The words you are searching are inside this book. To get more targeted content, please make full-text search by clicking here.

Microbiologia Medica e Imunologia 10a Edição_booksmedicos.org

Discover the best professional documents and content resources in AnyFlip Document Base.
Search
Published by Marvin's Underground Latino USA, 2018-08-10 11:55:52

Microbiologia Medica e Imunologia 10a Edição_booksmedicos.org

Microbiologia Medica e Imunologia 10a Edição_booksmedicos.org

104 Warren Levinson

D. Vacinas com bactérias vivas, atenuadas Imunidade passiva

(1) A vacina contra tuberculose contém uma linhagem As antitoxinas (imunoglobulinas) podem ser utilizadas no
viva atenuada de Mycobacterium bovis denominada BCG, tratamento e na prevenção de certas doenças bacterianas. As
sendo recomendada, em alguns países, para crianças sob alto seguintes preparações encontram-se disponíveis:
risco de exposição à tuberculose ativa.
(1) A antitoxina tetânica é utilizada no tratamento do
(2) Uma das vacinas contra a febre tifoide contém Sal- tétano e em sua prevenção (profilaxia). Como tratamento,
monella typhi vivas atenuadas. É indicada para indivíduos re- uma vez que o objetivo consiste em neutralizar qualquer to-
sidentes ou que viajam por regiões onde existe risco elevado xina não ligada a fim de prevenir o agravamento da doença,
de febre tifoide, bem como para indivíduos em contato pró- a antitoxina deve ser prontamente administrada. Na preven-
ximo com pacientes infectados ou portadores crônicos. ção, a antitoxina é administrada a indivíduos imunizados
inadequadamente que apresentam ferimentos contaminados
(3) A vacina contra tularemia contém células vivas ate- (“sujos”). A antitoxina é produzida em humanos a fim de
nuadas de Francisella tularensis, sendo utilizada principal- evitar reações de hipersensibilidade. Além da antitoxina, es-
mente em indivíduos expostos devido a sua ocupação, como tes indivíduos devem receber o toxoide tetânico. Este é um
profissionais de laboratório, veterinários e caçadores. exemplo de imunidade passiva-ativa. O toxoide e a antito-
xina devem ser administrados em sítios corporais distintos
E. Vacinas com bactérias mortas para evitar que a antitoxina neutralize o toxoide.

(1) A vacina de Vibrio cholerae contém organismos mor- (2) A antitoxina botulínica é utilizada no tratamento
tos, sendo administrada a indivíduos que viajam para regiões de botulismo. Uma vez que a antitoxina pode neutralizar a
onde a cólera é endêmica. toxina não ligada, impedindo a progressão da doença, ela
deve ser prontamente administrada. Ela contém anticorpos
(2) A vacina de Yersinia pestis contém organismos mor- contra as toxinas botulínicas A, B, e E, os tipos de ocorrência
tos, sendo indicada para indivíduos com alto risco de con- mais comum. A antitoxina é produzida em cavalos, de modo
trair a peste. que a hipersensibilidade pode ser um problema.

(3) A vacina contra tifo contém células mortas de Ri- (3) A antitoxina diftérica é utilizada no tratamento de
ckettsia rickettsiae, sendo utilizada principalmente na imuni- difteria. A antitoxina pode neutralizar a toxina não ligada,
zação de membros das forças armadas. prevenindo a progressão da doença; portanto, a antitoxina
deve ser prontamente administrada. A antitoxina é produ-
(4) A vacina contra a febre Q contém células mortas zida em cavalos, de modo que a hipersensibilidade pode ser
de Coxiella burnetii, sendo utilizada para imunizar indiví- um problema.
duos com alto risco de exposição a animais infectados pelo
organismo.

CONCEITOS-CHAVE

• A imunidade contra determinadas doenças bacterianas pode ser • Duas vacinas contêm proteínas bacterianas purificadas como o
induzida pela imunização com antígenos bacterianos (imunidade imunógeno. A mais comumente utilizada corresponde à vacina
ativa) ou pela administração de anticorpos pré-formados (imuni- pertussis acelular, a qual, em combinação com os toxoides dif-
dade passiva). térico e tetânico, é recomendada para todas as crianças. A vacina
contra antraz também contém proteínas purificadas, mas reco-
Imunidade ativa mendada apenas para indivíduos com possibilidade de exposição
ao organismo.
• A imunidade ativa pode ser obtida com vacinas consistindo em (1)
polissacarídeos capsulares bacterianos, toxoides, bactérias • A vacina BCG contra a tuberculose contém Mycobacterium bo-
inteiras (quer mortas, quer vivas atenuadas) ou (2) proteínas puri- vis vivos atenuados, sendo utilizada em países onde a doença é
ficadas isoladas a partir das bactérias. endêmica. Uma das vacinas contra febre tifoide contém Salmonella
typhi vivas atenuadas.
• Vacinas contendo polissacarídeos capsulares como o imunó-
geno são dirigidas contra Streptococcus pneumoniae, Haemo- • As vacinas contra cólera, peste, tifo e febre Q contêm bactérias
philus influenzae, Neisseria meningitidis e Salmonella typhi. O inteiras mortas. Essas vacinas são utilizadas apenas na proteção de
polissacarídeo capsular presente na vacina pneumocóccica, vacina indivíduos com possibilidade de serem expostos.
meningocóccica e vacina de H. influenzae é conjugado a uma pro-
teína carreadora para intensificar a resposta de anticorpos. Imunidade passiva

• Duas vacinas contêm toxoides como o imunógeno: as vacinas • A imunidade passiva na forma de antitoxinas encontra-se dispo-
contra difteria e tétano. O toxoide corresponde a uma toxina nível para a prevenção e o tratamento de tétano, botulismo e dif-
inativada que perdeu sua capacidade de provocar a doença, po- teria. Essas três doenças são causadas por exotoxinas. As antitoxi-
rém manteve sua imunogenicidade. (A vacina pertussis também nas (anticorpos contra as exotoxinas) neutralizam as exotoxinas,
contém toxoide, entretanto também contém outras proteínas bac- impedindo seus efeitos tóxicos.
terianas, sendo descrita na próxima seção.)

ERRNVPHGLFRV RUJ

Imunidade passiva-ativa Microbiologia Médica e Imunologia 105

• Envolve o fornecimento de proteção imediata (porém de curto tétano em indivíduo não imunizado que apresenta ferimento
prazo) na forma de anticorpos, assim como proteção de longo contaminado. Tanto a antitoxina tetânica como o toxoide tetâni-
prazo na forma de imunização ativa. Um excelente exemplo do co devem ser administrados. Devem ser administrados em sítios
uso de imunidade passiva-ativa corresponde à prevenção de distintos a fim de que os anticorpos da antitoxina não neutralizem
o toxoide.

QUESTÕES PARA ESTUDO

As questões sobre tópicos discutidos neste capítulo podem
ser encontradas nos itens Questões para estudo (Bacteriolo-
gia clínica) e Teste seu conhecimento.

ERRNVPHGLFRV RUJ

13 Esterilização e Desinfecção

A esterilização é a eliminação ou remoção de todos os mi- a partir da formação de colônias. A morte é definida como
cro-organismos, incluindo os esporos bacterianos, os quais a incapacidade de reproduzir-se. Em determinadas circuns-
são altamente resistentes. A esterilização é usualmente rea- tâncias, os restos celulares de bactérias mortas ainda podem
lizada pela autoclavagem, que consiste na exposição a vapor acarretar problemas (ver página 57).
a 121ºC, sob pressão de 15 lb/pol2, por 15 minutos. Ins-
trumentos cirúrgicos, que podem ser danificados por calor ■ AGENTES QUÍMICOS
úmido, geralmente são esterilizados por meio da exposição
ao gás óxido de etileno, enquanto a maioria das soluções in- Os compostos químicos variam significativamente quanto
travenosas é esterilizada por filtração. à capacidade de matar os micro-organismos. Uma medida
quantitativa dessa variação é expressa como o coeficiente
A desinfecção consiste na morte de muitos micro-orga- fenólico, que corresponde à razão entre a concentração de
nismos, mas não de todos. Para uma desinfecção adequada, fenol e a concentração do agente requerida para causar a
os patógenos devem ser mortos, apesar de alguns organismos mesma taxa de morte nas condições padrão do teste.
e os esporos bacterianos poderem sobreviver. Em relação às
propriedades de danos aos tecidos, os desinfetantes variam Os agentes químicos atuam principalmente por um
de compostos corrosivos contendo fenol, que devem ser uti- dentre três mecanismos: (1) ruptura da membrana celu-
lizados apenas em objetos inanimados, a compostos menos lar contendo lipídeos, (2) modificação de proteínas ou (3)
tóxicos, como etanol e iodo, que podem ser utilizados em modificação do DNA. Cada um dos seguintes agentes quí-
superfícies cutâneas. Os compostos químicos empregados micos foi classificado em uma das três categorias, embora
para matar micro-organismos na superfície da pele e nas alguns dos compostos químicos atuem por mais de um me-
membranas mucosas são denominados antissépticos. canismo.

TAXA DE MORTE DE MICROORGANISMOS RUPTURA DE MEMBRANAS CELULARES

A morte de micro-organismos ocorre em determinada taxa, Álcool
dependendo principalmente de duas variáveis: a concentra- O etanol é amplamente utilizado na limpeza da pele antes
ção do agente e o período de tempo em que o agente é apli- da imunização ou venopuntura. Atua principalmente pela
cado. A taxa de morte é definida pela relação desorganização da estrutura lipídica das membranas, mas
também desnatura as proteínas. O etanol requer a presença
N ∝ 1/CT de água para atividade máxima; ou seja, é muito mais efetivo
a 70% do que a 100%. Etanol a setenta por cento é frequen-
a qual revela que o número de sobreviventes, N, é inversa- temente utilizado como um antisséptico para a limpeza da
mente proporcional à concentração do agente, C, e ao tempo pele antes da venopuntura. Entretanto, uma vez que não é
de aplicação do agente, T. Coletivamente, CT é referido fre- tão eficaz quanto compostos contendo iodo, estes últimos
quentemente como a dose. Dito de outra maneira, o núme- devem ser utilizados antes da coleta de hemocultura ou in-
ro de micro-organismos mortos é diretamente proporcional trodução de cateteres intravenosos.
a CT. A relação é habitualmente referida em termos de so-
breviventes, uma vez que estes são facilmente quantificados

ERRNVPHGLFRV RUJ

Microbiologia Médica e Imunologia 107

Detergentes Metais pesados
Os detergentes são agentes “superfície-ativos” compostos
por uma porção hidrofóbica de cadeia longa e lipossolúvel O mercúrio e a prata exibem a maior atividade antibacte-
e um grupo hidrofílico polar, que pode ser um cátion, um riana dentre os metais pesados, sendo os mais amplamente
ânion, ou um grupo não iônico. Estes surfactantes intera- utilizados na medicina. Atuam ligando-se aos grupos sul-
gem com lipídeos da membrana celular por meio de sua fidril, bloqueando, assim, a atividade enzimática. O time-
cadeia hidrofóbica, e com a água circundante por meio de rosal (Merthiolate) e a merbromina (Mercurocromo), que
seu grupo polar, rompendo, assim, a membrana. Compos- contêm mercúrio, são utilizados como antissépticos cutâ-
tos quaternários de amônio, por exemplo, cloreto de benzal- neos. O nitrato de prata em gotas é utilizado na prevenção
cônio, são detergentes catiônicos amplamente utilizados na de oftalmia gonocóccica neonatal. A sulfadiazina de prata é
antissepsia da pele. utilizada na prevenção de infecções de ferimentos por quei-
madura.
Fenóis
O fenol foi o primeiro desinfetante utilizado em sala cirúr- Peróxido de hidrogênio
gica (por Lister, por volta de 1860), apesar de ser raramen-
te utilizado nos tempos atuais como desinfetante devido ao O peróxido de hidrogênio é utilizado como antisséptico na
fato de ser muito cáustico. O hexaclorofeno, que consiste limpeza de ferimentos e para desinfetar lentes de contato.
em um bifenol com seis átomos de cloro, é utilizado em Sua eficácia é limitada pela capacidade do organismo produ-
sabões germicidas, porém preocupações quanto à possível zir catalase, enzima que degrada H2O2. (As borbulhas pro-
neurotoxicidade limitaram seu uso. Outro derivado fenólico duzidas quando o peróxido é aplicado nos ferimentos são
corresponde ao cresol (metilfenol), o ingrediente ativo do formadas pelo oxigênio originado a partir da clivagem do
Lysol. Os fenóis não apenas danificam as membranas, como H2O2 pela catalase tissular.) O peróxido de hidrogênio é um
também desnaturam as proteínas. agente oxidante que ataca os grupos sulfidril, inibindo, as-
sim, a atividade enzimática.
MODIFICAÇÃO DE PROTEÍNAS
Formaldeído e glutaraldeído
Cloro
O cloro é utilizado como desinfetante na purificação de su- O formaldeído, disponível na forma de solução a 37% em
primentos de água e no tratamento de piscinas. Também água (Formalina), promove a desnaturação de proteínas e
corresponde ao componente ativo do hipoclorito (água sa- ácidos nucleicos. Tanto as proteínas quanto os ácidos nuclei-
nitária, Clorox), o qual é utilizado como desinfetante em re- cos contêm grupos essenciais –NH2 e –OH, que são os prin-
sidências e hospitais. O cloro é um agente oxidante potente cipais sítios de alquilação pelo grupo hidroximetil do for-
que provoca a morte por promover a ligação cruzada de gru- maldeído. O glutaraldeído, que possui dois grupos aldeído
pos sulfidril essenciais de enzimas, originando o dissulfeto reativos, é 10 vezes mais eficaz que o formaldeído, além de
inativo. ser menos tóxico. Em hospitais, é utilizado na esterilização
de equipamentos de terapia respiratória.
Iodo
O iodo é o antisséptico cutâneo mais efetivo utilizado na Óxido de etileno
prática médica, devendo ser utilizado antes da coleta de uma
hemocultura ou da introdução de cateteres intravenosos, O gás óxido de etileno é amplamente utilizado em hospitais
uma vez que a contaminação pela microbiota da pele, bem na esterilização de materiais termossensíveis, como instru-
como por Staphylococcus epidermidis, pode representar um mentos cirúrgicos e plásticos. Provoca a morte por meio da
problema. O iodo é fornecido em duas formas: alquilação de proteínas e ácidos nucleicos. Isto é, o grupo
hidroxietil ataca os átomos de hidrogênio reativos presentes
(1) A tintura de iodo (solução a 2% de iodo e iodeto de em grupos amino e hidroxil essenciais.
potássio em etanol) é utilizada para preparar a pele antes de
uma coleta de sangue. Por poder irritar a pele, a tintura de Ácidos e álcalis
iodo deve ser removida com álcool.
Ácidos fortes e álcalis provocam a morte pela desnaturação
(2) Iodóforos são complexos de iodo com detergentes, de proteínas. Embora a maioria das bactérias seja suscetível a
frequentemente utilizados no preparo da pele antes de ci- NaOH a 2%, é importante observar que Mycobacterium tu-
rurgias, uma vez que são menos irritantes que a tintura de berculosis e outras micobactérias são relativamente resistentes
iodo. O iodo, assim como o cloro, é um oxidante que inativa a ele, que é utilizado no laboratório clínico para liquefazer o
enzimas contendo sulfidril. Também se liga especificamente escarro antes da cultura do organismo. Ácido fracos, como
a resíduos de tirosina em proteínas. os ácidos benzoico, propiônico e cítrico, são frequentemen-
te utilizados como conservantes de alimentos, uma vez que
são bacteriostáticos. A ação desses ácidos é parcialmente uma
função da porção orgânica, por exemplo, benzoato, assim
como do pH baixo.

ERRNVPHGLFRV RUJ

108 Warren Levinson

MODIFICAÇÃO DE ÁCIDOS NUCLEICOS de patógenos transmitidos pelo leite, por exemplo, Myco-
bacterium bovis, Salmonella, Streptococcus, Listeria e Brucella,
Uma variedade de corantes não apenas cora os micro-or- mas não esteriliza o leite.
ganismos, mas também inibe seu crescimento. Um desses
corantes é o cristal violeta (violeta de genciana), o qual é uti- RADIAÇÃO
lizado como antisséptico cutâneo. Sua ação baseia-se na liga-
ção da molécula do corante de carga positiva aos grupos fos- Os dois tipos de radiação utilizados para matar micro-or-
fato de carga negativa dos ácidos nucleicos. Verde malaquita, ganismos são a luz ultravioleta (UV) e raios-X. A maior
um cristal violeta do tipo trifenilamina, é um componente atividade antimicrobiana da luz UV ocorre a 250-260 nm,
do meio de Löwenstein-Jensen, utilizado para cultivar M. que corresponde à região de comprimento de onda de ab-
tuberculosis. O corante inibe o crescimento de organismos sorção máxima pelas bases púricas e pirimídícas do DNA.
indesejados no escarro durante o período de incubação de A lesão mais importante causada pela irradiação UV con-
6 semanas. siste na formação de dímeros de timina, embora também
ocorra a adição de grupos hidroxil às bases. Como resulta-
■ AGENTES FÍSICOS do, a replicação de DNA é inibida, tornando o organismo
incapaz de crescer. As células possuem mecanismos de re-
Os agentes físicos atuam pela transmissão de energia na for- paro de danos induzidos por UV, que envolvem a clivagem
ma de calor ou radiação, ou pela remoção dos organismos de dímeros na presença de luz visível (fotorreativação) ou
por filtração. excisão de bases danificadas, que não depende de luz vi-
sível (reparo na ausência de luz). Uma vez que a radiação
CALOR UV pode causar danos à córnea e à pele, o uso de irra-
diação UV na medicina é limitada. Entretanto, é utilizada
A energia térmica pode ser aplicada de três maneiras: na em hospitais para matar organismos transmitidos pelo ar,
forma de calor úmido (por fervura ou autoclavagem), calor especialmente em salas cirúrgicas que não se encontram
seco ou por pasteurização. Em geral, o calor provoca a morte em uso. Os esporos bacterianos são bastante resistentes e
pela desnaturação de proteínas, embora danos à membrana e requerem uma dose até 10 vezes superior àquela das bac-
clivagem enzimática do DNA também possam estar envolvi- térias vegetativas.
dos. O calor úmido promove a esterilização a uma tempera-
tura mais baixa que o calor seco, uma vez que a água auxilia Os raios-X exibem maior energia e poder de penetra-
na ruptura de ligações não covalentes como, por exemplo, ção que a radiação UV e causam a morte principalmente
pontes de hidrogênio, que mantêm unidas as cadeias protei- pela produção de radicais livres, por exemplo, produção de
cas em suas estruturas secundária e terciária. radicais hidroxil a partir da hidrólise da água. Esses radicais
altamente reativos podem romper as ligações covalentes do
A esterilização por calor úmido, usualmente a autocla- DNA, matando, assim, o organismo. Compostos contendo
vagem, corresponde ao método de esterilização utilizado sulfidril, como o aminoácido cisteína, podem proteger o
com mais frequência. Uma vez que os esporos bacterianos DNA contra o ataque de radicais livres. Outro mecanismo
são resistentes à ebulição (100ºC ao nível do mar), eles consiste em um ataque direto sobre uma ligação covalente
devem ser expostos a temperaturas mais altas; esse proces- do DNA, resultando na ruptura da cadeia. No entanto, esse
so só pode ser realizado com um aumento na pressão. Com processo é provavelmente menos importante que o mecanis-
esse objetivo, utiliza-se uma autoclave, em que o vapor, a mo envolvendo radicais livres.
uma pressão de 15 lb/pol2, atinge temperatura de 121ºC,
sendo esta mantida por 15-20 minutos. Esse processo mata Os raios-X matam prontamente as células vegetativas,
até mesmo os esporos altamente termorresistentes de Clostri- porém os esporos são acentuadamente resistentes, provavel-
dium botulinum, a causa do botulismo, com margem de se- mente em virtude de seu baixo teor de água. Os raios-X são
gurança. Para testar a eficácia do processo de autoclavagem, utilizados na medicina para a esterilização de itens termos-
são utilizados organismos formadores de esporos, como, por sensíveis, como suturas e luvas cirúrgicas, bem como itens
exemplo, membros do gênero Clostridium. plásticos, como seringas.

A esterilização por calor seco, ao contrário, requer tem- FILTRAÇÃO
peraturas na faixa de 180ºC por 2 horas. Esse processo é
utilizado principalmente para vidraria, sendo utilizado com A filtração é o método preferencial de esterilização de de-
menor frequência que a autoclavagem. terminadas soluções, como aquelas contendo componentes
termossensíveis. No passado, as soluções para uso intrave-
A pasteurização, utilizada principalmente para o leite, noso eram submetidas à autoclave, no entanto a endotoxi-
consiste no aquecimento do leite a 62ºC por um período na termorresistente das paredes celulares de bactérias gram-
de 30 minutos, seguido por rápido esfriamento. (A pasteu- -negativas mortas causava febre nos receptores das soluções.
rização “rápida” a 72ºC por 15 segundos é frequentemente
utilizada.) Isso é suficiente para matar as células vegetativas

ERRNVPHGLFRV RUJ

Microbiologia Médica e Imunologia 109

Desse modo, atualmente, as soluções são filtradas a fim de tamanho promove a retenção de todas as bactérias e esporos.
que se tornem livres de pirogênio antes da autoclavagem. Os filtros atuam pela captura física de partículas maiores que
a dimensão do poro e retenção de partículas um pouco me-
O filtro mais comumente utilizado é composto de ni- nores pela atração eletrostática das partículas aos filtros.
trocelulose e possui poros com tamanho de 0,22 μm. Este

CONCEITOS-CHAVE • Os agentes químicos matam as bactérias por uma dentre três
ações: ruptura dos lipídeos das membranas celulares, modificação
• A esterilização consiste na morte de todas as formas de vida de proteínas ou modificação do DNA.
microbiana, incluindo os esporos bacterianos. Os esporos são
resistentes à fervura, de modo que a esterilização de equipamen- • Os agentes físicos matam (ou removem) bactérias por um dentre
tos médicos é realizada tipicamente a 121ºC por 15 minutos em três processos: calor, radiação ou filtração.
autoclave. A esterilização de materiais termossensíveis é realizada
pela exposição ao óxido de etileno, enquanto os líquidos podem ser • O calor geralmente é aplicado em temperaturas acima da ebulição
esterilizados por filtração. (121ºC) a fim de matar os esporos, entretanto materiais termossen-
síveis, como o leite, são expostos a temperaturas inferiores ao ponto
• A desinfecção consiste na redução do número de bactérias a um de ebulição (pasteurização), promovendo a morte de patógenos
nível suficientemente baixo, de modo que a ocorrência de doença presentes no leite, mas não sua esterilização.
seja improvável. Os esporos e algumas bactérias sobreviverão. Por
exemplo, a desinfecção do suprimento de água é obtida pelo trata- • A radiação, como a luz ultravioleta e radiação X, é frequentemen-
mento com cloro. A desinfecção da pele antes de uma venopuntura te utilizada na esterilização de itens termossensíveis. A luz ultravio-
é realizada pelo tratamento com etanol a 70%. Os desinfetantes leta e a radiação X matam causando danos ao DNA.
suaves o suficiente para serem aplicados sobre a pele e outros teci-
dos, como etanol a 70%, são denominados antissépticos. • A filtração é capaz de esterilizar líquidos quando a dimensão dos
poros do filtro for pequena o suficiente para reter todas as bactérias
• A morte de micróbios por agentes químicos ou radiação é propor- e os esporos. Líquidos termossensíveis, por exemplo, fluidos intrave-
cional à dose, a qual é definida como o produto da concentração nosos, são frequentemente esterilizados por filtração.
multiplicada pelo tempo de exposição.

