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O número 5 da ONE WORLD tem como temática principal "O Teatro". A edição de Verão foi apresentada no passado mês de julho, no Teatro do Bolhão, no Porto em mais um momento da nossa "Revista viva"

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Published by geral, 2017-09-18 11:02:32

ONE WORLD nº5

O número 5 da ONE WORLD tem como temática principal "O Teatro". A edição de Verão foi apresentada no passado mês de julho, no Teatro do Bolhão, no Porto em mais um momento da nossa "Revista viva"

Keywords: ONE WORLD,Teatro,Revista

PAULA GOMES DA COSTA

Head of Delivery, Paddy Power & International at Pad-
dy Power Betfair (Blip)

Presidente da Associação Porto Tech Hub

Para compreender como nasceu o grupo Paddy Power Bet- de Londres, dispersando o seu capital por um maior número
fair (PPB) e o sucesso que este actualmente detém no mun- de accionistas e ficando o seu valor sujeito à valorização do
do das apostas online, é necessário recuar no tempo até à mercado face à sua performance. Em linha com esta deci-
génese de ambas as empresas. são, o Exchange da Betfair foi e continua a ser o produto
premium da empresa, que desde o início optou por uma
A Betfair surge em 1998 pela mão do empresário britânico presença exclusivamente online. Com o passar dos anos e
Andrew Black, com base numa ideia revolucionária, mas o aumento da concorrência no mercado do online, na área
muito simples, de criar uma forma diferente de fazer apos- das apostas cruzadas, a Betfair foi diversificando a sua oferta
tas desportivas. Pretendia que os apostadores colocassem de produtos com outras áreas de apostas recreativas como
as suas apostas numa bolsa, dando a oportunidade a um o Sportsbook e Gaming, não tendo, no entanto, deixado de
ou vários indivíduos de apostarem contra ou a favor de inovar no Exchange.
uma posição, o que até à data só era possível às casas de
apostas. O novo conceito de “apostas em mercado aber- Já a PaddyPower teve a sua génese em 1988 na junção de
to” foi apresentado por Black a outro empresário britânico, várias empresas de lojas de apostas físicas que detinham
Edward Wray e os dois criaram uma empresa chamada The licenças para operar na Irlanda e no Reino Unido. Sem pre-
Sporting Exchange Limited, dando início ao desenvolvimen- sença online e com uma competição cada vez mais forte,
to da sua plataforma de apostas, que no ano 2000 estava três operadores de lojas, Stewart Kenny, David Power e John
pronta a abrir o seu novo site. Foi assim que nasceu a Be- Corcoran, decidiram juntar mais de 40 lojas para formar um
tfair. Em 2010 a Betfair submeteu-se a uma IPO na bolsa único grupo. O nome do grupo surgiu pela agregação do

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constelação.

Mais
do que um
sobrenome Power e a abreviatura grupo que vale cer- grupo. São eles a capitalização de uma

do nome Patrick, em Irlandês ca de 8 mil milhões de maior escalabilidade de recursos, o

“Paddy”, o nome do filho de euros, a PPB é pioneira aproveitamento de sinergias para

Corcoran. Paddy Power ce- fazer crescer a melhor oferta de

lebrava as suas raízes irlan- na qualidade da sua oferta cada uma das marcas e final-

desas. A postura da nova de mercado e na tecnologia. mente a optimização do posicio-

empresa no mercado ficou, Hoje, este gigante congrega namento de ambas as marcas

desde início, marcada pela cerca de 7300 colaboradores no mercado Britânico e Irlandês.

aposta numa maior visibili- espalhados por escritórios

dade e política de expansão em 16 países e pelas A área online da PPB tem sido, em

agressiva. Paralelamente à sua suas actuais 600 ambas as marcas, o canal com maior

presença física, a Paddy Power lojas. crescimento, desde a sua criação. O au-
apostou igualmente no crescimento das mento do número de smartphones e a aposta

apostas telefónicas. O seu crescimento foi con- imediata do grupo na disponibilização de Apps, nas

substanciado pela diversificação da sua oferta de produ- suas diferentes marcas, ajudou a incrementar a captação

tos e canais, pela agressividade e disruptividade das suas de novos utilizadores e a fidelização dos existentes. Ac-

campanhas de marketing e ainda pela aquisição de outras tualmente, 81% dos resultados do grupo têm origem no

empresas em novas geografias, como a Sportsbet na Aus- mercado online, estabelecendo como principal objectivo o

trália. crescimento deste segmento nos mercados onde já se en-

contra presente. Dos resultados provenientes dos diversos

Foi assim que em Fevereiro de 2016 surgiu o grupo PPB canais e marcas online, 79% derivam em exclusivo da área

resultante da fusão dos dois grupos - Paddy Power Plc e de mobile, sendo que 80% está exclusivamente afecto à

Betfair Plc - criando um dos maiores operadores mundiais oferta de apostas desportivas. Estes valores traduzem-se

de jogo e apostas desportivas para diferentes canais em no crescimento dos seus KPIs e nos resultados que o grupo

variadas geografias. Hoje, este gigante congrega cerca de PPB obteve em 2016, apesar do processo de fusão e de

7300 colaboradores espalhados por escritórios em 16 paí- todo o alinhamento que foi necessário fazer e ainda se en-

ses e pelas suas actuais 600 lojas. contra em curso.

O grupo PPB, espalhado por vários continentes, opera di- Mais do que um grupo que vale cerca de 8 mil milhões de
versos produtos com diferentes marcas para vários canais. euros (sujeito à variação do valor das suas acções) a PPB
Destacam-se o Sportsbook e Gaming da Paddy Power com é pioneira não só na qualidade da sua oferta de mercado,
presença online e em lojas físicas, o Exchange, Sportsbook como também na tecnologia, que lhe permite processar
e Gaming da Betfair só com presença online, o Sportsbook num dia mais transações do que as bolsas europeias to-
com exclusivo da televisão por cabo para corridas de ca- das numa semana. A inovação está presente na sua visão e
valos da TVG, o Gaming e o 4NJBets também da TVG nos nos seus valores, permitindo que os seus centros de com-
EUA e, finalmente, o Sportsbook da Sportsbet na Austrália. petência sejam a prova viva de como diferentes culturas e
A presença online de todas as empresas do grupo congre- competências podem acrescentar valor quando sustenta-
ga um universo de mais de 4 milhões de utilizadores. dos por uma visão comum e cimentados pela partilha dos
mesmos ideais.
Neste momento as grandes apostas estratégicas do gru-
po centram-se em três eixos que se espera que tenham, a O grupo irá continuar a apostar na tecnologia de ponta e
muito curto prazo, impacto nos resultados consolidados do na inovação dos seus produtos para alargar a sua base de

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Escritórios da Blip, Porto

clientes, garantindo, não só, propostas desafiantes para o fosse cada vez mais uma aposta de crescimento através da
mundo das apostas, como também um local em que se po- concentração num centro de competências.
tencia ao máximo o contributo de cada um dos seus cola-
boradores. Actualmente a Blip ocupa 5800m2 no centro do Porto, pos-
sui cerca de 300 colaboradores e é o centro de excelên-
Foi neste contexto que a Betfair adquiriu uma empresa se- cia de tudo que é desenvolvimento de apostas desportivas
diada no Porto em 2012. Inicialmente a Blip começou por para o grupo PPB, sendo que a totalidade do seu trabalho
fornecer serviços web à Betfair, assim como a outros gigan- se direcciona em exclusivo para a exportação.
tes do mundo digital como a Yahoo. No decurso da relação
comercial verificou-se que cada vez mais a Blip servia em Pode, assim, afirmar-se que o caso de sucesso das apostas
exclusivo a Betfair, tendo esta parceria culminado com a online do grupo PPB é não só o sucesso de o posiciona-
sua aquisição por parte da Betfair. Após este processo, a mento de uma marca, como também a vontade de alargar
tecnológica portuguesa rapidamente cresceu em número o grupo, procurando locais de excelência que possam con-
de colaboradores, passando de cerca de 30 para 150 em solidar a sua oferta internacional, beneficiando da multicul-
menos de um ano. A qualidade das entregas, a qualificação turalidade na partilha de valores e objectivos comuns, num
e know how dos recursos portugueses fez com que a inte- mundo cada vez mais global.
gração da Blip na Betfair e posteriormente no grupo PPB
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constelação.

Fotografia de VIP/Descobrir Press
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TenenteJosé António
// O ESTILISTA POR DETRÁS DO PALCO
POR CARLA CARAMUJO
Quis ser arquiteto, mas enveredou pela moda. Foi uma das grandes refe-
rências das nossas passerelles, mas trocou-as pelos palcos dos teatros.
Hoje, José António Tenente (JAT) cria essencialmente figurinos para espe-
táculos. Um universo onde põe a sua serenidade ao serviço dos autores e
dos personagens numa intensa e estimulante comunhão artística.

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constelação.

