos eram todos viciados em risco, que pode já ter outros filhos, em benefício de
em maconha e aí o Augustinho falou: “Precisamos expe- uma criança órfã. Então, sim, sou a favor da lei como ela é.
rimentar para entender o que eles sentem”. Fizemos uma
sessão solene. Não senti absolutamente nada. MC Já teve depressão?
MC Você já se apaixonou? MVR Nunca. Mas, de um ano para cá, estou tomando anti-
depressivo. Percebi que estava mais difícil dar conta das
MVR Na adolescência, a gente se apaixona e desapaixona fá- coisas. Liguei para uma amiga psiquiatra, que resolveu
cil. Namorei uns meninos. Mas sou muito seletiva. Se você com um remedinho.
coloca 200 pessoas na minha frente, sei quem é o cara que
pode oferecer algum perigo e não me aproximo. MC Do que você tem medo?
MVR [Pausa] De perder a fé nas pessoas e em um mundo melhor.
COM PORTA M EN TO 34
O que elas
têm em
comum?
Sensação de estar sempre cinco minutos atrasada,
autocobrança desmedida, uma voz interna que
ameaça: “não vai dar certo”, “não vai ser bom”,
“não vai dar tempo”. Juliana, Vitória e Fernanda
estão entre os 20 milhões de brasileiros que
sofrem de transtorno de ansiedade, uma doença
que acomete principalmente mulheres. Marie
Claire as acompanhou de perto para entender: por
que, mais do que nunca, estamos tão ansiosas?
Por Luíza Karam Fotos JuLia rOdrigues
Há dois anos, a publicitária paulistana
Juliana Jabra, 26, trabalhava numa
agência de tendências em ritmo
frenético. Acostumada a expedientes madrugada
adentro, depois de uma semana especialmente
atribulada, ouviu de um chefe uma pergunta
trivial, sobre um arquivo importante que estava
sendo produzido havia dias: “Você salvou, né,
Ju?”. De bate-pronto, ela assentiu. Mas, por dentro,
sentiu uma espécie de implosão. Não tinha certeza
se tinha mesmo guardado o arquivo. Pior: cogitava
tê-lo apagado. De cima a baixo, Juliana sentiu
sua espinha dorsal contrair. O ar rareou, a boca
secou. Cada vez mais rápido, o batimento do
coração parecia ser ouvido a 1 metro de distância.
Passou uma hora suando frio, sem conseguir se
concentrar em mais nada, até que deu o clique:
sim, o arquivo estava lá, lembrou-se. Mas nem
isso a fez voltar a seu estado natural, tampouco a
tranquilizou. Caiu numa crise de choro – logo ela,
que se orgulha de nunca chorar – e ficou tonta.
Passou o resto do dia agitada; a noite, em claro.
36
COM PORTA M EN TO Na manhã seguinte, exagerou no café para segurar entre os papéis de mãe, profissional de sucesso
as pontas numa reunião longa. Aí não demorou e mulher desejável. Todas têm ansiedade em
para a pressão baixar e a sensação de vertigem algum nível. Essa necessidade contemporânea da
reaparecer. Do escritório, Juliana foi carregada multitarefa não parece positiva para a qualidade
direto para o pronto-socorro. O diagnóstico? de vida da mulher”, afirma Wang Yuan Pang,
Crise de pânico. Motivo? Excesso de ansiedade. professor de psiquiatria da Faculdade de Medicina
da Universidade de São Paulo e autor do maior
O pânico é a principal manifestação do chama- mapeamento de transtornos de ansiedade na
do transtorno de ansiedade, a doença que atinge metrópole, cuja conclusão aponta que quase 20%
uma a cada 25 pessoas na Terra – funil que se da população sofre de ansiedade; as mulheres,
estreita no caso das mulheres: uma em 20 é an- o dobro que os homens.
siosa, de acordo com a Organização Mundial da
Saúde (OMS). Com os anos, o distúrbio só cres- Mecanismo de defesa inato ao corpo, a
ce, e hoje há 264 milhões de ansiosos no mundo. ansiedade é uma reação fisiológica que nos
No Brasil, a proporção é alarmante: quase 10% preserva de riscos. “Assim como o medo, ela
da população sofre do problema. A principal ra- é importante, porque faz crescer a noção de
zão é a mesma que desbancou Juliana naquele autoproteção. A diferença é que, enquanto o
dia: enquanto nossa saúde mental depende do medo é um reflexo do organismo a uma ameaça
contexto em que vivemos, numa sociedade sa- real, a ansiedade se defende de uma mera
turada por trânsito, prazos apertados, cobranças possibilidade”, explica a psicóloga Kátia Caetano,
estressantes e jornadas de trabalho sem fim, nos que faz parte da Association for Behavioral and
acostumamos a antecipar preocupações, esperar Cognitive Therapies, instituição americana que
pelo pior e fulminar a própria paz. é referência em pesquisas sobre o transtorno.