QUESTÕES PARA ESTUDO

As questões sobre tópicos discutidos neste capítulo podem
ser encontradas nos itens Questões para estudo (Bacteriolo-
gia clínica) e Teste seu conhecimento.

ERRNVPHGLFRV RUJ

PARTE II

Bacteriologia Clínica

14 Visão Geral dos Principais Patógenos e
Introdução às Bactérias Anaeróbias

VISÃO GERAL DOS PRINCIPAIS PATÓGENOS Treponema e Leptospira, que são espiroquetas muito delgados
para serem visualizados quando corados pela coloração de
Os principais patógenos bacterianos são apresentados na Gram; e espécies de Chlamydia e Rickettsia, que são coradas
Tabela 14-1 e descritos nos Capítulos 15-26. A fim de que adequadamente com o corante Giemsa ou outros corantes
o leitor possa concentrar-se nos patógenos importantes, as especiais, porém fracamente com a coloração de Gram. As
bactérias de menor importância médica são descritas em um espécies de Chlamydia e Rickettsia são parasitas intracelulares
capítulo diferente (ver Capítulo 27). obrigatórios, ao contrário dos membros dos outros quatro
gêneros.
A Tabela 14-1 é dividida em organismos prontamente
corados pela coloração de Gram e aqueles que não o são. Os A Tabela 14-2 apresenta as 10 doenças bacterianas “no-
organismos prontamente corados classificam-se em quatro tificáveis” mais comuns nos Estados Unidos em 2003, con-
categorias: cocos gram-positivos, cocos gram-negativos, ba- forme compilado pelo Centro de Controle e Prevenção de
cilos gram-positivos e bacilos gram-negativos. Uma vez que Doenças. Observe que somente as doenças notificáveis estão
existem tantos tipos de bacilos gram-negativos, estes foram incluídas e que certas condições comuns, como faringite es-
separados em três grupos: treptocóccica e impetigo, não são incluídas. Duas doenças
sexualmente transmissíveis, infecção clamidial e gonorreia,
(1) Organismos associados ao trato intestinal; são as doenças significativamente mais comuns dentre as lis-
(2) Organismos associados ao trato respiratório; tadas, seguidas pela salmonelose, sífilis e shigelose, as quais
(3) Organismos oriundos de fontes animais (bactérias ocupam as primeiras cinco posições.
zoonóticas).
INTRODUÇÃO ÀS BACTERIAS ANAERÓBIAS
Para facilitar o entendimento, os organismos associados
ao trato intestinal são ainda subdivididos em três grupos: (1) Propriedades importantes
patógenos encontrados dentro e fora do trato intestinal, (2)
patógenos encontrados no interior do trato intestinal e (3) Os anaeróbios são caracterizados por sua capacidade de
patógenos externos ao trato intestinal. crescer somente em atmosfera contendo menos de 20% de
oxigênio, isto é, exibem crescimento pobre ou ausente em
Como ocorre em qualquer classificação envolvendo en- atmosfera ambiente. Formam um grupo heterogêneo com-
tidades biológicas, esta não é totalmente precisa. Por exem- posto por uma variedade de bactérias, desde aquelas que exi-
plo, Campylobacter causa doença do trato intestinal, mas está bem crescimento mínimo em oxigênio a 20% até aquelas
frequentemente associado a uma fonte animal. Entretanto, capazes de crescer apenas com oxigênio abaixo de 0,02%.
apesar de algumas imprecisões, a subdivisão do grande nú- A Tabela 14-3 descreve as necessidades ótimas de oxigênio
mero de bacilos gram-negativos nestas categorias funcionais para vários grupos representativos de organismos. Os ae-
poderá ser útil ao leitor. róbios obrigatórios, como Pseudomonas aeruginosa, exibem
melhor crescimento na atmosfera ambiente com oxigênio a
Os organismos não corados prontamente pela coloração 20% e nenhum crescimento em condições anaeróbias. Os
de Gram classificam-se em seis categorias principais: espécies anaeróbios facultativos, como Escherichia coli, podem crescer
de Mycobacterium, que são bacilos acidorresistentes; espécies
de Mycoplasma, que não apresentam parede celular e, por-
tanto, não são coradas pela coloração de Gram; espécies de

ERRNVPHGLFRV RUJ

Microbiologia Médica e Imunologia 111

Tabela 14-1 Principais patógenos bacterianos Gênero

Tipo de organismo Staphylococcus, Streptococcus, Enterococcus
Neisseria
Prontamente coradas por Gram Corynebacterium, Listeria, Bacillus, Clostridium, Actinomyces, Nocardia
Cocos gram-positivos
Cocos gram-negativos Escherichia, Salmonella
Bacilos gram-positivos Shigella, Vibrio, Campylobacter, Helicobacter
Bacilos gram-negativos Grupo Klebsiella-Enterobacter-Serratia, Pseudomonas, Grupo Proteus-Providen-
Organismos do trato intestinal
Patogênicos interna e externamente ao trato cia-Morganella, Bacteroides
Patogênicos principalmente no interior do trato Haemophilus, Legionella, Bordetella
Patogênicos externamente ao trato Brucella, Francisella, Pasteurella, Yersinia

Organismos do trato respiratório Mycobacterium, Mycoplasma, Treponema, Leptospira
Organismos de fontes animais Chlamydia, Rickettsia
Não prontamente corados por Gram
Parasitas intracelulares não obrigatórios
Parasitas intracelulares obrigatórios

em qualquer das circunstâncias. Organismos aerotolerantes, gativos. Os bacilos são divididos em formadores de esporos,
como Clostridium histolyticum, podem exibir certo grau de por exemplo, Clostridium, e os não formadores de esporos,
crescimento no ar, entretanto multiplicam-se de forma mais por exemplo, Bacteroides. Neste livro, três gêneros de anaeró-
rápida em uma concentração de oxigênio mais baixa. Or- bios são descritos como os principais patógenos bacterianos,
ganismos microaerorofílicos, como Campylobacter jejuni, isto é, Clostridium, Actinomyces e Bacteroides. Streptococcus é
requerem concentração de oxigênio reduzida (aproximada- um gênero de importantes patógenos, consistindo em or-
mente 5%) para crescimento ótimo. Os anaeróbios obriga- ganismos tanto anaeróbios quanto facultativos. Os demais
tórios, como Bacteroides fragilis e Clostridium perfringens, anaeróbios exibem menor importância, sendo discutidos no
requerem ausência praticamente total de oxigênio. Vários Capítulo 27.
anaeróbios utilizam nitrogênio, em vez de oxigênio, como
aceptor terminal de elétrons. Infecções clínicas

A principal razão da inibição do crescimento de anae- Muitos dos anaeróbios de importância médica são membros
róbios pelo oxigênio consiste na quantidade reduzida (ou da microbiota normal dos humanos. Como tal, não cor-
ausência) de catalase e superóxido dismutase (SOD) ob- respondem a patógenos em seu hábitat normal, causando
servada nos anaeróbios. A catalase e o SOD eliminam os doença apenas quando deixam esses sítios. Duas exceções
compostos tóxicos peróxido de hidrogênio e superóxido,
formados durante a produção de energia pelo organismo Tabela 14-2 As 10 doenças bacterianas notificáveis mais
(ver Capítulo 3). Outra razão é a oxidação de grupos sul- comuns nos Estados Unidos em 20051
fidril essenciais das enzimas, sem poder redutor suficiente
para regenerá-las. Doença Número de casos

Além da concentração de oxigênio, o potencial de oxida- Infecções genitais por clamídias 976.445
ção-redução (Eh) de um tecido é um determinante importan-
te do crescimento de anaeróbios. Áreas com baixo Eh, como Gonorreia 339.593
bolsas periodontais, placa dental, e cólon, propiciam cresci-
mento adequado de anaeróbios. Lesões por compressão, que Salmonelose 45.322
resultam na desvitalização tissular causada por suprimento
sanguíneo insuficiente, originam baixo Eh, permitindo o Sífilis 33.278
crescimento de anaeróbios e a promoção de doenças.
Coqueluche 25.616
Anaeróbios de interesse médico
Doença de Lyme 23.305
Os anaeróbios de interesse médico são apresentados na Ta-
bela 14-4. Pode-se observar que eles incluem bacilos e cocos, Shigelose 16.168
além de organismos tanto gram-positivos quanto gram-ne-
Tuberculose 14.097

Doença estreptocóccica, grupo A, invasiva 4.715

Infecção por Escherichia coli entero-hemor- 2.621
rágica, O157

1O ano mais recente em que dados completos estão disponíveis.

ERRNVPHGLFRV RUJ

112 Warren Levinson

Tabela 14-3 Necessidades ótimas de oxigênio de bactérias representativas

Crescimento nas seguintes condições

Tipo bacteriano Organismo representativo Aeróbia Anaeróbia

Aeróbios obrigatórios Pseudomonas aeruginosa 3+ 0

Anaeróbios facultativos Escherichia coli 4+ 3+

Organismos aerotolerantes Clostridium histolyticum 1+ 4+
Microaerófilos Campylobacter jejuni 0 1 +1

Anaeróbios obrigatórios Bacteroides fragilis 0 4+

1C. jejuni exibe melhor crescimento (3 +) em 5% de O2 e 10% de CO2. É também denominado capnofílico em virtude de sua necessidade de CO2 para crescimento
ótimo.

marcantes são Clostridium botulinum e Clostridium tetani, os eróbias. Um espécime apropriado é aquele que não contêm
agentes do botulismo e tétano, respectivamente, que são or- membros da microbiota normal que poderiam confundir a
ganismos do solo. C. perfringens, outro importante patógeno interpretação. Por exemplo, espécimes como sangue, fluido
de humanos, é encontrado no cólon e no solo. pleural, pus e aspirados transtraqueais são apropriados, ao
contrário do escarro e das fezes.
As doenças causadas por membros anaeróbios da micro-
biota normal caracterizam-se por abscessos, localizados mais No laboratório, as culturas são manipuladas e incubadas
frequentemente no cérebro, nos pulmões, no trato genital fe- em condições anaeróbias. Além dos critérios diagnósticos
minino, no trato biliar, e em outros sítios intra-abdominais. usuais da coloração de Gram, morfologia e reações bioquí-
A maioria dos abscessos contém mais de um organismo, micas, a técnica especial de cromatografia gasosa é importan-
quer múltiplos anaeróbios, quer uma mistura de anaeróbios te. Nesse procedimento, são quantificados ácidos orgânicos,
e anaeróbios facultativos. Acredita-se que os anaeróbios fa- como os ácidos fórmico, acético e propiônico.
cultativos consumam oxigênio suficiente, permitindo o cres-
cimento dos anaeróbios. Tratamento
Em geral, a drenagem cirúrgica do abscesso e a administra-
Três importantes achados no exame físico que levam à ção de fármacos antimicrobianos são indicadas. Fármacos
suspeita de infecção anaeróbia são secreção fétida, presença habitualmente utilizados no tratamento de infecções anaeró-
de gás no tecido e necrose de tecido. Além disso, infecções bias são penicilina G, cefoxitina, cloranfenicol, clindamicina
associadas à aspiração pulmonar, à cirurgia intestinal, ao e metronidazol. Observe, no entanto, que vários isolados do
aborto, ao câncer, ou a mordeduras por humanos ou animais importante patógeno B. fragilis produzem β-lactamases, sen-
frequentemente envolvem anaeróbios. do, portanto, resistentes à penicilina.

Diagnóstico laboratorial QUESTÕES PARA ESTUDO

Dois aspectos do diagnóstico microbiológico de uma infec- As questões sobre tópicos discutidos neste capítulo podem
ção anaeróbia são importantes, antes mesmo da cultura do ser encontradas nos itens Questões para estudo (Bacteriolo-
espécime: (1) obtenção do espécime apropriado e (2) o rápi- gia clínica) e Teste seu conhecimento.
do transporte do espécime ao laboratório em condições ana-

Tabela 14-4 Bactérias anaeróbias de interesse médico

Morfologia Coloração de Gram Gênero
Bacilos formadores de esporos + Clostridium
– Nenhum

Bacilos não formadores de esporos + Actinomyces, Bifidobacterium, Eubacterium, Lactobacillus, Propionibacterium
Cocos não formadores de esporos – Bacteroides, Fusobacterium

+ Peptococcus, Peptostreptococcus, Streptococcus
– Veillonella

ERRNVPHGLFRV RUJ

Cocos Gram-Positivos 15

Há dois gêneros de cocos gram-positivos de importância mé- zem catalase, ao contrário dos estreptococos (a catalase de-
dica: Staphylococcus e Streptococcus. Dois dos mais importan- grada H2O2 a O2 e H2O). A catalase é um importante fator
tes patógenos de humanos, Staphylococcus aureus e Streptococ- de virulência, uma vez que o H2O2 é microbicida e sua de-
cus pyogenes, são descritos neste capítulo. Os estafilococos e gradação limita a capacidade de os neutrófilos promoveram
estreptococos são imóveis e não formam esporos. a morte.

Tanto os estafilococos como os estreptococos são cocos Três espécies de estafilococos são patógenos de humanos:
gram-positivos, apesar de serem diferenciados por dois crité- S. aureus, S. epidermidis e S. saprophyticus (Tabela 15-1). Das
rios principais: três, S. aureus é a mais importante. S. aureus distingue-se das
demais principalmente pela produção de coagulase. A coa-
(1) Microscopicamente, os estafilococos apresentam-se gulase é uma enzima que provoca a coagulação do plasma
como agrupamentos semelhantes a cachos de uvas, enquan- por ativar a protrombina, originando trombina. A trombina,
to os estreptococos formam cadeias; então, catalisa a ativação de fibrinogênio, originando o coá-
gulo de fibrina. S. epidermidis e S. saprophyticus são frequen-
(2) Bioquimicamente, os estafilococos produzem catala- temente referidos como estafilococos coagulase-negativos
se (i.e., degradam peróxido de hidrogênio), ao contrário dos (ver Prancha Colorida 15).
estreptococos.
S. aureus produz um pigmento carotenoide que confere
STAPHYLOCOCCUS uma coloração dourada a suas colônias. Este pigmento au-
menta a patogenicidade do organismo por inativar o efeito
Doenças microbicida de superóxidos e outras espécies reativas de oxi-
Staphylococcus aureus causa abscessos, várias infecções pio- gênio no interior dos neutrófilos. S. epidermidis não sintetiza
gênicas (p. ex., endocardite, artrite séptica e osteomielite), esse pigmento e forma colônias brancas. A virulência de S.
intoxicação alimentar, síndrome da pele escaldada e síndro- epidermidis é significativamente menor que aquela de S. au-
me do choque tóxico. O organismo é uma das causas mais reus. Outras duas características também diferenciam essas
comuns de pneumonia hospitalar, septicemia, e infecções espécies, ou seja, S. aureus usualmente fermenta manitol e
de feridas cirúrgicas. É uma importante causa de infecções provoca a hemólise de hemácias, ao contrário das demais.
cutâneas, como foliculite, celulite e impetigo. Staphylococcus
epidermidis pode causar endocardite e infecções em articula- Mais de 90% das linhagens de S. aureus contêm plas-
ções prostéticas. Staphylococcus saprophyticus causa infecções mídeos que codificam β-lactamase, a enzima que degrada
do trato urinário. A síndrome de Kawasaki é uma doença de diversas penicilinas, mas não todas. Algumas linhagens de S.
etiologia desconhecida, que pode ser causada por determina- aureus são resistentes às penicilinas resistentes à β-lactamase,
das linhagens de S. aureus. como meticilina e nafcilina, devido a alterações na proteína
de ligação à penicilina de sua membrana celular. Essas li-
Propriedades importantes nhagens são comumente conhecidas como S. aureus resis-
Os estafilococos são cocos gram-positivos esféricos, organi- tentes à meticilina (MRSA, do inglês, methicillin-resistant S.
zados em agrupamentos irregulares semelhantes a cachos de aureus) ou S. aureus resistentes à nafcilina (NRSA, do inglês,
uvas (ver Prancha Colorida 1). Todos os estafilococos produ- nafcillin-resistant S. aureus). Linhagens raras, denominadas

ERRNVPHGLFRV RUJ

114 Warren Levinson

Tabela 15-1 Estafilococos de importância médica

Produção de Hemólise

Espécie coagulase típica Características importantes1 Doença típica

S. aureus + Beta Proteína A na superfície Abscesso, intoxicação alimentar, síndrome do cho-
Sensível à novobiocina que tóxico
S. epidermidis – Ausente Resistente à novobiocina
Infecção de válvulas cardíacas prostéticas e próteses
S. saprophyticus – Ausente de quadril; membro comum da microbiota da pele

Infecção do trato urinário

1Todos os estafilococos são catalase-positivos.

S. aureus de resistência intermediária à vancomicina (VISA, aureus e aproximadamente 30% dos indivíduos são coloni-
do inglês, vancomycin-intermediate S. aureus), exibindo sen- zados em algum momento. O estado de portador nasal crô-
sibilidade reduzida à vancomicina, emergiram, bem como nico aumenta o risco de infecção por S. aureus. A pele, espe-
linhagens totalmente resistentes à vancomicina. cialmente de profissionais hospitalares e pacientes, também
corresponde a um sítio comum de colonização por S. aureus.
S. aureus possui vários componentes importantes de pa- O contato manual representa um importante mecanismo de
rede celular e antígenos. transmissão, e a lavagem das mãos diminui a transmissão.

(1) A proteína A é a principal proteína da parede ce- S. aureus também é encontrado na vagina de aproxima-
lular. Ela corresponde a um importante fator de virulência, damente 5% das mulheres, predispondo-as à síndrome do
uma vez que se liga à porção Fc da IgG no sítio de ligação choque tóxico. Fontes adicionais de infecções estafilocócci-
do complemento, impedindo, assim, a ativação do comple- cas estão associadas a lesões humanas e fômites, como toa-
mento. Como consequência, não há produção de C3b, e a lhas e roupas contaminadas por essas lesões.
opsonização e a fagocitose dos organismos são significativa-
mente reduzidas. A proteína A é utilizada em determinados Doenças causadas por S. aureus são favorecidas por um
testes no laboratório clínico porque se liga à IgG e forma um ambiente altamente contaminado (p. ex., familiares apresen-
“coaglutinado” com complexos antígeno-anticorpo. Os esta- tando furúnculos) e por um sistema imune comprometido.
filococos coagulase-negativos não produzem a proteína A. A imunidade humoral reduzida, incluindo baixos níveis
de anticorpos, complemento ou neutrófilos, predispõe es-
(2) Os ácidos teicoicos são polímeros de ribitol fosfato. pecialmente a infecções estafilocóccicas. Diabetes e uso de
Medeiam a adesão dos estafilococos às células mucosas e de- fármacos intravenosos predispõem a infecções por S. aureus.
sempenham um papel na indução de choque séptico. Pacientes acometidos por doença granulomatosa crônica
(DGC), doença caracterizada por uma falha na capacidade
(3) A cápsula polissacarídica também é um importante de neutrófilos matarem as bactérias, são especialmente pro-
fator de virulência. Existem 12 sorotipos, embora os tipos 5 pensos a infecções por S. aureus (ver Capítulo 68).
e 8 sejam responsáveis por 85% das infecções. A cápsula é
pouco imunogênica, fato que dificultou a produção de uma S. epidermidis é encontrado principalmente na pele de
vacina efetiva. humanos e pode atingir a corrente sanguínea a partir do sítio
de entrada de cateteres intravenosos na pele. S. saprophyticus
(4) Receptores de superfície para bacteriófagos estafilo- é encontrado principalmente na mucosa do trato genital de
cóccicos específicos permitem a “tipagem fágica” de linha- mulheres jovens e, a partir desse sítio, podem ascender até a
gens com objetivos epidemiológicos. Os ácidos teicoicos bexiga, causando infecções do trato urinário.
compõem parte desses receptores.
Patogênese
(5) A maioria das linhagens de S. aureus é revestida por
uma pequena quantidade de cápsula polissacarídica (micro- A. Staphylococcus aureus
cápsula), a qual é antifagocitária. Existem 11 sorotipos com
base na antigenicidade do polissacarídeo capsular. S. aureus causa doença por meio da produção de toxinas e
pela indução de inflamação piogênica. A lesão típica de in-
(6) O peptideoglicano de S. aureus exibe propriedades fecção por S. aureus é o abscesso. Os abscessos sofrem necro-
do tipo endotoxina, isto é, pode estimular a produção de se central e geralmente drenam para o exterior (p. ex., furún-
citocinas pelos macrófagos, como também pode ativar as culos), mas os organismos podem também ser disseminados
cascatas do complemento e de coagulação. Isso explica a ca- na corrente sanguínea. Corpos estranhos, como suturas e
pacidade de S. aureus causar os achados clínicos do choque cateteres intravenosos, são importantes fatores predisponen-
séptico, embora não possua endotoxina. tes à infecção por S. aureus.

