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Intitulada Remonte, esta edição ecoa como um tributo aos que lutaram contra os 21 anos de Ditadura Militar no Brasil. Homenageia aqueles que enfrentaram o regime, seja colocando suas mãos em microfones e subindo aos palcos, seja colocando suas mãos em armas e indo às ruas. Um convite à memória, um resgate de narrativas silenciadas, uma edição necessária. Ditadura nunca mais!

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Published by Revista JuMtos, 2024-05-24 04:46:38

Revista JuMtos - Remonte

Intitulada Remonte, esta edição ecoa como um tributo aos que lutaram contra os 21 anos de Ditadura Militar no Brasil. Homenageia aqueles que enfrentaram o regime, seja colocando suas mãos em microfones e subindo aos palcos, seja colocando suas mãos em armas e indo às ruas. Um convite à memória, um resgate de narrativas silenciadas, uma edição necessária. Ditadura nunca mais!

EDIÇÃON°6MAIO/2024uMtos J Remonte. Fotografia: Tadeu Augusto


EDIÇÃO MARCELO COSTA DIREÇÃO CRIATIVA JÚLIA CARVALHO DIREÇÃO DE PRODUÇÃO FABYOLLA RIBEIRO ARY ALBUQUERQUE DIREÇÃO DE EVENTOS IVENS NETO RHAFA MELLO REDAÇÃO RAFAEL DE LIMA FORTES CARVALHO AMELLY RUTH PEDRO VITOR SANRA DE LIS JUDI OLLI MARIANA PALHARES LUAN FABRÍCIO ANA FLÁVIA FREIRE MARIA LUIZA MOURA RAYSSA PIOVANI DANIELY DURÃO VICTOR AZAMBUJA ARTISTA CONVIDADO MATHENOVÊ PARCERIAS ASSEMBLEIA SOCIAL BIBLIOTECA ESTADUAL ESTEVÃO DE MENDONÇA CENTRO CULTURAL CASA CUIABANA REVISTA IKEBANA EDIÇÃO N° 6 CAPA TADEU AUGUSTO MILIENNE STEPHANIE ARIEL VON OCKER ARTE E DESENHO GABITO ALENCAR MARDEM PIRES PEDRO NAKAMURA 2


A Revista Digital , publicada semestralmente, é uma iniciativa de uma equipe de jovens artistas matogrossenses, estudantes de renda baixa, LGBTQIAPN+ e periféricos. Tem a finalidade de publicar e divulgar as atuações de diversos setores sociais, fomentar leitura nos tempos atuais e estimular o protagonismo, buscando enriquecer culturalmente, atualizar e complementar a formação de todos os leitores. uMtos J ESCOPO 3


Fotografia: Tadeu Augusto


ESTEANOCOMPLETOU-SE60ANOSDOGOLPEMILITARQUEDEPÔSJOAOGOULARTDAPRESIDÊNCIADANDOINÍCIO A UMA DITADURA QUE DUROU 21 ANOSNO BRASIL (1964-1985). TORTURAS, PERSEGUIÇÕES,MORTES E VIOLAÇÕES AOS DIREITOS HUMANOS FORAMELEMENTOS QUE CARACTERIZARAMESSE PERÍODO. PORÉM,MESMO COMSEU FIM,E A RETOMADA DEMOCRÁTICA, ATÉ HOJE MUITOS DOS CRIMES REALIZADOS PELO ESTADO BRASILEIRO SEGUEM SEM JUSTIÇA. NESSECONTEXTO,MUITASPESQUISAS,PASSARAMASEDEBRUÇARSOBREESSEPERÍODO,TENTANDOCOMPREENDER, ATRAVÉS DE DIFERENTES PONTOS DE VISTA, OS IMPACTOS DA DITADURAMILITAR DEIXADOS EMNOSSO PAÍS. APESAR DISSO, AINDA É NECESSÁRIO AMPLIAR AS DISCUSSÕES SOBRE A PARTICIPAÇÃO E O PROTAGONISMO FEMININO NO COMBATEAOAUTORITARISMO. SENDOASSIM,VOCÊJÁOUVIUFALAREMJANEVANINI? TAMBÉM CONHECIDA PELA DITADURA MILITAR BRASILEIRA COM CARLA, JANE NASCEU EM 1945 NA CIDADE DE CÁCERES NO INTERIOR DE MATO GROSSO E ESTUDOU, BOA PARTE DE SUA INFÂNCIA, NA ESCOLA IMACULADA CONCEIÇÃO QUEEXISTE ATÉ HOJE. LÁ ATUOU NO GRÊMIO ESTUDANTILMOSTRANDO DESDE CEDO ENGAJAMENTO NA LUTAPOLÍTICA. EM1966 SEMUDOU PRA SÃOPAULOPARAMORAR COMA IRMÃ EESTUDAR PARAOVESTIBULAR. SEU SONHOERA CURSAR FILOSOFIA NA USP. NA FACULDADE DE FILOSOFIA DA USP, JANEINGRESSAMAIS UMA VEZ, NOMOVIMENTO ESTUDANTILAPESARDASDURASREPRESSÕESQUEOSESTUDANTESJÁVINHAMSOFRENDODOSMILITARES. AINDA EMSÃOPAULO, JANE VANINI COMEÇOU TRABALHARNA EDITORA ABRIL COMOJORNALISTA. LÁ CONHECEU SÉRGIOCAPOZZI,COMQUEMTEVESEUPRIMEIROCASAMENTO.JÁEM1969,OCASALCOMEÇOUFAZERTRABALHOSDE APOIOÀ ALN(ALIANÇANACIONAL LIBERTADORA), UMAORGANIZAÇÃODE LUTA ARMADAQUE RECRUTAVA E TREINAVA MILITANTES PARA ENFRENTAR A DITADURAMILITAR. NÃO LEVOUMUITO TEMPO PARA QUE JANEE SÉRGIO FOSSEM IDENTIFICADOS PELOS ÓRGÃOS DE REPRESSÃO E POR CAUSA DISSO, DECIDIRAMBUSCAR EXÍLIO POLÍTICO EMOUTRO PAÍSPARAPENSAREMESTRATÉGIASDERETORNARAOBRASILECONSOLIDARUMALUTAARMADA. DESEMBARCANDO EM SANTOS, LITORAL PAULISTA JANE E SÉRGIO PASSARAM PELA ARGENTINA, URUGUAI ATÉ CHEGAREM EM CUBA. LÁ, TRABALHOU COMO JORNALISTA NA RÁDIO HAVANA E JUNTO COM OUTROS MILITANTES BRASILEIROSFUNDARAMAMOLIPO(MOVIMENTODELIBERTAÇÃOPOPULAR)PARAVOLTARAOBRASILEORGANIZARA LUTA ARMADA NO CAMPO. RETORNANDO AO BRASIL, O CASAL SE MUDOU PARA UMA REGIÃO DE GOIÁS QUE HOJE CORRESPONDEAOESTADODETOCANTINSELÁCOMEÇARIAMOSTRABALHOSDAMOLIPO,NOENTANTO,EMPOUCO TEMPO, A ORGANIZAÇÃO FOI DESCOBERTA E SEUS DIRIGENTES FORAM PRESOS OU MORTOS, DESSA FORMA JANE A SERGIOPRECISARAMMAISUMAVEZDEIXAROPAÍSE,DESSAVEZ,BUSCARAMEXÍLIONOCHILE. A TRAJETÓRIA DE JANE VANINI NO ENFRENTAMENTO À DITADURA 6