Tem noção de quando e porquê decidiu dedicar-se à moda? A partir de 2013 passa a dedicar-se quase em exclusivo à
criação de figurinos para espetáculos, deixou de ser feliz
Tenho que confessar que não consigo ter uma resposta mui- com a moda de autor?
to objectiva. Sem saber bem porquê, sempre gostei muito
de moda. Era miúdo e escolhia a minha roupa. No liceu, por Foi um processo gradual e agora estou, de facto, mais vo-
exemplo, lembro-me de desenhar roupa, às vezes até nas au- cacionado para a criação de figurinos para espectáculos,
las. Claro que temos que salvaguardar as devidas distâncias ficando no âmbito da moda dedicado a projectos especiais
entre o actual panorama da moda em Portugal e o que existia ou atendimento personalizado no Atelier JAT. Neste momento
no final dos anos 70, e o que na altura poderia saber sobre o não me revejo no ritmo desenfreado do mercado e nas “re-
que era ser estilista. A minha mãe sempre cuidou particular- gras” que se impuseram, em especial nos últimos anos. Cria-
mente do que vestia, eu acompanhava-a algumas vezes às tivamente deixou de fazer grande sentido para mim e daí a
provas na modista, via os ‘figurinos’… Talvez possa ter tido decisão um pouco mais radical de ter deixado de produzir,
alguma influência mas na verdade, quando penso nisso pare- comercializar e apresentar colecções. A criação de figurinos
ce-me uma teoria muito rebuscada… Os meus estudos foram sempre me interessou, e tive a sorte de cedo no meu per-
orientados para as ‘artes visuais’ a pensar em arquitectura, curso, ter tido a oportunidade de começar a experimentá-la,
curso que frequentei, mas não terminei. Comecei a interes- fazendo vários trabalhos paralelamente à minha actividade
sar-me cada vez mais pela moda e em 1984 decidi fazer um principal. Comecei em 1990 com o Rei Lear para o TEC Teatro
curso de design de moda, ainda com a intenção de conciliar Experimental de Cascais, nos anos seguintes colaborei com
as duas formações, mas depois ‘perdi-me’ e fui deixando a vários coreógrafos para o Ballet Gulbenkian, e em projectos
arquitectura de lado (risos). mais pontuais para a Escola Superior de Dança, para a Com-
panhia de Dança de Almada, para a Companhia Portuguesa
Em 1986 lança a sua primeira coleção e torna-se um dos de Bailado Contemporâneo, para o Teatro Maizum, entre ou-
mais conceituados criadores de moda em Portugal. Que tros. Tive um período, entre 2002 e 2008, no qual não trabalhei
avaliação faz da evolução do panorama da indústria da nesta área, fruto do enorme investimento criativo nas várias
moda no nosso país ao longo deste período? parcerias que fui estabelecendo em termos de moda e a par-
tir de 2009 voltei a colaborar na criação de figurinos. Encon-
Este é mesmo um daqueles casos em que a expressão 'passar tro-me actualmente a trabalhar na quadragésima produção
do oito ao oitenta' melhor se aplica. Portugal estava a dar os desde 2013, ano a partir do qual, tal como referiu, me dedico
primeiros passos pós-ditadura e várias actividades criativas quase em exclusivo a esta actividade.
emergiam em torrente. A moda de autor era um desses exem-
plos e os anos 80 foram muito férteis em iniciativas que de- A sua moda, as suas coleções de roupa sempre foram só-
notavam precisamente essa força criativa. Havia um enorme brias, elegantes, detalhistas, mas muito teatrais. Era o fu-
entusiasmo, associado a algum amadorismo e até inconsciên- turo que já se evidenciava?
cia, e com ele uma quase miríade de propostas e projectos.
A actividade profissional actual, com o nível de formação su- Possivelmente os meus gostos levaram-me a ver nesta área
perior, as profissões específicas em torno da moda, a própria da criação uma quase óbvia alternativa, com vários pontos
imprensa da área, foram aparecendo e desenvolvendo-se ao em comum entre elas, e podendo assim utilizar a minha ex-
longo dos anos. A oferta do mercado também sofreu uma evo- periência e conhecimentos adquiridos ao longo do meu per-
lução brutal, do quase nada, ao quase tudo; das cadeias de curso. Sempre gostei muito das artes de palco, teatro, ópera,
consumo generalizado ao luxo, com as opções e o papel do música… muitas das minhas colecções, desde logo a primei-
consumidor a alterarem-se radicalmente. A moda de autor é ra, foram por elas inspiradas. O lado teatral de histórias, per-
hoje uma realidade florescente, que no entanto, e posso estar sonagens, a literatura, a pintura… sempre fizeram parte das
equivocado nesta opinião, infelizmente continua a apresentar minhas referências e, actualmente, são elas próprias a fonte e
uma maturidade criativa largamente superior à sua implemen- objecto do trabalho.
tação no mercado.

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Enquanto designer de moda, o JAT era o líder da sua equi- Com a crise económica que, quase sempre, assola o mun-
pa. Na criação de figurinos para espetáculos, o JAT é mais do das artes do espetáculo, imagino que não seja o dinhei-
um membro de uma equipa. Numa época de busca de po- ro o que o impele a dedicar-se à criação de figurinos. O que
der e em que o sucesso é medido pelo “lugar ao sol” que mais o atrai neste processo?
se ocupa, o seu percurso parece ser o inverso. Há uma
razão para tal? São vários os pontos de interesse… desde logo as obras, au-
tores, compositores e depois todas as potencialidades ineren-
Apesar de adorar praia, esse tal “lugar ao sol” nunca foi a mi- tes a trabalhar com equipas artísticas tão diferentes entre si.
nha motivação (risos). Fui percebendo e tomando maior cons- A multiplicidade de leituras e de personalidades criativas, é
ciência que uma das componentes do trabalho era também fascinante. O poder da criação é muito estimulante e é muito
uma certa “exposição solar”, mas sempre a pratiquei com mo- intenso estar por dentro de todo o processo da construção
deração. Daí que não pense muito sobre o assunto, nem se- de um espectáculo e poder fazer parte dele. Muitas vezes,
quer tenha a noção desse trajecto. É certo, que com a minha os projectos desenvolvem-se em simultâneo, ou com grande
actividade actual, essa exposição e até mediatização, é muito proximidade, e tenho a oportunidade de trabalhar em univer-
mais reduzida, mas não foi de todo fruto de uma procura ou sos muito distintos em dimensão, género, exigências, especi-
necessidade objectiva. ficidades e até intérpretes, obrigando-me a uma diversidade
de respostas também muito diferentes.

“A moda de autor é hoje
uma realidade florescente,
que [...] infelizmente conti-
nua a apresentar uma ma-
turidade criativa largamente
superior à sua implementa-

ção no mercado.”

La Bayadere, 2016.
Fotografia de Bruno Simão

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constelação.

Afastou-se das passerelles, mas manteve as linhas de especificidades técnicas são inúmeras, muito mais rígidas
acessórios, eyewear, perfume, escrita. São linhas rentá- e condicionam de um modo mais evidente alguns aspectos
veis ou apenas porque lhe dá prazer esta criação? da criação. Noutras linguagens, contemporâneas, se a pro-
posta for interessante mas causar algumas interrogações,
Esses projectos correspondem a parcerias que existem há já posso ouvir, por exemplo, “deixa ver, podemos também
vários anos, que têm as suas próprias produções, comercia- adaptar o movimento a essa imagem, é uma questão de
lizações e distribuições, com um percurso no mercado e faz experimentar”.
sentido mantê-las. Apesar das transformações do mercado,
pode continuar a existir lugar para essas linhas e, por outro A dança, mais uma vez, foi a arte performativa que se-
lado, as suas concepções criativas são mais específicas e lecionou para a sua mostra na exposição “Vestir hoje
controladas. o teatro e a Dança – novos criadores portugueses nos
palcos de Lisboa” patente no Museu Nacional do Teatro
A dança é uma das suas artes favoritas. Criar figurinos e da Dança. Como planeou esta exposição? Considera-a
para bailarinos é seguramente um enorme desafio pela um ponto de chegada ou um ponto de partida?
exigência de liberdade de movimentos. Como é que gere
esta “restrição” à sua inspiração? Há algum bailiado que A minha participação nesta exposição colectiva resultou de
o tenha marcado mais do que qualquer outro por esta um convite do Museu e da Lisbonweek e pareceu-me inte-
exigência? ressante apresentar exemplos do meu trabalho para dança,
precisamente pelo Museu do Teatro ter também passado a
A verdade é que a liberdade criativa tem sempre algumas ser da Dança. A seleção que fiz recaiu em alguns trabalhos
condicionantes e quando estamos a criar figurinos, quer que desenvolvi para a Companhia Nacional de Bailado,
pelo trabalho de ensaios ou pelas indicações do coreógrafo, porque representa várias linguagens, estilos e inspirações.
vamos vendo que tipo de acção irá estar em causa. Pode até Do universo mais clássico de La Bayadère, às geometrias
acontecer que o objectivo seja precisamente condicionar o modernistas de Lídia, passando pela intemporalidade de
movimento. As minhas experiências com o bailado clássico Du Don de Soi ou pela construção fragmentada de Turbu-
talvez tenham sido a esse nível das mais exigentes, já que as lência.

Du don de soi, 2011
Fotografia de Fernando Guerra

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“A multiplicidade de leituras e de
personalidades criativas, é fascinante. O poder da criação é
muito estimulante e é muito intenso estar por dentro de todo
o processo da construção de um espectáculo e poder fazer

parte dele.”

Há alguma peça, bailado ou ópera em par-
ticular para o qual gostasse de criar figuri-
nos? Algum encenador em particular com
quem gostasse de trabalhar?
Na verdade, tenho tido a sorte de ter vários
convites e desafios que me têm preenchido
bastante. No entanto, ando com muita vonta-
de de desenvolver um projecto que me permita
uma maior construção, estilização e talvez até
uma maior sofisticação. Uma grande produção
de ópera não era nada má ideia. Se fosse bar-
roca então...(risos).

O Lago dos Cisnes, 2013.
Fotografia de Fernando Guerra
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editorial.

//3

em o´ rbita

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em órbita.

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micaela miranda

// O TEATRO COMO LIBERTAÇÃO

POR MANUELA CARAMUJO

Escolheu viver num campo de Refugiados na Palestina porque sabe que faz a diferença.
Pela sua escola de teatro já passaram três gerações de jovens que trocaram a violência pela
arte e dão o exemplo nas suas comunidades.