Transmissão Várias toxinas e enzimas importantes são produzidas
por S. aureus. Três exotoxinas clinicamente importantes são
Os seres humanos correspondem ao reservatório de estafi-
lococos. O nariz é o principal sítio de colonização de S.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Microbiologia Médica e Imunologia 115

a enterotoxina, a toxina da síndrome do choque tóxico e a (5) As enzimas incluem coagulase, fibrinolisina, hialu-
esfoliatina. ronidase, proteases, nucleases e lipases. A coagulase, por pro-
mover a coagulação do plasma, atua na contenção do sítio
(1) A enterotoxina causa intoxicação alimentar, caracte- infectado, retardando, assim, a migração de neutrófilos ao
rizada por vômito proeminente e diarreia aquosa não sangui- sítio. A estafiloquinase é uma fobrinolisina capaz de lisar os
nolenta. A toxina atua como um superantígeno no interior trombos.
do trato gastrintestinal, estimulando a liberação de grandes
quantidades de interleucina-1 (IL-1) e interleucina-2 (IL-2) B. Staphylococcus epidermidis e Staphylococcus
por macrófagos e células T auxiliares, respectivamente. O saprophyticus
vômito proeminente é aparentemente causado por citocinas
liberadas pelas células linfoides, estimulando o sistema ner- Contrariamente a S. aureus, estes dois estafilococos coagula-
voso entérico a ativar o centro de vômito no cérebro. A ente- se-negativos não produzem exotoxinas. Assim, não causam
rotoxina é relativamente termorresistente e, desse modo, não intoxicação alimentar ou síndrome do choque tóxico, mas
é inativada pela cocção rápida. É resistente ao ácido gástrico, causam infecções piogênicas. Por exemplo, S. epidermidis é
bem como às enzimas do estômago e jejuno. Há seis tipos uma importante causa de infecções piogênicas em implantes
imunológicos de enterotoxinas, tipos A-F. prostéticos, como válvulas cardíacas e articulações de qua-
dril.
(2) A toxina da síndrome do choque tóxico (TSST,
do inglês, toxic shock syndrome toxin) causa choque tóxico, Achados clínicos
especialmente em mulheres menstruadas fazendo uso de ab-
sorvente higiênico interno, ou em indivíduos apresentando As importantes manifestações clínicas causadas por S. aureus
infecções de ferimentos. O choque tóxico também ocorre podem ser divididas em dois grupos: as piogênicas e as me-
em pacientes utilizando tampão nasal para estancar sangra- diadas por toxina (Tabela 15-2). S. aureus é uma importante
mento nasal. A TSST é produzida localmente por S. aureus causa de infecções de pele, tecido mole, ossos, articulações,
na vagina, no nariz ou em outro sítio infectado. A toxina pulmões, coração e rins. Na listagem abaixo, as sete primei-
atinge a corrente sanguínea causando uma toxemia. As he- ras são de origem piogênica, enquanto as últimas três são
moculturas são tipicamente negativas quanto ao crescimento mediadas por toxinas.
de S. aureus.
A. Staphylococcus aureus: doenças piogênicas
A TSST é um superantígeno e causa choque tóxico por
estimular a liberação de grandes quantidades de IL-1, IL-2, (1) Infecções de pele são muito comuns. Elas incluem im-
e fator de necrose tumoral (TNF, do inglês, tumor necrosis petigo, furúnculos, carbúnculos, paroníquia, celulite, folicu-
factor) (ver as discussões sobre exotoxinas, no Capítulo 7, e lite, hidradenite supurativa, conjuntivite, infecções de pál-
sobre superantígenos, no Capítulo 58). Aproximadamente pebras (blefarite) e infecções de mama pós-parto (mastite).
5-25% dos isolados de S. aureus carreiam o gene da TSST. Infecções necrotizantes graves de pele e tecidos moles são
O choque tóxico ocorre em indivíduos que não apresentam causadas por linhagens de S. aureus resistentes à meticilina
anticorpos contra a TSST. que produzem a leucocidina P-V. Essas infecções são tipica-
mente adquiridas na comunidade, em vez de adquiridas em
(3) A esfoliatina causa a síndrome da “pele escaldada” hospitais.
em crianças. É “epidermolítica” e atua como uma protease
que cliva a desmogleína dos desmossomos, levando à separa- Essas linhagens de S. aureus resistentes à meticilina e
ção da epiderme na camada de células granulares. adquiridas na comunidade (CA-MRSA do inglês, communi-
ty-acquired, methicillin-resistant S. aureus) causam infecções
(4) Várias toxinas podem matar leucócitos (leucocidi- severas, especialmente em moradores de rua e usuários de
nas) e causam necrose de tecidos in vivo. Dentre elas, uma fármacos injetáveis. Atletas cujas atividades envolvem con-
das mais importantes é a toxina alfa, que provoca intensa tato pessoal próximo, como lutadores e jogadores de fute-
necrose de pele e hemólise. O efeito citotóxico da toxina alfa bol, também apresentam risco. Observe que MRSA adqui-
é atribuído à formação de orifícios na membrana celular e a ridas em hospitais (HA-MRSA do inglês, hospital-acquired
consequente perda de substâncias de baixa massa molecular MRSA) causam aproximadamente 50% de todas as infec-
a partir da célula danificada. ções nosocomiais por S. aureus. A análise molecular reve-
la que as linhagens CA-MRSA são distintas das linhagens
Uma segunda toxina importante, a leucocidina P-V, é HA-MRSA.
uma toxina formadora de poros que mata as células, especial-
mente leucócitos, por causar danos às membranas celulares. (2) A septicemia (sépsis) pode originar-se a partir de
A importância da leucocidina P-V como fator de virulência é qualquer lesão localizada, especialmente infecções de fe-
indicada pela grave infecção de pele e tecidos moles causada rimentos, ou como resultado do uso abusivo de fármacos
por linhagens de S. aureus resistentes à meticilina que pro- intravenosos. A sépsis causada por S. aureus exibe caracte-
duzem esta leucocidina. Uma pneumonia necrotizante grave rísticas clínicas similares àquelas da sépsis causada por certas
é também causada por linhagens de S. aureus que produzem bactérias gram-negativas, como Neisseria meningitidis (ver
leucocidina P-V. página 126).

ERRNVPHGLFRV RUJ

116 Warren Levinson

Tabela 15-2 Importantes características da patogênese de estafilococos

Organismo Tipo de patogênese Doença típica Fator predisponente Mecanismo de prevenção

S. aureus 1. Toxigênico (superan- Síndrome do choque tóxico Tampão nasal ou vaginal Reduzir o tempo de uso do
tígeno) tampão

Intoxicação alimentar Armazenamento impróprio Refrigerar os alimentos
de alimentos

2. Piogênico (abscesso)

a. Local Infecção de pele, p. ex., impetigo Má higiene da pele Asseio
Infecções de feridas cirúrgicas Falhas nos procedimentos Lavagem das mãos, redução

b. Disseminado Sépsis, endocardite1 assépticos do estado de portador nasal

Uso de fármacos IV Reduzir o uso de fármacos IV

S. epidermidis Piogênico Infecções de sítios de cateteres Falhas nos procedimentos Lavagem das mãos; pronta
intravenosos e dispositivos assépticos ou na pronta remoção de cateteres IV
prostéticos remoção de cateteres IV

S. saprophyticus Piogênico Infecção do trato urinário Atividade sexual

IV = intravenoso.
1Para simplificar, várias formas de doenças disseminadas causadas por S. aureus, p. ex., osteomielite, artrite, não foram incluídas na tabela.

(3) A endocardite pode ocorrer em válvulas cardíacas lar a uma queimadura de sol, que progride à descamação, e
normais ou prostéticas, especialmente a endocardite direita envolvimento de três ou mais dos seguintes órgãos: fígado,
(válvula tricúspide) em usuários de fármacos injetáveis. (A rim, trato gastrintestinal, sistema nervoso central, músculos
endocardite de válvulas prostéticas é frequentemente causa- ou sangue.
da por S. epidermidis.)
(3) A síndrome da pele escaldada caracteriza-se por fe-
(4) A osteomielite e a artrite podem surgir por dissemi- bre, grandes vesículas e uma erupção macular eritematosa.
nação hematogênica, a partir de um foco infectado distante, Grandes áreas da pele descamam, há exsudação de fluido se-
ou por introdução localizada em um sítio de ferimento. S. roso e pode ocorrer um desequilíbrio eletrolítico. Pode haver
aureus é uma causa muito comum dessas doenças, especial- perda de cabelos e unhas. A recuperação usualmente ocor-
mente em crianças. re em um período de 7-10 dias. Essa síndrome ocorre com
maior frequência em crianças.
(5) Infecções de feridas pós-cirúrgicas são uma impor-
tante causa de morbidade e mortalidade em hospitais. S. au- C. Staphylococcus aureus: síndrome de Kawasaki
reus é a causa mais comum.
A síndrome de Kawasaki (SK) é uma doença de etiologia
(6) A pneumonia pode ocorrer em pacientes pós-cirúr- desconhecida, discutida aqui por várias de suas característi-
gicos ou após uma infecção respiratória viral, especialmente cas assemelharem-se à síndrome do choque tóxico causada
a gripe. A pneumonia estafilocóccica frequentemente leva pelos superantígenos de S. aureus (e S. pyogenes). A SK é uma
a empiema ou abscesso pulmonar; em muitos hospitais é vasculite envolvendo artérias pequenas e médias, especial-
a causa mais comum de pneumonia nosocomial, em es- mente as artérias coronárias.
pecial a pneumonia associada à ventilação em unidades de
terapia intensiva. CA-MRSA causa uma grave pneumonia Clinicamente, a SK é caracterizada por febre alta que
necrotizante. perdura por pelo menos 5 dias, conjuntivite bilateral não
purulenta, lesões nos lábios e mucosa oral (como língua de
(7) Os abscessos podem ocorrer em qualquer órgão framboesa, edema labial e eritema da orofaringe), uma erup-
quando o organismo circula na corrente sanguínea (bacte- ção difusa eritematosa e maculopapular, eritema e edema nas
riemia). Esses abscessos são frequentemente denominados mãos e pés que frequentemente progridem à descamação e
“abscessos metastáticos”, uma vez que ocorrem devido à dis- linfadenopatia cervical.
seminação das bactérias a partir do sítio original.
O achado clínico mais característico da SK corresponde
B. Staphylococcus aureus: doenças mediadas por toxina ao comprometimento cardíaco, especialmente miocardite,
arritmia e regurgitação envolvendo as válvulas mitral e aórti-
(1) A intoxicação alimentar (gastrenterite) é causada ca. A principal causa de morbidade e mortalidade na SK é o
pela ingestão de enterotoxina, a qual é pré-formada nos ali- aneurisma das artérias coronárias.
mentos e, portanto, apresenta um curto período de incuba-
ção (1-8 horas). Na intoxicação alimentar estafilocóccica, o A SK é muito mais comum em crianças de ascendên-
vômito é tipicamente mais proeminente do que a diarreia. cia asiática, levando à especulação de que certos alelos do
complexo principal de histocompatibilidade (MHC, do
(2) A síndrome do choque tóxico caracteriza-se por fe- inglês, major histocompatibility complex) podem predispor à
bre, hipotensão, uma erupção cutânea difusa, macular, simi-

ERRNVPHGLFRV RUJ

Microbiologia Médica e Imunologia 117

doença. É a uma doença de crianças com menos de 5 anos ção ao antibiótico novobiocina: S. epidermidis é sensível,
de idade, ocorrendo frequentemente em pequenos surtos. enquanto S. saprophyticus é resistente. Não existem testes
Ocorre em nível mundial, mas é, muito mais comum no sorológicos ou cutâneos de utilidade geral. No caso da sín-
Japão. drome do choque tóxico, o isolamento de S. aureus não é
requerido para o diagnóstico desde que os critérios clínicos
Não há qualquer teste diagnóstico laboratorial defini- sejam compatíveis.
tivo para a SK. A terapia efetiva consiste em altas doses de
imunoglobulinas (IVIG), que prontamente reduz a febre e Para fins epidemiológicos, S. aureus pode ser subdivi-
demais sintomas, e, o mais importante, reduz significativa- dido em subgrupos com base na suscetibilidade do isolado
mente a ocorrência de aneurismas. clínico à lise por uma variedade de bacteriófagos. Um indi-
víduo portando S. aureus do mesmo grupo fágico que aque-
D. Staphylococcus epidermidis e Staphylococcus le responsável pelo surto pode ser a fonte das infecções.
saprophyticus
Tratamento
Existem dois estafilococos coagulase-negativos de impor-
tância médica: S. epidermidis e S. saprophyticus. As infecções Nos Estados Unidos, 90% ou mais das linhagens de S.
por S. epidermidis são quase sempre adquiridas em hospitais, aureus são resistentes à penicilina G. A maioria dessas li-
enquanto as infecções por S. saprophyticus são quase sempre nhagens produz β-lactamase. Esses organismos podem
adquiridas na comunidade. ser tratados com penicilinas resistentes à β-lactamase, por
exemplo, nafcilina ou cloxacilina, algumas cefalosporinas
S. epidermidis é membro da microbiota humana normal e vancomicina. O tratamento com a combinação de peni-
da pele e de membranas mucosas, no entanto pode atingir a cilina sensível à β-lactamase, por exemplo, amoxicilina, e
corrente sanguínea (bacteriemia), originando infecções me- inibidor de β-lactamase, por exemplo, ácido clavulânico, é
tastáticas, especialmente no sítio de implantes. Comumente também útil.
infecta cateteres intravenosos e implantes prostéticos, por
exemplo, válvulas cardíacas prostéticas (endocardite), enxer- Aproximadamente 20% das linhagens de S. aureus são
tos vasculares e articulações prostéticas (artrite ou osteomie- resistentes à meticilina ou resistentes à nafcilina em virtu-
lite) (Tabela 15-2). S. epidermidis é também uma importante de de proteínas de ligação à penicilina modificadas. Essas
causa de sépsis em neonatos e de peritonite em pacientes linhagens resistentes de S. aureus são frequentemente abre-
apresentando insuficiência renal e submetidos à diálise peri- viadas por MRSA ou NRSA, respectivamente. Tais organis-
toneal por cateter de longa duração. Esse organismo corres- mos podem causar surtos significativos, especialmente em
ponde à bactéria mais comum a causar infecções em deriva- hospitais. O fármaco de escolha para esses estafilococos é a
ções de fluido cerebroespinal. vancomicina, algumas vezes associada à gentamicina. Trime-
toprim-sulfametoxazol ou clindamicina podem ser utiliza-
Linhagens de S. epidermidis que produzem um glico- dos no tratamento de infecções sem risco à vida causadas
cálix apresentam maior probabilidade de aderir a materiais por esses organismos. Observe que essas linhagens MRSA
de implantes prostéticos e, portanto, exibem maior proba- são resistentes a todos os fármacos betalactâmicos, incluindo
bilidade de infectar esses implantes, quando comparadas a penicilinas e cefalosporinas.
linhagens que não produzem um glicocálix. Os profissionais
hospitalares são um importante reservatório de linhagens de Linhagens de S. aureus exibindo resistência intermediá-
S. epidermidis resistentes a antibióticos. ria (denominadas linhagens VISA) e resistência total à van-
comicina foram isoladas de pacientes. Essas linhagens são
S. saprophyticus causa infecções do trato urinário, parti- tipicamente também resistentes a meticilina/nafcilina, tor-
cularmente em mulheres jovens sexualmente ativas. A maio- nando seu tratamento muito difícil. A combinação de duas
ria das mulheres que apresenta essa infecção manteve relação estreptograminas, quinupristina-dalfopristina (Synercid),
sexual nas 24 horas prévias. Após Escherichia coli, esse or- mostrou-se efetiva; entretanto, até o momento, Synercid
ganismo é a principal causa de infecções do trato urinário encontra-se disponível apenas como fármaco experimental.
adquiridas na comunidade em mulheres jovens. As estreptograminas inibem a síntese proteica bacteriana de
maneira similar aos macrolídeos; contudo, são bactericidas
Diagnóstico laboratorial para S. aureus.

Esfregaços de lesões estafolocóccicas revelam cocos gram- O tratamento da síndrome do choque tóxico envolve
-positivos em agrupamentos semelhantes a cachos de a reversão do choque mediante o uso de fluídos, fármacos
uvas. Culturas de S. aureus tipicamente originam colô- pressores, e fármacos inotrópicos, administração de uma pe-
nias amarelo-douradas, geralmente beta-hemolíticas. S. nicilina resistente à β-lactamase, como nafcilina, e remoção
aureus é coagulase-positivo.O ágar manitol-sal é comu- do tampão ou debridação do sítio infectado, conforme a ne-
mente empregado na varredura de S. aureus. Culturas de cessidade. Um pool de globulinas séricas, contendo anticor-
estafilococos coagulase-negativos tipicamente originam pos contra TSST, pode ser útil.
colônias brancas e não hemolíticas. Os dois estafilococos
coagulase-negativos são diferenciados com base em sua rea-

ERRNVPHGLFRV RUJ

118 Warren Levinson

Mupirocina é muito eficaz como antibiótico tópico em rúrgicas e berçários. Cefozolina é frequentemente utilizada
infecções de pele causadas por S. aureus. Também tem sido no tratamento pré-operatório a fim de prevenir infecções
utilizada para reduzir o estado de portador nasal dos profis- estafilocóccicas em feridas cirúrgicas.
sionais hospitalares e pacientes exibindo infecções estafilo-
cóccicas recorrentes. STREPTOCOCCUS

Algumas linhagens de estafilococos exibem tolerância, Os estreptococos de importância médica estão listados na
isto é, podem ser inibidas pelos antibióticos, porém não Tabela 15-3. Todos, exceto um desses estreptococos, são
são mortas. (Ou seja, a razão entre a concentração míni- discutidos nesta seção; Streptococcus pneumoniae é discutido
ma bactericida [MBC] e a concentração mínima inibitória separadamente ao final deste capítulo devido a sua impor-
[MIC] é muito elevada.) A tolerância pode resultar de uma tância.
falha dos fármacos em inativarem os inibidores de enzimas
autolíticas que degradam o organismo. Organismos tole- Doenças
rantes devem ser tratados com combinações de fármacos Os estreptococos causam uma ampla variedade de infecções.
(ver Capítulo 10). S. pyogenes (um estreptococo do grupo A) é a principal causa
bacteriana de faringite e celulite. É uma importante causa de
A drenagem (espontânea ou cirúrgica) corresponde impetigo, fasciite necrosante, e síndrome do choque tóxico
ao principal procedimento do tratamento de abscessos. A estreptocóccico. Também é o fator incitador de duas impor-
infecção prévia confere apenas imunidade parcial a reinfec- tantes doenças imunológicas, a febre reumática e a glome-
ções. rulonefrite aguda. Streptococcus agalactiae (estreptococo do
grupo B) é a principal causa de sépsis e meningite neonatais.
S. epidermidis é altamente resistente a antibióticos. Enterococcus faecalis é uma importante causa de infecções no-
A maioria das linhagens produz β-lactamase e várias são socomiais do trato urinário e endocardite. Os estreptococos
resistentes a meticilina/nafcilina devido a proteínas de do grupo viridans são a causa mais comum de endocardite.
ligação à penicilina modificadas. O fármaco de escolha Streptococcus bovis também causa endocardite.
é a vancomicina, à qual a rifampina ou um aminoglico-
sídeo podem ser adicionados. A remoção do cateter ou Propriedades importantes
outro dispositivo é frequentemente necessário. Infecções Os estreptococos são cocos esféricos gram-positivos, organi-
do trato urinário por S. saprophyticus podem ser tratadas zados em cadeias ou pares (ver Prancha Colorida 2). Todos
com uma quinolona, como norfloxacina, ou com trimeto- os estreptococos são catalase-negativos, enquanto os estafi-
prim-sulfametoxazol. lococos são catalase-positivos (Tabela 15-3).

