caderno
-diario
segundo semestre
2020
Este caderno-diário e seus conteúdos foram realizados por Lua Bonduki para a disciplina
AP299 – Atividades artístico-culturais II (2S-2020). Ele contém o registro de 10 das atividades culturais
realizadas durante o semestre que foram consideradas significativas para sua produção artística, anotações
feitas a partir das participação nas atividades e produções relacionadas a elas.
Peço que não reproduza esse material., de forma total ou parcial, para quaisquer objetivos.
21
set bumbo da samba
dia n°
192
tipo: videodocumentário
ano: 2003
roteiro, direção Mariana Valença, Ivi Vitoriano,
e produção: Priscila Fabi e Renata Pagliuso
tempo: 21 min
país: Brasil
notas
Busquei esse documentário porque queria lembrar uma parte meio esquecida da minha infância.
Queria lembrar como eram os pontos do jongo, dos sambas. Pelo menos um ou outro para poder
repetir e lembrar. Achei ele salvo no canal do meu pai, junto com os vídeos dele fazendo tambor
e da gente brincando de boneco de queixo.
É muito rico poder ter essas coisas registradas de alguma forma, ainda mais nesse curta-
metragem que além de registrar é documental e guarda alguns aspectos mais arquiváveis dessa
tradição que na verdade ainda é bem viva. Sinto que a quarentena começou a me trazer muitas
dessas memórias meio esquecidas, meio carcumidas e que são difíceis de lembrar, porque não
têm lastro. Estou fazendo o esforço de me relacionar com elas porque sinto que preciso.
eu pequena, de
saia rodada e
tiara de crochê,
com o bumbo
produto
futuro-raiz
nov 2020
desenho e pintura
sobre papel sulfite
07 in my room
out tipo: filme
ano: 2020
dia n° direção: Mati Diop
tempo: 20 min
208 país: França, Itália
notas
O filme é uma construção muito delicada e forte. É muito louco como essa filmagem de um
espaço, tanto visual quanto temático, tão contido e tão individual parece quase explodir essa
narrativa privada para o mundo público do cinema como representação precisa de uma vivência
de quarentena e, especialmente, de luto.
A possibilidade de criar algo tão forte com poucos recursos e numa montagem limitada pelo
arquivo e pela casa me inspira a olhar o meu arquivo de sons e vídeo. A provocação que surgiu com
esse curta para a criação de uma montagem no campo do audiovisual foi reforçada e modificada
frente a três outros filmes, que também aparecem nesse caderno: “Memórias que só existem
quando lembradas”, “Acordar do dia” e “Cemetery”. Decidi juntar a entrada desses quatro
filmes, apesar de anacrônico, para poder apresentar o projeto final com mais facilidade.
17 memorias que so
out existem quando
dia n°
218 lembradas
tipo: filme
ano: 2012
direção: Júlia Murat
tempo: 138 min
país: Brasil
notas
O filme de Júlia Murat tem muito do Brasil, de literatura e de Guimarães Rosa. Diz respeito
a essa rotina que é tão forte que torna-se ritual. Como em Sarapalha, de Guimarães Rosa, a
narrativa se faz quando a rotina é quebrada e essa quebra vai revelando essas memórias que só
existem quando lembradas.
Num contexto de isolamento e depois de muito tempo sem ler Guimarães, é muito forte pensar
nesse lado ao mesmo tempo belo, ritualístico e de confronto com medos atávicos que vem da
rotina e da quebra com ela. Junto com o “In my room”, me deixou com muita vontade de utilizar
meus arquivos de áudio e vídeo para fazer um curta metragem de quarentena que trate dessas
memórias afetivas e dessas coisas que existem só quando lembradas. Espero que até o dia da
entrega desse trabalho já tenha alguns minutos de curta pra poder apresentar.
15 acordar do dia
nov
dia n°
247
tipo: filme
ano: 2009
direção: Derli, Marilton, Juninha, Janaína,
Fernando, Joanina, Zé Carlos,
Bernardo e João Duro Maxacali
tempo: 32 min
país: Brasil
notas
Muito forte como questionamento dos nossos espaços públicos e privados; acentua as limitações
entre pessoas, mundo, olhares e espaços, criando um contraste entre a aldeia Tik’mu-un/Maxacali
e a cidade próxima. Enquanto no acordar do dia dos Maxacali a câmera flui entre espaços, as
pessoas se movem sem barreiras, as conversas começam pelos olhares e são leves, simples e
rápidas, quando vamos para a cidade as barreiras são quase visíveis. As distâncias são calculadas,
as interações são como um jogo e a diferença entre o privado e a violação do particular parece,
curiosamente, mais presente.
11 CEMeTERY
dez tipo: filme
ano: 2019
dia n° direção: Carlos Casas
tempo: 85 min
274 país: França, Reino Unido
notas
Cemetery é um filme único, claramente resultado de uma pesquisa extensiva. Talvez quem não
goste muito da prevalescência dos sons acima das imagens e da dificuldade às vezes de ver ou
entender o que está acontecendo odeie o filme. Tudo bem. Mas ignorando as dificuldades (porque
nem sempre precisamos ser espectadores mimados, os reis do mundo) temos uma história rica e
uma construção de ambiência maravilhosa e sensível. Parece quase uma história nostálgica, uma
memória afetiva de algo que ainda não aconteceu.
produto
2 fundamentals of
nov
dian° graphic design
234
tipo: curso teórico-prático online
oferecimento: CalArts
prof.: Michael Worthington
tempo: aprox. 21h
notas
Um curso muito rico e denso sobre Design Gráfico. Muito forte como inspiração para a
experimentação, uma experimentação com base e teoria. Foi um primeiro passo muito grande
na direção de entender melhor composição, cor, expressão, tipografia, etc. Sem o curso esse
caderno não estaria aqui dessa forma. Por isso, apresento como produto do curso a criação
e diagramação desse pequeno diário.