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em órbita. entre os palestinianos, no campo de refugiados de Jenin,
para ajudar sobretudo as crianças e jovens a ultrapassar
Sempre quis ser atriz, trabalhar no mundo do teatro ou foi situações traumáticas através da arte e do teatro. Foi ini-
algo que se impôs naturalmente? cialmente destruído durante a invasão israelita de 2002 e
reaberto em 2006 por Juliano, filho de Arna. O TFT vive dos
Não exatamente. Sempre me interessaram os direitos hu- seus projetos e do apoio de diversas fundações interna-
manos e as causas. Acho que comecei pelos 14 -15 anos, cionais e dos diversos grupos de amigos que existem pelo
quando fundei a delegação regional da Amnistia Internacio- mundo. Em Portugal, a presidente da Associação dos Ami-
nal em Santa Maria da Feira, com uma amiga. O Teatro, a gos do Teatro da Liberdade da Palestina é a atriz Maria do
sério, surge aos 18 anos, quando fui para o curso na Aca- Céu Guerra. Somos uma organização palestiniana e tam-
demia Contemporânea do Espetáculo, no Porto. Nunca quis bém uma ONG de direito sueco, registada na Agência Inter-
ser uma atriz no sentido comercial do termo. Nunca me in- nacional para o Desenvolvimento e Cooperação da Suécia.
teressou fazer castings para telenovelas, ou afins. Sempre Recebemos apoio também da União Europeia.
procurei o Teatro como forma de intervenção, de libertação
interior das pessoas, saber o que o teatro pode fazer pela É a diretora pedagógica da escola profissional do The
sociedade e não tanto como a forma tradicional de entreteni- Freedom Theatre. Sente que faz a diferença com os jo-
mento. Por isso, após o curso, senti a necessidade de fazer vens palestinianos?
uma especialização e fui para Paris para a Escola Interna-
cional de Teatro Jacques Lecoq e “descobri” o teatro físico. Sim, claro. Sinto-o todos os dias. Já são três gerações de
jovens que vejo a formarem-se no TFT. Os resultados do
Como é que chega à Palestina? nosso programa são preciosos e com grande impacto nos
indivíduos, mas também frágeis pois estamos a falar de
Numa sucessão de acontecimentos. Depois de Paris fui para combater a ocupação e a desumanização. Por vezes, coi-
o Sul da Irlanda (país que esteve muitos anos sob ocupação sas que nos levam 3 anos a construir, podem ser destruídas
inglesa). Aí, com uma amiga, fazia uma recolha de estórias em cinco minutos, com uma demolição ou alguém ser preso
das pessoas em irlandês que depois encenávamos e foi ao pelo exército. No entanto, é um trabalho muito recompensa-
fazer a pesquisa para essa encenação que, numa revista, li dor pelo impacto direto da vida dos jovens. Os nossos alu-
sobre o The Freedom Theatre (TFT) e o trabalho que faziam nos dão-nos muito feedback das suas vidas. Por exemplo,
de resistência cultural à ocupação israelita junto da comuni- aqui, as famílias vivem todas juntas numa mesma divisão ou
dade local. Nomeadamente, lembro-me que o artigo falava quando existem várias, como há muitos filhos, eles partilham
de uma rapariga que queria ser mártir, participar numa ope- o quarto com vários irmãos e os nossos jovens começam a
ração suicida, e ao entrar para o teatro aprendeu a canalizar perceber o importante que é ter um quarto só para eles, um
a sua “raiva” para a resistência pacífica através da arte. Era espaço onde se possam isolar e ter um momento só deles.
“a minha cara”. Por essa altura, umas colegas de Paris, is- Outro tipo de mudança que vemos é o conceito de liber-
raelitas, contactaram-me para ir fazer uma substituição numa dade, fazê-los entender que liberdade e responsabilidade
peça, que era uma sátira sobre o exército israelita que seria são valores que caminham juntos, que quando falamos de
representada em vários festivais em Israel e na Europa. Fui, liberdade falamos de ser responsáveis pelas nossas ações.
estávamos em 2008, encontrei-me com o Juliano, diretor do Quando os jovens chegam pela primeira vez à escola dão
TFT, que estava justamente a criar a escola profissional do sempre desculpas por chegarem atrasados ou por não fa-
teatro e precisava de alguém com a minha formação. Fiquei zerem as suas tarefas ou são incapazes de receber críticas
e conheci o Nabil, que se tornou meu marido em 2009 e te- construtivas, etc, com o tempo, vemos o avançar para uma
mos 2 filhas, nascidas em Jenin. personalidade que é mais construtiva, admitirem os seus er-
ros e, portanto, abrirem espaço para melhorar. Cresce um
Fale-nos do The Freedom Theatre. O projeto original e sentimento de escuta. E tudo isto, através do teatro.
como sobrevive.

O TFT foi criado logo após a primeira Intifada, em 1987, por
uma israelita Arna Mer Khamis que escolheu viver e trabalhar

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A sua forma de fazer teatro é uma arte social, interven- Foi bem recebida pela comunidade local?
tiva, de libertação. Como é que convive este princípio
numa sociedade tão tradicional como aquela em que se Sempre. Sempre fui muito bem recebida. Quando che-
insere? guei, as crianças dirigiam-se a mim em hebraico, pois
como estrangeiros só concebiam os israelitas, agora já me
É preciso não esquecer que nós estamos inseridos numa abordam em inglês. Aliás, pelo facto de ser mulher vou a
sociedade não só conservadora, mas uma sociedade que locais que normalmente são vedados aos homens e pelo
sofre com a ocupação, daí o conservadorismo e a pobreza, facto de ser estrangeira vou a locais que são vedados às
todos estes elementos sociais que contribuem para uma ra- mulheres. Eu costumo dizer que desenvolvi 2 cérebros:
dicalização. Nós alimentamo-nos deste facto. É mais fácil um português e outro palestino e que, por vezes, eles são
identificar o despotismo e o conservadorismo quando es- contraditórios entre si. Por viver onde vivo, isto é uma faci-
tes são mais extremos e quando são os próprios jovens a lidade, mas também é uma grande responsabilidade.
sofrer esse conservadorismo. É a nossa grande fonte de
inspiração, ao mesmo tempo que impõe limites à nossa
criatividade. E ter limites na criação é bom para a própria
criatividade.

“Numa revista, li sobre o The Freedom Theatre [...]. O artigo falava de
uma rapariga que queria ser mártir, participar numa operação suici-
da, e ao entrar para o teatro aprendeu a canalizar a sua “raiva” para a

resistência pacífica através da arte.
Era “a minha cara”.”

Fotografia de The Freedom Theater
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em órbita. autoridades reconhecem que nós somos uma instituição
de resistência não violenta, pelo que sofremos apenas as
Tem muitas alunas raparigas? Como é que elas transpor- represálias normais que todos os palestinianos sofrem no
tam a exposição do palco para as suas vidas de todos dia-a-dia.
os dias numa sociedade onde a mulher tem um papel
subalterno? A Micaela vive num campo de refugiados, onde as con-
dições de vida estão muito longe de ser as melhores.
Sim, é aí que o teatro é tão importante. Já temos muitas alu- Há gerações de palestinianos a viver nessas condições.
nas a servirem de exemplo nas suas comunidades. Não for- Como é viver num lugar assim?
çosamente como atrizes, embora algumas sim, mas como
veículo de consciencialização e de mudança, da diferença Atualmente vivo a 1 km do campo. O seu limite foi estabe-
que faz a educação. Lembro-me recentemente que uma alu- lecido pelas Nações Unidas, embora seja muito relativo. O
na escreveu e encenou uma peça, onde aparecia com um campo de refugiados tem 1km2 e 17 mil pessoas. As cons-
pássaro numa gaiola e onde ela falava com o pai, que era truções são muito encaixotadas, muito juntas, precárias. Um
o pássaro, e lhe dizia que não concordava com o que ele dos grandes problemas é a água. Onde eu vivo não temos
esperava de si, que não queria ser como ele dizia e aca- água. Temos uns reservatórios no cimo da casa e compra-
ba a explicar ao pai que ele é que está prisioneiro da sua mos a água a umas pessoas que vêm cá encher com ca-
própria condição. As mulheres que estavam no púbico ova- miões. Jenin tem muitas reservas de água, mas a população
cionaram-na de pé. A atriz, no final, veio-me dizer que tinha está impedida de cavar para a obter. Se alguém for apanha-
sentido uma grande responsabilidade porque entendeu que do, esse local é imediatamente tapado com cimento. São
estava a dar voz a mulheres da sua sociedade que viviam o os israelitas que têm acesso aos lençóis freáticos, que a
mesmo que ela, mas que nunca se tinham podido expres- levam para Israel e depois revendem à Autoridade Pales-
sar e que, se calhar, algumas, até aí, nem nunca teriam tido tiniana que por sua vez revende a estas pessoas a quem
consciência disso. Isto é muito importante. nós compramos. Ou seja, a água chega-nos três vezes mais
cara do que deveria. O meu marido quando vai a Portugal
Como é que as autoridades locais (palestinianas e israe- e vê todos os nossos rios e lagos não entende onde é que
litas) veem o seu trabalho? está a crise no nosso país, pois somos tão ricos em água!

Isso terá de lhes perguntar a eles (risos). Temos uma relação “Um dos grandes proble-
muito diplomática com a Autoridade Palestiniana. Este foi o mas [do campo de refugia-
primeiro ano em que tivemos um acordo com o Ministério da dos] é a água. Onde eu vivo
Cultura Palestiniano que financiou uma tournée pela Cisjor- não temos água. [...] O meu
dânia. Devo dizer que a Autoridade Palestiniana está numa marido quando vai a Portu-
posição muito ingrata pelos Acordos de Oslo (que procla- gal e vê todos os nossos rios
mam um Estado israelita desde o Mar Mediterrâneo até ao e lagos não entende onde
Rio Jordão) que a obrigam a fazer e não fazer um determina- é que está a crise no nosso
do número de coisas e que a obriga de certa forma, não só país, pois somos tão ricos
por pressão israelita, mas também por pressão internacio-
nal, a implementar o plano sionista. Infelizmente. Portanto, a em água!”
nossa relação com a Autoridade Palestiniana é diplomática,
mas independente porque não concordamos com a imple-
mentação desse plano. Como somos uma ONG temos mais
liberdade, nesse sentido. Quanto às autoridades israelitas,
lembro-lhe que nós estamos situados na zona A, zona de
controlo da Autoridade Palestiniana, mas tivemos muitos
conflitos com o exército israelita que chegou a partir-nos os
vidros, vir prender pessoas do nosso teatro durante a noite,
enfim. As autoridades israelitas - não digo os israelitas - as

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É uma mulher corajosa. Nunca tem medo? Nunca receia Fotografia de The Freedom Theater
pelos seus?