EM1972, QUANDOJANE SEMUDA PARAOCHILE, SALVADOR ALLENDE(1908-1973) AINDA ERA PRESIDENTE. ALLENDE ERA DECLARADAMENTE SOCIALISTA E DEFENDIA A REFORMA AGRÁRIA EESTATIZAÇÃO DAS INDÚSTRIAS COMO FORMA DEREDUZIRASDESIGUALDADES SOCIAIS EMELHORARAQUALIDADEDEVIDADOPOVOCHILENO. PORESSES EOUTROS MOTIVOS,OCHILEENTRANORADAR DOS ESTADOUNIDOSQUE, TEMENDOOALINHAMENTODOS PAÍSES DA AMÉRICA DOSULCOMAUNIÃOSOVIÉTICANAGUERRAFRIA,FINANCIOUAMAISBRUTALDITADURAMILITARDAAMÉRICALATINA. NESSE SENTIDO, JANE MAIS UMA VEZ SE VÊ OBRIGADA A RETORNAR PARA A CLANDESTINIDADE. AGORA EM SEU SEGUNDOCASAMENTO,ELA ADOTAONOME GABRIELA PARA SEESQUIVAR DOSOLHARES ATENTOS DA REPRESSÃO. AO LADO DE SEU NOVO ESPOSO JOSÉ CARRASCO, JANE PASSOU A MILITAR NO MOVIMIENTO DE IZQUIERDA REVOLUCIONÁRIA (MIR) POIS SEMPREESTEVEDETERMINADA A ENFRENTARAS INJUSTIÇASDOMUNDO.NODIA 06DE DEZEMBRO DE 1974, CARRASCO É PRESO E TORTURADO DURANTE MUITAS HORAS PARA REVELAR INFORMAÇÕES COMPROMETEDORASDESUAATUAÇÃOCONTRAADITADURA,PORUMACORDOQUEHAVIAFIRMADOCOMJANE,APÓS LONGA SESSÃO DE TORTURA, ELE ESTAVA CERTO DE QUE JANE NÃO ESTARIA MAIS EM CASA E REVELOU O SEU ENDEREÇOAOSMILITARES.NOENTANTOJANEAINDAESTAVAEMCASAESPERANDOPELORETORNODESEUESPOSOE FOISURPREENDIDACOMACHEGADADOSAGENTESDADITADURA.NESTEMESMODIAJANEFOITORTURADAEMORTAE ATÉHOJESEUSRESTOSMORTAISNÃOFORAMENCONTRADOS. POR ONDE PASSOU A JOVEMMATO-GROSSENSE DEIXOU SEU LEGADO DE BRAVURA E RESISTÊNCIA E O DIA 06 DE DEZEMBROÉRELEMBRADOCOMOADATADASUAIMORTALIDADE.ONOMEDEJANEÉ SÍMBOLODERESISTÊNCIAPOR TODA AMÉRICA LATINA E O SEU ROSTO ESTAMPAMUROS, BANDEIRAS E CARTAZES. CARLANO BRASIL E GABRIELANO CHILE, JANE VANINI FOI UMA SÓ E SUAMEMÓRIA CONTINUA VIVA NASMENTES E CORAÇÕES DE QUEMACREDITA E LUTAPELOTRIUNFODOSOPRIMIDOS. RAYSSA PIOVANI TEM22 ANOS EÉ GRADUANDA EMHISTÓRIA - LICENCIATURA PELAUFMT E TEMUMA GATINHACHAMADA ELIS. ATUALMENTE FAZ APARTE DO GRUPO DE ESTUDADOS EM DITADURA, SOCIEDADE E ENSINO DE HISTÓRIA E PESQUISA MATERNIDADEEMILITÂNCIAFEMININANADITADURAMILITAR. 7


Moral, bons costumes e liberdade sexual: a perseguição às prostitutas na Ditadura Militar no Brasil Mariana Palhares Foloni Luan Fabricio C. de Souza o ano de 2024 completa-se 60 anos do golpe que instaurou a Ditadura Militar no Brasil, esta que deixou marcas profundas na sociedade brasileira. A Ditadura Militar no Brasil, que perdurou de 1964 a 1985, foi caracterizada por um regime autoritário marcado por censura, repressão política, violações dos direitos humanos e uma brutal presença militar no governo. Durante esse período, houve perseguições políticas, torturas e desaparecimentos de opositores ao regime, além da supressão de liberdades civis e políticas básicas. Nas últimas décadas têm surgido diversos trabalhos e pesquisas sobre os grupos subalternos que por muito tempo se mantiveram no esquecimento, dentre eles podemos destacar as prostitutas, cuja trajetória é marcada por muita luta, resistência e companheirismo. Este breve texto parte de uma pesquisa em andamento, na qual busca analisar a perseguição às mulheres prostitutas durante a Ditadura Militar no Brasil (1964-1985). Porém, seu enfoque é na autobiografia de Lourdes Barreto, prostituta e ativista de Belém do Pará, que lutou pela reabertura do meretrício denominado de “Quadrilátero do Amor”, que foi fechado durante o período, pelos militares. Apesar do avanço de inúmeras pesquisas sobre as mulheres e suas atuações durante o período ditatorial, ainda há um silenciamento da profissional do sexo, muitas vezes não sendo contemplada dentro do próprio movimento feminista e na luta por reparação política, uma vez que também foi duramente perseguida durante a Ditadura Militar. Rodeada de estigmas e preconceitos, a mulher prostituta vai contra o ideal social criado pelo patriarcado no qual exalta hábitos moralizadores cristãos e o padrão de família – e de mulher – gerado a partir da família burguesa do início do século XX, restando a essas mulheres exclusão social e violência. Cabe ressaltar que a prostituição era considerada um dos grandes problemas sociais no século XX, um problema que precisava ser resolvido e principalmente, erradicado. Na concepção social, a exclusão dessas mulheres da sociedade colaborava com a preservação da família tradicional, fazendo com que, consequentemente, houvesse apoio popular nas ações de retirada delas dos principais polos das cidades. Sendo assim, as questões morais e sexuais se tornaram políticas estruturantes do regime instaurado. N