Prevenção Uma das características mais importantes para a iden-
tificação de estreptococos é o tipo de hemólise (ver Prancha
Não há vacinas contra estafilococos. Asseio, lavagem fre- Colorida 16).
quente das mãos e manipulação asséptica das lesões auxiliam
no controle da disseminação de S. aureus. A colonização (1) Estreptococos alfa-hemolíticos formam uma zona
persistente do nariz por S. aureus pode ser reduzida com o verde ao redor de suas colônias, resultante da lise incompleta
uso de mupirocina intranasal ou antibióticos orais, como das hemácias no ágar.
ciprofloxacina ou trimetoprim-sulfametoxazol, contudo sua
eliminação completa é difícil. Pode ser necessária a remoção
de portadores das áreas de alto risco, por exemplo, salas ci-

Tabela 15-3 Estreptococos de importância médica

Espécie Grupo de Lancefield Hemólise típica Características diagnósticas1

S. pyogenes A Beta Sensível à bacitracina

S. agalactiae B Beta Resistente à bacitracina, hidrólise do hipurato
E. faecalis D Alfa ou beta ou nenhuma Crescimento em NaCl a 6,5%3

S. bovis2 D Alfa ou nenhuma Crescimento ausente em NaCl a 6,5%
S. pneumoniae NA4 Alfa Bile-solúvel; inibido por optoquina
Grupo viridans5 NA Alfa Não bile-solúvel; não inibido por optoquina

1Todos os estreptococos são catalase-negativos.
2S. bovis é um organismo não enterocóccico do grupo D.
3E. faecalis e S. bovis crescem em ágar bile-esculina, ao contrário dos demais estreptococos. Eles hidrolisam a esculina, resultando em uma característica descoloração
negra do ágar.
4NA, não aplicável.
5Os estreptococos do grupo viridans incluem várias espécies, como S. sanguis, S. mutans, S. mitis, S. gordoni, S. salivarius, S. anginosus, S. milleri e S. intermedius.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Microbiologia Médica e Imunologia 119

(2) Estreptococos beta-hemolíticos formam uma zona enterococos (p. ex., S. bovis). Os enterococos são membros
clara ao redor de suas colônias, uma vez que ocorre a lise da microbiota normal do cólon, caracterizando-se por sua
completa das hemácias. A beta-hemólise é decorrente da capacidade de causar infecções urinárias, biliares e cardiovas-
produção de enzimas (hemolisinas) denominadas estreptoli- culares. São organismos muito tenazes, capazes de crescer em
sina O e estreptolisina S (ver a seguir a seção Patogênese). salina hipertônica (6,5%) ou em bile, e não são mortos pela
penicilina G. Como resultado, uma combinação sinergística
(3) Alguns estreptococos são não hemolíticos (gama- de penicilina e um aminoglicosídeo (como a gentamicina) é
-hemólise). requerida para matar enterococos. A vancomicina também
pode ser utilizada, mas enterococos resistentes à vancomicina
Os estreptococos de beta-hemolíticos possuem dois im- (VRE, do inglês, vancomycin-resistant enterococci) emergiram
portantes antígenos: e se tornaram uma importante e temida causa de infecções
nosocomiais de risco à vida. Maior número de linhagens de
(1) O carboidrato C determina o grupo dos estreptoco- E. faecium é resistente à vancomicina, quando comparadas às
cos beta-hemolíticos. Situa-se na parede celular, e sua especi- linhagens de E. faecalis.
ficidade é determinada por um amino-açúcar.
Os estreptococos não enterocóccicos do grupo D, como
(2) A proteína M é o fator de virulência mais importan- S. bovis, podem causar infecções similares, porém são or-
te e determina o tipo dos estreptococos beta-hemolíticos do ganismos menos resistentes. Por exemplo, são inibidos por
grupo A. Ela se projeta a partir da superfície externa da célula NaCl a 6,5% e mortos pela penicilina G. Observe que a
e interfere com a ingestão por fagócitos, ou seja, é antifagoci- reação hemolítica de estreptococos do grupo D é variável: a
tária. Anticorpos contra a proteína M conferem imunidade maioria é alfa-hemolítica, porém alguns são beta-hemolíti-
tipo-específica. Existem aproximadamente 80 sorotipos com cos, enquanto outros são não hemolíticos.
base na proteína M, o que explica a possibilidade de ocor-
rência de múltiplas infecções por S. pyogenes. As linhagens Os estreptococos dos grupos C, E, F, G, H e K-U rara-
de S. pyogenes que produzem determinados tipos de proteína mente causam doenças em humanos.
M são reumatogênicas, isto é, causam principalmente febre
reumática, enquanto linhagens de S. pyogenes que produzem B. Estreptococos não beta-hemolíticos
outros tipos de proteína M são nefritogênicas, isto é, cau-
sam principalmente glomerulonefrite aguda. Embora a pro- Alguns não produzem hemólise, outros promovem alfa-
teína M seja o principal componente antifagocitário de S. -hemólise. Os principais organismos alfa-hemolíticos são S.
pyogenes, o organismo também possui uma cápsula polissaca- pneumoniae e os estreptococos do grupo viridans. Os estrep-
rídica que desempenha um papel no retardo da fagocitose. tococos viridantes (p. ex., Streptococcus mitis, Streptococcus
sanguis e Streptococcus mutans) não são bile-solúveis e não
Classificação de estreptococos são inibidos por optoquina – ao contrário de S. pneumoniae,
que é bile-solúvel e inibido por optoquina. Os estreptoco-
A. Estreptococos beta-hemolíticos cos viridantes são membros da microbiota normal da faringe
humana e intermitentemente atingem a corrente sanguínea,
Os estreptococos beta-hemalíticos são organizados em grupos causando endocardite infecciosa. S. mutans sintetiza os po-
de A-U (conhecidos como grupos de Lancefield) com base lissacarídeos (dextranas) encontrados na placa dental e que
nas diferenças antigênicas do carboidrato C. No laboratório levam à formação da cárie dental. Streptococcus intermedius
clínico, o grupo é determinado por meio de testes de precipi- e Streptococcus anginosus (também conhecidos como o grupo
tina com antissoros específicos ou por imunofluorescência. Streptococcus aginosus-milleri) são usualmente alfa-hemolí-
ticos ou não hemolíticos, apesar de alguns isolados serem
Os estreptococos do grupo A (S. pyogenes) estão entre os beta-hemolíticos. São encontrados principalmente na boca
mais importantes patógenos de humanos. Eles são a causa e cólon.
bacteriana mais frequente de faringite e uma causa muito co-
mum de infecções de pele. Aderem ao epitélio da faringe por C. Peptostreptococos
meio de pili revestidos por ácido lipoteicoico e proteína M.
Muitas linhagens possuem uma cápsula de ácido hialurônico Peptostreptococos crescem em condições anaeróbias ou
antifagocitária. O crescimento de S. pyogenes é inibido pelo microaerofílicas e produzem hemólise variável. São mem-
antibiótico bacitracina, importante critério diagnóstico (ver bros da microbiota normal do intestino, da boca e do tra-
Prancha Colorida 17). to genital feminino, participando em infecções anaeróbias
mistas. O termo “infecções anaeróbias mistas” refere-se ao
Os estreptococos do grupo B (S. agalactiae) colonizam fato de essas infecções serem causadas por múltiplas bac-
o trato genital de algumas mulheres e podem causar menin- térias, algumas das quais são anaeróbias, enquanto outras
gite e sépsis neonatais. São usualmente resistentes à bacitra- são facultativas. Por exemplo, peptostreptococos e estrep-
cina e hidrolisam (clivam) hipurato, um importante critério tococos viridantes, ambos membros da microbiota oral, são
diagnóstico. frequentemente encontrados em abscessos cerebrais pós ci-
rurgia odontológica. Peptostreptococcus magnus e Peptostrep-
Os estreptococos do grupo D incluem os enterococos
(p. ex., Enterococcus faecalis e Enterococcus faecium) e os não

ERRNVPHGLFRV RUJ

120 Warren Levinson

tococcus anaerobius são as espécies frequentemente isoladas a Os estreptococos do grupo A produzem três importan-
partir de espécimes clínicos. tes enzimas associadas à inflamação:

Transmissão (1) A hialuronidase degrada o ácido hialurônico, a subs-
tância base do tecido subcutâneo. A hialuronidase é conheci-
A maioria dos estreptococos é parte da microbiota normal da como fator de disseminação, uma vez que facilita a rápida
da garganta, da pele e do intestino humanos, mas causam disseminação de S. pyogenes em infecções de pele (celulite).
doença quando obtêm acesso aos tecidos ou ao sangue. Os
estreptococos viridantes e S. pneumoniae são encontrados (2) A estreptoquinase (fibrinolisina) ativa o plasmino-
principalmente na orofaringe; S. pyogenes é encontrado na gênio, formando plasmina, que dissolve a fibrina em coágu-
pele e, em pequenos números, na orofaringe; S. agalactiae los, trombos e êmbolos. Pode ser utilizada para lisar trombos
é encontrado na vagina e no cólon; e tanto os enterococos de artérias coronárias em pacientes infartados.
como os estreptococos anaeróbios localizam-se no cólon.
(3) A DNase (estreptodornase) degrada o DNA em
Patogênese exsudatos ou tecidos necróticos. Anticorpos contra DNa-
se B desenvolvem-se durante a piodermite, o que pode ser
Os estreptococos do grupo A (S. pyogenes) causam doença utilizado para fins diagnósticos. Misturas de estreptoquina-
por três mecanismos: (1) inflamação piogênica, induzida se-estreptodornase aplicadas como teste cutâneo apresentam
localmente no sítio dos organismos no tecido, (2) produção reação positiva na maioria dos adultos, indicando uma imu-
de exotoxina, que pode causar sintomas sistêmicos dissemi- nidade normal mediada por células.
nados em regiões corporais onde não há organismos e (3)
imunológico, que ocorre quando o anticorpo contra um Além disso, os estreptococos do grupo A produzem cin-
componente do organismo reage de forma cruzada com o co importantes toxinas e hemolisinas.
tecido normal ou forma complexos imunes que danificam o
tecido normal (ver a seção sobre doenças pós-estreptocócci- (1) A toxina eritrogênica causa a erupção da escar-
cas, posteriormente, neste capítulo). As reações imunológicas latina. Seu mecanismo de ação é similar àquele da toxina
causam inflamação, por exemplo, as articulações inflamadas da síndrome do choque tóxico (TSST) de S. aureus; isto é,
observadas na febre reumática, porém não há organismos atua como superantígeno (ver S. aureus, anteriormente, e
nas lesões (Tabela 15-4). Capítulo 58). É produzida apenas por certas linhagens de
S. pyogenes lisogenizadas por um bacteriófago que carreia
A proteína M de S. pyogenes é o mais importante fa- o gene da toxina. A injeção de uma dose de teste cutâneo
tor antifagocitário, mas sua cápsula, composta por ácido da toxina eritrogênica (teste de Dick) apresenta resultado
hialurônico, é também antifagocitária. Não são formados positivo em indivíduos desprovidos da antitoxina (i.e., in-
anticorpos contra a cápsula, uma vez que o ácido hialurô- divíduos suscetíveis).
nico é um componente normal do corpo e os humanos são
tolerantes a ele. (2) A estreptolisina O é uma hemolisina inativada por
oxidação (lábil ao oxigênio). Causa beta-hemólise somente
quando as colônias desenvolvem-se abaixo da superfície de

Tabela 15-4 Características importantes da patogênese de estreptococos

Organismo Tipo de patogênese Doença típica Principal sítio da doença
S. pyogenes (grupo A) (D), colonização (C) ou
1. Piogênica Impetigo, celulite microbiota normal (MN)
S. agalactiae (grupo B) a. Local Faringite
E. faecalis (grupo D) Sépsis Pele (D)
S. bovis (grupo D) b. Disseminada Escarlatina Garganta (D)
S. pneumoniae 2. Toxigênica Choque tóxico Corrente sanguínea (D)
Estreptococos viridantes Febre reumática Pele (D)
3. Imunomediada (pós-estrepto- Glomerulonefrite aguda Vários órgãos (D)
cóccica, não supurativa) Sépsis e meningite neonatais Coração, articulações (D)
Infecção do trato urinário, endocardite Rim (D)
Piogênica Endocardite Vagina (C)
Piogênica Pneumonia, otite média, meningite Cólon (MN)
Piogênica Endocardite Cólon (MN)
Piogênica Orofaringe (C)
Piogênica Orofaringe (MN)

ERRNVPHGLFRV RUJ

Prancha Colorida 1 Staphylococcus aureus – Coloração de Prancha Colorida 2 Streptococcus pyogenes – Coloração de
Gram. As setas apontam para dois agrupamentos de cocos gram- Gram. As setas apontam para uma cadeia longa de cocos gram-
-positivos, semelhantes a “cachos de uvas”. A ponta de seta indica -positivos. Fonte: Professora Shirley Lowe, University of California,
um neutrófilo com núcleo segmentado róseo. Fonte: Professora San Francisco School of Medicine. Com permissão.
Shirley Lowe, University of California, San Francisco School of Me-
dicine. Com permissão.

Prancha Colorida 3 Streptococcus pneumoniae – Coloração de Prancha Colorida 4 Neisseria gonorrhoeae – Coloração de
Gram. As setas apontam para típicos diplococos gram-positivos. Gram. A seta aponta para típicos diplococos gram-negativos “ri-
Observe que a área clara ao redor do organismo corresponde à niformes” no interior de um neutrófilo. Fonte: Professora Shirley
cápsula. Fonte: Professora Shirley Lowe, University of California, Lowe, University of California, San Francisco School of Medicine.
San Francisco School of Medicine. Com permissão. Com permissão.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Prancha Colorida 5 Bacillus anthracis – Coloração de Gram. A Prancha Colorida 6 Clostridium perfringens – Coloração de
seta aponta para um bacilo longo gram-positivo, semelhante a Gram. A seta aponta para um grande bacilo gram-positivo. Fonte:
um “vagão”, em uma cadeia longa. Fonte: CDC. Professora Shirley Lowe, Universidade da Califórnia, Faculdade de
Medicina de São Francisco. Com permissão.

Prancha Colorida 7 Corynebacterium diphtheriae – Coloração
de Gram. A seta aponta para um bacilo gram-positivo em forma
de “clava”. A ponta de seta indica as típicas corinebactérias em
forma de V ou L. Fonte: CDC.

Prancha Colorida 8 Escherichia coli – Coloração de Gram. A
seta aponta para um bacilo gram-negativo. Fonte: Professora
Shirley Lowe, University of California, San Francisco School of Me-
dicine. Com permissão.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Prancha Colorida 10 Haemophilus influenzae – Coloração de
Gram. As setas apontam para dois pequenos bacilos gram-nega-
tivos “coco-bacilares”. Fonte: Professora Shirley Lowe, University
of California, San Francisco School of Medicine. Com permissão.

Prancha Colorida 9 Vibrio cholerae – Coloração de Gram. A
seta longa aponta para um bacilo gram-negativo curvo. A ponta
de seta indica um flagelo em uma das extremidades de um baci-
lo gram-negativo curvo. Fonte: CDC.

Prancha Colorida 11 Mycobacterium tuberculosis – Coloração
acidorresistente. As setas apontam para três bacilos acidorresis-
tentes de coloração vermelha. Fonte: CDC/Dr. Edwin Ewing, Jr.

Prancha Colorida 12 Nocardia asteroides – Coloração de
Gram. A seta aponta para uma área contendo filamentos de baci-
los gram-positivos. Fonte: Professora Shirley Lowe, University of
California, San Francisco School of Medicine. Com permissão.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Prancha Colorida 13 Treponema pallidum – Microscopia de Prancha Colorida 14 Chlamydia trachomatis – Microscopia
campo escuro. A morfologia espiralada deste espiroqueta pode óptica de cultura celular. A seta longa aponta para um corpo de
ser observada no centro do campo. Fonte: CDC/Dr. Schwartz. inclusão citoplasmático de Chlamydia trachomatis; a seta curta
aponta para o núcleo da célula. Fonte: CDC/Dr. E. Arum e Dr. N.
Jacobs.

Prancha Colorida 15 Teste de coagulase – Tubo superior ino- Prancha Colorida 16 Alfa hemólise e beta hemólise em ágar
culado com Staphylococcus aureus; tubo inferior inoculado com sangue – A seta curta aponta para uma colônia alfa-hemolítica,
Staphylococcus epidermidis. A seta aponta para plasma coagulado provavelmente um estreptococo do grupo viridante. A seta longa
formado pela coagulase produzida por Staphylococcus aureus. aponta para uma colônia beta-hemolítica, provavelmente Strep-
Fonte: Professora Shirley Lowe, University of California, San Fran- tococcus pyogenes. O espécime utilizado foi um swab de garganta
cisco School of Medicine. Com permissão. de um indivíduo com faringite. Fonte: Professora Shirley Lowe,
University of California, San Francisco School of Medicine. Com
permissão.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Prancha Colorida 17 Teste de bacitracina – A seta aponta Prancha Colorida 18 Teste de optoquina – A seta aponta para
para a zona de inibição de crescimento de estreptococos do a zona de inibição de crescimento de Streptococcus pneumoniae
grupo A (Streptococcus pyogenes) causada pela bacitracina que se causada pela optoquina que se difundiu a partir do disco P. Na
difundiu a partir do disco A. A metade superior da placa de ágar metade inferior da placa de ágar sangue, osberva-se a alfa-hemó-
sangue exibe beta hemólise causada por estreptococos do grupo lise produzida por Streptococcus pneumoniae, exceto na região ao
A, exceto na região ao redor do disco de bacitracina. A metade redor do disco de optoquina. A seta aponta para o limite externo
inferior da placa de ágar sangue exibe beta-hemólise causada da zona de inibição. A metade superior da placa de ágar sangue
por estreptococos do grupo B (Streptococcus agalactiae) e não há exibe alfa-hemólise causada por um estreptococo viridante, e
zona de inibição de crescimento ao redor do disco de bacitracina. não há zona de inibição ao redor do disco de optoquina. Fonte:
Fonte: Professora Shirley Lowe, University of California, San Fran- Professora Shirley Lowe, University of California, San Francisco
cisco School of Medicine. Com permissão. School of Medicine. Com permissão.

Prancha Colorida 19 Teste de oxidase – Uma gota do rea- Prancha Colorida 20 Serratia marcescens – Colônias pigmen-
gente de oxidase foi depositada à esquerda e à direita do papel tadas em vermelho. A seta aponta para uma colônia de pigmen-
de filtro. As bactérias de uma colônia de Neisseria gonorrhoeae tação vermelha de Serratia marcescens. Fonte: Professora Shirley
foram homogeneizadas com a gota à esquerda e uma coloração Lowe, University of California, San Francisco School of Medicine.
púrpura indica um teste positivo, isto é, o organismo é oxida- Com permissão.
se-positivo. As bactérias de uma colônia de Escherichia coli foram
homogeneizadas com a gota à direita e a ausência de uma colo-
ração púrpura indica um teste negativo. Fonte: Professora Shirley
Lowe, University of California, San Francisco School of Medicine.
Com permissão.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Prancha Colorida 21 Espécies de Proteus – Motilidade pul- Prancha Colorida 22 Pseudomonas aeruginosa – Pigmento
sante em ágar sangue. A ponta de seta indica o sítio onde as verde-azulado. O pigmento verde-azulado (piocianina) produ-
bactérias Proteus foram depositadas no ágar sangue. A seta curta zido por Pseudomonas aeruginosa difunde-se pelo ágar. Fonte:
aponta para a borda do primeiro anel da motilidade pulsante; a Professora Shirley Lowe, University of California, San Francisco
seta longa aponta para a borda do segundo. Fonte: Professora School of Medicine. Com permissão.
Shirley Lowe, University of California, San Francisco School of Me-
dicine. Com permissão.

Prancha Colorida 24 Vírus do herpes simples – Micrografia
eletrônica. Três vírions de HSV são visíveis. A seta curta aponta
para o envelope de um vírion de HSV. A seta longa aponta para o
nucleocapsídeo do vírion. Fonte: CDC/Dr. John Hierholzer.

Prancha Colorida 23 Prevotella melaninogenica – Colônias
de pigmentação negra. A seta aponta para uma colônia de pig-
mentação negra de Prevotella melaninogenica. Fonte: Professora
Shirley Lowe, University of California, San Francisco School of
Medicine. Com permissão.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Prancha Colorida 25 Herpes simples tipo 2 – Células gigantes Prancha Colorida 26 Citomegalovírus – Corpo de inclusão
multinucleadas em esfregaço de Tzanck. A seta aponta para uma em olho de coruja. A seta aponta para um corpo de inclusão em
célula gigante multinucleada, com aproximadamente oito núcle- “olho de coruja” no núcleo de uma célula infectada. Fonte: CDC/
os. Fonte: CDC/Dr. Joe Miller. Dr. Edwin Ewing, Jr.

Prancha Colorida 28 Vírus da raiva – Corpúsculo de Negri no
citoplasma de um neurônio infectado. A seta aponta para um
“corpúsculo de Negri”, um corpo de inclusão no citoplasma de
um neurônio infectado. Fonte: CDC.

Prancha Colorida 27 Influenzavírus – Micrografia eletrôni-
ca. A seta longa aponta para o nucleocapsídeo helicoidal do
influenzavírus. O nucleocapsídeo contém o genoma de RNA
segmentado e de polaridade negativa. A seta curta aponta para
as espículas no envelope do vírion. As espículas são as proteínas
hemaglutinina e neuraminidase. Fonte: CDC/Dr. Erskine Palmer e
Dr. M. Martin.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Prancha Colorida 29 Vírus da hepatite B – Micrografia eletrô- Prancha Colorida 30 Encefalopatia espongiforme (mal da
nica. A seta longa aponta para um típico vírion do vírus da hepa- vaca louca) mediada por príons – As duas setas indicam o aspec-
tite B. A seta curta aponta para uma pequena esfera (imediata- to espongiforme (“orifícios semelhantes aos do queijo suíço”)
mente à esquerda da ponta da seta) e para um bastonete longo do cérebro de uma vaca acometida pelo mal da “vaca louca”. O
(imediatamente à direta da ponta da seta), ambos compostos cérebro de um paciente com a doença de Creutzfeldt-Jakob (CJD,
apenas pelo antígeno HB de superfície. Fonte: CDC. do inglês, Creutzfeldt-Jakob disease) exibe aspecto similar. Fonte:
CDC/Dr. Al Jenny.

Prancha Colorida 31 Vírus da imunodeficiência humana – Mi- Prancha Colorida 32 Vírus Ebola – Micrografia eletrônica. A
crografia eletrônica. A seta longa aponta para um vírion maduro seta longa aponta para um típico vírion do vírus Ebola. A seta
de HIV que foi liberado pelo linfócito infectado apresentado na curta indica a aparência de “cajado de pastor” de alguns vírions
parte inferior da figura. A seta curta (na porção inferior esquerda Ebola. Fonte: CDC/Dr. Erskine Palmer e Dr. Russell Regnery.
da imagem) aponta para diversos vírions nascentes no citoplas-
ma, imediatamente antes de brotarem a partir da membrana
celular. Fonte: CDC/Dr. A. Harrison, Dr. P. Feirino e Dr. E. Palmer.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Prancha Colorida 33 Coccidioides immitis – Esférula. A seta Prancha Colorida 34 Histoplasma capsulatum – Leveduras
longa aponta para uma esférula em tecido pulmonar. As esféru- no interior de macrófagos. A seta aponta para um macrófago
las são estruturas grandes e de parede espessa, que contêm vá- contendo várias leveduras coradas em púrpura no citoplasma. As
rios endósporos. A seta curta aponta para um endósporo. Fonte: leveduras no interior de macrófagos podem ser observadas em
CDC/Dr. L. Georg. diversos macrófagos neste espécime de baço. Fonte: CDC/Dr. M.
Hicklin.

Prancha Colorida 35 Blastomyces dermatitidis – Levedura com Prancha Colorida 36 Candida albicans – Levedura. A seta
brotamento de base larga. A seta aponta para a base larga da longa aponta para uma levedura com brotamento. A seta curta
levedura com brotamento. Fonte: CDC/Dr. L. Ajello aponta para a membrana externa de uma célula epitelial vaginal.
Neste espécime submetido à coloração de Gram, podem ser
observadas várias bactérias membras da microbiota normal da
vagina. Fonte: CDC/Dr. S. Brown.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Prancha Colorida 37 Candida albicans – Pseudo-hifas. As duas Prancha Colorida 38 Cryptococcus neoformans – Preparação
setas apontam para pseudo-hifas de Candida albicans. Fonte: com tinta nanquim. A seta aponta para uma levedura de Crypto-
CDC/Dr. S. Brown. coccus neoformans com brotamento. Observe a cápsula polissa-
carídica espessa e translúcida delineada pelas partículas escuras
de tinta nanquim. Fonte: CDC/Dr. L. Haley.