“Passar mal foi uma reação por ter chegado Há poucas certezas sobre o que acontece no
ao limite. Sou superparanoica, não cometo erros cérebro em momentos de ansiedade à flor da pe-
no trabalho, jamais estou atrasada... Ainda assim, le – durante uma crise de pânico, por exemplo,
dificilmente acho que tudo vai dar certo”, diz o papel de estruturas neurais é modificado, as-
Juliana. Não por acaso, o sexo feminino lidera sim como ocorrem alterações químicas no cor-
o ranking do transtorno. “Atendo diretoras de po, mas a ciência nunca atestou se os indícios se-
empresas e altas executivas que se dividem riam causa ou consequência da doença. Respos-
tas mais certeiras moram na filosofia. Foi ainda
na Antiguidade que o romano Sêneca antecipou
os escritos de pensadores existencialistas como
Kierkegaard e Heidegger de que a ansiedade fun-
damental do homem vem de se saber finito. Te-
mos medo de morrer ou de carregar vexames até
o fim, daí nossa perturbação constante. Não que
isso seja de todo ruim. “Nossas respostas a situa-
ções de perigo constituem uma saudável capa-
cidade humana. Temer as feras ajudou a manter
nossos ancestrais a salvo. Faz parte do instinto de
sobrevivência”, afirma o historiador Leandro Kar-
nal. “Hoje, temos muita comunicação no mundo
e muita difusão de medos. Resultado: o mundo
tecnológico multiplica ansiedades.”
“Cheguei ao limite. Fui parar
no hospital. Não me permito
errar” – Juliana Jabra, 26, publicitária
Beleza: Carlos rosa (Capa MGT) / produção-exeCuTiva: vandeCa ziMMerMann / assisTenTe de foToGrafia: silas aGuiar Hora do burnout “Comia para desviar
a atenção do que me
Dez anos atrás, a bióloga Vitória Moreau, 37,
passava os dias no afã de dar conta de tudo – preocupava. Depois
e mais um pouco. Queria manter o corpo per- de devorar uma
feito, os estudos sobre célula-tronco em dia,
os dois empregos e os dois namorados (só um pizza, batia a culpa
oficial). Em paralelo, foi colecionando fobias e caminhava 10 km”
e transtornos classificados sob o guarda-chuva
da ansiedade pela bíblia da psiquiatria, o DSM, – Vitória Moreau, 37, bióloga
caso do estresse pós-traumático e da bulimia
nervosa. “Eu comia demais para desviar a aten- devorou 1 litro de sorvete de chocolate branco
ção de tudo que me preocupava – e, naquela ao acordar atrasada para esta entrevista com
toada insana, não era pouca coisa. Depois de Marie Claire. Durante toda a conversa, mordeu
devorar uma pizza e meia, por exemplo, batia e cutucou as unhas, já envoltas por feridas.
a culpa, e eu saía caminhando sem meios-ter-
mos, durante horas, 10 quilômetros numa ta- Em termos de tratamento, o que os estudos
cada só”, conta. “Eu era magérrima, mas supe- apontam como uma das saídas mais eficazes
rangustiada. Minha vida era pura ansiedade.” para o transtorno é a terapia cognitivo-
comportamental, que ajuda a diminuir sintomas e
A literatura médica mostra que é na trabalha o paciente para encarar suas ansiedades,
intensidade dessas desordens mentais além de encontrar seus próprios caminhos para
desencadeadas por traumas e estresse que mora lidar com a questão – muitas vezes, atividades
o problema. Diante do pânico, das compulsões
e das fobias, chega-se a perder as rédeas do
sentimento normal de ansiedade, e o organismo
sai dos eixos: as mãos suam, começam a
taquicardia e os tiques, como puxar o cabelo
e arrancar as cutículas despudoradamente, até
que voilà: eis o quadro clínico. Nessa toada,
quanto mais tempo se leva para procurar ajuda,
mais o cérebro fortalece seus comando ansiosos.
Vitória demorou tanto que desenvolveu um
transtorno secundário, a depressão.