O foco dessa pesquisa gira em torno de Lourdes Barreto, que foi prostituta e militante, reside no Pará desde o início dos anos 1950 onde fundou o Grupo de Mulheres Prostitutas do Pará – GEMPAC –, e batalhou pela reabertura do meretrício fechado na década de 1970. Realizou diversas passeatas em Brasília reunindo trabalhadoras sexuais da região em prol da reabertura política. Barreto foi presa e perseguida inúmeras vezes por possuir esta profissão, dentre os motivos se destaca a violação a moral e ir contra a política conservadora, uma vez que para a repressão representava uma ameaça à família e a sociedade, lutou pela instauração da primeira delegacia da mulher em Belém e participou da campanha contra a AIDs, como convidada do Ministério da Saúde. Mas, além da militância em movimentos sociais, ela tem uma vida marcada por lutas pela libertação sexual, pelo direito à liberdade do corpo, luta pelas suas companheiras de profissão e por melhores condições de trabalho – como estrutura, horas trabalhadas por dia, entre outros. Lourdes sempre foi referência para as mulheres que trabalhavam na prostituição em Belém, junto a sua companheira de luta Gabriela Leite,fundou a Rede Brasileira de Prostitutas. Tornando o movimento das prostitutas em um movimento social, entretanto marcado de fortes repressões, e em 1979, tem-se o início da visibilidade dessas mulheres prostitutas no processo de se organizarem, e de se denominarem profissionais do sexo. A partir do exposto, afirmo que até hoje essas mulheres lidam com políticas higienistas e com a ideia de moralidade e bons costumes, características que seguem enraizadas na sociedade e que herdadas da ditadura e suas delegacias moldam a identidade social. Desta forma o presente texto buscou, ainda que brevemente, destacar as formas de repressão cometidas contra essas mulheres, a partir da autobiografia de Lourdes Barreto, mas, também no regramento moral sobre as prostitutas, embasadas nos discursos conservadores e morais. Portanto, torna-se claro que ampliar essa discussão para diferentes esferas sociais é fundamental para a compreensão deste período que deixou uma marca indelével na história brasileira. Promover o debate sobre esse assunto é garantir que uma nova ditadura não se estabeleça na atualidade. Além da compreensão, é de extrema importância dar visibilidade aos personagens que foram negligenciados na narrativa da luta contra a ditadura militar brasileira. Entre esses personagens, destacam-se as prostitutas mencionadas neste artigo, cujas histórias e experiências oferecem uma perspectiva valiosa e muitas vezes esquecida desse período tumultuado da história do Brasil.


10 Mariana Palhares Foloni, 24 anos, graduanda de História na UFMT (Universidade Federal de Mato Grosso), membro ativo do GPEDSEH (Grupo de pesquisa em ditadura militar, sociedade e ensino de história), possui pesquisa em andamento com foco na Ditadura Militar, Prostituição e Gênero. Atualmente pesquisa as prostitutas durante a ditadura militar através da trajetória da militante e prostituta Lourdes Barreto. Me chamo Luan Fabrício,tenho 23 anos, sou acadêmico de História Licenciatura na UFMT. Participo do Grupo Estudantil de Prática Docente (GEPD) ministrando aula no cursinho popular(PRO-ENEM). Atualmente sou pesquisador do Grupo de Estudos em Ditadura Militar, Sociedade e Ensino de História (GEDSEH). Fui Diretor de Comunicação do Centro Acadêmico Olga Benário (CAHIS-2023/24).


PROVOQUE A DITADURA! PROVOQUE A DITADURA! PROVOQUE A DITADURA!