Prancha Colorida 39 Aspergillus fumigatus – Hifas septadas. A Prancha Colorida 40 Espécies de Mucor – Hifas não septadas.
seta longa aponta para as hifas septadas de Aspergillus. Observe A seta aponta para hifas não septadas e de morfologia irregular
as paredes celulares retas e paralelas deste bolor. A seta curta de Mucor. Fonte: CDC/Dr. L. Ajello.
aponta para a típica ramificação de pequena angulação, em for-
ma de Y. Fonte: Professor Henry Sanchez, University of California,
San Francisco School of Medicine. Com permissão.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Prancha Colorida 41 Entamoeba histolytica – Trofozoíto. A Prancha Colorida 42 Entamoeba histolytica – Cisto. A seta
seta longa aponta para um trofozoíto de Entamoeba histolytica. aponta para um cisto de Entamoeba histolytica. Dois dos quatro
A seta curta aponta para o núcleo do trofozoíto. A ponta de seta núcleos são visíveis imediatamente à esquerda da ponta da seta.
indica uma das seis hemácias ingeridas. Fonte: CDC. Fonte: CDC.

Prancha Colorida 44 Trichomonas vaginalis – Trofozoíto. As
setas apontam para dois trofozoítos. Fonte: CDC.

Prancha Colorida 43 Giardia lamblia – Trofozoíto. A seta
aponta para um trofozoíto piriforme de Giardia lamblia. Fonte:
CDC/Dr. M. Mosher.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Prancha Colorida 45 Plasmodium falciparum – Trofozoíto em Prancha Colorida 46 Plasmodium falciparum – Gametócito. A
forma de anel. A seta aponta para uma hemácia contendo um seta aponta para um gametócito em “forma de banana” de Plas-
trofozoíto anelar. A ponta de seta indica uma hemácia contendo modium falciparum. Fonte: CDC/Dr. S. Glenn.
quatro trofozoítos em forma de anel. Observe a porcentagem
muito alta de hemácias contendo formas em anel. Esta parasite-
mia em alto nível é observada com mais frequência na infecção
por Plasmodium falciparum do que em infecções por outros plas-
módios. Fonte: CDC/Dr. S. Glenn.

Prancha Colorida 47 Toxoplasma gondii – Taquizoíto. A seta Prancha Colorida 48 Pneumocystis jeroveci – A seta aponta
aponta para um taquizoíto de Toxoplasma gondii em músculo para um cisto de Pneumocystis jeroveci em tecido pulmonar. Fon-
cardíaco. Fonte: CDC/Dr. E. Ewing, Jr. te: CDC/Dr. E. Ewing, Jr.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Prancha Colorida 49 Trypanosoma cruzi – Amastigotas. A seta Prancha Colorida 50 Trypanosoma brucei – Tripomastigotas.
aponta para um amastigota (forma não flagelada) no citoplasma. A seta aponta para um tripomastigota (a forma flagelada) no san-
Fonte: CDC/Dr. A. J. Sulzer. gue. Fonte: CDC/Dr. M. Schultz.

Prancha Colorida 51 Leishmania donovani – Amastigotas. Prancha Colorida 52 Naegleria fowleri – Trofozoíto. As setas
A seta aponta para um amastigota (forma não flagelada) no apontam para dois trofozoítos em forma de ameba em tecido
citoplasma da uma célula da medula óssea. Fonte: CDC/Dr. Dr. cerebral. Fonte: CDC.
Francis Chandler.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Prancha Colorida 53 Babesia microti – Trofozoítos em tétra- Prancha Colorida 54 Taenia solium – Escólex e diversas pro-
des. A seta aponta para uma hemácia contendo quatro trofo- glotes. A seta longa aponta para uma das quatro ventosas do
zoítos em uma tétrade semelhante a uma “cruz maltesa”. Fonte: escólex de Taenia solium. A seta curta aponta para o círculo de
CDC/Dr. S. Glenn. ganchos. As proglotes podem ser observadas estendendo-se a
partir do escólex, em direção à parte esquerda da imagem. Fonte:
CDC/Dr. M. Melvin.

Prancha Colorida 55 Cisticerco de Taenia solium no cérebro – Prancha Colorida 56 Taenia saginata – Tênia adulta. Observe
A seta longa aponta para uma larva de Taenia solium. A seta curta o pequeno escólex à direita da imagem, e as proglotes grávidas à
aponta para a parede do cisticerco (saco) que envolve a larva. esquerda. A régua mede 12 polegadas. Fonte: CDC.
Fonte: Reproduzido com permissão de Muller e Baker, Medical
Parasitology. J.B. Lippincott Company, 1990.

Prancha Colorida 57 Schistosoma – Cercária. A seta aponta Prancha Colorida 58 Schistosoma mansoni – Ovo. A seta
para uma cercária de Schistosoma. Observe a típica cauda bifur- longa aponta para um ovo de Schistosoma mansoni. A seta curta
cada, à esquerda da imagem. Fonte: CDC/Minnesota Departa- aponta para sua grande espinha lateral. Fonte: CDC.
ment of Health, R. N. Barr Library; Bibliotecários M. Rethlefson e
M. Jones; Prof. W. Wiley. Com permissão.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Prancha Colorida 59 Schistosoma hematobium – Ovo. A seta Prancha Colorida 60 Enterobius vermicularis – Ovos. A seta
longa aponta para um ovo de Schistosoma hematobium. A seta longa aponta para um ovo do oxiúro Enterobius vermicularis recu-
curta aponta para sua espinha terminal. Fonte: CDC. perado em “fita adesiva”. A seta curta aponta para o embrião no
interior do ovo. Fonte: CDC.

Prancha Colorida 61 Trichuris trichiura – Ovo. A seta longa Prancha Colorida 62 Ascaris lumbricoides – Ovo. A seta apon-
aponta para um ovo de Trichuris trichiura. A seta curta aponta ta para um ovo de Ascaris. Observe a típica borda “ondulada” do
para um dos dois “tampões” mucoides em cada extremidade do ovo de Ascaris. Fonte: CDC.
ovo. Fonte: CDC/Dr. M. Melvin.

Prancha Colorida 63 Necator e Strongyloides – Larvas filarifor- Prancha Colorida 64 Ancylostoma duodenale – Cabeça do an-
mes. Larva filariforme de Necator à esquerda e de Strongyloides cilóstomo adulto. A seta aponta para os quatro dentes cortantes
à direita. A larva filariforme corresponde à forma infectiva que da boca de Ancylostoma. Fonte: CDC/Dr. M. Melvin.
penetra na pele. Fonte: CDC.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Prancha Colorida 65 Necator e Ancylostoma (ancilóstomos) Prancha Colorida 66 Trichinella spiralis – Larvas no músculo
– Ovo. A seta aponta para um ovo de um ancilóstomo. Os ovos esquelético. As três seta apontam para larvas de Trichinella no in-
de Necator e Ancylostoma são indistinguíveis. Observe o embrião terior de “células alimentadoras” do músculo esquelético. Fonte:
enrolado no interior. Fonte: CDC. CDC.

Prancha Colorida 67 Wuchereria bancrofti – Verme filário em Prancha Colorida 68 Pediculus corporus – Piolho corporal. Ob-
sangue. A seta aponta para um verme filário em um esfregaço de serve o abdômen alongado de Pediculus corporus. Ao contrário, o
sangue. Fonte: CDC/Dr. M. Melvin. piolho pubiano exibe abdômen curto, semelhante a um “caran-
guejo”. Fonte: CDC/Dr. F. Collins.

Prancha Colorida 69 Pediculus capitis – Ovo (lêndea). A seta Prancha Colorida 70 Sarcoptes scabiei – Ácaro da “sarna”. A
aponta para um ovo (também conhecido como lêndea) aderido a seta longa aponta para a boca. A seta curta aponta para uma
um pedículo piloso. Fonte CDC/Dr. D. Juranek. das oito patas. Esta é uma visão ventral. Fonte: CDC/Doado pela
World Health Organization, Geneva, Switzerland.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Microbiologia Médica e Imunologia 121

uma placa de ágar sangue. É antigênica, e anticorpos vol- Os estreptococos do grupo A causam infecções de pele
tados contra ela (ASO) desenvolvem-se após infecções por e tecidos moles, como celulite, erisipela, fasciite necrosante
estreptococos do grupo A. O título de anticorpos ASO pode (gangrena estreptocóccica) e impetigo. O impetigo, uma for-
ser importante no diagnóstico de febre reumática. ma de piodermite, é uma infecção cutânea superficial carac-
terizada por lesões crostosas “cor de mel”. Os estreptococos
(3) A estreptolisina S é uma hemolisina que não é ina- do grupo A também causam endometrite (febre puerperal),
tivada pelo oxigênio (estável ao oxigênio). Ela não é anti- uma infecção grave em mulheres grávidas e sépsis. A glo-
gênica, porém é responsável pela beta-hemólise quando as merulonefrite aguda pós-estreptocóccica imunomediada
colônias desenvolvem-se na superfície de uma placa de ágar também pode ocorrer, especialmente após infecções de pele
sangue. causadas por certos tipos de proteína M de S. pyogenes.

(4) A exotoxina A piogênica é a toxina responsável Os estreptococos do grupo B causam sépsis e menin-
pela maioria dos casos da síndrome de choque tóxico por gite neonatais. O principal fator predisponente consiste na
estreptococos. Exibe o mesmo mecanismo de ação que a ruptura prolongada (superior a 18 horas) das membranas em
TSST estafilocóccica, isto é, consiste em um superantígeno mulheres colonizadas pelo organismo. Crianças nascidas an-
que provoca a liberação de grandes quantidades de citocinas tes de 37 semanas de gestação exibem risco significativamente
pelas células T auxiliares e pelos macrófagos (ver páginas 54 aumentado da doença. Além disso, crianças cujas mães não
e 414). apresentam anticorpos contra estreptococos do grupo B, e,
consequentemente, nascem desprovidas de IgG adquirida pela
(5) A exotoxina B é uma protease que destrói rapida- via transplacentária, exibem elevada taxa de sépsis neonatal
mente os tecidos, sendo produzida em grandes quantidades causada por esses organismos. Os estreptococos do grupo B
por linhagens de S. pyogenes, os denominados estreptococos são também uma importante causa de pneumonia neonatal.
“carnívoros”, responsáveis pela fasciite necrosante.
Embora a maioria das infecções por estreptococos do
A patogênese de estreptococos do grupo B (S. agalac- grupo B ocorra em neonatos, esses organismos também
tiae) baseia-se na capacidade de o organismo induzir uma causam infecções, como pneumonia, endocardite, artrite
resposta inflamatória. Entretanto, diferentemente de S. pyo- e osteomielite, em adultos. A endometrite pós-parto tam-
genes, não foram descritas enzimas citotóxicas ou exotoxinas, bém ocorre. O diabetes corresponde ao principal fator pre-
e não há evidência de qualquer doença induzida imunologi- disponente de infecções por estreptococos do grupo B em
camente. Os estreptococos do grupo B exibem uma cápsu- adultos.
la polissacarídica antifagocitária, e o anticorpo anticapsular
confere proteção. Os estreptococos viridantes (p. ex., S. mutans, S. sanguis,
S. salivarius e S. mitis) são a causa mais comum de endo-
Achados clínicos cardite infecciosa. Eles atingem a corrente sanguínea (bac-
teriemia) a partir da orofaringe, tipicamente após cirurgia
S. pyogenes causa três tipos de doenças: (1) doenças piogêni- odontológica. Os sinais de endocardite são febre, murmúrio
cas, como faringite e celulite; (2) doenças toxigênicas, como cardíaco, anemia e eventos embólicos, como hemorragias
escarlatina e síndrome do choque tóxico; e (3) doenças imu- em lasca, hemorragias petequiais subconjuntivas e lesões de
nológicas, como febre reumática e glomerulonefrite aguda Janeway. A endocardite é 100% fatal, exceto quando efetiva-
(ver a seguir a seção sobre Doenças Pós-estreptocóccicas). mente tratada com agentes antimicrobianos. Cerca de 10%
dos casos de endocardite são causados por enterococos, mas
S. pyogenes (estreptococo beta-hemolítico do grupo A) qualquer organismo que cause bacteriemia pode alojar-se em
é a causa bacteriana mais comum de faringite. A faringite válvulas deformadas. Em mais de 90% dos casos são neces-
caracteriza-se por inflamação, exsudato, febre, leucocitose e sárias pelo menos três hemoculturas para assegurar a recupe-
linfonodos cervicais sensíveis. Quando não tratada, a recu- ração do organismo.
peração espontânea ocorre em 10 dias. No entanto, pode
resultar em otite, sinusite, mastoidite e meningite. Quando Os estreptococos viridantes, especialmente S. anginosus,
os estreptococos infectantes produzirem toxina eritrogêni- S. milleri e S. intermedius, causam também abscessos cere-
ca e o hospedeiro for desprovido de antitoxinas, o resul- brais, frequentemente em combinação com anaeróbios da
tado pode ser escarlatina. A febre reumática pode ocorrer cavidade oral (uma infecção mista aeróbia-anaeróbia). A
especialmente após a faringite. S. pyogenes causa também cirurgia odontológica é um importante fator predisponen-
outra doença mediada por toxinas, a síndrome do choque te de abscessos cerebrais, uma vez que propicia uma porta
tóxico estreptocóccico, que exibe achados clínicos similares de entrada para os estreptococos viridantes e anaeróbios da
àqueles da síndrome do choque tóxico estafilocóccico (ver cavidade oral atingirem a corrente sanguínea (bacteremia),
página 116). disseminando-se para o cérebro. Os estreptococos viridan-
tes estão envolvidos em infecções mistas aeróbias-anaeróbias
Contudo, a SCT estreptocóccica exibe tipicamente um também em outras regiões do corpo, por exemplo, abscessos
sítio reconhecível de inflamação piogênica, sendo as hemo- abdominais.
culturas frequentemente positivas, enquanto a SCT estafilo-
cóccica tipicamente não exibe um sítio de inflamação piogê-
nica, ou hemoculturas positivas.

ERRNVPHGLFRV RUJ

122 Warren Levinson

Os enterococos causam infecções do trato urinário, es- nização da pele, porém não pela administração de penicilina
pecialmente em pacientes hospitalizados. Cateteres urinários após a manifestação dos sintomas.
de longa duração e a instrumentação do trato urinário são
importantes fatores predisponentes. Os enterococos também B. Febre reumática aguda
causam endocardite, particularmente em pacientes submeti-
dos a cirurgia ou a instrumentação do trato gastrintestinal Aproximadamente duas semanas após uma infecção estrep-
ou urinário. Também causam infecções intra-abdominais e tocóccica do grupo A – geralmente faringite – pode haver o
pélvicas, tipicamente em combinação com anaeróbios. S. bo- desenvolvimento de febre reumática, caracterizada por febre,
vis, um estreptococo não enterocóccico do grupo D, causa poliartrite migratória e cardite. A cardite danifica o tecido
endocardite, especialmente em pacientes apresentando car- miocárdico e endocárdico, especialmente as válvulas mitral
cinoma de cólon. Essa associação é tão intensa que pacientes e aórtica. Movimentos espasmódicos e incontroláveis dos
apresentando bacteriemia ou endocardite por S. bovis devem membros ou face (coreia) também podem ocorrer. Os títulos
ser investigados quanto à presença de carcinoma de cólon. de ASO e a taxa de sedimentação de eritrócitos são elevados.
Observe que infecções de pele por estreptococos do grupo A
Em agosto de 2005, foi relatado que Streptococcus suis não causam febre reumática.
foi responsável pela morte de 37 fazendeiros na China. A
doença é caracterizada pela súbita manifestação de choque A febre reumática deve-se a uma reação imunológica
hemorrágico. Sabe-se que essa espécie causa doença em por- entre anticorpos contra certas proteínas M estreptocóccicas
cos, mas ocorreu apenas raramente em seres humanos antes que reagem de forma cruzada com antígenos dos tecidos
deste surto. Não houve disseminação das bactérias a partir articulares, cardíacos e cerebrais. É uma doença autoimu-
do caso índice para outros indivíduos. ne, significativamente exacerbada pela recorrência de infec-
ções estreptocóccicas. Quando as infecções estreptocóccicas
Os peptostreptococos são uma das bactérias mais co- são tratadas no período de 8 dias após sua manifestação, a
mumente encontradas em abscessos cerebrais, pulmonares, febre reumática geralmente é prevenida. Após um episódio
abdominais e pélvicos. de febre reumática com danos cardíacos, a reinfecção deve
ser prevenida por profilaxia de longo prazo. Nos Estados
Doenças pós-estreptocóccicas Unidos, menos de 0,5% das infecções por estreptococos do
(não supurativas) grupo A leva à febre reumática; contudo, nos países tropicais
em desenvolvimento, essa taxa é superior a 5%.
Consistem em distúrbios em que uma infecção local por es-
treptococos do grupo A é seguida, após algumas semanas, Diagnóstico laboratorial
por inflamação em um órgão que não foi infectado pelos
estreptococos. A inflamação é causada por uma resposta A. Microbiológico
imunológica às proteínas M estreptocóccicas, que reagem
de forma cruzada com os tecidos humanos. Algumas linha- Esfregaços submetidos à coloração de Gram não são úteis no
gens de S. pyogenes portando certas proteínas M são nefrito- caso da faringite estreptocóccica, uma vez que os estreptoco-
gênicas e causam glomerulonefrite aguda, enquanto outras cos viridantes são membros da microbiota normal e não po-
linhagens apresentando proteínas M distintas são reumato- dem ser distinguidos visualmente de S. pyogenes patogênicos.
gênicas, causando febre reumática aguda. Contudo, esfregaços de lesões ou ferimentos da pele corados
que revelam estreptococos são diagnósticos. Culturas de swa-
A. Glomerulonefrite aguda bs da faringe ou de lesões, em placas de ágar sangue, revelam
colônias beta-hemolíticas pequenas e translúcidas em um
A glomerulonefrite aguda (GNA) tipicamente ocorre 2-3 período de 18-48 horas. Quando inibidas por discos de ba-
semanas após a infecção cutânea por determinados tipos es- citracina, provavelmente correspondem a estreptococos do
treptocóccicos do grupo A em crianças (p. ex., a proteína M grupo A. Os estreptococos do grupo B caracterizam-se por
do tipo 49 causa GNA com maior frequência). A GNA é sua capacidade de hidrolisar hipurato e pela produção de
mais frequente após infecções de pele do que após faringite. uma proteína que provoca maior hemólise em ágar sangue de
As características clínicas mais marcantes são hipertensão, carneiro quando combinada à beta-hemolisina de S. aureus
edema de face (especialmente edema periorbital) e tornoze- (teste CAMP). Os estreptococos do grupo D hidrolisam a
los, e urina “fumarenta” (devido à presença de hemácias na esculina na presença de bile, isto é, originam um pigmento
urina). A maioria dos pacientes recupera-se completamente. negro no ágar bile-esculina. Os organismos do grupo D são
A reinfecção por estreptococos raramente leva à recorrência ainda subdivididos: os enterococos crescem em NaCl hiper-
de glomerulonefrite aguda. tônico (6,5%), ao contrário dos não enterococos.

A doença é iniciada por complexos antígeno-anticor- Embora as culturas sejam ainda consideradas o padrão
po na membrana basal glomerular, e os antígenos solúveis ouro para o diagnóstico de faringite estreptocóccica, existe
das membranas estreptocóccicas podem corresponder ao an- um problema porque os resultados da cultura não são dis-
tígeno incitador. Pode ser prevenida pela erradicação precoce ponibilizados por pelo menos 18 horas, e seria conveniente
dos estreptococos nefritogênicos presentes nos sítios de colo- saber, enquanto o paciente encontra-se no consultório, se

ERRNVPHGLFRV RUJ

Microbiologia Médica e Imunologia 123

antibióticos devem ser prescritos. Por esse motivo, foram ram. Enterococos resistentes à vancomicina (VRE) atual-
desenvolvidos testes rápidos que fornecem um diagnóstico mente são uma importante causa de infecções nosocomiais;
em aproximadamente 10 minutos. O teste rápido detecta a não há terapia antibiótica confiável para esses organismos.
presença de antígenos bacterianos em um espécime de um Atualmente, estão sendo utilizados dois fármacos experi-
swab de garganta. Nesse teste, antígenos específicos dos es- mentais no tratamento de infecções causadas por VRE: line-
treptococos do grupo A são extraídos do swab de garganta zolida (Zyvox) e quinupristina/dalfopristina (Synercid). Os
por meio de certas enzimas, sendo submetidos a uma reação estreptococos não enterocóccicos do grupo D, e.g., S. bovis,
com anticorpos contra esses antígenos ligados a partículas de não são altamente resistentes e podem ser tratados com pe-
látex. A aglutinação das partículas coloridas de látex ocorre nicilina G.
quando estreptococos do grupo A estão presentes no swab
de garganta. O fármaco de escolha para infecções por estreptococos
do grupo B correspondem à penicilina G ou à ampicilina.
Há também um teste rápido para a detecção de estrep- Algumas linhagens podem requerer doses mais elevadas de
tococos do grupo B em amostras vaginais e retais. O teste penicilina G, ou uma combinação de penicilina G e um
detecta o DNA do organismo, e os resultados podem ser ob- aminoglicosídeo, para erradicar o organismo. Os peptostrep-
tidos em aproximadamente uma hora. tococos podem ser tratados com penicilina G.

Os estreptococos do grupo viridans formam colônias Prevenção
alfa-hemolíticas em ágar sangue e devem ser diferenciados
de S. pneumoniae (pneumococos) que também é alfa-hemo- A febre reumática pode ser prevenida pelo imediato trata-
lítico. Os estreptococos do grupo viridans são resistentes à mento da faringite por estreptococos do grupo A com peni-
lise por bile e crescem na presença de optoquina, ao con- cilina. A prevenção de infecções estreptocóccicas (geralmen-
trário dos pneumococos. Os vários estreptococos do grupo te com penicilina benzatina uma vez ao mês, durante vários
viridans são classificados em espécies mediante uso de uma anos) em indivíduos já acometidos por febre reumática é
variedade de testes bioquímicos. importante a fim de prevenir a recorrência da doença. Não
há evidências de pacientes que foram acometidos por GNA
B. Sorológico necessitarem de profilaxia similar com penicilina.