Foi só depois de cinco anos de correria e
sofrimento para dar conta da vida dupla que
ela buscou a ajuda de um psicoterapeuta.
Mais especificamente, quando os namoros
deram errado e a solidão bateu, junto com
o desespero. Vitória encontrou acolhimento
nas sessões, sentiu-se à vontade para falar dos
medos e desconfortos mais íntimos, aprendeu
que descontava suas ansiedades na comida
(até hoje, o pano de fundo de sua grande
batalha contra a balança). Enxergou-se com
mais clareza e passou a controlar as fobias com
remédios. Atualmente, são seis. “Não conheço
ninguém que não tenha ansiedade. Agora, tento
trabalhar a minha de uma maneira positiva,
migrar minhas aflições para outros escapes,
como os estudos. Mas nem sempre consigo.
Tenho que lidar com a ansiedade dia após
dia”, diz ela, que, mesmo hoje, em tratamento,
38
com porta m en to físicas, lúdicas ou intelectuais que sirvam como loto automático.” Todo mês, R$ 2 mil acabavam
válvula de escape para o turbilhão da mente. em frasquinhos de antidepressivos e ansiolíticos.
Hobbies que demandam muita energia física
ou concentração também podem ter efeito Vivia trancada no apartamento no bairro nobre
preventivo. No ano passado, um dos papas da dos Jardins. Tão dopada que, não raro, caía no
ansiedade no mundo, Stefan Hofmann, que sono com o cigarro entre os dedos – das
lidera o Programa de Ansiedade Social, da almofadas da sala à cama, todos os tecidos da
Universidade de Boston, publicou um estudo casa eram queimados. “A ansiedade me levou
com 501 participantes que comparava a eficiência ao isolamento total, a uma vida sem sentido
da hatha ioga no tratamento da ansiedade. algum”, diz. A filha caçula não aguentou mais
ver a mãe naquele estado e resolveu intervir.
remédios: amigos ou vilões? Para atender ao apelo, Fernanda deu ouvidos à
sugestão de um amigo: um grupo de mútua
Ainda assim, há casos em que o uso de remédios ajuda em que as pessoas se reúnem diariamente
se faz necessário. Estamos entre os maiores para conversar sobre o que lhes aflige, sem
consumidores de clonazepam, o princípio ativo mediadores nem terapeutas especializados. Há
do ansiolítico queridinho dos brasileiros, o dois anos, o método tem dado frutos. “Não tomo
Rivotril. Só em 2015, foram vendidos pelo menos mais remédio, larguei o cigarro e aprendi a tratar
23 milhões de caixas do remédio no país. “Temos o mal pela raiz: parar de me preocupar com
uma cultura de prescrição e consumo excessivos tudo de antemão e lidar serenamente com o
de remédios. O ideal é descontinuar o uso à momento presente”, diz. Quando ouve aquele
medida que a terapia evolui. Usar ansiolíticos e velho grito agudo e descontrolado dentro do
antidepressivos por anos pode causar distúrbios peito, olha para si, medita, vai à academia, se
de memória, afetar a cognição e até levar a um concentra. “Nunca me senti tão livre. Me vejo à
quadro demencial”, afirma o psiquiatra Tito frente dos meus medos, de minhas preocupações,
Paes de Barros Neto, autor do livro Sem Medo das tristezas. Sou, enfim, dona de mim.”
de Ter Medo, um guia prático para ansiosos.