Por: Pedro Nakamura 12


O DIA 1 DE ABRIL DE 2024 SE COMPLETOU 60 ANOS QUE BRASIL FOI MARCADO POR UM DOS CAPÍTULOS MAIS CRUÉIS DA SUA HISTÓRIA, O GOLPE DE 1964.UM GOLPE CIVIL- MILITAR QUE FOI FINANCIADO PELOS ESTADOS UNIDOS E TEVE CONSEQUÊNCIAS DESASTROSAS COMO 439 MORTOS E DESAPARECIDOS, SEGUNDO O RELATÓRIO FINAL DA “COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE” JÁ O RELATÓRIO “BRASIL NUNCA MAIS” INDICA QUE 1.918 PESSOAS AFIRMAM TER SIDO PRESOS E TORTURADOS ENTRE 1964 - 1979. ENTRE ESSES PRESOS E TORTURADOS ESTAVA LYLIA DA SILVA GUEDES, MILITANTE SECUNDARISTA DO PARTIDO COMUNISTA BRASILEIRO REVOLUCIONÁRIO (PCBR) QUE ACABOU POR SER PRESA EM 30 DE JANEIRO DE 1970 NA PRAIA DA MARIA DA FARINHA EM PERNAMBUCO, JUNTO COM OUTRO MILITANTE HÁ MUITO TEMPO PROCURADO DE NOME: ODIJAS DE CARVALHO. LYLIA QUE TINHA SIDO ENTREGUE POR SEU PRÓPRIO PAI AOS APARELHOS DE REPRESSÃO, PRESENCIOU AS TORTURAS IMPOSTAS A ODIJAS DE CARVALHO E FOI TESTEMUNHA DE SEU ASSASSINATO PELOS APARELHOS REPRESSIVOS DO ESTADO VIGENTES NA ÉPOCA. ALÉM DE TER QUE RESISTIR AS TORTURAS IMPOSTAS A SI PRÓPRIA COMO: GRACEJOS DOS MILITARES, PALMATORIAS E ENTRE OUTROS. APESAR DE SUA CLARA IMPORTÂNCIA PARA A HISTÓRIA DA REDEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL COMO UMA MILITANTE, POUCO SE FALA DA HISTORIA DE LYLIA DA SILVA GUEDES. INCLUSIVE DENTRO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO (UFMT) UNIVERSIDADE NA QUAL MINISTROU AULAS POR MAIS DE 30 ANOS CHEGOU A CONHECER SUA HISTÓRIA COMO IMPORTANTE RESISTÊNCIA A DITADURA DA ÉPOCA. A PERGUNTA QUE FICA É SE LYLIA FOI TÃO IMPORTANTE, POR QUE TÃO POUCO SE FALA DELA? POUCO SE LEMBRA SUA HISTÓRIA? SERIA POR QUE ELA NÃO FOI MORTA NO ATO DAS TORTURAS NÃO CONSEGUINDO SER TRANSFORMADA EM UM MÁRTIR OU A SUA HISTÓRIA SÓ FOI MAIS UMA DE OUTRAS TANTAS HISTÓRIAS DE MILITANTES POLÍTICAS MULHERES QUE FOI ESQUECIDA, POR CONTA DE SUA CONDIÇÃO DE SER MULHER? O ESQUECIMENTO DA HISTÓRIA DE LYLIA ASSIM COMO DE TANTAS OUTRAS MULHERES DURANTE A DITADURA TEM O SEUS MOTIVOS,VISTAS COMO DUPLAMENTE DESVIANTES PELA DITADURA. EM PRIMEIRO LUGAR POR IR CONTRA O GOLPE DE ESTADO INSTAURADO, E EM O SEGUNDO POR SE COLOCAREM EM UM PAPEL DESTINADO AOS HOMENS QUE ERA A VIDA PÚBLICA E POLÍTICA EM VEZ DE SE RESGUARDAREM AO PAPEL DE GÊNERO IMPOSTO A ELAS,UMA VIDA PRIVADA DENTRO DE CASA. OUSAR LUTAR SENDO MULHER ERA UM DOS MAIORES CRIMES AOS OLHOS DOS APARELHOS REPRESSORES DO ESTADO, NESSES 60 ANOS DE GOLPE QUE OUSEMOS LUTAR NÃO SÓ COMO LILYA MAS COMO TODAS AS QUE FORAM PRESAS E TORTURADAS É M UM REGIME QUE CALAVA NÃO SÓ A VOZ DE UMA SOCIEDADE MAS TAMBÉM SUFOCAVA OS SONHOS DE TODA UMA JUVENTUDE. “LYLIA DA SILVA GUEDES” DANIELY DURÃO N


DANIELY DURÃO MOURA, TEM 23 ANOS, NASCIDA E CRIADA EM CUIABÁ, TEVE TODA A SUA FORMAÇÃO EM ESCOLA PÚBLICA, HOJE É GRADUANDA EM HISTORIALICENCIATURA PELA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO, PARTICIPOU DO PIBIC COM UMA PESQUISA FOCADA EM MULHERES NEGRAS ENCARCERADAS EM MATO GROSSO E AGORA TEM SEU TCC VOLTADO PARA GÊNERO NA DITADURA MILITAR COM ENFOQUE NAS MEMÓRIAS FEMININAS SILENCIADAS. 14


Fotografia: Tadeu Augusto


Eu já estive em sintonia Com Elis regina Dizendo que apesar dos pesares ainda somos os mesmos Até mesmo com Geraldo Vandré Que explica que quem sabe faz na hora e não espera acontecer Chico Buarque mostra-me uma realidade menos morta Sim, Caetano, nós temos caminhado contra o vento E eu concordo com você quem lê tanta notícia? Eu gostaria de viver das minhas rimas Então eu olho para cima e peço uma chance Mas vejo o desdém de relance O público nem sempre busca a verdade E sim algo impressionante Algo que caiba em um nicho No qual eu entro, e aí de mim se tentar outra coisa O mundo é seletivo E eu sou horrível presa nesse cubículo Rabisco tudo e mostro quem eu sou no ao vivo. amelly ruth Me sinto em uma caixa as vezes


A dor que escrita cura É a mesma que mata Tantas dores que não foram divulgadas Tantas lutas a troco de nada Quantas vidas foram terminadas? E bandeiras falsas levantadas Tentando justificar Essa atitude irreversível, país entregue A preconceitos, a choros, e até hoje: sofrimento. Golpe imensurável Trazendo animais ao acento Eles ditando e os demais obedecendo Mas hoje não me calo Me conservo, mas eu falo Grito mais alto que os meus antepassados puderam. EU GRITO Amelly Ruth


Voa a mosca Voa aqui, voa ali Pousa em tu e em mim As araras grasnam bem alto Insetos por todos os lados e As moscas continuam pousando Chuvas amarelas Breve escuridão E as moscas continuam passando entre a multidão Na televisão, apenas felicidade Mas as moscas pousam em pessoas de diversas idades Houve uma trégua e já não vejo mais as araras grasnar Mas e você, onde estás? Pedro Vitor Próximo da Nova Era


19 Me chamo Amelly Ruth, sou escritora mato-grossense publicada, tenho 18 anos. Fazer parte dessa edição é uma honra pois aborda um tema muito importante e pouquíssimo falado. Pedro Vitor é um homem preto, gay e tem 22 anos. Graduando de Letras Língua Portuguesa e Inglesa, na UFMT, desde 2021. Atua em coletivo de audiovisual e grupo de teatro. Escritor desde 2022 e, recentemente, representou Mato Grosso como poeta na 4ª Conferência Nacional da Cultura.