Claro que sim. Mas esses receios também os tenho em Por-
tugal, por exemplo. São inerentes à condição humana. Tive
medo quando prenderam o meu marido, em 2012, e estive
15 dias sem saber dele, onde é que estava, sob que acusa-
ção, e andei “a fazer piscinas” entre as autoridades israe-
litas e palestinianas, à procura dele. Valeu-me o saber ver
o humor das situações e a ajuda da comunidade de Jenin.

Há algum projeto em particular que gostasse de desen-
volver?

Além de todos os projetos da escola do TFT, sou membro da
PLL (Palestinian Laughter Liberation) o Riso como Liberta-
ção, uma companhia de teatro cómico criada por ex-alunos,
sempre no princípio da resistência pacífica, mas levando
as pessoas a consciencializarem-se da sua situação. Num
futuro, faz parte do nosso plano de desenvolvimento profis-
sional da nossa escola, acreditar o nosso curso de “Inter-
pretação, Criação Coletiva e Cultura da Resistência” como
curso superior e para tal candidatei-me a um Mestrado no
Reino Unido, para o qual acabo de saber que a Fundação
Calouste Gulbenkian me concedeu uma bolsa de estudo, o
que torna tudo possível.

Fotografia de The Freedom Theater
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editorial.

//4

do mundo

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do mundo.

REINO UNIDO

// QUATRO PAÍSES, MIL ENCANTOS.

POR MARIA MARTINS
Prepare o seu chá preferido e desfrute de uma surpreendente viagem
pelo reino dos castelos e dos cavaleiros da távola redonda. Um reino de
inúmeras lendas e mistérios repleto de paisagens encantadoras e lugares
mágicos. Um reino que nos cativa pela sua História e grandiosidade, onde

a aventura não tem limites. Viaje connosco até ao Reino Unido.

70 | ONE WORLD | nº 5 | Julho 2017

Castelo de Eilean Donan,
Terras Altas escocesas.

Ainda que os termos Reino Unido, Grã-Bretanha e Inglaterra como chefe de governo, o Primeiro-Ministro. O poder executi-
sejam muitas vezes utilizados de forma incorreta enquanto vo é assegurado pelo Governo de Sua Majestade, atualmente
sinónimos, são na realidade conceitos distintos: o primeiro é a Rainha Isabel II. O monarca em exercício convida o membro
um estado soberano, o segundo uma ilha e o terceiro é par- da Câmara dos Comuns em melhores condições (normalmen-
te de uma ilha. O Reino Unido é um estado independente da te o vencedor das eleições) a formar governo em seu nome.
costa noroeste da Europa, composto por quatro países: In- Assim, as funções do monarca são meramente representati-
glaterra, Escócia, Gales e Irlanda do Norte, que ocupa a ilha vas, embora a sua figura seja absolutamente respeitada en-
da Grã-Bretanha e a Irlanda do Norte. Assim, Grã-Bretanha quanto figura de autoridade, união e estabilidade do país.
é o nome dado à ilha principal que compõe o Reino Unido e
que, por sua vez, é constituída por três regiões autónomas: Em termos económicos, o país representa a segunda maior
Inglaterra, Gales e Escócia. economia da Europa, com 2,37 mil biliões de euros de PIB
(cerca de 13 vezes o valor português), atrás da Alemanha,
O Reino Unido é uma das mais antigas democracias eu- com 3,13 mil biliões de euros em 2016, segundo dados do
ropeias, estando os direitos do povo estabelecidos desde PORDATA. Londres em particular, é considerada, juntamente
os tempos da Magna Carta (século XIII). Enquanto monar- com Nova Iorque e Tóquio, uma das praças financeiras de re-
quia constitucional, tem como chefe de Estado o monarca e ferência do mundo.

Julho 2017 | nº 5 | ONE WORLD | 71

do mundo. Aterre diretamente em Londres e deixe-se envolver pela
História, cultura e arte que a cidade tem para lhe oferecer. A
À descoberta do Reino Unido: um roteiro cerca de 50 minutos, faça uma paragem em Windsor, uma
Se quer partir à descoberta do que o Reino Unido tem para pequena vila tipicamente inglesa que alberga o mais antigo
lhe oferecer, este artigo foi escrito a pensar em si. Deixa- castelo habitado do mundo, o Castelo de Windsor, que dá o
mos-lhe algumas sugestões de “paragens obrigatórias” nome à atual dinastia reinante. Continue a viagem e deixe-
numa viagem que se inicia em Inglaterra, passando por Ga- -se perder pelas ruas de Oxford, onde podemos encontrar
les, pela Escócia e termina na Irlanda do Norte. a universidade mais antiga da Grã-Bretanha e que serviu
de palco para várias cenas dos filmes da saga Harry Potter.
Colina de Edimburgo com o Castelo ao fundo, Ainda em Inglaterra, apaixone-se por Bath, Património Mun-
Escócia dial da Humanidade, mundialmente conhecido pelas suas
termas romanas e pelo Royal Crescent, um conjunto de edi-
fícios georgianos de arquitetura inigualável.

Está na hora de seguir viagem até ao País de Gales, terra
tradicionalmente associada ao príncipe herdeiro britânico.
A aproximadamente 01h20 de Bath encontramos Cardiff, a
capital deste país e porta de entrada para muitos outros lo-
cais maravilhosos como o castelo de Caerphilly.

Regressando a solo inglês, faça uma paragem em Liver-
pool. Aqui, é impossível não se deixar contagiar pela magia
dos The Beatles, um dos grupos musicais mais bem-suce-
didos e aclamados da música do século XX. Manchester,
berço da Revolução Industrial, a menos de 50 minutos de
Liverpool, é outro sítio a não perder, quer seja pelo Museu
do Futebol do Manchester United para os adeptos deste
desporto ou pela grandiosa Catedral da cidade.

Parta agora à descoberta da Escócia. Não pode perder
Edimburgo, capital do país e um dos melhores sítios para
conhecer a sua História, no Museu da Escócia. Nesta ci-
dade não pode perder o Castelo de Edimburgo, a fortaleza
mais atacada da história do Reino Unido, que hoje alber-
ga as joias da coroa escocesa, entre muitas outras estó-
rias sangrentas por contar. No outro extremo da Royal Mile,
a principal via do centro histórico da cidade, encontrará o
parlamento escocês e o palácio de Holyrood, residência ofi-
cial da Rainha na Escócia. Não deixe de se deleitar com os
vários Bagpipe Players (tocadores de gaitas de foles) nas
esquinas de Edimburgo e saboreie um whisky nesta cidade
fortemente ligada à fantasia e estórias medievais. Conheça

72 | ONE WORLD | nº 5 | Julho 2017

também Glasgow, a maior cidade da Escócia e centro nev- (Exército Republicano Irlandês). Belfast foi também o local
rálgico da indústria do país. Por fim, não perca as Highlands de construção do Titanic, um dos mais célebres navios do
(Terras Altas), com todos os seus lochs (lagos), paisagens mundo. Fora da capital, tire pelo menos um dia para fazer a
verdes a perder de vista e castelos medievais, símbolos re- tour pela Calçada dos Gigantes no Norte do país, onde pode
sistentes do antigo sistema de Clãs, que vigorou até à Bata- descobrir inúmeras falésias, cavernas ou estradas cénicas.
lha de Culloden, em 1746.
Ao apanhar o voo para Portugal, pense em todas as coisas
Chegou a altura de visitar a Irlanda do Norte. Comece por maravilhosas que o Reino Unido ainda tem para lhe oferecer.
Belfast, capital do país, uma cidade ainda muito marcada e Há muitos mais sítios para visitar e inúmeros lugares mági-
amargurada pelo passado conturbado dos tempos do IRA cos por (re) descobrir. Quando pensa voltar?

Câmara Municipal de Belfast,
Irlanda do Norte

Guardas ingleses no Castelo de Windsor Uma das estradas que conduzem à
Inglaterra Calçada dos Gigantes, Bushmills, Irlanda do Norte

Julho 2017 | nº 5 | ONE WORLD | 73

do mundo.

Le oontedarteros

// UM BINÓMIO LUCRATIVO

POR MANUELA CARAMUJO

Os teatros londrinos do West-End, em 2016, renderam ao erário britânico
mais de 107 milhões de libras esterlinas. Na noite de 26 de Dezembro bateu-
-se um novo record: 439.109 espetadores assistiram a um espetáculo na ca-
pital inglesa. A cultura como indústria de sucesso na pátria de Shakespeare.

74 | ONE WORLD | nº 45 | MJualhrçoo22001177

Julho 2017 | nº 5 | ONE WORLD | 75

do mundo. Uma viagem a Londres não é viagem sem uma ida a al-
gum dos muitos teatros da cidade. Se no ano passado,
Prince Edward Theatre, Londres recebeu 37,3 milhões de turistas, 14,3 milhões
Londres passaram por uma das 53 salas do bairro londrino de
76 | ONE WORLD | nº 5 | Julho 2017 West-End e arredores. Os bilhetes para espetáculos em
2016 renderam à indústria mais de 644 milhões de libras
esterlinas (cerca de 739 milhões de Euros) e as finanças
inglesas arrecadaram com isso mais de 107 milhões de
libras (cerca de 122 milhões de Euros) em IVA.