24 OFICINA DE ARTE
nov
POSTALdia n°
256
tipo: ação formativa de curta duração
teórico-prática
org.: FEIA
profa.: Isabela Jaha
tempo: 6h
notas
A adaptação da ação formativa ao ambiente virtual foi muito rica. Pessoalmente, senti que a
oficina me permitiu experimentar e criar de maneira mais livre, o que me ajudou a perceber alguns
aspectos importantes do meu processo de criação que pareciam estar um pouco bloqueados.
A oficina também apresentou um questionamento importante sobre a criação, participação e
existência de circuitos não-oficiais/institucionais da arte, que dispensam a curadoria e criam um
diálogo mais flúido e permeável para artistas diversos (de países, idades, culturas, formações,
poética, etc. diversas(os)).
Produzimos a partir da pergunta “o que é urgente para você, é urgente para nós?”, que, em
contexto de pandemia, ganha novos significados. Porém somente a segunda produção presente
nesse caderno usa esse questionamento como motivação.
produto
produto
ficha técnica
1
florescer e
tombar
nov 2020
pintura e corte sobre papel vegetal
+ recorte de folheto de tabaco e
desenho sobre papel triplex
2
erramos
(frente)
nov 2020
colagem, bordado, pintura e
desenho sobre papel triplex
28 ancestralidade
nov contemporanea nas
dia n°
261 artes visuais
tipo: webnário
org.: SP-Arte
convidadas: Hariel Revignet, Moara Tupinambá
e Ariana Nuala
tempo: 76 min
notas
Essa conversa formalizou e deu voz a algumas coisas que sinto. Num sentido muito forte,
parece que elas falaram pouco de arte, mas me parece que pra elas isso tem que ver com uma
relação muito forte entre arte e vida. Os símbolos, que são evocados na construção visual, validam-
se e se enchem de significado pela prática. A prática se torna uma chave essencial, muito forte
quando pensamos, como disse Hariel, que “somos os ancestrais do futuro”. Não adianta busca
espiritualidade e ancestralidade sem praticar a ancestralidade que se torna viva. A retomada não
faz sentido caso limitada à criação de símbolos vazios.
Elas também apontam a importância da criação e participação em coletivos, que permite
construir o novo e a prática ancestral do futuro. A língua entra como chave para a criação e ao
mesmo tempo limitante, dando espaço para a representação visual e outras línguas não-coloniais.
processo
produto
ficha técnica
1e 2
raiz (registros)
nov 2020
registros da planta e da
realização do díptico raiz
3e4
raiz
nov 2020
impressão de raiz com
guache sobre papel canson
(lados A e B)
30 Sharing crisis by
nov
dian° janani cooray
263
performances: “Corona Lockdown” e “My beautiful
world in lockdown time”
ano: 2020
artista: Janani Cooray
país: Sri Lanka
notas
As imagens das performances de Janani fazem parte de um grupo de 9 trabalhos performáticos
publicados dentro de um intervalo de 60 dias para a chamada “99 project Sharing Crisis”, de Qing
Cai. A maioria dos trabalhos da artista criados para esse projeto são muito fortes e interessantes.
Ressaltei aqui dois que me chamaram mais a atenção, em especial no que diz respeito à representação
do sufoco, das limitações e da relação com as telas e redes sociais.
Dialogando com essa forma de representação, elaborei o seguinte objeto escultórico como
relato da minha experiência na quarentena. A partir da noção de “enraizar para florescer” e
levando em conta a necessidade e importância de florescer, de exteriorizar, de crescer e de pensar
futuros, na representação ao lado é justamente a parte da planta que se projeta para fora da terra
que é encapsulada pelo emaranhado de linha vermelha, enquanto a raíz se projeta solta.
produto
produto
ficha técnica
1,2 e 3
casulo
dez 2020
registros fotográficos de
planta inteira (copa e
raiz) com copa encasulada
com um carretel de linha
vermelha para costura
17 mulheres
invisiveis
dez
tipo: sarau
dia n° ano: 2020
279 artistas: Beatriz LuMO, Mariana Schiezaro, Isabelly
Gonçalves, Bel Brentani e Lya Bueno
tempo: 86 min
país: Brasil
notas
Destaco desse evento maravilhoso a performance da Bel Brentani, que vai muito além do
tema do sarau e de encontro com um pensamento que tenho de forma recorrente. Para mim, ela
representa esse luto somado, recorrente, cada vez mais em uníssono, enquando entramos cada
vez mais fundo num momento interminável de pandemia. 200 mil mortos. Virar estatística. Luto
por gente que a gente ama, lembrança de gente que a gente conheceu. Muitas individualidades-
rio que se juntam, que se apagam e criam um Mar d’água.
Assitimos muita gente amada morrendo, mas assistimos também uma completa catástrofe em
saúde pública que nada tem que ver com aquelas duas pessoas que você conhecia bem e por
quem entrou em luto. Parece que vamos entrando em luto sem saber como sair, porque a estatística
é Mar e muito forte, muito niveladora.
A produção que escolhi para esse evento não foi feita pra ele mas dialoga com ele, na minha
opinião, num nível muito forte. Foi feita em Maio, quando eu ainda estava mais sensível a cada
rio desses que fluiu pra esse mar nada bonito, separada da minha família e doída de saudade da
minha irmã de menos de dois anos.
produto
maio de 2020
mai 2020
desenho e pintura sobre
papel sulfite