Fotografia: Tadeu Augusto


Luisa Augusta Garlippe e a representação das mulheres Guerrilha do Araguaia. m2024oGolpeCivil-Militarde1964completa60anos,trazendonovamenteàtona esseperíodotenebrosodaHistóriadoBrasileacarretandoreflexõessobreos20anos derepressãoeformasparaquenuncamaisserepita.Historicamente,aorefletirmos sobreosnomesquerepresentamaresistênciacontraaDitadura,semprenosvem emmentepessoascomoCarlosMarighella,CarlosLamarcaqueforammilitantes nalutaarmada,alémdeGilbertoGileCaetanoVeloso,artistasqueforamexilados por também se posicionarem contra o Estado repressivo. Entretanto, além de reconheceraimportânciadesses,podemosrefletirsobreosilenciamentodenomes femininoscomoreferênciasderesistênciaaoperíodo. AsmulheressempredesempenharamumpapelcrucialnaHistória,mas,apesar de alguns avanços recentes sobre a problemática, ainda énecessário ressaltar a presençafemininanos eventoshistóricos e combater seuapagamentoenquanto protagonista.Dessaforma,devemosimpulsionaressemovimentoparaapreciarde maneiramaiscompletaaparticipaçãodasmulheres,colocando-ascomofoconas narrativashistóricas,comonocasodaDitaduraMilitardoBrasil. Consideradasduplamentetransgressoras,asmulhereseramdesqualificadaspor se posicionarem contra o Estado repressivo e por participarem de movimentos políticos - espaço considerado masculino - ao invés de ficarem em suas casas, cuidandodesuasfamílias.Ouseja,transgrediamanoçãodeumespaçoreservado paraelas,olar,deacordocomopensamentopatriarcalassimdeterminado. Jánasaçõesdetorturaerepressão,eramconsideradasputascomunistasjáque mulheres não deveriam estar em espaços políticos, então deveriam ser desqualificadas, sendo taxadas como estarem apenas como acompanhantes de seus companheiros. Nesse sentido, ao procurar pelas militantes nos relatórios oficiaiselas sempresãoreferidas como“mulher”dealguém,limitandoassimsua capacidade de ação e pensamento, como se não tivessem a habilidade de se posicionareagirdeacordocomsuavontadeprópria. NahistóriadaDitaduraMilitardoBrasil(1964-1985)apresençafemininasefezem diferentes frentes de luta, seja contra o suposto comunismo como a MarchaDa Família Com Deus Pela Liberdade, ou na luta armada, como no movimento da guerrilha do Araguaia, onde 16 mulheres estiveram presentes executando diferentesfunçõesealgumasposiçõesdeliderança. E Ana Flávia Freire Bispo 21


A Guerrilha do Araguaia foi um movimento de resistência armada contra a Ditadura Militar, liderado por militantes de esquerda em áreas rurais do Pará, Maranhão e Tocantins. Foi uma tentativa de promover uma revolução por vias camponesas, sendo dividida em três destacamentos liderados por grupos responsáveis por áreas como estratégia, saúde e militar. Entre as três divisões estavamasmilitantesdistribuídassendonodestacamentoA,CriméiaSchimmdt, Maria Célia, Lúcia Maria, Helenira Resende e Jana Moroni. No destacamento B estavam Suely Yumiko, Dinaelza Santana, Luisa Garlippe, Regilena da Silva Carvalho e WalkíriaAfonso. E no C,ÁureaValadão,DinalvaOliveira, LuziaReis, MariaLuciaPetiteTelmaRegina. Apresento o nome de todas as participantes da guerrilha como forma de representaçãode suaspresenças,mas focaremosnabiografiade LuisaGarlippe devidoasuaposiçãonaguerrilha.LuisanasceuemAraraquara-SãoPauloem16de outubrode1941,sendoaprimogênitadocasalArmandoeDurvalinaGarlippe.Se mudouparaacapitaldoEstadoparaseformaremenfermagempelaUniversidade de São Paulo e trabalhou no Hospital das Clínicas como enfermeira-chefe no DepartamentodeDoençasTropicais.SendoativanaAssociaçãodosFuncionários doHospitaldasClínicas,organizouepanfletoujuntocomcolegaspelamobilização contraaditaduramilitar,jáseguindoasorientaçõesdoPCdoB,partidoque era filiada. Aoperceberquearepressãoàmilitânciacolocavaasuavidaeadeseunamorado PedroAlexandrinodeMoraes,codinomePeri,emrisco,decidiramirparaaregiãodo Rio Gameleira.Durante a guerrilha, desenvolveu um trabalho importante tanto paraosguerrilheiros comoparaapopulaçãolocaldevidoasuaexperiênciacom doençastropicais.Naoportunidadepodesalvaravidadediversaspessoas,alémde tersidoumaimportanteparteiraparaasmãesdaregião.ComamortedeJoãoHass Sobrinho, Tuca como era conhecidana guerrilha, assumiuem1972 a posição de comandante-médica da guerrilha, sendo, portanto, uma das lideranças do destacamentoB. Relatóriosgovernamentaisestabelecemqueseudesaparecimentoocorreuentreo natalde1973emeadosde1974equefoipresajuntocomDinalvaOliveira.Entretanto, suamorte eoparadeirode seucorpoaindasãodesconhecidos, sendomaisuma militantequeoEstadobrasileirodeixasemrespostas.Porfim,épossívelperceberque Luisaetantasoutrasfizerampapéisimportantesnodecorrerdaresistênciacontra aDitadura,assimcomooutrasdiversasmulheresanteseapóselasnodecorrerde eventoshistóricos.Poressemotivo,énecessáriocriarumanarrativaqueahistória demulheresativaseindependentes sejacontada,dissipandoaideiademulheres passivas e dependentes de aprovação e/ouordem masculina, e destacando seus diversosprotagonismos,comofoinoperíododaDitaduraMilitar.