Se os 14,3 milhões de espetadores representaram uma

diminuição de 2,81% em relação ao número de espetado-

res de 2015, o nível dos preços não se viu ameaçado. Pelo

contrário, em média, cada espetador pagou £45 (52€)

para assistir a um espetáculo, mais 4,68% do que

no ano anterior, mas os preços podem ir

Em 2016, Londres de £15 (17€) a £200 (230€). De uma
recebeu 37,3 milhões forma geral, é mais barato assistir
de turistas, dos quais14,3 a uma peça de teatro, cerca de
milhões passaram por uma £33 por performance, do que

das 53 salas do bairro londri- a uma ópera ou um musical,

onde os preços rondam as
no de West-End e arredores. £45.
Os bilhetes para espetáculos
renderam à indústria mais The Mousetrap (A Ratoeira), a

de 644 milhões de libras peça de Agatha Christie, no St

esterlinas. Martin’s Theatre desde 1952 é,

sem dúvida, a mais longa produção

do West End em cena e, portanto, um

dos espetáculos mais procurados. Já conta

com mais de 26 mil apresentações e até a Rainha Isabel

II esteve entre os espetadores. Além do seu final inespe-

rado, a peça tornou-se famosa pelo facto do público ser

convidado a não revelar o assassino ao sair do teatro para

não estragar o efeito às futuras plateias. O nº 2 do Top 20

dos espetáculos mais vistos é o musical Les Misérables,

desde 1982, em cena no The Queen’s Theatre, com cerca

de 13 mil performances, seguido de muito perto pelo Fan-

tasma da Ópera, no Her Majesty’s Theatre, desde 1986.

Curiosamente, na sétima posição surge um musical da

Disney, O Rei Leão, que todas as noites, desde 1999, faz

vibrar a sala do Lyceum Theatre.

Os musicais são, de longe, os espetáculos mais procu-
rados com mais de 8 milhões dos espetadores de 2016

e gerando mais de 400 milhões de libras (459 milhões de de época pode ser visitado e experimentado através da
Euros) de receitas. Seguem-se as peças de teatro com 4 mi- muito realista “Shakespeare Globe Exhibition and Tour”.
lhões de assistentes e mais de 150 milhões de libras (172
milhões de Euros) em entradas. Os espetáculos de ópera e Saindo do Globe, não há como falhar uma visita à Tate
dança são o único género que apresenta um decréscimo no Gallery e continuando o passeio sempre pela margem sul
número de espetadores, pouco mais de 2 milhões, menos do Tamisa, encontramos o National Theatre. Uma instituição
15% que em 2015, com as receitas a rondarem os 91 milhões entre os jovens talentos. Tratando-se de um teatro subsidia-
de libras (104 milhões de Euros). do, aposta em autores pouco conhecidos que começam por
se apresentar neste palco e daqui são catapultados para o
No ano em referência, realizaram-se 17.881 performances West-End ou mesmo a Broadway, em Nova Iorque, como
em Londres, das quais 276 corresponderam a novas pro- aconteceu com Cavalo de Guerra baseado no romance de
duções. Os números são da Society of London Theatre que Michael Morpurgo.
reúne os proprietários, produtores e managers dos teatros
do West-End. Este mítico bairro que se estende das famo- E como para alimentar todos estes palcos são precisos ar-
sas Leicester Square, Shaftesbury Avenue, Covent Garden, tistas, a capital do Reino Unido conta com 35 escolas su-
Oxford Circus até Charring Cross, alberga desde teatros gi- periores de teatro e artes performativas que atraem anual-
gantescos como o Apollo Victoria Theatre com 2300 lugares mente alunos do mundo inteiro. Destas sairão as estrelas
até salas ditas íntimas como o Arts Theatre com apenas 350 vindouras.
cadeiras.
As receitas desta indústria cultural são apenas um dos in-
Mas nem só no West-End há teatros. A margem sul do Tami- dicadores do sucesso. Nas palavras de Caro Newling, pre-
sa é a casa de William Shakespeare. O mais célebre autor sidente da “Society of London Theatre”, “o que mais nos
inglês de todos os tempos tem o seu palco no Shakespeare
Globe: uma recriação moderna do teatro que o próprio diri- orgulha é que as novas gerações de espetadores de teatro
gia no século XVI. Essencialmente apresenta as criações são atraídas para a capital, lar do maior talento criativo
“shakesperianas” e de seus contemporâneos, numa do mundo, pela nossa capacidade incomparável de
temporada que se estende de Abril a Setembro. Fora criar e contar histórias que marcam”. E com as histó-
rias cresce a cultura das massas e dinamiza-se a
economia de um país.

Cavalo de guerra,
ExPirbiindcoenEodRwoayrdalTNhaetaiotrnea, l Theatre

Londres

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editorial.

//5

esse^ ncia

78 | ONE WORLD | nº 5 | Julho 2017

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essência.

80 | ONE WORLD | nº 5 | Julho 2017

MElisaatboetse
// O LEGADO DE UMA VIDA
DEDICADA À GRANDE ÓPERA

POR CARLA CARAMUJO

Após 30 anos de uma carreira internacional brilhante, a Diva portugue-
sa, é uma mulher realizada e serena, que se renova no refúgio de uma
infância feliz e vê no ensino uma dádiva recíproca e a oportunidade de
passagem de testemunho.

O canto nasceu consigo ou foi um “chamamento”?
Nasceu comigo, aínda que de uma maneira inconsciente. Tenho familiares ligados à
música, à banda e às tradições musicais portuguesas. Oiço música desde criança. A
minha primeira audição não vem dos discos mas sim da banda. O meu pai era trom-
petista e lembro-me perfeitamente de ouvir desde cedo a abertura do Barbeiro de
Sevilha e do Tannhäuser. Sempre gostei imenso de cantar e desde muito nova, apesar
de tímida, no que tocava a interpretar ou exteriorizar assumia uma faceta extrovertida.
No final dos jantares, o meu avô pedia-me que subisse a um banquinho. “Canta que
depois no final dou-te 5 tostões”, dizia. Mas era tudo absolutamente inconsciente, até
porque, quando decidi ir para o conservatório, escolhi violino, o instrumento do meu
coração. Só mais tarde surgiu o interesse em educar a voz, à medida que os estudos
avançavam e o gosto pelo canto aumentava.

Julho 2017 | nº 5 | ONE WORLD | 81

essência.

Saiu da sua Terra Natal, Caldas das Taipas (Guimarães), Refere-se à sua profissão como um sacerdócio. Em que
aos 18 anos para estudar canto em Madrid. O que a moti- medida?
vou e o que procurava nessa mudança?
O sacerdócio a que me refiro é a entrega e dedicação to-
Quase por intuição e também com um misto de inconsciên- tal, de coração, e a fé que se deposita no arrancar de uma
cia, sentia que tinha de procurar algo mais, como se tivesse carreira, na música e em cada uma das personagens. Para
chegado ao topo do que aqui me podia ser ensinado. Sem- que o público receba a mensagem é preciso senti-la e para
pre fui muito consciente, ainda sem saber como se fazia, do senti-la é necessário estar embebido e focado totalmente.
que estava bem e do que estava mal feito. No final do conser- Compreendo que haja quem consiga conciliar várias coi-
vatório, tive a sorte de concorrer a uma bolsa para prosseguir sas e dar mais importância a outros aspectos da vida tão
os estudos. Espanha era um país com grandes tradições e importantes ou mais que a carreira, mas eu, pessoalmente,
com cantores que falavam por si como Montserrat Caballé, não consigo deixar coisas a meio. Na medida do possível,
Victoria de Los Angeles, Plácido Domingo, José Carreras, tentei sempre ter a família e amigos presentes e sou feliz e
Juan Pons e tantíssimos outros, e eu procurei estar mais perto consequente com as escolhas que fiz!
dessa realidade. Com a bolsa e as provas feitas para a Esco-
la Superior de Canto de Madrid, encontrei aí, realmente, tudo Porque a ópera é teatro, das personagens que interpre-
o que completava a formação de um cantor tendo tido como tou, qual a mais impactante no seu desenvolvimento ar-
mentora Marimí del Pozo. Terminado o curso, voltei a sentir tístico?
que a minha voz precisava de desenvolver certos aspetos e
estudei particularmente com Angeles Chamorro. Sempre retirei algo especial de cada personagem, sempre
pude dar alguma coisa de mim. Mas essa questão também
Subiu aos grandes palcos e trabalhou com os maiores está ligada com a mise-en-scène, a maneira como se traba-
nomes da cena lírica internacional. O que gostaria ainda lha com o encenador e o maestro. Para mim, tem de existir
de alcançar? uma sintonia perfeita entre todos os envolvidos, com igual-
dade de circunstâncias entre música e libreto, num grande
Na minha carreira nunca trabalhei com o intuito de alcançar trabalho de equipa e na possibilidade de todos cederem de
isto ou aquilo. Claro que sempre quis melhorar e dar um pas- parte a parte para construir uma grande produção, sem veto
so a seguir ao outro, um cantor tem o seu ego e ambição de diálogo por parte dos egos (que também são importan-
de cantar nos palcos emblemáticos internacionais, mas para tes nesta profissão, eu também tenho o meu!). Recordo os
mim, fazer música, cantar e interpretar sempre foi o mais im- meus primeiros Wagners com Harry Kupfer e também o tra-
portante. As personagens enriquecem-nos pela forma como balho com Gilbert Deflou, quando fiz a minha primeira Tos-
as vestimos e encarnamos. Evidentemente que cantar na ca. Foram momentos muito especiais porque as persona-
Ópera de Viena, no La Scala de Milão, no Metropolitan de gens foram realmente trabalhadas do ponto de vista daquilo
Nova Iorque, são grandes pontos de chegada, mas para mim que está escrito e não só a partir do estereótipo. Não posso
nunca foram pontos de partida. Tive a sorte de poder estrear deixar de destacar a minha primeira Elsa, em Lohengrin, em
a maior parte dos meus papéis com cantores da época de que fiz de criança, um papel que desfrutei imenso porque
ouro como Plácido Domingo, Eva Marton ou Renato Bruson, usava roupa igual à da minha infância. Relembro também
que me incentivavam e obrigavam a estar sempre ao máximo o meu primeiro Cid de Massenet que trouxe afora toda a
porque não podia falhar. Hoje sinto que ainda faltam fazer minha ingenuidade, sensibilidade e alguma infantilidade
coisas e ainda há mesmo alguns papéis que deixei propo- também. Eu ainda conservo muito de criança, com a idade
sitadamente para esta idade. A Turandot e a Brünhilde, por que tenho e apesar da vida nos ir marcando com alguns
exemplo, vieram quando a maturidade mo permitiu. Mas com momentos menos bons. Esse refúgio do regressar à infância
tudo aquilo que já fiz sinto-me muito feliz. O que vier, virá encaro-o sempre como a oportunidade de recomeçar.
naturalmente como tudo o resto.