Os títulos de ASO são elevados logo após infecções por es- Em pacientes apresentando válvulas cardíacas danifi-
treptococos do grupo A. Em pacientes suspeitos de apresen- cadas e submetidos a procedimentos odontológicos inva-
tarem febre reumática, um título de ASO elevado é tipi- sivos, a endocardite causada por estreptococos viridantes
camente utilizado como evidência de infecção prévia, uma pode ser prevenida com o uso pré-operatório de amoxici-
vez que os resultados de culturas de garganta são frequente- lina. Em pacientes apresentando válvulas cardíacas danifi-
mente negativos no momento em que o paciente apresenta cadas submetidos a procedimentos no trato gastrintestinal
febre reumática. Os títulos de anti-DNase B são elevados ou urinário, a endocardite causada por enterococos pode
em infecções de pele por estreptococos do grupo A e atuam ser prevenida com o uso pré-operatório de ampicilina e
como um indicador de infecção estreptocóccica prévia em gentamicina.
pacientes suspeitos de apresentarem GNA.
A incidência de sépsis neonatal causada por estreptoco-
Tratamento cos do grupo B pode ser reduzida por meio de uma abor-
dagem de duas vertentes: (1) todas as gestantes devem ser
Todos os estreptococos do grupo A são suscetíveis à penici- examinadas, realizando-se culturas vaginais e retais entre
lina G, mas os pacientes acometidos por febre reumática ou 35-37 semanas. Se as culturas forem positivas, a penicilina
GNA não são beneficiados pelo tratamento com penicilina G (ou ampicilina) deve ser administrada por via endovenosa
após a manifestação. Em infecções brandas por estreptococos no momento do parto. (2) No caso de pacientes nas quais as
do grupo A, a penicilina V oral pode ser utilizada. Em pa- culturas não foram realizadas, a penicilina G (ou ampicilina)
cientes alérgicos à penicilina, a eritromicina ou um de seus deve ser administrada por via endovenosa no momento do
derivados de ação prolongada, por exemplo, azitromicina, parto, no caso de mulheres que sofreram ruptura prolongada
podem ser utilizadas. Entretanto, linhagens de S. pyogenes re- (superior a 18 horas) das membranas, cujo trabalho de parto
sistentes à eritromicina emergiram, podendo limitar a efeti- iniciou-se antes de 37 semanas de gestação, ou que apresen-
vidade de fármacos da classe dos macrolídeos no tratamento tam febre no momento do parto. Se a paciente for alérgica à
da faringite estreptocóccica. penicilina, podem ser utilizadas cefazolina ou vancomicina.
A administração oral de ampicilina a mulheres portadoras
A endocardite causada pelo maioria dos estreptococos vaginais de estreptococos do grupo B não erradica o organis-
viridantes é curável pelo tratamento prolongado com peni- mo. Testes rápidos para antígenos de estreptococos do grupo
cilina. No entanto, a endocardite enterocóccica apenas pode B em espécimes vaginais podem ser insensíveis, e recém-nas-
ser erradicada com penicilina ou vancomicina combinadas a cidos de mulheres antígeno-negativas apresentaram, apesar
um aminoglicosídeo. disso, sépsis neonatal. Observe, no entanto, que infecções

Enterococos resistentes a múltiplos fármacos, por exem-
plo, penicilinas, aminoglicosídeos e vancomicina, emergi-

ERRNVPHGLFRV RUJ

124 Warren Levinson

por estreptococos do grupo B declinaram como resultado indicador de risco de ataque cardíaco do que uma taxa ele-
destas medidas profiláticas, enquanto as infecções neonatais vada de colesterol.
causadas por E. coli aumentaram.
Transmissão
Não existem vacinas disponíveis contra quaisquer dos
estreptococos, exceto S. pneumoniae (ver a seguir). Os seres humanos são os hospedeiros naturais de pneumo-
cocos, não havendo reservatório animal. Já que uma pro-
STREPTOCOCCUS PNEUMONIAE porção (5-50%) da população sadia alberga organismos vi-
rulentos na orofaringe, as infecções pneumocóccicas não são
Doenças consideradas transmissíveis. Em indivíduos jovens e sadios,
a resistência é elevada, e a doença ocorre mais frequente-
Os pneumococos causam pneumonia, bacteriemia, menin- mente quando fatores predisponentes (ver a seguir) estão
gite e infecções do trato respiratório superior, como otite presentes.
média e sinusite. Os pneumococos são a causa mais comum
de pneumonia adquirida na comunidade, meningite, sépsis Patogênese
em indivíduos esplenectomizados, otite média e sinusite.
O principal fator de virulência consiste no polissacarídeo
Propriedades importantes capsular, sendo os anticorpos anticapsulares protetores. O
ácido lipoteicoico, que ativa o complemento e induz a pro-
Os pneumococos são cocos gram-positivos em forma de lan- dução de citocinas inflamatórias, contribui para a resposta
ça, arranjados em pares (diplococos) ou cadeias curtas. (O inflamatória, bem como para a síndrome do choque tóxico
termo “em forma de lança” significa que os diplococos são que ocorre em alguns pacientes imunocomprometidos. A
ovais com extremidades relativamente afiladas, em vez de es- pneumolisina, a hemolisina que causa alfa-hemólise, pode
féricos.) (Ver Prancha Colorida 3). Em ágar sangue, produ- também contribuir para a patogênese. Os pneumococos
zem alfa-hemólise. Ao contrário dos estreptococos viridantes, produzem IgA protease que aumenta a capacidade de o orga-
eles são lisados por bile ou desoxicolato e seu crescimento é nismo colonizar a mucosa do trato respiratório superior. Os
inibido pela optoquina (ver Prancha Colorida 18). pneumococos multiplicam-se nos tecidos e causam inflama-
ção. Quando atingem os alvéolos, há efusão de fluido e de
Os pneumococos possuem cápsulas polissacarídi- hemácias e leucócitos, resultando em consolidação do pul-
cas, havendo mais de 85 tipos antigenicamente distintos. mão. Durante o período de recuperação, os pneumococos
Diante do antissoro tipo-específico, as cápsulas sofrem in- são fagocitados, as células mononucleares ingerem os restos
tumescimento (reação de Quellung), processo que pode ser celulares e a consolidação regride.
utilizado para identificar o tipo. As cápsulas são fatores de
virulência, isto é, interferem com a fagocitose, favorecendo Os fatores que diminuem a resistência, predispondo os
a invasividade. Anticorpos específicos contra a cápsula op- indivíduos à infecção pneumocóccica, incluem (1) intoxi-
sonizam o organismo, facilitam a fagocitose e promovem cação por álcool ou fármacos, ou outro comprometimento
a resistência. Tais anticorpos desenvolvem-se em humanos cerebral capaz de deprimir o reflexo de tosse e aumentar a
como resultado de infecção (assintomática ou clínica) ou aspiração de secreções; (2) anomalias do trato respiratório
pela administração de vacina polissacarídica. O polissacarí- (p. ex., infecções virais), acúmulo de muco, obstrução brô-
deo capsular elicita principalmente uma resposta de células nquica e lesões do trato respiratório causadas por irritantes
B (i.e., T-independente). (que perturbam a integridade e movimentação do revesti-
mento mucociliar); (3) dinâmica circulatória anormal (p.
Outro componente importante da superfície de S. pneu- ex., congestão pulmonar e insuficiência cardíaca); (4) es-
moniae consiste em um carboidrato da parede celular, deno- plenectomia; e (5) certas doenças crônicas, como anemia
minado substância C. Esse carboidrato exibe importância falciforme e nefrose. Traumatismo cefálico que provoque
médica, não por si, mas pelo fato de reagir com uma pro- perda de fluido espinal pelo nariz predispõe à meningite
teína sérica normal produzida pelo fígado, denominada pro- pneumocóccica.
teína C-reativa (CRP, do inglês, C-reactive protein). A CRP
é uma proteína de “fase aguda” que apresenta uma elevação Achados clínicos
de até 1.000 vezes durante a inflamação aguda. A CRP não
é um anticorpo (que são gamaglobulinas), correspondendo a A pneumonia frequentemente inicia-se por manifestação
uma betaglobulina. (O plasma contém alfa, beta e gamaglo- súbita de calafrios, febre, tosse e dor pleural. O escarro
bulinas.) Observe que a CRP é um indicador inespecífico de apresenta coloração “ferruginosa” vermelha ou marrom. A
inflamação, tornando-se elevada em resposta à presença de bacteriemia ocorre em 15-25% dos casos. A recuperação
diversos organismos, não somente a S. pneumoniae. Clinica- espontânea pode iniciar-se em 5-10 dias, sendo acompa-
mente, a presença de CRP no soro humano é quantificada nhada pelo desenvolvimento de anticorpos anticapsulares.
em laboratório por sua reação com o carboidrato de S. pneu- Os pneumococos são uma causa proeminente de otite mé-
moniae. A importância médica da CRP refere-se ao fato de dia, sinusite, bronquite purulenta, pericardite, meningite
uma CRP elevada aparentemente corresponder a um melhor

ERRNVPHGLFRV RUJ

Microbiologia Médica e Imunologia 125

bacteriana e sépsis, especialmente em pacientes imunocom- indivíduos com idade acima de 65 anos), indivíduos imu-
prometidos. nocomprometidos (especialmente esplenectomizados) ou
debilitados. Tais indivíduos devem ser imunizados com a va-
Diagnóstico laboratorial cina polissacarídica polivalente (23 tipos). A vacina é segura
e relativamente efetiva, conferindo proteção de longa dura-
Em esfregaços de escarro submetidos à coloração de gram, os ção (pelo menos 5 anos). Uma dose de reforço é recomen-
pneumococos são visualizados como diplococos gram-posi- dada para (1) indivíduos acima de 65 anos que receberam a
tivos em forma de lança. Podem também ser detectados pela vacina há mais de 5 anos e apresentavam idade abaixo de 65
reação de Quellung com antissoro de múltiplos tipos. Em anos quando receberam a vacina, e (2) indivíduos asplênicos
ágar sangue, os pneumococos formam pequenas colônias com idade entre 2 e 64 anos, infectados por HIV, submeti-
alfa-hemolíticas. As colônias são bile-solúveis, isto é, lisa- dos a quimioterapia contra câncer, ou recebendo fármacos
das por bile, e o crescimento é inibido pela optoquina. As imunossupressores para prevenir a rejeição de transplante.
hemoculturas são positivas em 15-25% das infecções pneu- A penicilina oral é administrada em crianças apresentando
mocóccicas. A cultura de fluido cerebroespinal é geralmente hipogamaglobulinemia ou esplenectomia, uma vez que essas
positiva na meningite. O diagnóstico rápido de meningite crianças são propensas a infecções pneumocóccicas e respon-
pneumocóccica pode ser realizado mediante a detecção de dem inadequadamente à vacina.
seu polissacarídeo capsular no fluido espinal por meio do
teste de aglutinação do látex. Um teste rápido que detecta Uma vacina pneumocóccica distinta, contendo o
o antígeno (polissacarídeo capsular) na urina também é dis- polissacarídeo pneumocóccico acoplado (conjugado) a
ponível para o diagnóstico de pneumonia pneumocóccica e uma proteína carreadora (toxoide diftérico), é adminis-
bacteriemia. Em virtude do número crescente de linhagens trada em crianças com idade abaixo de 2 anos. Essa vacina
resistentes à penicilina, os testes de sensibilidade a antibió- “conjugada” é efetiva em crianças pequenas na prevenção
ticos devem ser realizados em organismos isolados de infec- de infecções bacteriêmicas, como meningite, e infecções
ções graves. de mucosas, como otite média. A vacina contém o polissa-
carídeo capsular dos sete sorotipos pneumocóccicos mais
Tratamento comuns. A imunização das crianças reduz a incidência de
doença pneumocóccica em adultos, uma vez que as crian-
A maioria dos pneumococos é suscetível às penicilinas e a ças correspondem à principal fonte do organismo para os
eritromicina. Em infecções pneumocóccicas severas, a pe- adultos, e a imunização reduz a taxa de portadores entre
nicilina G é o fármaco de escolha, enquanto nas infecções as crianças.
pneumocóccicas brandas, a penicilina V oral pode ser uti-
lizada. Em pacientes alérgicos à penicilina, a eritromicina Um problema em potencial relacionado ao uso da
ou um de seus derivados de ação prolongada, por exemplo, vacina pneumocóccica contendo 7 sorotipos refere-se à
azitromicina, podem ser utilizados. Nos Estados Unidos, substituição do sorotipo. A vacina reduzirá a incidên-
cerca de 25% dos isolados exibem resistência de baixo nível cia da doença causada pelos sorotipos presentes na vacina,
à penicilina, principalmente como resultado de modifica- mas não a incidência global de doença pneumocóccica
ções nas proteínas de ligação à penicilina. Uma porcentagem porque outros sorotipos ausentes na vacina causarão a
crescente de isolados, variando de 15% a 35%, dependen- doença? Essa importante questão encontra-se em análise
do da localização, exibe resistência de alto nível, atribuída atualmente.
a múltiplas alterações nas proteínas de ligação à penicilina.
Eles não produzem β-lactamase. A vancomicina é o fármaco RESUMOS DOS ORGANISMOS
de escolha para pneumococos resistentes à penicilina. Entre-
tanto, linhagens de pneumococos tolerantes à vancomicina Resumos sucintos sobre os organismos descritos neste capí-
emergiram bem como linhagens de pneumococos resistentes tulo são iniciados na página 486. Favor consultar esses resu-
a múltiplos fármacos. (A tolerância a antibióticos é descrita mos para uma rápida revisão do material essencial.
na página 97.)
QUESTÕES PARA ESTUDO
Prevenção
As questões sobre tópicos discutidos neste capítulo podem
Apesar da eficácia do tratamento com fármacos antimi- ser encontradas nos itens Questões para estudo (Bacteriolo-
crobianos, a taxa de mortalidade é elevada em idosos (i.e., gia clínica) e Teste seu conhecimento.

ERRNVPHGLFRV RUJ

16 Cocos Gram-Negativos

NEISSERIA a endotoxina de N. gonorrhoeae é um lipooligossacarídeo
(LOS). Tanto o LPS como o LOS contêm o lipídeo A. En-
Doenças tretanto, LOS é desprovido das cadeias laterais com longas
repetições de açúcares observadas no LPS.
O gênero Neisseria contém dois importantes patógenos de
humanos: Neisseria meningitidis e Neisseria gonorrhoeae. N. O crescimento de ambos os organismos é inibido por
meningitidis causa principalmente meningite e meningococ- metais traço tóxicos e ácidos graxos presentes em determi-
cemia. É a principal causa de morte por infecção em crianças nados meios de cultura, por exemplo, placas de ágar sangue.
nos Estados Unidos. N. gonorrhoeae causa gonorreia, a se- Eles, portanto, são cultivados em ágar “chocolate” contendo
gunda doença bacteriana notificável mais comum nos Esta- sangue aquecido a 80ºC, o que inativa os inibidores. Neis-
dos Unidos (Tabelas 16-1 e 16-2). Também causa conjunti- sérias são oxidase-positivas, isto é, possuem a enzima cito-
vite neonatal (oftalmia neonatorum) e doença inflamatória cromo c. Esse é um importante teste diagnóstico laboratorial
pélvica (DIP). no qual as colônias expostas a fenilenodiamina tornam-se
púrpuras ou negras, como resultado da oxidação do reagente
Propriedades importantes pela enzima (ver Prancha Colorida 19).

As neissérias são cocos gram-negativos semelhantes a pares O gênero Neisseria é um dentre vários da família Neisse-
de rins ou feijões (ver Prancha Colorida 4). riaceae. Um gênero distinto contém o organismo Moraxella
catarrhalis, membro da microbiota normal da garganta, po-
(1) N. meningitidis (meningococo) exibe uma cápsula dendo causar, contudo, infecções do trato respiratório, como
polissacarídica proeminente que intensifica a virulência por sinusite, otite média, bronquite e pneumonia. M. catarrhalis,
sua ação antifagocitária e induz anticorpos protetores (Ta- assim como membros de outros gêneros, como Branhamella,
bela 16-3). Os meningococos são divididos em pelo menos Kingella e Acinetobacter, são descritos no Capítulo 27. (M.
13 grupos sorológicos, com base na antigenicidade de seus catarrhalis corresponde à atual denominação de Branhamella
polissacarídeos capsulares. catarrhalis.)

(2) N. gonorrhoeae (gonococo) não possui cápsula po- 1. Neisseria meningitidis
lissacarídica, no entanto apresenta múltiplos sorotipos com
base na antigenicidade da proteína do pilus. Há uma acen- Patogênese e epidemiologia
tuada variação antigênica dos pili gonocóccicos, resultante
de rearranjo cromossomal, sendo conhecidos mais de 100 Os humanos são os únicos hospedeiros naturais de meningo-
sorotipos. Os gonococos apresentam três proteínas de mem- cocos. Os organismos são disseminados por gotículas trans-
brana externa (proteínas I, II e III). A proteína II desempe- mitidas pelo ar. Colonizam as membranas da nasofaringe e
nha papel na adesão do organismo às células e também varia tornam-se parte da microbiota transiente do trato respirató-
antigenicamente. rio superior. Os portadores são geralmente assintomáticos.
A partir da nasofaringe, o organismo pode atingir a corrente
As neissérias são bactérias gram-negativas e contêm en- sanguínea e disseminar-se a sítios específicos, como as me-
dotoxina em sua membrana externa. A endotoxina de N. ninges ou articulações, ou pode disseminar-se por todo o
meningitidis é um lipopolissacarídeo (LPS) similar àquele
encontrado em diversos bacilos gram-negativos, enquanto

ERRNVPHGLFRV RUJ

Microbiologia Médica e Imunologia 127

Tabela 16-1 Neissérias de importância médica1

Espécie Porta de entrada Cápsula Fermentação Produção de Vacina
polissacarídica de maltose β-lactamase disponível

N. meningitidis (meningococo) Trato respiratório + + Ausente +
N. gonorrhoeae (gonococo) Trato genital – – Parcial –

1Todas as neissérias são oxidase-positivas.

corpo (meningococcemia). Aproximadamente 5% dos indi- A resistência à doença está correlacionada à presença do
víduos tornam-se portadores crônicos, atuando como fonte anticorpo contra o polissacarídeo capsular. A maioria dos
de infecção para terceiros. A taxa de portadores pode atingir portadores desenvolve títulos de anticorpos protetores no
35% em indivíduos que vivem em ambientes confinados, período de 2 semanas de colonização. Uma vez que a imuni-
por exemplo, recrutas militares. Esse fato explica a elevada dade é grupo-específica, é possível o indivíduo apresentar an-
frequência de surtos de meningite nas forças armadas antes ticorpos protetores contra um grupo de organismos, porém
do uso da vacina. A taxa de portadores é também elevada ser suscetível à infecção por organismos dos outros grupos.
entre os contatos próximos (familiares) dos pacientes. Surtos O complemento é uma importante característica das defesas,
de doença meningocóccica também ocorreram em universi- uma vez que indivíduos exibindo deficiências do comple-
tários residindo em alojamentos. mento, particularmente de componentes do complemento
de ação tardia (C6-C9), exibem incidência aumentada de
Dois organismos são responsáveis por mais de 80% dos bacteriemia meningocóccica.
casos de meningite bacteriana em indivíduos com idade aci-
ma de 2 meses: Streptococcus pneumoniae e N. meningitidis. Achados clínicos
Desses organismos, os meningococos, especialmente aqueles
do grupo A, exibem maior probabilidade de causar epide- As duas manifestações mais importantes da doença são a
mias de meningite. Em geral, N. meningitidis corresponde meningococcemia e meningite. A forma mais grave de
à segunda causa de meningite, quando comparada a S. pneu- meningococcemia é a síndrome de Waterhouse-Frideri-
moniae, porém é a causa mais comum em indivíduos com chsen, de risco à vida, caracterizada por febre alta, choque,
idades entre 2 e 18 anos. púrpura disseminada, coagulação intravascular dissemina-
da, trombocitopenia e insuficiência adrenal. A bacteriemia
Os meningococos apresentam três importantes fatores pode resultar na colonização de vários órgãos, especialmente
de virulência: as meninges. Os sintomas da meningite meningocóccica são
aqueles de uma típica meningite bacteriana – ou seja, febre,
(1) Uma cápsula polissacarídica que permite ao orga- cefaleia, rigidez de nuca e concentrção aumentada de PMNs
nismo resistir à fagocitose por leucócitos polimorfonucleares no liquor.
(PMNs);
Diagnóstico laboratorial
(2) Endotoxina (LPS), responsável por febre, choque e
outras alterações fisiopatológicas (na forma purificada, a en- Os principais procedimentos laboratoriais são o esfregaço e
dotoxina pode reproduzir muitas das manifestações clínicas cultura de amostras de sangue e fluido espinal. Um diagnós-
da meningococcemia); tico presuntivo de meningite meningocóccica pode ser rea-
lizado quando cocos gram-negativos são observados em um
(3) Uma imunoglobulina A (IgA) protease auxilia na esfregaço de fluido espinal. O organismo cresce melhor em
adesão das bactérias às membranas do trato respiratório su-
perior pela clivagem da IgA secretória.

Tabela 16-2 Importantes características clínicas de neissérias

Organismo Tipo de patogênese Doença típica Tratamento

N. meningitidis Piogênica Meningite, meningococcemia Penicilina G
N. gonorrhoeae Piogênica
Gonorreia, p. ex., uretrite, cervicite Ceftriaxona1 mais doxiciclina2
1. Localizada Doença inflamatória pélvica Cefoxitina mais doxiciclina1,2
2. Ascendente Infecção gonocóccica disseminada Ceftriaxona1
3. Disseminada Conjuntivite (oftalmia neonatorum) Ceftriaxona3
4. Neonatal

1 Outros fármacos também podem ser empregados. Ver orientações de tratamento publicadas pelo Centers for Disease Control and Prevention.
2 Adicionar doxiciclina no caso de possível coinfecção por Chlamydia trachomatis.
3 Como prevenção, utilizar unguento de eritromicina ou gotas de nitrato de prata.