Graduanda pela Universidade Federal de Mato Grosso, com pesquisa na área de Brasil Contemporâneo, foco em Ditadura Militar com o título “Do Araguaia ao Araraquara: A trajetória política de Luisa Augusta Garlippe (Tuca)". Faço parte da equipe de execução do projeto de extensão "Cine & Ensino de História: a ditadura militar brasileira pelas lentes do cinema" vinculado a UFMT. Sou membro do grupo de estudos em Ditadura Militar, Sociedade e Ensino de História (GEDSEH) e pesquisadora no projeto de pesquisa Ditadura Militar No Brasil: Representações, Sociedade e Ensino De História. 23


Por: Mathenovê As flores também sangram 24


Natural de Caruaru, Pernambuco, Matheus Fernando Gomes de Azevedo (Mathenovê) é artista visual, escritor, professor (CIDA — Centro de Instrução e Desenvolvimento Aéreo), mercadólogo (ETEMFL), administrador (ETEPAC), socorrista, pesquisador em Neurobiologia do TEA pela UNINASSAU-Caruaru e estudante de enfermagem (bolsista UNINASSAU). É colunista das revistas Brasilis e Ikebana. Editor-chefe da revista Brasilis. Teve sua primeira exposição individual intitulada Felicidade Clandestina realizada na Casa Clandestina com curadoria de Ayanne Sobral e Stênio Marcos. Em 2019 criou o projeto “Escrito&Descrito” para divulgar seus trabalhos artísticos de pintura, escrita, fotografia e escultura. Com publicações nas revistas: Clandestina, Brasilis, Impérios sagrados, Grifo, Ikebana, Sucuru e Fruta Bruta, o artista procura explorar filosofias cotidianas e psicanalíticas, mesclando lirismo e surrealismo em suas produções. Instagram: @escritodescrito 25


DI NTA D A AU UNR CMA I S ?


DITADURA NUNCA MAIS?


urante a Ditadura, a imprensa teve as suas divisões, jornais que apoiaram o fim do governo Jango como também o processo ditatorial, a exemplo do Correio da Manhã e o jornal do Brasil (Chamas, 2012) e em Mato Grosso o editorial O Estado de Mato Grosso, mas há jornais que se tornam contra a ditadura neste processo. Mato Grosso, em sua grande maioria, sempre foi um Estado conservador de direita, ligado ao agronegócio, que tem impacto de certa maneira no apoiar a queda de Goulart e a entrada dos militares ao poder, o que podese perceber na edição n° 4.460 do jornal O Estado de Mato Grosso, quando em 12 de abril de 1964, o editorial anuncia uma homenagem que ocorrerá ao Governador Fernando Corrêa, com presença de estudantes de Direito, operários, comerciantes e a população no geral, e diz que ``pela sua participação nos últimos acontecimentos políticos que culminaram a queda do COMO O PERIÓDICO O ESTADO DE MATO GROSSO NOTICIOU A DITADURA CIVIL MILITAR NO BRASIL `governo do Sr. João Goulart e com a espetacular vitória das forças democráticas do país ́ ́ (O ESTADO DE MATO GROSSO, 12 de abr. 1964, p 1). É imprescindível notar o apoio do jornal aos militares e a Ditadura, que vão chamar de ``forças democráticas ́ ́ os novos governantes que ascendem ao poder, e ter uma negação de existência de um golpe de estado, mas como dito, não somente o editorial, mas estudantes e trabalhadores também prestaram apoio ao Governador pela atuação na queda de Goulart. É possível ver ainda nesta mesma página, uma notícia acerca do novo Chefe da Nação do Brasil, Castelo Branco, caracterizando-o como um dos maiores nomes das Forças Armadas e que se constituía como uma grande esperança para a recondução do país aos seus destinos gloriosos de liberdade, onde diz que o mesmo restaurou o regime democrático no Brasil na derrubada do Sr. ex-presidente João Goulart. D 28


Isto é, percebe-se um alinhamento forte e explícito do editorial na queda de Jango e em como eles retrataram esta informação, alegando que o novo presidente, Castelo Branco, trará destinos de paz, trabalho, progresso e liberdade ao Brasil, ou seja, o jornal difunde a concepção de que o país enfrentava diversas dificuldades econômicas e sociais com Goulart no poder. Cabe-se ressaltar ainda que a maneira como o jornal veiculava suas informações conectada a preocupação com a instabilidade política e econômica do Brasil na época, apoiando a ideia da restauração da ordem e da estabilidade, haja vista que se propagava o conteúdo de que Jango era um comunista e que iria instaurar o comunismo no Brasil. Para Edvaldo Sotana (2019, p 420) fica claro essa associação de Goulart ao comunismo ``O jornal construiu um enredo que aproximava Jango dos comunistas e do comunismo, além de lançar suspeição sobre sua palavra e salientar sua intenção de perpetuar-se no poder. ́ ́ As manchetes principais do jornal O Estado de Mato Grosso, em sua grande maioria, no que tange às notícias acerca do governo, são de maneira positiva, estando a favor das ações cometidas pelo Estado. Sempre noticiando novas obras e realizações que vêm sendo feitas em Mato Grosso, mas poucas ou raras vezes contrariando o Governo. Rememorar os 60 anos da Ditadura no Brasil é um imperativo para preservar a memória histórica e extrair lições do passado. Conforme a Comissão Nacional da Verdade, 434 vidas políticas foram perdidas nesse período sombrio. Recordar esta luta e resistência é um tributo necessário às vítimas e um chamado à vigilância para que a democracia, ameaçada em 1964, jamais seja rompida novamente, sendo fundamental para fortalecer os alicerces da democracia no Brasil. 29


Rafael Fortes, estudante de História na UFMT. Onde é membro do GEDSEH - Grupo de Estudos em Ditadura Militar, Sociedade e Ensino de História e do Grupo de Pesquisa em História, Terra e Trabalho, ambos no Departamento de História/UFMT. Onde é Voluntário de Iniciação Científica, pesquisando sobre a repressão e perseguição aos indígenas Xavante de São Félix do Araguaia na década de 1970. 30


Ansiedade 10/10 Judi Olli Louca para desatar cada nó de mim -de peito, boca, estômago, saliva, suorMe desfiz Soltei o nó Coração na boca -em esperaDa pata do elefante no peito à confusão mental (silepse de mim ao quadrado) Me pergunto se é a vida ou eu quem faz tudo ser desazado


E mais uma noite de expectativas rachadas O ciclo volta ao seu retorno Se é de má fé ou falta de senso Na prática o resultado não se altera Os restos se acumulam nos cantos ignorados O vento volta a desalentar o desloc ado e mais uma vez aqui tudo se finda Para quê esperar o que não irá se a lterar Para quê adiantar o retardado dito Finda linha dos semimortos pois é hora de acordar Para si e pra mim Notívagos Judi Olli 32