82 | ONE WORLD | nº 5 | Julho 2017

“Na minha carreira
nunca trabalhei com o
intuito de alcançar isto
ou aquilo. [...] Mas com

tudo aquilo que já fiz
sinto-me muito feliz.

O que vier, virá
naturalmente
como tudo
o resto.”

O Teatro Nacional de S. Carlos, único teatro
de ópera em Portugal, é, ou deveria ser a
“Casa” de todos os cantores líricos portu-
gueses. Sente que assim seja? É o S. Carlos
a sua “Casa”?

Não é a casa de todos os cantores portugue-
ses. Deveria ser a casa de todos aqueles que
têm talento e estão preparados, mas infeliz-
mente não é. A nossa profissão é muito eféme-
ra, as coisas são o que são no momento, mas
quando canto e sinto o carinho do público e
das pessoas que trabalham no S. Carlos, sinto
que é a minha casa, sim. No entanto, em Por-
tugal temos muita dificuldade em acarinhar,
fomentar ou lançar os nossos cantores. O S.
Carlos é um teatro público, gerido com dinhei-
ro público, e por isso deveria cumprir com as
suas funções de teatro nacional: defender,
formar e catapultar os artistas nacionais. Cla-
ro que vivemos numa sociedade globalizada
e a arte é universal, mas devemos encontrar
um equilíbrio que justifique que venha cá quem
tem de vir mas também que os nossos, que
querem e sabem cantar, tenham a possibilida-
de de o fazer.

Julho 2017 | nº 5 | ONE WORLD | 83

essência.

Nos últimos 20 anos, o ensino da música, canto incluído, A par da sua carreira internacional, é docente na Escola
foi alargado a todos os níveis de ensino. Mais crianças têm Superior de Artes Aplicadas do Instituto Politécnico de
acesso ao ensino da música e mais jovens seguem estu- Castelo Branco. É importante para si deixar um legado às
dos superiores especializados nas diferentes vertentes da gerações futuras?
música. Sente que realmente houve mudanças no paradig-
ma do ensino da música em Portugal? Muito, sem dúvida. Neste momento da minha vida, de plena
maturidade, é importante não só continuar a minha carreira
Sim, evidentemente que há muitas mais crianças a ter aces- como cantora mas também poder passar o meu testemunho,
so ao ensino da música, que agora é muito mais alargado, e principalmente por ter tido a oportunidade de fazer carreira in-
isso é um aspeto muito positivo. É o que realmente faltava, ternacional e estar em contacto com grandes nomes da músi-
um acesso à arte e à música como existe à matemática ou às ca e do canto. Sou feliz quando ensino e vejo alguém seguir o
línguas, sensibilizar as crianças e dar-lhes a oportunidade de seu caminho. Tenho alunas que começaram aos 17/18 anos e
perceber se no futuro querem fazer das artes uma profissão agora têm 20/21 e começam a tornar-se umas senhoras canto-
ou mesmo que não queiram, adquirir esse conhecimento e ras. É quase uma relação maternal. Sentir que lhes dou armas
saber apreciá-las. Por outro lado, estamos a assistir a uma para traçarem os seus caminhos da melhor forma possível é
transformação no ensino em que o importante é estudar para para mim um grande estímulo. Mas contínua a ser uma dádiva
cumprir etapas. Em três anos já estamos licenciados e de re- recíproca. Eu aprendo imenso a ensinar. Se um dia conseguir
pente já temos o mestrado. Mestre é aquele que realmente formar pessoas que cantem pelo mundo fora, sentir-me-ei tão
podemos seguir, e, neste caso concreto, estamos a criar uma feliz como pela minha carreira enquanto performer.
quantidade de mestres que não têm experiência de perfor-
mance, de pisar um palco, executar e transmitir a música e a
palavra. Sem esta experiência não se pode ensinar. No fundo,
gostaria de perguntar à população em geral se as pessoas
que têm mestrado estão realmente capacitadas e sabem de
facto do que estão a falar.

O mercado de trabalho acompanhou este crescimento?
Sente que há mercado para os músicos portugueses?

Não, não há. É por isso que grande parte das pessoas fazem
o mestrado e imediatamente procuram trabalho na escola X ou
Y, porque não há trabalho como performer, mas daqui a algum
tempo também não haverá como professor. Neste momento
não existem orquestras suficientes e temos apenas um teatro
de ópera. Por outro lado, também não existem escolas que
possam acomodar todos os mestrados em ensino. Esta ne-
cessidade de alargar postos de trabalho tem de ser pensada
pelo governo como o é noutro qualquer trabalho. É preciso
criar infraestruturas para que as pessoas pratiquem a sua pro-
fissão.

mu“Agnupdpiroreelffnaoodrmrmaoi,inasmhrenepantecissraos-romraaeeeisrn-qaesuidinteeãacpora.efnSertfleeoizmcromcnopemserel.oo-”

84 | ONE WORLD | nº 5 | Julho 2017

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strategyxxi.pt VENDER CIDADES

A crescente concorrência entre territórios, à
escala nacional e internacional, nomeada-
mente na atração de turistas, investimento e
fixação de residentes, implica uma alteração
dos modelos de planeamento, gestão e pro-
moção dos territórios.

Estes modelos, trabalhados de forma integra-
da e concertada, adquirem uma relevância
extrema, potenciando a valorização e o reco-
nhecimento dos territórios.
O Marketing Territorial tem-se revelado a fer-
ramenta de eleição nesta matéria, permitindo,
de forma transversal ou setorial, maximizar os
resultados no posicionamento e divulgação
da marca e da oferta de valor territorial.

Julho 2017 | nº 5 | ONE WORLD | 85

essência.

MAFALDA

SANTOS

// A ARTE DE APELO
À INQUIETUDE

POR JOSÉ MARQUES DA SILVA

Licenciou-se em pintu-
ra e sempre acreditou
que o seu caminho era
no mundo das artes. Foi
programadora do espaço
PÊSSEGOpráSEMANA,
bolseira na Location One
em Nova Iorque e hoje
gere o “Moinho da Fonte
Santa”, uma residência ar-
tística no Alentejo. O seu
trabalho faz parte do es-
pólio de importantes cole-
ções de arte contemporâ-
nea portuguesa. Sobre as
suas obras, gostaria que
estas causassem inquie-
tude no seu público, mas
não sente grande apego
por elas. Conheça Mafal-
da Santos, artista plástica.

86 | ONE WORLD | nº 5 | Julho 2017

Licenciou-se em Pintura na Faculdade de Belas Artes do e exposições para ver, sente-se um permanente desassos-
Porto, em que momento é que percebeu que a arte seria sego por se poder estar a perder qualquer coisa. O meio
o seu futuro? Segue o exemplo de alguém próximo? artístico é mais profissionalizado mas existe uma grande
informalidade e facilidade na comunicação com os outros
Sempre senti que o meu futuro estaria ligado à criação artís- que deixa a sensação, por vezes enganadora, de que tudo
tica. Salvo alguns raros momentos minados pela inseguran- é possível. Foi nesse contexto que tive a oportunidade de
ça e alguma frustração, sempre acreditei que não deveria fazer uma intervenção site-specific no edifício Bloomberg, a
estar noutro lugar. Nesse aspecto, sigo o exemplo e força convite da curadora Cecilia Alemani e da associação Art in
da minha mãe que sempre me apoiou e incentivou a pros- General. Procurei nessa intervenção fazer um mapeamento
seguir uma carreira como artista. de todas as exposições, eventos e respectivos protagonistas
que visitei durante a minha estadia, numa tentativa de reter
Entre 2002 e 2007, foi programadora do espaço PêSSE- toda aquela informação.
GOpráSEMANA, que apoiava a apresentação do trabalho
de jovens artistas. No seu percurso artístico como tem Segundo Matisse, “é preciso estar a trabalhar para quan-
traduzido o apoio às novas gerações de artistas? Que do a inspiração surgir”. Normalmente trabalha à espera
conselhos lhes pode deixar? que a inspiração apareça ou trabalha quando se sente
inspirada? Como consegue gerir essa aparente dicoto-
O PêSSEGOpráSEMANA foi um espaço criado por mim e mia?
pelos artistas Miguel Carneiro e André Sousa, meus amigos
e colegas de faculdade. Ainda durante o nosso percurso Acho que gerir esta dicotomia vai ser sempre um desafio,
académico e a partir do espaço de atelier, surgiu como uma para além da permanente luta contra a procrastinação. Sim,
tentativa de criar condições (ainda que precárias) para ar- preciso de trabalhar constantemente e principalmente de es-
tistas da nossa geração apresentarem os seus trabalhos e tar em movimento para me deixar inspirar. O que pode acon-
propostas na área da performance, instalação, música etc. tecer enquanto arrumo e varro o atelier ou dando um passeio.
Procurávamos criar um espaço informal onde fosse possível Estar à espera raramente resulta…
fazer colaborações, experimentar formatos e trabalhar fora
do âmbito académico, galeristico ou institucional. O conse- Como tem sido o desafio de gerir a residência artística no
lho que posso deixar às novas gerações de artistas é que Alentejo, o Moinho da Fonte Santa? Facilita a conciliação
procurem organizar-se, que promovam e se envolvam em da vida familiar e profissional?
projectos colectivos. Não só permitem ganhar experiência
como a criarem as suas próprias condições de visibilidade, O Moinho da Fonte Santa é realmente um projecto a três,
o seu próprio discurso e autonomia. a nossa vida profissional e familiar está muito entrelaçada.
Recebemos artistas, musicos, realizadores de cinema que
Em 2007/2008 foi bolseira da Fundação Calouste Gul- vêm desenvolver os seus projectos no sítio onde vivemos e
benkian e Fundação Luso-Americana para o Desenvol- trabalhamos, com a vantagem da nossa filha poder partici-
vimento, na residência artística Location One, em Nova par e usufruir dessa dinâmica. No fundo, eu e o meu marido
Iorque. O que retirou dessa experiência? Manuel Mesquita, também ele um criador em várias fren-
tes, somos artistas em residência permanente aqui na Fonte
A minha experiência em Nova Iorque foi muito boa, quase Santa.
avassaladora. Existe uma quantidade infindável de eventos

Julho 2017 | nº 5 | ONE WORLD | 87

essência.