Com o uso desmedido de remédios, a paulis-
tana Fernanda Abdo, 54, dava fim às crises de an-
siedade que a atormentavam. Herdeira de uma
grande fabricante de esmaltes, tinha se acostuma-
do a pintar, descascar e passar outra camada de
cor nas unhas, em looping, quando se sentia an-
siosa. Mas, em 1995, terminou o casamento com
o pai de suas duas filhas (hoje com 23 e 25 anos)
e começou a frequentar consultórios em busca de
tarjas pretas para amenizar a dor. “Parei de sentir
medo. Na verdade, não sentia nada. Entrei no pi-
“A ansiedade me levou
ao isolamento total, a
uma vida sem sentido
algum. Gastava R$ 2 mil
em remédios todo mês”
– Fernanda Abdo, 54, empresária
CA PA 40
Ela começou a atuar aos 13 anos, acumulou
prêmios e fama antes dos 30, quando teve vontade
de jogar tudo para o alto e recomeçar. Então,
passou a escrever. Em sua primeira capa de Marie
Claire, Fernanda Torres, 52, conta como a literatura
ajudou em sua reinvenção profissional e, de quebra,
a colocou entre as mais importantes escritoras
do país, com o lançamento do segundo romance,
A Glória e Seu Cortejo de Horrores. Na conversa
que você acompanha nas próximas páginas,
a atriz revela detalhes da vida pessoal, a lida com
a maturidade e os (muitos) planos para o futuro
Por adriana ferreira Silva
Fotos CHriSTian GaUl
EDIÇÃo DE MoDA lariSSa lUCCHeSe
Fernanda usa vestido dior, / st yling: andré Puertas / São 2 da tarde de um dia en- Não foi a primeira vez que Nanda
ProduÇÃo-eXeCutiva: vandeCa ZiMMerMann solarado no Rio, quando Fernanda teve de lidar com o ódio na rede. Em
Torres recebe Marie Claire para a 2016, escreveu um texto para o blog
primeira de duas longas conversas, #AgoraÉqueSãoElas, no site da Folha
no apartamento onde mora com o de S.Paulo, em que dizia: “A vitimi-
marido, o diretor Andrucha Wad- zação do discurso feminista me irrita
dington, e os filhos, Joaquim, 18, e mais do que machismo”. Despertou a
Antonio, 9. Enquanto faz um café, ira das feministas e levou uma chamada
Nanda, como os amigos a chamam, do filho mais velho. Logo em seguida,
fala sobre sua preocupação com os pediu desculpas em um novo artigo.
haters. Poucos dias antes, sua mãe, “Me senti uma mulher do século pas-
a atriz Fernanda Montenegro, ha- sado. Foi Joaquim quem me localizou
via participado de uma campanha no tempo e no espaço. Tanto que se
pela liberdade de expressão. O ví- tornou meu revisor nesse texto”, diz.
deo, que viralizou, foi hostilizado e “Descobri que o meu discurso era de
a atriz, ameaçada. “Uma pessoa es- exceção. Sou neta de operários e ja-
creveu que, se visse minha mãe na mais meu avô proibiu minha mãe de
rua, passaria com o carro em cima. ser atriz, numa época em que, para is-
Denunciamos ao Facebook e a res- so, era preciso ter carteirinha de puta.
posta foi que o post não feria sua Os direitos foram dados a mim, sem
‘política’. Fiquei chocada.” que eu precisasse lutar por eles”, reflete.
42 CA PA
Sua juventude não teve nada de tri- BeleZ a: riCardo dos anjos (CaPa Mgt) CoM Produtos M.a.C e MatCH o BotiCário / assistente de BeleZ a:
vial: foi nos bastidores do teatro, acom- Mill a Mendes / assistente de FotograFia: guilHerMe Ferreira / trataMento de iMageM: rg iMageM
panhando Fernanda e Fernando Tor-
res. “Fui criada na coxia e foi uma in-
fância tristíssima: meus pais trabalha-
vam de terça a domingo, sem fim de
semana nem feriado. Ir ao teatro era
fazer parte da vida deles”, relembra.
Desse período, no entanto, sobram
histórias divertidas, como a primeira
viagem internacional da família, quan-
do Nanda tinha 9 anos. “Meus pais ga-
nharam duas passagens e decidiram
levar a mim e ao meu irmão, Cláudio,
à Europa. Seriam 45 dias para conhe-
cer tudo. Foi um périplo exaustivo,
dois dias em cada cidade, e ainda
cruzamos o oceano rumo à Dis-
ney e a Nova York, onde final-
mente eu poderia comprar brin-
quedos”, lembra ela. “Meu sonho
era ter uma Barbie e, quando che-
gamos à loja, escolhi uma para a
minha prima e, quando peguei
a minha, mamãe disse: ‘Pra que
duas? Brinca com a dela’. Resignada,
trouxe o Ken pra mim”, fala, às gar-
galhadas. “Contei isso numa entrevis-
ta e, no meu aniversário de 40 anos,
minha mãe me deu a Barbie. Ficou
horrorizada de eu ter esse trauma.”
Garota precoce
Com ou sem Barbie, Nanda teve pouco
tempo para as bonecas. Aos 13 anos,
estreou no teatro. Aos 16, recusou o pri-
meiro papel em um filme por influên-
cia dos pais. “Foi a única vez em que
eles falaram: ‘Esse não dá para você
fazer’.” Não por acaso, nesse longa, ela
seria uma ninfeta, com muitas cenas de
nudez. “Na época, a pornochanchada
sustentava o cinema. Se não tirasse a
roupa, não dava público. Como par-
te do lançamento, era comum a atriz
já assinar com a Playboy”, conta ela,
que nunca topou posar para a revista.