Morreram Morreram os estudantes Morreram os militantes Morreram os meliantes E as pessoas com mentes brilhantes Morreram tantos De tantas formas Naquela época Quando alguém se atrasava Começavam a contar as horas Consegue imaginar a angústia? Consegue imaginar o medo? Se os militares chegassem Logo se instaurava o desespero Cadê Maria? Cadê João? A polícia passou Foram torturados no camburão Não desistiram Não falaram Não revelaram Resistiram calados A única fala era o grito entalado “Fale onde eles estão! Diga, quem são os responsáveis?!” “Jamais direi nada a vocês! Bando de covardes!” E assim a luta persistiu Muitos morreram Outros foram torturados Tudo em defesa do Brasil Agora é a nossa vez Hora de honrar quem muito fez Vamos mobilizar dos interiores ao litorais E sair gritando forte pelas ruas “DITADURA NUNCA MAIS!” -Sanra de Lis Torturados no camburão 33


Judi Olli, pseudônimo de Judikerle P. de Oliveira, nasceu em Bodocó- PE, cresceu na periferia de Cuiabá, capital Matogrossense, atualmente reside em Campo Verde, interior de Mato Grosso. Além de escritora e poeta é professora de Arte e Língua Portuguesa/literatura, mestre em Estudos Literários no Programa de Pós-graduação em Estudos de Linguagem da Universidade Federal de Mato Grosso (2019). Sanra de Lis é psicóloga e mestranda em Educação e atualmente atua como Psicóloga escolar na E.E. Malik Didier Namer Zahafi, é coordenadora de mulheres na Nova Frente Negra Brasileira, membra do Coletivo Daruê Malungo, representante da sociedade civil na Comissão para Educação das Relações Étnico-Raciais e para Ensino de História e Cultura Afrobrasileira e Africana (CADARA) no Ministério da Educação (MEC). Atua na cultura ballroom e é Imperatriz da Casa de Excelência Mansão Flor de Lis. 34


Fotografia: Tadeu Augusto


Por: Gabito Alencar 36


“POR ISSO O BLACK POWER PERMANECE VIVO”: O HIP HOP E A LUTA PELA CULTURA AFRO COMO RESPOSTA À REPRESSÃO E À MARGINALIZAÇÃO NO BRASIL Maria Luiza da Silva Moura. Movimento Hip Hop, que se iniciou nos anos 60 em bairros majoritariamente periféricos dos Estados Unidos, é um conjunto de expressão artística que vai muito além da música e da dança. A forma de fazer política através de poesias, letras e da acentuação das diferenças sociais por meio de performances, foi o que tornou este um movimento composto por latinos e afro americanos, perseguido de forma vertiginosa como consequência da marginalização dacultura quevinha do gueto e da periferia. O No Brasil, o hip hop e o rap passaram por algumas alterações que foram além dos ritmos e sonoridades. No contexto dos anos 70, se deu uma forte oposição e luta da classe de artistas independentes contra a ditadura militar e à repressão. A partir desse cenário de militância política contra um inimigo em comum de todos que lutavam pela redemocratização do país, havia também a realidade de um povo que sofria com a repressão militarantes, duranteeapósesse período obscuro que percorreu durante 20 anos no Brasil. A violência policial, que mesmo após a restituição da democracia, continuou predominantemente em locais periféricos urbanos, tem como umas das principais razões o racismo estrutural que ocorre pela impunidade de agentes do Estado para com os atos de extrema violência e intervenções mortais em locais periféricos, e nos quais as maiorias das vítimas são pessoas pretas. Em um dos relatórios da Comissão Nacional da Verdade, se tem o número de 434 pessoas que foram mortas e torturadas por militares durante 1964 e 1985. Entretanto, no mesmo relatório se tem um apagamento de estatística de pessoas negras, o que se dácomo resultado de uma normalização daviolênciacontra o povo negro. Mesmo o movimento musical do rap no Brasil se concretizando somente após o final dos anos 80 e em transição para os anos 90, com figuras como os grupos Racionais MC’S, Facção Central, Detentos do Rap, e artistas como Thaíde, Sabotage e Dj Hum, que dominaram o pioneirismo da cena. Durante os anos de chumbo, houve uma intensa repressão contra os chamados Bailes Black, que eram festas em que tocavam misturas rítmicas como blues, jazz e o funky (gênero que misturava os outros dois ritmos). Esses bailes, quando ocorriam, além da música, havia também uma elevação da auto estima de pessoas negras por meio de seu estilo, vestimenta e o que mais estava em alta na época, como o penteado black. Essa influência que vinha muitas vezes dos norte-americanos se findava na valorização da cultura afroamericana de várias outras formas. Longe de passarem despercebidos, após pouco tempo em que os bailes estavam em altas, militares a e chamada polícia política começaram uma movimentação que consistia na espionagem com o intuito de colocar à prova a desconfiança de que na verdade tudo não passava de reuniões de cunhos políticos e formação de atos perigosos. Considerando que, durante os anos 70, havia essa preocupação por parte do Estado repressivo brasileiro como consequência daluta do partido político Panteras Negras, queconsistia no