Sem título (2009). Acrílico e esmalte sobre pavimento.
Exposição “Hospitalidade”, comissariada por Miguel Von Hafe Pérezm. Hospital São João, Porto

Fotografia: André Cepeda

“Gosto de obras que me O seu trabalho faz parte do espólio de importantes cole-
cativam mas que não consigo ções de arte contemporânea portuguesa: António Cacho-
totalmente apreender, com la, Fundação Ilídio Pinho, Grupo RAR, ou Fundação PLMJ.
as quais me sinto automati- Onde gostaria de estar e tem algum local especial onde
camente conectada mas de gostasse de expor?
uma forma que ainda reserva
mistério. Acho que só a arte é A nível de colecções de arte contemporânea portuguesa
capaz de nos transportar para gostaria de fazer parte da colecção da Gulbenkian e de
esse território, que agita e al- Serralves. É sempre uma honra ser incluída em colecções
tera o nosso pensar e privadas, estas são guiadas por critérios diferentes, em que
sentir habituais.” normalmente existe uma ligação mais pessoal do coleccio-
nador com o trabalho. Quanto a exposições gostaria de ter
88 | ONE WORLD | nº 5 | Julho 2017 a oportunidade de expor mais no estrangeiro, estou sempre
aberta a desafios.

Vivemos tempos de massificação cultural, onde tudo é va mistério. Acho que só a arte é capaz de nos transportar
demasiado rápido para ser apreciado. Que desafios essa para esse território, que agita e altera o nosso pensar e sentir
realidade impõe ao mundo da pintura? Que fase atraves- habituais.
sa a arte contemporânea?
Há alguma obra, ou algum momento do seu trabalho, que
Acho que o maior desafio que a arte atravessa é o de resistir gostasse de destacar ou da qual que lhe tenha custado
à sua “comodificação”, para que não se torne num mero mais separar-se?
objecto de mercado ou veículo de discursos travessos. Isto
exige uma grande responsabilidade dos artistas e outros Não sinto grande apego pelas minhas obras depois de con-
agentes culturais mas também que a nível das políticas cul- cluídas, apesar de por vezes sentir grande satisfação quan-
turais haja um verdadeiro interesse e apoio naquilo que a do revejo uma obra minha de que gosto. Posso destacar a
arte pode oferecer e nas mudanças que pode operar e não obra que apresentei na Gulbenkian em 2005: uma pintura
só no que “fica bem na fotografia”. Importa também que a de grandes dimensões, realizada directamente sobre o pavi-
nivel pessoal e colectivo exista uma genuína disponibilida- mento de uma das salas da exposição “7 artistas ao 10 mês”
de e abertura para a fruição e compreensão da arte. A arte comissariada por Leonor Nazaré. Tornei aquela sala o meu
contemporânea teve o condão de afastar os seus espec- espaço de trabalho durante um mês e finda a exposição o
tadores fazendo-os provavelmente sentir que não estariam trabalho foi literalmente lavado do chão. Orgulho-me muito
equipados para uma linguagem que é por vezes hermética do resultado final, ainda que tão efémero. Na forma como foi
e codificada. Todavia, acho que essas barreiras têm vindo a feito e na forma que finalmente tomou sinto que reúne uma
ser derrubadas, também graças aos serviços educativos de série de características que são basilares no meu processo
diferentes intituições culturais. de trabalho.

Que reações gostaria que as suas obras despertassem O que nos podem trazer as próximas fases do seu percur-
nos apreciadores do seu trabalho? so artístico?

Gostaria principalmente de provocar alguma inquietude. Encontro-me numa fase de balanço em que estou a organi-
Pessoalmente gosto de obras que me cativam mas que não zar textos, desenhos, fotografias para compilar num livro que
consigo totalmente apreender, com as quais me sinto auto- reúna documentação do que tenho vindo a fazer nos últimos
maticamente conectada mas de uma forma que ainda reser- 12 anos. De resto, continuarei sempre a trabalhar!

Sem título (2005). Acrílico e cera sobre pavimento, 600x1150cm
Exposição “7 Artistas ao 10º Mês” Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa (detalhe).

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essência.

Théâtre

royal

de Toone

No coração de Bruxelas, ao fundo de um beco com menos de
um metro de largura, uma casa setecentista abriga, num pe-
queno sótão, “personagens de madeira com alma”: são as ma-
rionetas do Teatro Real de Toone. Um dos poucos teatros de
marionetas para adultos do mundo que ainda resiste à cultura
de massas. Venha conhecê-lo!

POR MANUELA CARAMUJO

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Fica situado no bairro mais emblemático da publicitando peças desde os anos 30 do sé-
capital da Europa, “o Ilhote Sagrado” (îlot culo passado um deles anuncia uma digres-
sacré), mas é preciso estar atento para se são por Portugal: Porto, Coimbra, Lisboa e
dar por ele. Bem ao lado da praça mais vi- Évora na década de 80. Chegamos ao pata-
sitada da Bélgica, a Grand Place, e das Ga- mar da bilheteira: um pequeno balcão com
lerias Reais Saint Hubert, é preciso levantar muitos anos, uma velha máquina registadora
o queixo para ver as letras pintadas que e o sorriso de Nicolas.
anunciam o Teatro Real de Toone. A entrada
é uma abertura de menos de 1 metro entre o Continuamos a subir e chegamos ao “céu
traçado de casas de tijolo espanhol que ain- das marionetas”! Um velho sótão, de telha-
da resistem de tempos muito idos. No cimo, do inclinado com as suas traves de madeira
uma escultura religiosa que já conheceu de onde pendem centenas de bonecos. A
melhores dias. Nas paredes do “Impasse de plateia é feita de pequenos bancos, pre-
Sainte Petronille”, os murais anunciam o pal- gados ao chão, com almofadas multicores,
co do teatro que não se vislumbra. Abrimos que anunciam o almejado palco vermelho e
a velha porta de madeira e vidros coloridos amarelo, com alguns personagens em me-
e recuamos no tempo. Entramos no “Estami- dalhões pintados.
net”: uma taverna sombria, onde velhas ma-
rionetas e restos de um palco convivem com Nicolas passa entre o público, chamando-
os turistas e suas câmaras fotográficas. É a -o com uma campainha, com a sua voz de
ante-câmara do nosso teatro. No extremo barítono deseja-nos um bom espetáculo e
oposto, uma pequena porta anuncia a entra- desaparece atrás da cortina. Hoje sobe à
da da sala de espetáculos. Faltam 5 minutos cena: Os Quatro Filhos de Aymont, de Her-
para começar e os clientes do Estaminet e mam Closson, mas poderia ser uma adap-
outros vindos da rua começam a fazer fila. tação de Carmen, a ópera de Bizet, ou de
Os Três Mosqueteiros de Alexandre Dumas
É o próprio Toone VIII, Nicolas Géal, com o ou de Hamlet de Shakespeare, entre muitas
seu sorriso cativante, quem abre a porta e outras peças. Na boa tradição do teatro de
nos convida a entrar. Uma escada íngreme marionetas, é Nicolas quem faz todas as
e estreita, as paredes forradas com cartazes vozes do espetáculo, desde as entoações

Hamlet
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essência. solenes, às sepulcrais, alternando entre o registo masculino
e feminino. Começa por dar voz ao simpático Woltje, ma-
Le Bossu rioneta mais pequena que encarna o próprio Teatro Toone
Les Trois Mosquetaires com o seu fato e boina de xadrez branco e preto, que faz
de narrador e vai interpretando pequenos papéis no enre-
do, e passa para o Imperador Carlos Magno, o duque e a
duquesa, etc. Ao seu lado, trabalham 6 marionetistas que
manipulam os “atores” de madeira. No seu conjunto fazem
rir, e muito, o público, acentuando as características das
personagens, mas “sempre respeitando os autores”, como
mais tarde nos explicará Nicolas.