A decisão foi correta. Após esse epi-
sódio, acumulou sucessos no teatro, no
cinema e na TV. Antes dos 30 anos,
Nanda tinha até um troféu de melhor
atriz em Cannes. Então, cansou. Não
queria mais atuar. “Lamentei ter saído
do colégio aos 17 e não ter feito facul- e lança o segundo romance, A Glória
dade. Foi quando comecei a escrever.” e Seu Cortejo de Horrores (Companhia
das Letras, 216 págs., R$ 44,90) – que
Sem saber, construía uma nova versão a colocou entre as escritoras de ficção
de si mesma. Primeiro, fez roteiros de mais vendidas do Brasil. Desde que
filmes como O Redentor, dirigido pelo chegou às lojas em dezembro, o livro
irmão, Cláudio. Depois, passou a assinar ganhou inúmeros elogios, foi desta-
crônicas para jornais e revistas. Em 2013, que na revista The New Yorker e será
publicou o primeiro livro, Fim (Compa- traduzido para o francês.
nhia das Letras, 208 págs., R$ 39,90), su-
cesso instantâneo, com mais de 180 mil Mas, apesar da repercussão, Fernan-
exemplares vendidos e traduzido para da ainda se sente um peixe fora d’água
sete línguas. Em paralelo, assumiu de na literatura. “Quando acabei Fim, achei
vez o humor ácido com o qual encara que nunca mais ia conseguir fazer ou-
essa “tragicomédia que é a vida”, e que tro. Talvez por isso, tenha escrito agora
a inspirou a compor a Vani, de Os Nor- sobre um ator, ofício que conheço tão
mais, e a Fátima, de Entre Tapas e Beijos. bem”, diz, a respeito do protagonista,
Mario Cardoso, que começa no teatro
É nessa nova persona que ela aposta experimental, faz cinema, alcança a
agora, enquanto prepara a volta à TV, fama como galã de novelas globais e
na série Sob Pressão, no ar em junho, entra em decadência. O fim da linha é
o fracasso num folhetim bíblico. O an-
ti-herói toma emprestadas característi-
cas de amigos como Evandro Mesqui-
ta e da própria Fernanda. O trecho em
que o personagem se apresenta para
uma plateia de pessoas bêbadas, que
roncam durante a peça, foi vivido por
ela. “Foi um suplício lento e doloroso”,
lembra. Outros momentos marcan-
tes, durante o desbunde dos anos
70, também são lembranças da
juventude: “Vi o Dzi Croquettes
aos 12 anos e foi um choque”,
conta, em referência ao grupo de
teatro cujos atores, a maioria as-
sumidamente gay, debochavam da
política em plena ditadura.
Mas mesmo sendo testemunha des-
se período de revolução de costumes
e liberação sexual, Fernanda nunca
fez o estilo pegadora. Pelo contrário.
“Sempre fui casadoura. Quando co-
“Fui criada na coxia
e foi uma infância
tristíssima. Meus pais
trabalhavam sem feriado
nem fim de semana”
CA PA44
“Toda a minha geração nheço alguém de quem gosto, tenho Fernanda usa vestido dior
conheceu e experimentou um relacionamento longo”, diz. Foi as-
cocaína. Mas vício sim que, aos 18 anos, se casou com o
mesmo eu tenho jornalista Pedro Bial. Os dois se apai-
por café e passas!” xonaram durante uma entrevista em
que ela aparece com as bochechas
inchadas, por ter arrancado o dente
do siso, falando bobagens típicas da
adolescência. “Até hoje, pergunto ao
Pedro como pode ter me ligado: eu
parecia uma imbecil!”, exagera.
Pelo segundo marido, o diretor Ge-
rald Thomas, Fernanda trocou o Brasil
por Nova York. “Foi um amor incrível”,
conta Thomas. “Nanda reúne várias
genialidades: não deixa ninguém fi-
car down. É hilário conviver com ela.”
A saída do país foi também o afasta-
mento de um cenário em que a barra
começava a pesar, do show business
movido a cocaína e rock’n’roll. “Toda
a minha geração conheceu e expe-
rimentou cocaína”, diz ela, cujo úni-
co vício, hoje, é o café. “Ah, também
sou louca por passas!”, fala, aos risos.