Ocombate daviolência policiale na busca de direitos civis nos Estados Unidos. Percebe-seacriminalização de qualquer forma de manifestação da cultura negra, com o foco no lazer de jovens negros e suburbanos. Com o passar de alguns poucos anos, esses bailes foram diminuindo gradativamente até que ocorriam de formas esporádicas ou em forma de comemoração. Mas a perseguição policial não foi o único motivo desse desaparecimento dos Bailes Blacks. O Após o fim da Ditadura Militar, o inimigo que antes era comum à classe média, grupos políticos de esquerda e ao movimento tropicalista, fora derrotado com o direito de votos sendo conquistado através do ativismo político e o movimento Diretas Já (1983-1984). Entretanto, a violência policial e repressiva ainda existia em áreas periféricas, e a partir daí nascem grupos de rap que tinham como objetivo, passar a mensagem e sua denúncia de um Estado que usava de uma política violenta e mortal para continuar os segregando. OO Movimento Hip Hop no Brasil, começa juntamente com a globalização dos anos 80, e com umas das principais formas de manifestação: o Breakdance, que consiste em movimentos performáticos de batidas e instrumentais. Com personalidades como Nelson Triunfo, que com o seu black solto, seu talento na dança e sua bagagem cultural que para muitos era única, pois ele tinha a mistura do forró com a black music da gringa, começa nesse momento a introdução de vertentes do Hip Hop no Brasil como os bailes, shows, festas voltadas para dançareescutar discos defunky queforam o grande“boom” paraaintrodução do Movimento Já o rap como forma de protesto, foi um dos primeiros contatos diretos do Movimento do Hip Hop como um movimento político, cultural e social no Brasil. Em letras como a do rap Sr. Tempo Bom, percebemos a denúncia direta da marginalização dessacultura,além deenaltecê-la: O tempo foi passando,eu meadaptando Aprendendo novas gírias, me malandreando Observando aevolução radical de meus irmãos Percebi o direito quetemos como cidadãos De dar importânciaàsituação Protestando pra queachamos umasolução Por isso o Black Power permanecevivo Só que de um jeito bem mais ofensivo Seja dançando break, ou um DJ no scratch Mesmo fazendo graffiti, ou cantando rap (Thaídee Dj Hum, Sr. Tempo Bom, 1996.) A identidade negra no contexto de um país pós ditadura militar e a continuidade da perseguição do Estado, mesmo com muitas outras formas de militância e luta política, encontra-se na música como o samba, a MPB, e o funk brasileiro. Mas principalmente no rap, se tem como objetivo escancarar o racismo estrutural, que se inicia durante o período de colonização com a escravidão, continua durante a sua abolição, e séculos depois, nos dias atuais. Por isso, a narrativa de um povo que durante todos esses séculos foi torturado, mortalmente ferido e privado de sua própria cultura, ainda continua existindo por meio da poesia como um dos pilares de umasociedade quetentaatodo custo apagar sua históriae memória.


l 0M r H m p d e e s e o i a ú s s ti s r tóri s i q M l i d i a o u c i ovi n a i m s a d , L a u o m u n s tr i c e z i a e om c a a n m a , g to U l o . F n C o M H or u e i T obj i p s ti a . s b s a H e E á ta op ti ntu d v p n e o a s p s a i i x d a d s a ã r e c e s o a i ta d tr 2 a m 0 p a e 2 a u z e e r 1 i m to a a r . p a E r a a B s e l p tu e c é l i l e m u a é d s r d m a c a or n d r - l te i i e P ta a d a a u r d d d m á e e e e , lGabito Alencar vive em Goiânia há 5 anos, onde cursa Licenciatura em Artes Visuais pela Universidade Federal de Goiás (UFG) mas é cearense, nascido em Sertão Caririense. Esta é uma referência importante para sua arte, orientação para o desenvolvimento de seu trabalho artístico, mesclando a cultura do sertão nordestino aelementos dacultura negra. 0RAP É COMPROMISSO! 39


Por: Mardem Pires 41


Eu Quero a Escolarização dos Quartéis Eu quero a escolarização dos quartéis Quero não queimar os papéis nem as ordens de serviço Que é pra revelar o quão cruéis foram os ofícios Quero abrir novos processos, exportar nomes próprios, Resgatar pessoas físicas e, em lista, fazer uma exposição Performance da dor Prestar contas, ao final E pelo menos amanhã, o jornal no chão Ao vento, queimando notícias no clarão Vai parafrasear a cena, a ameaça em questão Mesmo o proceder histórico sombreado com fuligem Mesmo a memória acobreada com ferrugem Dirão, em colunas tortas Que eu quero a inversão dos papéis Repensando as culturas ocidentais- e essa sua influência é uma cicatriz Mexendo nos métodos educacionais Dados viciados pelas estruturas capitais Revoltado com o esquecimento ... lembro-me dos meus motivos ... O que consta na carteira de trabalho, dos atrasos do trânsito cotidiano até a carta de demissão as neuroses da tv, problemas da população os segredos escondidos durante a eleição carreiras políticas, políticos grileiros por tradição 42


E nois andando na linha, pagando com disciplina ou dando uma escapadinha Na verdade, cuidado na esquina, é tudo um castelo de cartas Nossa memória é saudosa maloca O próprio sistema é a manobra da massa Na luta de classes, o bloco que passa na rua deixa a pergunta: quanta custa a brincadeira? quem manda na jogatina? como tirar a sujeira da minha retina? Documentos históricos nos reportam ao contexto, sentimos muito e ficamos emudecidos a mente indaga o que fazer com tudo isso? Vou a mesa, abro o caderno, pego no lápis e aplico palavras e imagens no papel submisso ao meu querer... Eu quero a escolarização dos quartéis quero reverter a situação, mudar a direção, voltar S at e rás na decisão possível for, eu queria a desintoxicação, sem nenhum P re o s r í q d u uo no meu chão e o não dito me revolta, porque volta em mim, nódulo na garganta Quero P a esperança verde limão, pousando na corda bomba ujança no jardim e fartura no lanche das crianças Revertendo a carência, trazendo a bonança Victor Azambuja. Maio, 2024. Cuiabá Centro Geodésico da América do Sul


Mardem Pires é artista multidisciplinar e, graduado em Pedagogia pela Universidade Federal de Mato Grosso. Enfatizou suas pesquisas durante a graduação sob as especulações da arte enquanto recurso pedagógico para Educação. Tendo ao fim da graduação entregue em seu Dossiê uma pesquisa que utilizou o cinema como arte exemplo para ensino, formação e educação de estudantes e tambem para alfabetização. Ultimamente desenvolve projetos artisticos com outros artistas, amigos, professores e pesquisadores da arte, cultura e educação em/de Cuiabá. 44 Nascido em Pontes e Lacerda (Mato Grosso), vive em Cuiabá há 3 anos, onde cursa História e trabalha com artes divesas. É poeta e escritor, tendo publicado o livro "No Fundo do Eco" (2022), em formato digital e independente. Teve poemas publicados na revista de literatura Ruído Manifesto (2022), participou da Antologia Poética 1001 Poetas (2022). Realizou shows de declamação de poemas em eventos como sarau de poesia. Integra o núcleo de artistas da Revista JuMtos, publicando textos na revista nas edicões II, III, IV e V (2022-2023). Atua também como fotógrafo, filmmaker, ator e assistente de produção no grupo de teatro Kyvaverá, sediado em Várzea Grande (MT). Na área da fotografia e filmagem, atuou em projetos socioculturais que promoveram a cultura Hip Hop destinada a dependentes químicas e pessoas em situação de rua na cidade de Cuiabá.


seja marginal seja herói


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Fotografia: Tadeu Augusto


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