Uma “dinastia popular”, nem sempre hereditária

Não restam dúvidas de que Nicolas, aliás, Toone VIII, é a
alma do Teatro Real de Toone. Ele é ator, encenador, drama-
turgo, barman no intervalo das peças, reparador de mario-
netas e administrador do Teatro e do seu legado. Esta última
função, confessa-nos, leva-lhe mais tempo do que gostaria.
Toone está-lhe nos genes. Recebeu a coroa do pai, José
Géal, o mítico Toone VII, numa cerimónia de entronização
como manda a tradição de cada vez que é preciso nomear
um sucessor. Só entre o III e o IV Toone a coroa tinha pas-
sado de forma hereditária. Infelizmente, Nicolas já não rece-

Les Trois Mosquetaires
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beu a coroa original, a que era usada por marionetas como ta ser neste ponto que está o futuro do seu teatro: “a ní-
Carlos Magno ou Jesus Cristo, pois esta desapareceu, en- vel técnico não é de esperar mudanças radicais. Às vezes
tretanto, levada por algum “amante de coroas”, como nos tentamos novos cenários, mas continuamos sempre com as
conta Toone VII que hoje veio expressamente ao teatro para técnicas tradicionais. Os nossos bonecos têm resistido ao
receber a ONE WORLD e nos contar a sua história e a desta teste do tempo, têm sido polidos e usados por gerações
dinastia popular. de marionetistas. Foram desenhados por mãos experientes
até terem atingido o tamanho, o peso e o equilíbrio ideais.
Toone é o diminutivo de Antoine Genty, o criador deste teatro Atingiram um grau de perfeição que já é difícil de ultrapas-
em 1830, Toone “o velho” ou Toone I. “As marionetas tradi- sar”. Mas há que captar novos públicos e ser competitivo
cionais eram o único meio de educar o povo”, lembra Toone num mundo da cultura de massas, por isso os espetáculos
VII. Nessa época, “os marionetistas íam ao La Monnaie [Tea- já não são de improviso como antigamente, mas há muitos
tro Real de Ópera] para copiar os grandes espetáculos que ensaios e muito trabalho de estudo e bastidores”.
eram inacessíveis às classes mais modestas. Era a única Se o Toone IX também terá o apelido Géal ou se a coroa
maneira que o povo tinha de estar informado da atualidade passará para outra família amante de marionetas, ainda é
cultural”. Mas as marionetas em Bruxelas são mais antigas e muito cedo para se saber, mas por agora só nos resta dese-
tornaram-se famosas na clandestinidade. O seu auge data jar: Longa Vida ao Teatro Real de Toone!
do reinado de Filipe II (sim, o de Espanha e I de Portugal
que também herdou a coroa dos Países Baixos do seu pai, Nicolas Géal
o Imperador Carlos V) que, não sendo muito amado nesta Toone VIII
parte do império, mandou fechar os teatros para impedir
“ajuntamentos”. A população de Bruxelas substituiu então Julho 2017 | nº 5 | ONE WORLD | 93
os atores por estes bonecos de madeira, os polichinelles,
em teatros clandestinos. “Havia muitos teatros de marione-
tas, mas o nosso é o único teatro de marionetas tradicionais
de Bruxelas que ainda está em atividade”, afirma Toone VII,
com orgulho. Muito deve-se à gestão deste ator octogenário
que “abriu o teatro à Europa”, apresentando os espetáculos
em várias línguas, embora mantendo o dialeto bruxelense
que sempre está presente nas peças e conseguindo a pre-
servação do património que são estas marionetas, a casa e
os próprios manuscritos de tradição que o pequeno museu
do teatro alberga. Uma luta que está a ser travada agora
pelo seu filho Nicolas que em 2016 impediu que o teatro
fosse fechado por falta de subsídios.

Mais do que um museu, Toone VIII quer manter o Teatro
vivo, “uma casa de espetáculos pelos espetáculos, não
apenas como legado histórico-cultural”. Por isso, cada dois
anos “tento criar uma peça nova”. Ao oitavo Toone deve-se
a introdução da literatura fantástica no repertório dos seus
polichinelles que, pela sua pluma e voz, interpretaram Drá-
cula e, recentemente, Dr Jekill e o Sr Hyde uma adaptação
muito lúdica do romance de R.L. Stevenson. Tentam-no os
romances policiais e Nicolas gostaria de converter Sherlock
Holmes num dos seus “bonecos com alma”. Aliás, acredi-

essência.

MCaajeféstic

Direito ao “mimo” e ao luxo

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No Majestic Café viajamos do pequeno mimo a uma refei-
ção de luxo. É como entrar num mundo à parte em plena rua
de Santa Catarina no Porto. O barulho da rua comercial pa-
rece ficar lá fora, enquanto o chocolate na beira da chávena
de café ou o chá aquecem os dias frios e o piano do fundo
de sala abranda os dias quentes.

O Majestic abre as suas portas a 17 de Dezembro de 1921,
pela autoria do arquitecto João Queiroz como Café Elite.
É o reflexo do vigor do Porto dessa década - das tertúlias
políticas ao simples debate de ideias. O espaço transpare-
ce o espírito da «Bélle Époque» em toda a sua decoração,
desde a Arte Nova aos bancos aveludados, à espelharia
em cristal flamengo e ao mármore e metal que se interligam
com requinte. Foi precisamente o glamour de Paris, tão in-
fluente na cultura portuguesa da altura, que fez recair em
“Majestic” a escolha do novo nome. Nas traseiras encontra-
mos a natureza de um jardim de inverno, que junta a rua de
Santa Catarina à rua de Passos Manuel.

O café teve todas as honras e distinções, recebendo visitas
ilustres, como o Almirante aviador Gago Coutinho que re-
gressou várias vezes, uma delas acompanhado pela actriz
Beatriz Costa. No Majestic passou a reunir-se a elite cultu-
ral como os escritores José Régio, Teixeira de Pascoaes ou
Leonardo Coimbra.

Na década de 1960, coincidindo com um certo adormeci-
mento forçado das manifestações culturais do país, o Café
Majestic começa, ele próprio também... a adormecer, num
declínio lento mas contínuo. Existem algumas tentativas de
revitalização, mas só em 1992 é que se decide devolver-lhe
a vaidade justa de ser um dos mais belos cafés do Porto. A
15 de Julho de 1994 o Majestic abre novamente as portas,
após dois anos de trabalhos. Hoje tem cultura, beleza arqui-
tectónica, arte e eventos.

Inúmeros prémios e o reconhecimento internacional surgi-
ram naturalmente, como surgem e estão para ficar, as ra-
banadas envoltas num suave creme de ovos e frutos secos.

Texto: Adaptado de Rota dos Cafés com História
Fotografia: Jorge Simões | Rota dos Cafés com História

Julho 2017 | nº 5 | ONE WORLD | 95

360º

Pela lente de António Luís Campos

Horta | Faial Norberto Serpa é um dos rostos do Faial e do mar açoriano. Pioneiro nas atividades turístico-maritimas, como a observação de
cetáceos, mergulho e apoio à fotografia subaquática, está também ligado à Universidade dos Açores e à investigação oceanográfica.
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António Luís Campos

Nascido em Coimbra em 1977, é um fotojornalista apaixonado por temáticas ambientais e colaborador regular da Natio-
nal Geographic Magazine. Após ter terminado o curso de Engenharia Electrotécnica, foi voluntário de ONGs ambientais
nos Pirinéus, em Espanha e, mais tarde, na Polónia. Membro do colectivo 4SEE Photographers, expôs já em diversos
países e publicou quatro livros em nome próprio: Metamorfose, À Beira da Água, Geografia da Esperança e mais recen-
temente Sobre|Viver, projecto documental sobre a Amazónia boliviana. Foi premiado no concurso VISÃO/BES Fotojor-
nalismo e desenvolve uma intensa atividade como formador de fotografia, sendo ainda líder de viagens-aventura com a
agência Nomad e curador da galeria Manifesto.
antonioluiscampos.com

Crónicas da Atlântida

Durante dois anos o fotojornalista da National Geographic, António Luís Campos, percorreu os Açores de lés a lés, em
busca das pequenas grande estórias do quotidiano insular. São as Crónicas da Atlântida. Uma jornada visual pelas
nove ilhas açorianas, da maior à mais pequena, de Leste para Oeste, tendo a viagem pelo dia-a-dia das suas gentes
como fio condutor, numa narrativa construída ao sabor dos elementos. Continental apaixonado por este arquipélago,
recorre à fotografia e à escrita de viagem para partilhar uma visão muito pessoal da verdadeira essência açoriana, num
projeto documental de longa duração, que em 2017 será editado em livro, focado sobretudo nas pessoas, muito mais
do que nas paisagens.
cronicasdaatlantida.org

Março 2017 | nº 4 | ONE WORLD | 97

Norte Pequeno | São Jorge
A família Brasil sempre teve uma relação muito
forte com a lavoura, e apesar de manterem ape-
nas algumas vacas - o que obriga à ordenha ma-
nual - a cumplicidade é impressionante, com cada
animal a reagir ao seu nome e às festas que lhes
fazem, na brincadeira.

Flores
Marc Antoine Ragot, fotógrafo francês radicado
na ilha das Flores, brinca com a filha, de longe
a mais jovem natural da ilha, que o próprio pai
ajudou a vir ao mundo, dada a opção do casal em
ter um parto domiciliário. Devido à inexistência de
maternidades nas ilhas mais pequenas, há anos
que não nascem crianças nas Flores, sendo as
grávidas obrigadas a viajar para as ilhas princi-
pais com semanas de antecedência, onde têm os
partos longe do seu ambiente familiar.

98 | ONE WORLD | nº 5 | Julho 2017

Ribeirinha | Graciosa
Agostinho Espínola tem o seu emprego diário
mas como uma considerável parte dos açoria-
nos, complementa-o com a criação de vacas e
com a vinha. No final do Verão, a sua pequena
adega, cujo lagar foi construído pelo pai após
uma desavença com um vizinho que lhe rouba-
va uvas, ganha vida.

Julho 2017 | nº 5 | ONE WORLD | 99

Costa do Corvo | Corvo
José Freitas, 48 anos, pescador, num dia de mar azeite primave-
ril, numa pausa da pesca ao cherne com a vizinha ilha das Flores
em fundo. Cigarro após cigarro, o dia vai-se passando dolente-
mente, ao ritmo da pescaria.
Porto Formoso | São Miguel
A faina começa ainda de noite, a madrugada surge já no mar
alto… Foi uma manhã sombria para Mestre Eugénio: o entusias-
mo dos homens esmorecia à medida que as armadilhas de fundo
eram recolhidas, hora após hora, quase vazias. Para complicar,
um outro conjunto havia-se perdido e nem mesmo os muitos pa-
res de olhos, varrendo o horizonte, encontraram sinal das bóias
sinalizadoras.

100 | ONE WORLD | nº 5 | Julho 2017


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