O relacionamento com Thomas ter-
minou quando ele conheceu a produ-
tora Gilda Midani. De volta ao Brasil e
sem emprego, quem ajudou Fernanda a
curar a “dor de corno” foram amigos co-
mo Debora Bloch e Luiz Fernando Gui-
marães, que a convidaram para fazer
5 X Comédia, peça que se tornou sen-
sação. Pouco depois, Nanda reencon-
traria Andrucha. “Eu o conheci quan-
do tinha 24 e ele, 18. Achei um meni-
no bonito, mas era casado com a Bel
Diegues [também ex de Pedro Bial]”,
lembra. Separado da primeira mulher,
com quem tem dois filhos, João, de 25
anos, e Pedro, de 23, Andrucha se rea-
proximou de Nanda graças ao cunha-
do, seu sócio na Conspiração Filmes.
“Um dia, jantando com meu irmão,
Andrucha falou: ‘Bom, quem está li-
vre?’, e o Cláudio: ‘Porra, a Nanda, ca-
ra!’. E o Andrucha me ligou”, descreve,
imitando, hilária, a voz de cada um de-
les. “Mas tinha acabado de sair de um
casamento e o rejeitei. Um ano depois,
nos encontramos...” Casaram, tiveram
dois filhos, passaram uma temporada
separados em 2009 – poucos sabem,
mas eles não estavam juntos quando, foi quando meu enteado João teve uma
nessa época, o diretor foi flagrado por aplasia na medula (produção insufi-
paparazzi beijando uma mulher duran- ciente de células sanguíneas na medu-
te o Carnaval. Reataram e somam 20 la) e a médica receitou Rivotril para me
anos juntos. “Passamos por tudo: vive- tirar do estado de ansiedade”, conta.
mos juntos, separados, tivemos filhos...
Agora estamos num momento muito in- Ela também aprendeu a lidar com
teressante, numa espécie de maturida- outra perturbação recente: os hormô-
de, aquela fase em que a gente não se nios. “Quando comecei a sentir as alte-
engalfinha como se fosse morrer por rações, não sabia se estava grávida ou
causa de uma crise”, diz ela. se era menopausa, porque você incha,
a pele seca... É assustador”, diz ela. “O
Foi com Andrucha que Fernanda mais engraçado de ficar mais velha é
conta que se tornou adulta. “Apesar de estranhar o mundo: de repente, as coi-
ser mais velha do que ele, vivia com sas começam a ficar diferentes. Mas não
uma mala, enquanto o Andrucha ti- tenho o menor medo de envelhecer.”
nha casa com arroz, feijão e o João e o
Pedro”, diz. Os dois decidiram morar Até porque ela tem muitos planos.
juntos quando Fernanda ficou grávida Ao mesmo tempo que divulga o novo
de Joaquim. Antes, sofreu um aborto, livro, adapta Fim para uma série que
que também aconteceu ao tentar engra- deve ser exibida pela Globo em 2020.
vidar de Antonio. “Sou assim: só pego Também quer levar um texto de Ma-
no tranco”, diz ela, que nunca interrom- chado de Assis ao teatro e se prepara
peu uma gravidez, embora seja a favor para transformar em filme A Casa dos
da regulamentação do aborto. “Foram Budas Ditosos, monólogo de João Ubal-
duas perdas espontâneas, em momen- do Ribeiro. “A TV me descansa da lite-
tos em que queria engravidar. Seu cor- ratura, que me descansa do teatro, que
po todo se prepara pra aquilo e, de re- me descansa de outras coisas...”
pente... É um luto”, diz, emocionada.
efeito sanfona
Minha segunda conversa com Fernan-
da, semanas depois, foi em seu apar-
tamento em São Paulo, horas antes da
sessão de fotos. Para o almoço, sugeriu
um peixe com salada, menu que refle-
te a preocupação com a silhueta: ainda
que a gente só se lembre dela magra e
definida, jura que vive um eterno efeito
sanfona. “Comecei a fazer regime aos
12 anos, porque tinha os joelhos jun-
tos e, se engordasse, piorava”, lembra.
“Mas descobri que não bastava ema-
grecer, tinha de fazer reeducação ali-
mentar e malhar. Fiz de tudo: capoeira,
taekwondo, ioga, balé... Estou ruman-
do para o pilates geriátrico!”, brinca.