ERRNVPHGLFRV RUJ

128 Warren Levinson

Tabela 16-3 Propriedades da cápsula polissacarídica do entre os militares. Indivíduos que viajam para regiões onde
meningococo1 estão ocorrendo epidemias devem receber a vacina. Univer-
sitários residindo em alojamentos são estimulados a receber
(1) Intensifica a virulência por sua ação antifagocitária; a vacina. Não é recomendada dose de reforço para qualquer
das vacinas. A vacina conjugada é recomendada para crianças
(2) É o antígeno que define os grupos sorológicos com idades entre 11-12 anos, visando reduzir a incidência
de doença meningocóccica em adolescentes e adultos jovens.
(3) É o antígeno detectado no liquor de pacientes com meningite; Relatos sobre efeitos adversos da vacina descrevem vários ca-
sos de síndrome de Guillain-Barré após a imunização com
(4) É o antígeno presente na vacina. Menactra. Uma relação causal entre a imunização e a síndro-
me de Guillain-Barré não foi estabelecida.
1As mesmas quatro características aplicam-se à cápsula do pneumococo e de
Haemophilus influenzae. 2. Neisseria gonorrhoeae

ágar chocolate incubado a 37ºC, em atmosfera com 5% de Patogênese e epidemiologia
CO2. Um diagnóstico presuntivo de Neisseria pode ser reali-
zado quando são detectadas colônias de diplococos gram-ne- Os gonococos, assim como os meningococos, causam
gativos oxidase-positivos. A diferenciação entre N. meningi- doença apenas em humanos. O organismo é usualmente
tidis e N. gonorrhoeae é realizada com base na fermentação de transmitido sexualmente, sendo que recém-nascidos po-
açúcares: os meningococos fermentam maltose, ao contrário dem ser infectados durante o nascimento. Uma vez que o
dos gonococos (ambos os organismos fermentam glicose). gonococo é bastante sensível à desidratação e a condições
A imunofluorescência pode também ser utilizada para iden- de baixa temperatura, a transmissão sexual favorece sua so-
tificar essas espécies. Os testes para verificar a presença de brevivência. Habitualmente, a gonorreia é sintomática em
anticorpos séricos não são úteis para o diagnóstico clínico. homens, mas em geral assintomática em mulheres. Infec-
Entretanto, um procedimento capaz de auxiliar no rápido ções do trato genital são a fonte mais comum do organis-
diagnóstico de meningite meningocóccica consiste no teste mo, porém as infecções anorretais e faríngeas são também
de aglutinação do látex, que detecta a presença do polissaca- importantes fontes.
rídeo capsular no fluido espinal.
Os pili constituem um dos mais importantes fatores de
Tratamento virulência, por controlarem a adesão às superfícies das cé-
A penicilina G é o tratamento de escolha para infecções me- lulas mucosas e por serem antifagocitários. Os gonococos
ningocóccicas. Linhagens resistentes à penicilina são de rara apresentando pili são usualmente virulentos, ao passo que
emergência, mas a resistência à sulfonamida é comum. linhagens desprovidas de pili são avirulentas. Dois fatores de
virulência da parede celular são o LOS (uma forma modi-
Prevenção ficada de endotoxina) e as proteínas da membrana externa.
A quimioprofilaxia e imunização são utilizadas na prevenção Observe que a endotoxina de gonococos é mais fraca que
de doença meningocóccica. A rifampina ou ciprofloxacina aquela de meningococos, de modo que ocorre uma doença
podem ser utilizadas na profilaxia de indivíduos que estabe- menos severa quando gonococos atingem a corrente sanguí-
leceram contato próximo com o caso índice. Esses fármacos nea do que quando os meningococos o fazem. A IgA prote-
são preferidos, uma vez que são eficientemente secretados na ase do organismo pode hidrolisar a IgA secretória, a qual, de
saliva, contrariamente à penicilina G. outra forma, bloquearia a adesão à mucosa. Os gonococos
não apresentam cápsulas.
Existem duas formas de vacina meningocóccica, ambas
contendo o polissacarídeo capsular dos grupos A, C, Y e As principais defesas contra os gonococos são os anti-
W-135 como imunógenos. A vacina conjugada (Menactra) corpos (IgA e IgG), o complemento e os neutrófilos. A op-
contém os quatro polissacarídeos conjugados a uma proteína sonização mediada por anticorpos e morte no interior de fa-
carreadora (toxoide diftérico), enquanto a vacina não conju- gócitos ocorrem, apesar de infecções gonocóccicas repetidas
gada (Menomune) contém apenas os quatro polissacarídeos serem comuns, principalmente como resultado de alterações
(não conjugados a uma proteína carreadora). A vacina con- antigênicas dos pili e das proteínas da membrana externa.
jugada induz maiores títulos de anticorpos em crianças do
que a vacina não conjugada. As duas vacinas induzem títulos Os gonococos infectam principalmente as superfícies
de anticorpos similares em adultos. Observe que nenhuma mucosas, por exemplo, uretra e vagina, porém ocorre dis-
das vacinas contêm o polissacarídeo do grupo B, uma vez seminação. Determinadas linhagens de gonococos causam
que ele não é imunogênico em humanos. infecções disseminadas com maior frequência que outras.
A característica mais importante dessas linhagens consiste
A vacina conjugada foi licenciada em 2005, de modo em sua resistência à morte por anticorpos e complemento.
que sua eficiência a longo prazo é desconhecida. A vacina O mecanismo dessa “resistência ao soro” é incerto, porém
não conjugada é efetiva na prevenção de epidemias de me- a presença de uma proteína porina (porina A) na parede ce-
ningite e na redução da taxa de portadores, especialmente

ERRNVPHGLFRV RUJ

Microbiologia Médica e Imunologia 129

lular, a qual inativa o componente C3b do complemento, Diagnóstico laboratorial
parece desempenhar um papel importante.
O diagnóstico de infecções localizadas dependem da colora-
A ocorrência de uma infecção disseminada é função não ção de gram e cultura da secreção. Em homens, a detecção
somente da linhagem do gonococo, mas também da efeti- de diplococos gram-negativos no interior de PMNs em
vidade das defesas do hospedeiro. Indivíduos com uma de- um espécime de secreção uretral é suficiente para o diag-
ficiência nos componentes de ação tardia do complemento nóstico. Em mulheres, o uso da coloração de Gram isolada-
(C6-C9) exibem risco de infecções disseminadas, bem como mente pode ser de difícil interpretação; desse modo, devem
as mulheres durante a menstruação e gravidez. As infecções ser realizadas culturas. As colorações de Gram em espéci-
disseminadas geralmente surgem a partir de infecções assin- mes cervicais podem ser falso-positivas devido à presença
tomáticas, indicando que a inflamação localizada pode inibir de diplococos gram-negativos na microbiota normal, bem
a disseminação. como podem ser falso-negativas em virtude da dificuldade
de visualização de pequeno número de gonococos quando
Achados clínicos do uso de lentes de imersão. As culturas também devem ser
utilizadas no diagnóstico de faringite ou infecções anorretais
Os gonococos causam infecções localizadas, geralmente no suspeitas.
trato genital, bem como infecções disseminadas, com a colo-
nização de vários órgãos. Os gonococos atingem esses órgãos Os espécimes coletados de sítios de mucosas, como ure-
por meio da corrente sanguínea (bacteriemia gonocóccica). tra e cérvix, são cultivados em meio Thayer-Martin, que con-
siste em ágar chocolate contendo antibióticos (vancomicina,
Em homens, a gonorreia caracteriza-se principalmente colistina, trimetoprim e nistatina) a fim de suprimir a micro-
por uretrite, acompanhada de disúria e descarga purulenta. biota normal. A detecção de uma colônia oxidase-positiva
A epididimite pode ocorrer. composta por diplococos gram-negativos é suficiente para
identificar o isolado como um membro do gênero Neisseria.
Em mulheres, a infecção localiza-se principalmente no A identificação específica do gonococo pode ser realizada
endocérvix, provocando secreção vaginal purulenta e sangra- com base na fermentação de glicose (mas não de maltose)
mento intermenstrual (cervicite). A complicação mais fre- ou pela coloração com anticorpo fluorescente. Observe que
quente nas mulheres consiste em uma infecção ascendente espécimes oriundos de sítios estéreis, como sangue ou fluido
das trompas uterinas (salpingite, DIP), podendo resultar articular, podem ser cultivados em ágar sangue sem antibió-
em esterilidade ou gravidez ectópica como resultado da for- ticos, uma vez que não há microbiota normal competidora.
mação de cicatrizes nas trompas.
Dois testes rápidos que detectam a presença de ácidos
As infecções gonocóccicas disseminadas (IGD) comu- nucleicos gonocóccicos em espécimes de pacientes são am-
mente manifestam-se como artrite, tenossinovite ou pústulas plamente utilizados como teste de varredura. Esses testes são
na pele. A infecção disseminada é a causa mais comum de altamente sensíveis e específicos. Em um tipo de teste, os
artrite séptica em adultos sexualmente ativos. O diagnóstico ácidos nucleicos gonocóccicos são amplificados (testes de
clínico de IGD é frequentemente difícil de ser confirmado amplificação), ao passo que, no outro tipo, não são ampli-
por testes laboratoriais, uma vez que o organismo não é cul- ficados. Os testes de amplificação podem ser utilizados em
tivado em mais de 50% dos casos. amostras de urina, evitando a necessidade de técnicas de co-
leta mais invasivas. Observe que testes sorológicos para de-
Outros sítios infectados incluem a região anorretal, terminar a presença de anticorpos contra gonococos no soro
garganta e olhos. As infecções anorretais ocorrem principal- do paciente não são úteis para o diagnóstico.
mente em mulheres e em homens homossexuais. Frequente-
mente são assintomáticas, porém pode ocorrer uma secreção Tratamento
sanguinolenta ou purulenta (proctite). Na garganta, ocorre
faringite, contudo muitos pacientes são assintomáticos. Em Ceftriaxona é o tratamento de escolha para infecções go-
crianças recém-nascidas, a conjuntivite purulenta (oftalmia nocóccicas não complicadas. Espectinomicina ou ciproflo-
neonatorum) é resultante de infecção gonocóccica adquirida xacina devem ser utilizadas quando o paciente é alérgico a
da mãe durante a passagem pelo canal do parto. A incidên- penicilina. Uma vez que infecções mistas com C. trachomatis
cia de oftalmia gonocóccica diminuiu significativamente nos são comuns, a tetraciclina também deve ser prescrita. Uma
anos recentes devido ao amplo uso profilático de unguento cultura de acompanhamento deve ser realizada 1 semana
ocular de eritromicina (ou nitrato de prata), aplicado logo após a conclusão do tratamento para determinar se ainda há
após o nascimento. A conjuntivite gonocóccica também presença de gonococos.
ocorre em adultos como resultado da transferência dos orga-
nismos da genitália para os olhos. Antes de meados dos anos de 1950, todos os gonococos
eram altamente sensíveis à penicilina. Posteriormente, emer-
Outras infecções sexualmente transmitidas, por exem- giram isolados com resistência de baixo nível à penicilina e
plo, sífilis e uretrite não gonocóccica causada por Chlamydia a outros antibióticos, como tetraciclina e cloranfenicol. Esse
trachomatis, podem coexistir com a gonorreia; portanto, o tipo de resistência é codificada pelo cromossomo bacteriano,
diagnóstico apropriado e as medidas terapêuticas adequadas
devem ser adotados.

ERRNVPHGLFRV RUJ

130 Warren Levinson

sendo decorrente da captação reduzida do fármaco ou de sí- seus parceiros. Os casos de gonorreia devem ser notificados
tios de ligação modificados, ao invés da degradação enzimá- ao departamento de saúde pública para garantir-se o acom-
tica do fármaco. panhamento adequado. Um problema importante refere-se à
detecção de portadores assintomáticos. A conjuntivite gono-
Então, em 1976, linhagens produtoras de penicilinase cóccica em recém-nascidos é prevenida com mais frequência
(PPNG) exibindo resistência de alto nível foram isoladas de pelo uso de unguento de eritromicina; gotas de nitrato de
pacientes. A penicilinase é codificada por plasmídeo. Atual- prata são utilizadas com menor frequência, não existindo
mente, as linhagens PPNG são comuns em várias regiões do vacina disponível.
mundo, incluindo diversas áreas urbanas dos Estados Uni-
dos, onde aproximadamente 10% dos isolados são resisten- RESUMOS DOS ORGANISMOS
tes. Isolados resistentes a fluoroquinolonas, como ciproflo-
xacina, tornaram-se um problema importante, atingindo até Resumos sucintos sobre os organismos descritos neste capí-
25% dos isolados em algumas regiões do país. Desde 2007, tulo são iniciados na página 488. Favor consultar esses resu-
não se recomenda o uso de ciprofloxacina no tratamento de mos para uma rápida revisão do material essencial.
gonorreia em regiões dos Estados Unidos onde a resistência
é elevada. QUESTÕES PARA ESTUDO

Prevenção As questões sobre tópicos discutidos neste capítulo podem
ser encontradas nos itens Questões para estudo (Bacteriolo-
A prevenção da gonorreia envolve o uso de preservativos e o gia clínica) e Teste seu conhecimento.
rápido tratamento de pacientes sintomáticos, assim como de

ERRNVPHGLFRV RUJ

Bacilos Gram-Positivos 17

Existem quatro gêneros de bacilos gram-positivos de impor- ção deste capítulo, foram relatados 18 casos de lesão; dentre
tância médica: Bacillus, Clostridium, Corynebacterium e Lis- estes, 5 resultaram em óbitos.
teria. Bacillus e Clostridium formam esporos, ao contrário de
Corynebacterium e Listeria. Os membros do gênero Bacillus Propriedades importantes
são aeróbios, enquanto aqueles do gênero Clostridium são
anaeróbios (Tabela 17-1). B. anthracis é um bacilo gram-positivo grande, com extre-
midades retas, comumente observado em cadeias (ver Pran-
Esses bacilos gram-positivos também podem ser dife- cha Colorida 5). Sua cápsula antifagocitária é composta por
renciados com base em seu aspecto, quando corados pela D-glutamato. (Essa característica é exclusiva – as cápsulas de
coloração de Gram. As espécies de Bacillus e Clostridium são outras bactérias são polissacarídicas.) B. anthracis é imóvel,
mais longas e coram-se mais intensamente que as espécies de enquanto outros membros do gênero são móveis. A toxina
Corynebacterium e Listeria. As espécies de Corynebacterium do antraz é codificada em um plasmídeo, enquanto a cápsula
exibem morfologia similar a uma clava, isto é, são mais del- de poliglutamato é codificada em um plasmídeo distinto.
gadas em uma extremidade do que na outra. As espécies de
Corynebacterium e Listeria exibem caracteristicamente mor- Transmissão
fologia bacilar em forma de V ou L.
Os esporos do organismo persistem por anos no solo. Os hu-
■ BACILOS GRAMPOSITIVOS FORMADORES manos são mais frequentemente infectados por via cutânea
DE ESPOROS por ocasião de traumas à pele, o que permite a entrada de es-
poros presentes em produtos animais, como couro, cerdas
BACILLUS e lã. Os esporos podem também ser inalados, atingindo o
trato respiratório. O antraz pulmonar (por inalação) ocorre
Existem duas espécies de Bacillus de importância médica: quando os esporos são inalados até os pulmões. O antraz
Bacillus anthracis e Bacillus cereus. As características impor- gastrintestinal ocorre pela ingestão de carne contaminada.
tantes da patogênese dessas duas espécies de Bacillus são des-
critas na Tabela 17-2. O antraz por inalação não é transmissível interpessoal-
mente, apesar de a infecção ser grave. Após ser inalado até
1. Bacillus anthracis o pulmão, o organismo desloca-se rapidamente para os lin-
fonodos mediastinais, onde causa mediastinite hemorrágica.
Doença Pelo fato de deixar o pulmão tão rapidamente, o antraz não
B. anthracis causa antraz, que é comum em animais, mas é transmitido a terceiros pela via respiratória.
raro em humanos. A doença em humanos exibe três formas
principais: cutânea, pulmonar (inalação) e gastrintestinal. Patogênese
Em 2001, ocorreu um surto de antraz por inalação e cutâ-
neo nos Estados Unidos. O surto foi causado pelo envio de A patogênese baseia-se principalmente na produção de duas
esporos do organismo pelo correio. Até o momento da reda- exotoxinas, conhecidas coletivamente como toxina do an-
traz. Cada uma das duas exotoxinas, fator de edema e fator
letal, consiste em duas proteínas na configuração de subu-
nidades A-B. A subunidade B, ou de ligação, corresponde,

ERRNVPHGLFRV RUJ

132 Warren Levinson

Tabela 17-1 Bacilos gram-positivos de importância médica

Gênero Crescimento Formação de Exotoxinas importantes
anaeróbio esporos na patogênese

Bacillus – + +
Clostridium + + +
Corynebacterium – – +
Listeria – – –

em cada uma das duas exotoxinas, ao antígeno protetor. A servadas as características clássicas nem imagem radiológi-
subunidade A, ou ativa, exibe atividade enzimática. ca de pneumonia. O alargamento mediastinal observado
no raio-X de tórax é um importante critério diagnóstico.
O fator de edema, uma exotoxina, é uma adenilato ci- A mediastinite hemorrágica e a meningite hemorrágica são
clase que provoca aumento na concentração intracelular de complicações severas de risco à vida. Os sintomas do an-
AMP cíclico. Isso causa extravasamento de fluido a partir traz gastrintestinal incluem vômito, dor abdominal e diar-
da célula para o espaço extracelular, manifestando-se como reia sanguinolenta.
edema. (Observe a similaridade da ação em comparação à
toxina colérica.) O fator letal é uma protease envolvida na Diagnóstico laboratorial
clivagem da fosfoquinase que ativa a via de transdução de
sinal da proteína quinase ativada por mitógenos (MAPK, do Os esfregaços exibem grandes bacilos gram-positivos em
inglês, mitogen-activated protein kinase). Essa via controla o cadeias. Os esporos usualmente não são observados em es-
crescimento das células humanas, e a clivagem da fosfoqui- fregaços de exsudato, uma vez que os esporos são formados
nase inibe o crescimento celular. O antígeno protetor forma quando os nutrientes são insuficientes e, nos tecidos infec-
poros na membrana da célula humana, permitindo a entrada tados, há abundância de nutrientes. Colônias não hemolí-
do fator de edema e do fator letal na célula. A denominação ticas são formadas em ágar sangue incubado em condições
antígeno protetor refere-se ao fato de que anticorpo contra aeróbias. Em caso de ataque bioterrorista, o rápido diag-
essa proteína protege contra a doença. nóstico pode ser realizado em laboratórios especiais pelo
uso de testes de reação de polimerização em cadeia (PCR,
Achados clínicos do inglês, polymerase chain reaction). Outro procedimento
de diagnóstico rápido consiste no teste direto com anticor-
A típica lesão do antraz cutâneo é uma úlcera indolor com pos fluorescentes, que detecta os antígenos do organismo
uma escara negra (crosta, casca). O edema local é acentuado. na lesão. Testes sorológicos, como um teste de ELISA para
A lesão é denominada pústula maligna. Os casos não trata- anticorpos, requerem amostras de soro da fase aguda e con-
dos progridem para bacteriemia e óbito. valescente, podendo ser utilizados apenas para o diagnósti-
co retrospectivo.
O antraz pulmonar (por inalação), também conheci-
do como “doença dos selecionadores de lã”, inicia-se com Tratamento
sintomas inespecíficos no trato respiratório, semelhantes à
gripe, especialmente tosse seca e pressão subesternal. Esse A ciprofloxacina é o fármaco de escolha. A doxiciclina é um
quadro progride rapidamente para mediastinite hemor- fármaco alternativo. Linhagens resistentes não foram isola-
rágica, efusões pleurais sanguinolentas, choque séptico e das clinicamente.
óbito. Embora os pulmões sejam infectados, não são ob-

Tabela 17-2 Características importantes da patogênese de espécies de Bacillus

Organismo Doença Transmissão/Fator predisponente Ação da toxina Prevenção

B. anthracis Antraz 1. Antraz cutâneo: esporos do solo A exotoxina possui três componentes: A vacina contém o antígeno
B. cereus penetram no ferimento o antígeno protetor liga-se às células; protetor como imunó-
Intoxicação o fator de edema é uma adenilato ci- geno
alimentar 2. Antraz pulmonar: os esporos são clase; o fator letal é uma protease que
inalados até o pulmão inibe o crescimento celular Vacina inexistente

Os esporos germinam em arroz re- Duas exotoxinas (enterotoxinas):
quentado; as bactérias, então, pro- 1. Similar à toxina colérica, aumenta o
duzem exotoxinas que são ingeridas
AMP cíclico
2. Similar à enterotoxina estafilocóccica,

é um superantígeno

ERRNVPHGLFRV RUJ

Microbiologia Médica e Imunologia 133

Prevenção vômitos, semelhante à intoxicação alimentar estafilocóccica;
A ciprofloxacina ou a doxiciclina foram utilizadas como (2) a outra exibe período de incubação longo (18 horas) e
profilaxia em indivíduos expostos durante o surto de 2001 caracteriza-se por diarreia aquosa não sanguinolenta, similar
nos Estados Unidos. Os indivíduos sob alto risco podem à gastrenterite por clostrídios.
ser imunizados com vacina desprovida de células, con-
tendo o antígeno protetor purificado como imunógeno. Diagnóstico laboratorial
A vacina é pouco imunogênica, sendo administradas seis Geralmente não é realizado.
doses da vacina no decorrer de um período de 18 meses.
Reforços anuais são também administrados a fim de man- Tratamento
ter a proteção. Incinerar animais mortos por antraz, em Limita-se ao tratamento sintomático.
vez de enterrá-los, previne a contaminação do solo pelos
esporos. Prevenção
Não há forma específica de prevenção. O arroz não deve ser
2. Bacillus cereus mantido aquecido por períodos longos.