Mas, mais que o corpo, o que lhe
preocupa é a mente. Fernanda convi-
veu anos com uma tristeza, por vezes
profunda, sensação da qual se livrou
com terapia. “Não tive depressão, mas
sentia muita melancolia... O único mo-
mento em que aceitei tomar remédios
46
MULHER NO PODER será que Imagine um país em
que parlamentares vo-
agora é tam no que é melhor para
que são o povo e não para seus par-
tidos; onde investimentos em
saúde e educação só aumentam.
Nesse país, empresas que pagam
salários diferentes para homens e
mulheres na mesma função são pu-
elas? nidas e a licença parental é ampla e
remunerada. Utopia? Nem tanto. Estudos
mostram que essas mudanças acontecem
quando nós ocupamos cargos na política
de forma expressiva. Ao longo de 2018, Marie
Claire se dedicará ao tema em todas as edições,
site e redes sociais. A seguir, uma investigação so-
bre o que muda quando o poder se torna feminino,
e os nomes que poderão fazer parte dele no Brasil
por maria laura neves
fotos: thinkstock, jorge willians, divulgaççao Massa crítica é um termo cunhado pela física, manuela d’Ávila
usado, grosso modo, para designar a quantida-
de necessária de material para uma explosão Quem é : Jornalista gaúcha,
nuclear. Num experimento em laboratório, alcança-se a 36 anos, deputada estadual
massa crítica e, bum, acontece a mudança. Por sua cla-
reza, a expressão foi usada pela sociologia nas últimas Por Que falarão dela:
décadas. E, em 2018, deverá cair na boca das brasileiras:
quando alcançam um número significativo de postos na Pré-candidata à Presidência
política, as mulheres promovem melhorias não só para si da República pelo PCdoB, foi
próprias, mas para o país. No Brasil, onde temos apenas deputada federal e vereadora
10% das cadeiras do Parlamento, os passos para atingir de Porto Alegre e investigada
esse patamar são ainda mais urgentes. por suposto caixa dois de
campanha pela Lava Jato
Um estudo feito pela ONU Mulheres divulgado no ano
passado mostrou que estamos em 154º lugar entre 174 países marina silva
em termos de representatividade, com 55 mulheres entre 513
deputados e 13 entre 81 senadores. “Foi uma surpresa. Na Quem é : Acreana, ambientalista
América Latina e no Caribe, onde a média de participação é e fundadora da Rede, 59 anos
de 25%, o Brasil só perde para Belize”, afirma Nadine Gas- Por Que falarão dela : Pré-
man, representante do órgão no Brasil. Pior: se continuar- candidata à Presidência da República pela
mos elegendo deputadas e senadoras na velocidade dos úl- Rede. Foi vereadora, deputada, senadora
timos anos, só alcançaremos a equidade em 2080, segundo e ministra do Meio Ambiente. Também
um estudo do Banco Mundial. No Executivo, a situação é foi citada na Lava Jato por suposto caixa
ainda mais vergonhosa: no governo federal são apenas duas dois na campanha à Presidência de 2010
ministras (Grace Mendonça, Advocacia-Geral da União, e
Luislinda Valois, Direitos Humanos) entre 28. “Embora no
Brasil as mulheres tenham conquistado direitos, como o vo-
to, mais rapidamente do que em países como a Arábia Sau-
dita, não alcançamos cargos de poder”, diz a socióloga Fáti-
ma Pacheco Jordão, fundadora do Instituto Patrícia Galvão,
que promove estudos feministas. “Isso se deve ao machis-
mo estrutural dos partidos políticos, que não permite uma
renovação de perfis dos candidatos em seus quadros. Essa
realidade se refere às mulheres, mas também aos negros.”
E quem perde com a falta de mulheres no poder? Não
só elas, mas a democracia. Quando há um aumento de 5%
no número total de deputadas e senadoras em um país,
o uso da violência como arma de guerra cai cinco vezes
em conflitos internacionais, segundo estudo da Universi-
dade de Massachusetts. A pesquisa mostrou também que,
quanto maior é a participação feminina no Parlamento,
menos se usa a violência como arma de Estado e maior
é a preservação dos direitos humanos. “Crescem ainda
os investimentos em educação e saúde porque a mulher
se preocupa muito mais com o impacto na vida cotidia-
na dos cidadãos do que os políticos homens”, diz Fátima.