Doença CLOSTRIDIUM
B. cereus causa intoxicação alimentar. Existem quatro espécies de importância médica: Clostridium
tetani, Clostridium botulinum, Clostridium perfringens (que
Transmissão causa gangrena gasosa ou intoxicação alimentar) e Clostri-
Os esporos presentes em grãos, como arroz, resistem à dium difficile. Todos os clostrídios são bacilos gram-positivos,
ação do vapor e da fritura rápida. Os esporos germinam anaeróbios e formadores de esporos (ver Prancha Colorida
quando o arroz é mantido aquecido por muitas horas (p. 6). Características importantes da patogênese e prevenção
ex., arroz frito reaquecido). A porta de entrada é o trato são descritas na Tabela 17-3.
gastrintestinal.
1. Clostridium tetani
Patogênese
B. cereus produz duas enterotoxinas. O mecanismo de ação Doença
de uma das enterotoxinas é o mesmo daquele da toxina colé- C. tetani é o agente do tétano (trismo).
rica; isto é, adiciona adenosina difosfato ribose, processo de-
nominado ADP-ribosilação, a uma proteína G, estimulando Transmissão
a adenilato ciclase, promovendo um aumento na concen- Os esporos são amplamente distribuídos no solo. A porta de
tração de adenosina monofosfato (AMP) cíclico no interior entrada geralmente é um sítio de ferimento, por exemplo,
do enterócito. O mecanismo de ação da outra enterotoxina o local onde um prego penetra no pé. Contudo, os esporos
assemelha-se àquele da enterotoxina estafilocóccica; isto é, também podem ser introduzidos durante o “skin-popping”,
consiste em um superantígeno. técnica empregada por dependentes químicos a fim de inje-
tar droga na pele. A germinação dos esporos é favorecida por
Achados clínicos tecido necrótico e pouco suprimento sanguíneo no ferimen-
Existem duas síndromes: (1) uma exibe curto período de to. O tétano neonatal, quando o organismo penetra por um
incubação (4 horas) e consiste principalmente em náusea e ferimento infectado no umbigo ou associado à circuncisão,

Tabela 17-3 Características importantes da patogênese de espécies de Clostridium

Organismo Doença Transmissão/fator Ação da toxina Prevenção
predisponente

C. tetani Tétano Os esporos no solo penetram Bloqueia a liberação de transmis- Vacina de toxoide
C. botulinum Botulismo no ferimento sores inibitórios, p. ex., glicina
C. perfringens 1. Gangrena gasosa
2. Intoxicação alimentar A exotoxina no alimento é Bloqueia a liberação de acetil- Enlatamento apropriado;
C. difficile Colite pseudomembranosa ingerida colina cocção dos alimentos

Os esporos no solo penetram Lecitinase Debridação de ferimentos
no ferimento
Superantígeno Cocção de alimentos
A exotoxina no alimento é
ingerida A citotoxina danifica a mucosa Uso apropriado de anti-

Antibióticos suprimem a mi- do cólon bióticos
crobiota normal

ERRNVPHGLFRV RUJ

134 Warren Levinson

representa um importante problema em alguns países em administrado em crianças em combinação com o toxoide
desenvolvimento. diftérico e a vacina pertussis acelular (DTaP).

Patogênese Quando ocorre um trauma, o ferimento deve ser limpo
A toxina tetânica (tetanospasmina) é uma exotoxina produ- e debridado, e um reforço do toxoide tetânico deve ser admi-
zida por células vegetativas no sítio do ferimento. Essa toxina nistrado. Quando o ferimento encontra-se altamente conta-
polipeptídica é transportada intra-axonalmente (via retrógra- minado, a imunoglobulina tetânica, bem como o reforço
da) ao sistema nervoso central, onde se liga a receptores de de toxoide devem ser administrados, assim como penicilina.
gangliosídeos, bloqueando a liberação de mediadores inibi- A imunoglobulina tetânica (antitoxina tetânica) é produzida
tórios (p. ex., glicina) nas sinapses espinais. A toxina tetânica em humanos a fim de evitar as reações de doença do soro
e a toxina botulínica (ver a seguir) estão entre as substâncias que ocorrem quando se utiliza a antitoxina produzida em
mais tóxicas conhecidas. São proteases que clivam as proteí- cavalos. A administração de imunoglobulinas e do toxoide
nas envolvidas na liberação de mediadores. tetânico (em sítios corporais distintos) é um exemplo de
imunidade passiva-ativa.
A toxina tetânica possui um tipo antigênico, diferente-
mente da toxina botulínica, a qual apresenta oito tipos. Por- 2. Clostridium botulinum
tanto, existe apenas um tipo antigênico de toxoide tetânico
na vacina contra o tétano. Doença
C. botulinum causa botulismo.
Achados clínicos
O tétano caracteriza-se por intensos espasmos muscula- Transmissão
res (paralisia espástica, tetania). As características clínicas Os esporos, amplamente distribuídos no solo, contaminam
específicas incluem trismo decorrente da contração rígi- vegetais e carnes. Quando esses alimentos são enlatados ou
da dos músculos da mandíbula, impedindo a abertura da embalados a vácuo sem a esterilização adequada, os esporos
boca, uma expressão facial característica, conhecida como sobrevivem e germinam no ambiente anaeróbio. A toxina
riso sardônico, e reflexos exacerbados. Frequentemente é produzida no alimento enlatado, sendo ingerida pré-for-
é observado opistótono, arqueamento pronunciado das mada. Os alimentos de maior risco são (1) vegetais alcalinos,
costas decorrente do espasmo dos fortes músculos exten- como feijões verdes, pimentas e cogumelos e (2) peixes defu-
sores dorsais. Segue-se a insuficiência respiratória. Uma mados. A toxina é relativamente termolábil, sendo inativada
elevada taxa de mortalidade está associada a essa doença. pela fervura do alimento por vários minutos. Desse modo, a
Observe que no tétano ocorre paralisia espástica (inten- doença pode ser prevenida por cocção suficiente.
sas contrações musculares), ao passo que, no botulismo,
ocorre paralisia flácida (contrações musculares fracas ou Patogênese
ausentes). A toxina botulínica é absorvida a partir do intestino, sendo
transportada pela corrente sanguínea para as sinapses de ner-
Diagnóstico laboratorial vos periféricos, onde bloqueia a liberação de acetilcolina.
Não há diagnóstico microbiológico nem sorológico. Os É uma protease que cliva as proteínas envolvidas na libera-
organismos raramente são isolados a partir do sítio do fe- ção de acetilcolina. A toxina é um polipeptídeo codificado
rimento. C. tetani produz um esporo terminal, isto é, um por um fago lisogênico. Juntamente com a toxina tetânica,
esporo na extremidade do bacilo. Isso confere ao organismo é uma das substâncias mais tóxicas conhecidas. Há oito ti-
o aspecto característico de uma “raquete de tênis”. pos imunológicos da toxina; os tipos A, B e E são os mais
comuns na enfermidade de humanos. O botox é uma prepa-
Tratamento ração comercial da exotoxina A utilizada para remover rugas
A imunoglobulina tetânica é utilizada para neutralizar a to- faciais. Quantidades mínimas da toxina são eficazes no trata-
xina. O papel dos antibióticos é incerto. Quando são utili- mento de certos distúrbios musculares espasmódicos, como
zados antibióticos, o metronidazol ou a penicilina G podem torcicolo, “cãibra do escrivão” e blefaroespasmo.
ser administradas. Uma ventilação adequada deve ser man-
tida e um suporte respiratório deve ser fornecido. Benzo- Achados clínicos
diazepinas, p. ex., diazepam, devem ser administradas para São observadas fraqueza e paralisia descendentes, incluindo
prevenir os espasmos. diplopia, disfagia e insuficiência muscular respiratória. Não
ocorre febre. Contrariamente, a síndrome de Guillain-Barré
Prevenção é uma paralisia ascendente (ver Capítulo 66).
O tétano é prevenido pela imunização com o toxoide te-
tânico (toxina tratada com formaldeído) na infância e, em Há duas formas clínicas especiais: (1) botulismo do
seguida, a cada 10 anos. O toxoide tetânico é usualmente ferimento, em que os esporos contaminam um ferimento,
germinam e produzem a toxina no sítio, e (2) botulismo

ERRNVPHGLFRV RUJ

Microbiologia Médica e Imunologia 135

infantil, no qual os organismos crescem no intestino, onde mais importante é a toxina alfa (lectinase), que danifica as
produzem a toxina. A ingestão de mel contendo o organis- membranas celulares, incluindo aquelas de eritrócitos, o que
mo está implicada na transmissão de botulismo infantil. As resulta em hemólise. Enzimas degradativas produzem gás
crianças afetadas desenvolvem fraqueza ou paralisia e podem nos tecidos.
necessitar de suporte respiratório, embora, em geral, recupe-
rem-se espontaneamente. Nos Estados Unidos, o botulismo Achados clínicos
infantil corresponde a cerca da metade dos casos de botulis- Dor, edema e celulite ocorrem na área do ferimento. A cre-
mo, e o botulismo do ferimento está associado ao abuso de pitação indica a presença de gás nos tecidos. A hemólise e a
drogas, especialmente por skin-popping com heroína negra. icterícia são comuns, bem como exsudatos tintos de sangue.
Choque e óbito podem ocorrer, sendo as taxas de mortalida-
Diagnóstico laboratorial de elevadas.
O organismo geralmente não é cultivado. A toxina botulí-
nica é demonstrável no alimento não ingerido e no soro do Diagnóstico laboratorial
paciente por testes de proteção em camundongos. Os ca- Esfregaços de amostras de tecido e exsudato exibem gran-
mundongos são inoculados com uma amostra do espécime des bacilos gram-positivos. Os esporos geralmente não são
clínico e morrerão, exceto se protegidos pela antitoxina. observados, uma vez que são formados principalmente em
condições de deficiência nutricional. Os organismos são
Tratamento cultivados anaerobiamente e identificados por reações de
Administra-se a antitoxina trivalente (tipos A, B e E), jun- fermentação de açúcar e produção de ácido orgânico. As
tamente com suporte respiratório. A antitoxina é produzida colônias de C. perfringens exibem uma zona dupla de he-
em cavalos, e a doença do soro ocorre em cerca de 15% dos mólise no ágar sangue. O ágar gema de ovo é utilizado para
receptores do antissoro. demonstrar a presença de lectinase. Testes sorológicos não
são úteis.
Prevenção
A esterilização apropriada de todos os alimentos enlatados e Tratamento
embalados a vácuo é essencial. Os alimentos devem ser cozi- A penicilina G é o antibiótico de escolha. Os ferimentos de-
dos adequadamente a fim de inativar a toxina. Latas estufa- vem ser debridados.
das devem ser descartadas (as enzimas proteolíticas de clos-
trídios formam gás, promovendo o estufamento das latas). Prevenção
Os ferimentos devem ser limpos e debridados. A penicilina
3. Clostridium perfringens pode ser administrada como profilaxia. Não há vacina.
C. perfringens causa duas doenças distintas, gangrena gasosa
e intoxicação alimentar, dependendo da via de entrada no Doença: intoxicação alimentar
corpo. A intoxicação alimentar é a segundo doença causada por
C. perfringens.
Doença: gangrena gasosa
A gangrena gasosa (mionecrose, fasciite necrotizante) é Transmissão
uma das duas doenças causadas por C. perfringens. A gangre- Os esporos estão localizados no solo e podem contami-
na gasosa é também causada por outros clostrídios histotó- nar o alimento. Os esporos termorresistentes sobrevivem
xicos, como Clostridium histolyticum, Clostridium septicum, à cocção e germinam. Os organismos crescem em grandes
Clostridium novyi e Clostridium sordellii. (C. sordellii também números em alimentos reaquecidos, especialmente pratos
causa síndrome do choque tóxico em mulheres após o parto cárneos.
e o aborto.)
Patogênese
Transmissão C. perfringens é um membro da microbiota normal do có-
Os esporos estão localizados no solo; as células vegetativas lon, mas não do intestino delgado, onde a enterotoxina atua
são membros da microbiota normal do cólon e da vagina. provocando diarreia. O mecanismo de ação da enterotoxina
A gangrena gasosa está associada a ferimentos de guerra, aci- é o mesmo daquele da enterotoxina de S. aureus, isto é, atua
dentes automobilísticos e de motocicleta e abortos sépticos como um superantígeno.
(endometrite).
Achados clínicos
Patogênese A doença apresenta um período de incubação de 8 a 16 ho-
Os organismos crescem em tecidos traumatizados (especial- ras, sendo caracterizada por diarreia aquosa, acompanhada
mente músculos) e produzem uma variedade de toxinas. A de cólicas e pouco vômito, regredindo em 24 horas.

ERRNVPHGLFRV RUJ

136 Warren Levinson

Diagnóstico laboratorial 49). A diarreia geralmente não é sanguinolenta, e são obser-
Geralmente não é realizado. Não há ensaios para a toxina. vados neutrófilos nas fezes de aproximadamente metade dos
Grandes números de organismos podem ser isolados a partir casos. Febre e cólicas abdominais ocorrem frequentemente.
do alimento não ingerido. As pseudomembranas são visualizadas por sigmoidoscopia.
Megacólon tóxico pode ocorrer, e a ressecção cirúrgica do
Tratamento cólon pode ser necessária. A colite pseudomembranosa pode
O tratamento é sintomático; não são administrados fárma- ser diferenciada de uma diarreia transitória, que ocorre como
cos antimicrobianos. efeito colateral de vários antibióticos orais, testando-se a pre-
sença da toxina nas fezes.
Prevenção
Não existem medidas preventivas específicas. Os alimentos Em 2005, uma linhagem nova e mais virulenta de C. di-
devem ser cozidos adequadamente a fim de matar o orga- fficile emergiu. Essa nova linhagem causa doença mais grave,
nismo. exibe maior probabilidade de causar recorrências e responde
menos ao metronidazol, quando comparada à linhagem an-
4. Clostridium difficile terior. Também caracteriza-se pela resistência a quinolonas,
acredita-se que o amplo uso de quinolonas em doenças diar-
Doença reicas pode ter promovido a seleção dessa nova linhagem.
C. difficile causa colite pseudomembranosa associada a an-
tibiótico. C. difficile é a causa mais comum de diarreia no- Diagnóstico laboratorial
socomial. A presença de endotoxinas em um filtrado do espécime de
fezes do paciente corresponde à base do diagnóstico labora-
Transmissão torial. Existem dois tipos de testes habitualmente utilizados
O organismo é encontrado no trato gastrintestinal em para detectar as exotoxinas. Um consiste no ensaio imuno-
aproximadamente 3% da população geral, e em até 30% absorvente associado a enzimas (ELISA) utilizando-se anti-
de pacientes hospitalizados. A maioria dos indivíduos não corpo conhecido contra as exotoxinas. Os testes de ELISA
é colonizada, o que explica porque a maioria das pessoas são rápidos, apesar de menos sensíveis que o teste de cito-
que tomam antibióticos não é acometida por colite pseu- toxicidade. No teste de citotoxicidade, células humanas em
domembranosa. C. difficile é transmitido pela via fecal-oral. cultura são expostas à exotoxina presente no filtrado de fezes,
As mãos dos profissionais hospitalares são importantes in- sendo observada a morte das células. Esse teste é mais sen-
termediários. sível e específico, mas requer um período de incubação de
24-48 horas. Para diferenciar a citotoxicidade causada pelas
Patogênese exotoxinas da citotoxicidade causada por um vírus possivel-
Os antibióticos suprimem os membros da microbiota nor- mente presente nas fezes do paciente, o anticorpo contra as
mal sensíveis ao fármaco, permitindo que C. difficile se mul- exotoxinas é utilizado para neutralizar o efeito citotóxico.
tiplique e produza as exotoxinas A e B. Tanto a exotoxina A
como a exotoxina B são enzimas que glicosilam (adicionam Tratamento
glicose) uma proteína G, denominada Rho GTPase. O prin- O antibiótico causal deve ser suspenso. Metronidazol ou
cipal efeito da exotoxina B em particular consiste na despoli- vancomicina devem ser administrados oralmente, acompa-
merização da actina, resultando em perda da integridade do nhados de reposição de fluidos. O metronidazol é preferido,
citoesqueleto, apoptose e morte dos enterócitos. uma vez que o uso da vancomicina pode selecionar entero-
cocos resistentes a ela. Em muitos pacientes, o tratamento
A clindamicina foi o primeiro antibiótico a ser reconhe- não erradica o estado de portador, podendo ocorrer repeti-
cido como uma causa de colite pseudomembranosa, apesar de dos episódios de colite.
serem conhecidos vários antibióticos que causam essa doença.
Atualmente, as cefalosporinas de segunda e terceira gerações Prevenção
são a causa mais comum, uma vez que são frequentemente Não há vacinas ou fármacos preventivos. Os antibióticos de-
utilizadas. A ampicilina e as fluoroquinolonas estão também vem ser prescritos somente quando necessário.
comumente implicadas. Além dos antibióticos, a quimiotera-
pia contra câncer também predispõe à colite pseudomembra- ■ BACILOS GRAMPOSITIVOS NÃO
nosa. C. difficile raramente invade a mucosa intestinal. FORMADORES DE ESPOROS

Achados clínicos Existem dois patógenos importantes neste grupo: Coryne-
C. difficile causa diarreia associada a pseudomembranas bacterium diphtheriae e Listeria monocytogenes. As caracterís-
(placas amarelo-esbranquiçadas) na mucosa do cólon. (O ticas importantes da patogênese e prevenção são descritas na
termo “pseudomembrana” é definido no Capítulo 7, página Tabela 17-4.

ERRNVPHGLFRV RUJ

Microbiologia Médica e Imunologia 137

Tabela 17-4 Importantes características da patogênese de Corynebacterium diphtheriae e Listeria monocytogenes

Organismo Tipo de patogênese Doença típica Fator predisponente Modo de prevenção

C. diphtheriae Toxigênica Difteria Falta de imunização Vacina de toxoide
L. monocytogenes Piogênica Meningite; sépsis Neonato; imunossupressão
Não há vacina; pasteurização de
produtos lácteos

CORYNEBACTERIUM DIPHTHERIAE O DNA que codifica a toxina diftérica é parte do mate-
rial genético de um bacteriófago temperado. Durante a fase
Doença lisogênica do crescimento viral, o DNA desse vírus integra-se
ao cromossomo bacteriano e a toxina é sintetizada. Células
C. diphtheriae causa difteria. Outras espécies de Corynebac- de C. diphtheriae não lisogenizadas por esse fago não produ-
terium (difteroides) estão implicadas em infecções oportu- zem exotoxina e não são patogênicas.
nistas.
A resposta do hospedeiro a C. diphtheriae consiste em:
Propriedades importantes
(1) Inflamação local na garganta, com um exsudato fi-
As corinebactérias são bacilos gram-positivos que exibem brinoso, que forma a pseudomembrana rígida, aderente e
forma de clava (mais larga em uma extremidade), organiza- acinzentada, característica da doença;
dos em paliçadas ou em formações em V ou L (ver Prancha
Colorida 7). Os bacilos exibem aspecto de contas. As contas (2) Anticorpos capazes de neutralizar a atividade da
consistem em grânulos de polifosfato altamente polimeriza- exotoxina bloqueando a interação do fragmento B com os
do, um mecanismo de armazenamento de ligações fosfato receptores, impedem, assim, a entrada na célula. O grau
ricas em energia. Os grânulos exibem coloração metacro- de imunidade de um indivíduo pode ser avaliado pelo tes-
mática, isto é, um corante cora o restante da célula em azul te de Schick. O teste é realizado pela injeção intradérmica
e cora os grânulos em vermelho. de 0,1 mL de toxina padronizada purificada. Se o paciente
não apresenta a antitoxina, a toxina provocará inflamação no
Transmissão sítio após 4-7 dias. Se não houver inflamação, a antitoxina
encontra-se presente e o paciente é imune. O teste é rara-
Os humanos são os únicos hospedeiros naturais de C. di- mente realizado nos Estados Unidos, exceto em circunstân-
phtheriae. Organismos tanto toxigênicos como não toxigê- cias epidemiológicas especiais.
nicos são encontrados no trato respiratório superior, sendo
transmitidos por gotículas disseminadas pelo ar. O orga- Achados clínicos
nismo pode também infectar a pele no sítio de uma lesão
cutânea pré-existente. Isso ocorre principalmente nos tró- Embora a difteria seja rara nos Estados Unidos, os médi-
picos, mas pode ocorrer em nível mundial em indivíduos cos devem estar alertas para seu sinal mais proeminente, a
indigentes exibindo má higiene da pele. pseudomembrana espessa acinzentada e aderente sobre as
amígdalas e a garganta. (O termo “pseudomembrana” é de-
Patogênese finido no Capítulo 7, página 49.) Os outros aspectos são
inespecíficos: febre, faringite e adenopatia cervical. Há três
Embora a produção de exotoxina seja essencial à patogênese, complicações marcantes:
a invasividade é também necessária, uma vez que o organis-
mo deve primeiro estabelecer-se e manter-se na garganta. A (1) Extensão da membrana até a laringe e traqueia, cau-
toxina diftérica inibe a síntese proteica pela ADP-ribosila- sando obstrução da via aérea;
ção do fator de elongação 2 (EF-2). A toxina afeta todas
as células eucarióticas, independentemente do tipo tissular, (2) Miocardite acompanhada de arritmia e colapso cir-
mas não tem efeito sobre o fator análogo em células proca- culatório;
rióticas.
(3) Fraqueza ou paralisia, especialmente dos nervos cra-
A toxina é um polipeptídeo único, apresentando dois nianos. A paralisia dos músculos do palato mole e da farin-
domínios funcionais. Um domínio medeia a ligação da to- ge pode levar à regurgitação de fluidos pelo nariz. Neurite
xina a receptores glicoproteicos da membrana celular. O periférica afetando os músculos das extremidades também
outro domínio possui atividade enzimática que cliva a ni- ocorre.
cotinamida da nicotinamida adenina dinucleotídeo (NAD)
e transfere a ADP-ribose remanescente para EF-2, promo- A difteria cutânea causa lesões cutâneas ulcerativas
vendo, assim, a inativação deste. Outros organismos cujas recobertas por uma membrana cinza. Essas lesões são fre-
exotoxinas atuam por ADP-ribosilação são descritos nas quentemente indolentes e com frequência não invadem
Tabelas 7-9 e 7-10. tecidos circundantes. Sintomas sistêmicos raramente ocor-
rem. Nos Estados Unidos, a difteria ocorre principalmente
em indigentes.

ERRNVPHGLFRV RUJ


Click to View FlipBook Version