A presença de mais mulheres no poder gera outro ci-
clo virtuoso. Quando são eleitas presidentes (o que acon-
teceu até hoje em 50 dos 193 países), o número de can-
didatas que chegam ao Parlamento sobe 6%. O contrário
48
MULHER NO PODERé verdadeiro, segundo a ONG americana One Earth Fu- renata Campos
ture. Quanto maior a presença delas na Câmara e no Se-
fotos: ccommons_pmdb nacional, divulgação, joão carlos mazellanado, mais elas se candidatam à Presidência. Ainda so-Quem é : Economista pernambucana,
bre os ganhos democráticos, elas também são mais pro- 51 anos, viúva de Eduardo Campos
pensas a levar discussões que sejam interessantes para as (morto em 2014)
nações e não apenas para seu partido – nada mais bem- Por Que falarão dela: Atuante nos
vindo em tempos de radicalismo e polarização. Nos EUA, bastidores, é forte influência em seu
por exemplo, foi um grupo de senadoras republicanas que estado. Geraldo Alckmin, Lula e Marina
deixou as diferenças para abrir diálogo com democratas a cortejaram em busca de apoio. À
e fazer avançar pautas de interesse nacional quando as frente do programa Mãe Coruja, reduziu
taxas de aprovação de projetos não chegavam a 20%, em a mortalidade infantil em Pernambuco
2013. As primeiras a topar a aliança foram mulheres. En- e recebeu prêmio da ONU pelo feito
tre os ganhos diretos, pode-se citar o fato de que na In-
glaterra de Theresa May, com 32% de mulheres no Parla- rosa Weber
mento, aprovou-se um projeto de lei que prevê que em-
presas com mais de 250 funcionários tenham suas folhas Quem é : Juiza gaúcha, 69 anos,
de pagamento fiscalizadas para evitar diferenças salariais ministra do STF e do TSE
de gênero. E as licenças parentais são mais comuns em
países nórdicos – na Suécia, elas são 44% do Legislativo. Por Que falarão dela
No Brasil, os partidos políticos são obrigados a apresen- Ocupa a vice-presidência do
tar 30% de candidaturas femininas. Para cumprir esse obje- TSE e deverá estar no comando
tivo, promoveram candidatas fantasmas, que não receberam do órgão em outubro, quando
um voto sequer nas últimas eleições. Por isso, começamos acontecerão as eleições. Ou
a levantar os nomes que dominarão o cenário neste ano. seja: todo o rito estará sob seu
comando. Construiu carreira de
Kátia abreu sucesso como juíza do trabalho
Quem é Empresária goiana,
55 anos, senadora
Por Que falarão dela
Embora tenha sido expulsa
do PMDB no ano passado,
deverá encontrar outro
partido que legitime sua
campanha ao governo do
estado do Tocantins. Foi
ministra da Agricultura e
é a principal representante
política do agronegócio
Gleisi Hoffmann
Quem é Advogada paranaense, 52
anos, senadora e presidente do PT
Por Que falarão dela Deve
concorrer ao governo do Paraná, mas
as citações em delações da Lava Jato
podem atrapalhar os planos.
É ex-ministra da Casa Civil e exerceu
dois mandatos como senadora
Foto: divulgação obra de Jean
M i c h e l - B a s q u i at
está na mostra com
trabalhos do
artista, que passa
por quatro capitais
cultura
por@driferreira
50 cultura
por Adriana Ferreira Silva
das ruas Minas de respeito no centro FotoS: drica, get t yimageS / divulgação / Fernando donaSci / thinkStock / Sharon at tia
Um dos mais Depois de uma estreia inspirada, O antigo prédio
importantes artistas dos o grupo feminista Rimas e Melodias do Banespa, hoje
anos 80, Jean-Michel segue trazendo frescor ao rap com suas
Basquiat, grafiteiro que Farol Santander,
transformou as ruas de rimas afiadas e suingue imbatível. em São Paulo, vai
Nova York num museu
a céu aberto, é tema de se transformar
uma superexposição num espaço para
que abre no CCBB de exposições – que
São Paulo em 25 de
janeiro e segue para abre com Laura
Brasília (abril), Belo Vinci e o coletivo
Horizonte (julho) e Rio
de Janeiro (outubro). Tundra – e um
coworking, entre
outras novidades
que vão agitar o
centro da cidade a
partir do dia 25.
MeMórias
Com previsão de
lançamento em março,
pela Cia. das Letras, a
biografia de Fernanda
Montenegro traz saborosos
bastidores do teatro e da
TV nos últimos 70 anos.
As apostas
Quais serão os melhores shows e exposições do ano
do país? Que modinhas ganharão as ruas e
os cardápios? Quem são as mulheres que vão
nos inspirar? Marie Claire selecionou artistas,
eventos e tendencinhas que agitarão 2018